Introdução
A Internet, nos últimos anos, possibilitou um real crescimento econômico. Os mercados digitais passaram a fornecer uma plataforma rica em soluções para integrar os diferentes modelos de negócios (LEBOULANQER, 2009). Exemplo dessa expansão é o crescimento de $29,34 bilhões em 2012, posição conquistada pela C2C markets (LEE, 2014).
Os desafios apresentados pela economia digital ao regime tributário não são novos (MORENO, 2015). A globalização, em sua evolução sistêmica, modificou os negócios de forma a romper com o mercado tradicional. O que implica desenvolver novas legislações para suprimir as lacunas deixadas pelas relações criadas. Nessa linha argumentativa, é inegável a necessidade da evolução legislativa frente às mutações econômicas e tecnológicas. Além disso, olhando para o real contexto, percebe-se a preocupação das entidade governamentais em buscar soluções para essa problemática (DEVEREUX; VELLA, 2017).
Alguns projetos inovadores criaram a estratégia para combater as incompatibilidades e lacunas deixadas pelos novos modelos de negócio (ECONOMIC, 2018).No entanto, no caso do Brasil, essas regras se demonstraram ineficazes visto as condições anômalas das operações executadas pelos empreendimentos eletrônicos. Isso ocorre, muitas vezes, pois na Internet grande parte das transações acontecem sem nota fiscal ou sem outra forma de registro.
No entanto, conforme a própria dinâmica da comunicação, tudo o que ocorre na rede pode ser identificado e rastreado. Seria, portanto, uma questão de implantação de software centralizado para que os tributos passassem a ser recolhidos automaticamente em operações eletrônicas, com um risco de sonegação muito menor do que o do mundo real (PINHEIRO, 2012).
Apesar da solução simples apresentada anteriormente, no atual contexto, a realidade é outra. Não existe um software que receba os dados das transações entre consumidor final e as lojas virtuais. Acarretando em um trabalho moroso e ineficaz por parte dos órgão fazendários. No entanto, existem suportes legislativos capazes de suplantar as ferramentas dos órgãos fazendários para as mutações ocorridas no plano tributário. Usando a Lei complementar 105 em conjunto com as ferramentas de sistema de informação é possível construir um plano eficiente de fiscalização.
É nessa linha uma das preocupações desse estudo. Avaliar o plano de aplicação da lei complementar 105 diante das inúmeras controversas sobre o sigilo bancário e fiscal. Assim como, definir uma estratégia fiscal para o combate de sonegadores digitais. Aliás, o estudo se propõem a debater as formas razoáveis de fiscalização frente aos processos eletrônicos existentes.
Indiscutivelmente, são questões importantes que merecem um aprofundamento jurídico e social e servem, inicialmente, como um ponto de reflexão. Portanto, a tese central é apresentar as formas de fiscalização da administração tributária frente aos novos desafios decorrentes das relações eletrônicas e, ao mesmo tempo, de forma subsidiária, discutir os seus impactos frente aos direitos fundamentais dos indivíduos.
A Lei Complementar 105 de 2001
Visando a aparelhar o Estado de instrumentos jurídicos aptos a capacitá-lo a fazer valer, na prática, o princípio da capacidade contributiva , a Constituição Federal de 1988, no Art. 145 § 1, facultou à administração tributária ”identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”. (ALEXANDRE, 2015)
O legislador, preocupado com a finalidade social do tributo, buscou estabelecer mecanismos para que o Estado alcance seus objetivos. Assim, o direito ao sigilo aos dados bancários não pode servir como barreira invencível para o fim coletivo que o Estado procura. Entende-se dessa forma, pois o prejuízo da arrecadação por sonegadores pode acarretar a mitigação de políticas públicas.
Nessa linha de raciocínio, o grande jurista, Alexandre de Moraes, explica que os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5o da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. (MORAES, 2017)
Portanto, é passivo de entendimento que atividades espúrias ao Estado Democrático de Direito não podem prevalecer sobre a proteção do manto dos direitos fundamentais. Assim, a Lei complementar 105 surgiu para combater exatamente essa premissa, pois, até então, muitos contribuintes alegavam o sigilo bancário como forma de escusar-se da fiscalização e, consequentemente, lograr êxito nas atividades ilícitas.
Paradigma da LC 105 e a chancela do Supremo Tribunal Federal
A lei complementar 105 tem por objetivo possibilitar à Administração Tributária o acesso aos dados bancários dos contribuintes. Aliás, pode-se dizer que esse dispositivo legal é um excelente instrumento no combate aos ilícitos tributários praticados por pessoas físicas e jurídicas. Em sua essência, a LC visa garantir que o Estado tenha a devida arrecadação, com ferramentas adequadas para desvendar esquemas de sonegação, objetivando que o Estado cumpra seu papel garantidor de direitos e ofereça à população serviços públicos de qualidade. Isto porque a função do Estado fica prejudicada na medida em que alguns contribuintes burlem a Administração Tributária e contribuam menos do que efetivamente deveriam. (VALADãO; ARRUDA, 2014)
Infelizmente, esse pensamento não é compreendido de forma unânime pela Egrégia Corte Constitucional Brasileira. Alguns ministros alegam que a o rompimento do sigilo bancário só pode ser feito por uma função jurisdicional, nesse caso, órgãos tributários não poderiam restringir esse direito por se tratar de uma função juridica-arrecadatória.
O ministro Celso de Mello aponta:
Mostra-se imperioso assinalar, considerados os fatos subjacentes ao litígio em causa, que se revela inacolhível a pretensão da administração tributária federal, que busca afastar, ”ex propria auctoritate” independentemente de prévia autorização judicial, o sigilo bancário[..]
No mesmo sentido, o relator - Marco Aurelio – disciplina:
Tenho que o sigilo bancário está sob a proteção do disposto nos incisos X e XII do artigo 5o da Constituição Federal. Entendo que somente é possível afastá-lo por ordem judicial.
Nas inteligentes palavras de (VALADãO; ARRUDA, 2014), os argumentos sustentados pelos ministros - reserva de jurisdição - não devem prosperar. Segundo os autores, o efeito de limitar a quebra do sigilo por um órgão jurisdicional inviabilizaria uma fiscalização eficiente, impedindo que se efetive os preceitos do art. 145 § 1o e do princípio da eficiência previsto no art. 37 da Constituição Federal.
Ainda, na visão dos renomados escritores, a restrição jurisdicional poderia resultar em transformar o juiz em auxiliar da autoridade fazendária, considerando que atualmente praticamente todos os contribuintes movimentam valores via sistema bancário, e, por conseguinte, o judiciário, já abarrotado de processos, ficaria mais empanzinado pelos pedidos de acesso a dados bancários, prejudicando inclusive a regular tramitação de outros processos. (VALADãO; ARRUDA, 2014)
Na verdade, o real interesse na quebra do sigilo resulta de um processo democrático, que vive da confiança do povo no governo. Assim, tudo que concorra para que o Estado não possa adequadamente atuar, conspira contra o Estado Democrático de Direito. Portanto, a eventual relativização da liberdade individual expressa pela transferência do sigilo bancário ao fisco, em realidade, constituiria um mecanismo de efetividade da ação fiscalizadora, e, portanto, de fortalecimento da confiança nas instituições, expressão do fortalecimento democrático. (LAKS, 2017)
Ambos autores entendem, de forma sistemática, a essência da LC 105 como fruto da conservação da ordem pública por meio da proteção ao sistema econômico e fiscal dos contribuintes. Aliás, (LAKS, 2017) destaca que o direito ao sigilo bancário e fiscal devem ser observados até o limite em que o interesse público de todos seja a causa determinante de seu excepcionamento.
Importante lembrar as brilhantes palavras do Ministro Maurício Corrêa no voto do Mandado de Segurança 21.729-4 DF - Impetrado pelo Banco do Brasil contra o Procurador Geral da República, que buscava a quebra de sigilo bancário para fins de investigação de corrupção.
Tese tão despropositada, como a do segredo profissional absoluto do banqueiro, conduziria a situações absurdas. O ladrão que depositasse o dinheiro furtado em um banco teria o produto do crime resguardado da apreensão pelo poder público e da reivindicação da vítima.
Em outro trecho de seu voto, o Ministro nos brinda com as seguintes afirmações:
Esta Corte, em inúmeros julgados, vem dizendo reiteradamente e com sabedoria que o direito ao sigilo bancário é um direito limitado, não absoluto, e que pode ceder a interesses públicos em determinadas e restritas situações, sempre orientadas para a busca da verdade no interesse da justiça, seja em causas de natureza penal, administrativa ou civil.
Em conclusão, o Ministro Gilmar Mendes profere seu voto esclarecendo:
Havendo tensão entre o interesse do indivíduo e o interesse da coletividade, em torno do conhecimento de informações relevantes para determinado contexto social, o controle sobre os dados pertinentes não há de ficar submetido ao exclusivo arbítrio do indivíduo.
É importante notar que a grande parte da Suprema Corte entende ser possível a quebra de sigilo bancário por órgãos fazendários. Isso denota a real necessidade da Lei complementar 105 que regula os limites e finalidades da restrição do sigilo. Ademais, é possível enxergar, pelos votos citados, a linha harmônica de pensamento dos ministros, qual seja: o interesse público sobre o particular, princípio corolário que norteia o Estado Democrático de Direito.
Para esgotar o assunto, resta discutir se realmente existe a quebra de sigilo bancário quando a autoridade fiscal solicita informações às instituições financeiras. A princípio, é importante expressar as palavras do Ministro Dias Toffoli no MS 389.808:
A lei comete um ato falho, porque ela fala em quebra de sigilo. Na verdade, aqui, quando se fala em quebra, quer-se dizer transferência do dever de sigilo.
Assim sendo, não há que se falar em violação ao sigilo bancário (”quebra de sigilo”) em relação às informações transferidas do banco ao fisco. Na verdade, o que há é transferência de sigilo. Veja-se que a lei disciplina a transferência de dados bancários mesmo entre instituições financeiras, e não fala, portanto, de quebra de sigilo, mas de transferência de sigilo. O que é corroborado pelo que dispõe o § 3o do art. 1o, quando diz ”não constitui violação do sigilo...” referindo-se às situações em que a Lei permite a transferência de informações, mas sempre mantendo o sigilo em relação aos destinatários das informações. Ocorre ”quebra de sigilo” apenas na hipótese prevista no § 4o do art. 1o da Lei em comento, quando a informação é necessária para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial, para apuração de crimes (o processo penal, em princípio, é público), embora o art. 10 da LC 105/2001 estabeleça que a ”quebra do sigilo” foras das hipóteses prevista na Lei se constitua crime e o § 2o do art. 3o também indique a ”quebra” em determinadas circunstâncias (com prévia autorização judicial). Ou seja, ”quebra do sigilo” é diferente de ”transferência de sigilo”, nos termos da LC 105. (VALADãO; ARRUDA, 2014)
Em conclusão, é possível avaliar o grande salto jurisdicional feito pelo Supremo Tribunal Federal, respeitando a Constituição Federal e, ao mesmo tempo, possibilitando o cumprimento das medidas que garantam eficiência administrativa. Aliás, é importante frisar a evolução judicial das decisões proferidas. Extrai-se que o direito à intimidade não pode blindar atividades ilícitas sobre o manto dos direitos fundamentais. É nesse sentido, em favor da democracia, que a Corte Suprema chancelou a constitucionalidade da referida lei.
Fiscalização Digital e as suas consequências
Quando se fala em fiscalizar um tributo ou ações dos contribuintes deve se levar em consideração em que meio haverá esse exercício. Atualmente, pelas transformações sofridas nos modelos de negócios, muitos ajustes e novos conceitos surgiram para encaixar essas formas aos meios eletrônicos.
Essa nova forma de fazer negócio não muda os conceitos tradicionais das definições dos tributos (PINHEIRO, 2012), mas traz novas consequências no plano de arrecadação e fiscalização. Assim, é possível entender que haverá uma transformação completa na forma de efetivar o exercício da Administração Tributária. Na verdade, isso envolverá treinamento e mais capacitação por parte dos agentes como também os ajustes legislativos para conferir efetividade nas atividades exercidas por eles.
Ademais, com a mudança do meio físico para o digital outras formas de sonegar foram criadas e outras aprimoradas. Isso ocorre, pois nesse meio as informações ficam ”escondidas” e não se revelam facilmente aos órgãos fazendários. Assim, surgem inúmeros problemas à administração, pois o número de transações feitas por meio da internet é infinitamente superior aos agentes disponíveis para fiscalizá-las.
Nessa linha, um grande passo legislativo foi a criação da Lei Complementar 105 que possibilitou aos órgãos administrativos dispor de uma ferramenta poderosa para o combate de ilícitos tributários. No entanto, deve-se assegurar que ela, por si só, não torna o ambiente protegido de atividades espúrias, na verdade, trata-se de um instrumento que colabora para a fiscalização, mas não se revela capaz de identificar ilícitos de maneira autônoma.
Em tese, a busca pela excelência na fiscalização de ações eletrônica é uma tarefa árdua e complexa. Muitas vezes esse objetivo torna-se inalcançável, pois, em determinadas situações, os autores - contribuinte e administração pública - estão em conluio, exemplo disso seria os crimes de corrupção. Por fim, é preciso levantar a questão de inúmeros tributos definidos na Constituição Federal, cada qual gerido em favor do ente da federação, o que, por sinal, dificulta ainda mais o processo de fiscalização.
Diante de vários problemas citados, surge o questionamento: é possível realizar uma fiscalização adequada para o meio digital? espantosamente, a resposta é sim. Deve-se levar em consideração que não se pode combater novas formas de sonegação com métodos antigos, é preciso reprimir os ilícitos digitais com as próprias ferramentas digitais. Exemplo disso seria o cruzamento de dados.
Para exemplificar a problemática, poderia citar um contribuinte que justificando um passivo a descoberto declara uma doação como forma de contorna o problema. Veja, esse tipo de informação é fornecida por meio da declaração de imposto de renda, sendo praticamente inalcançável aos fiscos estaduais, que são competentes para disciplinar o imposto de transmissão causa mortis e doação. Nesse caso, a incomunicabilidade da União com os Estados poderia acarretar a sonegação do tributo.
A situação acima trata-se de uma forma de ludibriar o fisco com o propósito de escapar da fiscalização tributária. Aliás, a falta de origem de recurso poderia ser suprida pela doação, ocasionando um equilíbrio contábil financeiro e, por seguinte, aplicar corretamente o princípio das partidas dobradas (LUDíCIBUS; MARTINS; CARVALHO, 2005), situação que passaria despercebida pelos fiscos, já que não compete à União a fiscalização de tributos estaduais.
No entanto, objetivando o combate ao ilícito exposto, muitas fazendas estaduais criaram portarias e convênios que cooperam com os fiscos federais e municipais. (FéLIX; HENRIQUE, 2018) Ademais, o compartilhamento de dados é um acordo que possibilita aos fiscos avaliarem, com o cruzamento de informação, os processos que estão transitando em outros sistemas. No caso em tela, bastaria a comunicação da escrituração da doação no imposto de renda ao fisco estadual, resultando avaliar se realmente foi recolhido o valor sobre o fato gerador.
Portanto, a integração sistêmica possibilita um grande avanço em termos de fiscalização. Aliás, todo o processo é feito por sistemas digitais que cruzam as informações importantes, avaliando se realmente os contribuintes cumpriram com o recolhimento. Nesse caso, há clara evidência da eficiência administrativa, pois não há presença subjetividade dos agentes tributários. Assim, as inúmeras transações fiscais acabam sendo analisadas pelos próprios programas de computadores, resultando em um trabalho célere, objetivo e eficiente.
A substituição tributária na relação digital
Em parceria com a análise de dados e o cruzamento das informações, a substituição tributária é um instrumento eficaz no combate à sonegação fiscal. Além disso, a sua adoção constitui exigência da sociedade moderna, visando à aplicação do princípio da praticabilidade da tributação. Apoia-se, aqui e alhures, em dois valores básicos: necessidade de evitar a evasão fiscal (segurança fiscal) e de assegurar recursos com alto grau de previsão e praticabilidade (certeza fiscal).(RIBEIRO, 1997)
Nessa linha de pensamento, que o Desembargador Mohamed Amaro, no seu voto luminoso, esclareceu:
Apelação Cível no 214.003-2/7, da Comarca de São Paulo. Não se compreende a feroz resistência oposta por alguns à substituição tributária nas operações subsequentes, como evolução da política tributária, como se isso fosse novidade no país e já não existira desde o Código Tributário Nacional (art. 52, § 2o, II, posteriormente revogado pelo DL 406/68, e restabelecido pelo sistema da LC 44/83), insistindo em pugnar pela manutenção de um modelo colonial que, aliado à massificação das operações, revela-se propício aos sonegadores, em contrapartida, olvidando-se o magistério do sempre lembrado Aliomar Baleeiro, para quem os tributos destinados à manutenção dos serviços públicos ”devem ser arrecadados por meios expeditos, simples e econômicos”, ... ”e, dentre eles, a transferência da responsabilidade pela dívida tributária do contribuinte para os ombros de terceiro”(Direito Tributário Brasileiro, São Paulo:Forense, 10a edição, p. 479)
Dessa forma, tecnicamente, a substituição tributária é um método no qual a responsabilidade pelo recolhimento do tributo é atribuída ao contribuinte que não pertence ao fato gerador da ação direta. Assim, trata-se de um modelo estratégico usado pelo fisco para responsabilizar terceiros por fatos geradores desconexos.
Exemplificando, um empregador que receba a título oneroso R$ 2500.00 reais recolherá R$ 170,62 de imposto de renda, base de cálculo deduzido da contribuição social.(RFB, 2019) Portanto, a fonte pagadora descontará o valor respectivo em folha de pagamento, assumindo a responsabilidade como substituto. Assim, a empresa fica responsável por escriturar os tributos a recolher e, consequentemente, pagar os devidos crédito para a União.
É dessa forma que a relação digital mostra-se um item a complementar o mecanismo da substituição tributária, pois todas essas checagens - crédito e débito - são avaliadas por meio de programas de computadores desenvolvidos para essa finalidade. Assim, a análise é feita em cima dos demonstrativos e relatórios contábeis. Portanto, essa duas ferramentas se mostram eficazes para combater os ilícitos tributários.
Mudança no sistema tributário. Centralização das transações
(ALBUQUERQUE, 1990) revela um projeto ousado para substituir os inúmeros tributos elencados na Carta Magna. Em seu artigo, Marcos Cintra Cavalcante de Albuquerque contempla a ideia de reduzir todos os impostos a um único tributo, o qual incidirá sobre todas as transações monetárias. Aliás, não se pode negar a audácia do projeto e a repercussão que teria caso fosse aprovado pela emenda constitucional apresentada pelo Deputado Federal Flavio Rocha.
O Autor defende essa ideia, pois avalia tratar-se de uma nova concepção de administração fiscal, com características que não se confundem minimamente com a mera redução do número de impostos; em realidade, o fundamental são as inovações do ponto de vista de administração e de técnicas tributárias permitidas pelo projeto. Além disso, a proposta é discutida e avaliada em função de seu impacto ao contribuinte, nas formas de gestão pública, e nos mercados financeiro e de capitais. Por fim, o estudo busca atender aos critérios de simplicidade, custo, equidade e eficiência.
Por outro lado (NETO, 1991) rebate os argumentos do douto economista. Na visão de Alfredo Meneghetti Neto, o conceito trazido no projeto apresenta diversas falhas. Por exemplo, constata-se que o imposto é disposto em cascata, ou seja, atinge todas as etapas de fabricação dos produtos. Dessa forma, um produto é tributado repetidamente; também, segundo ele, há grande parcela da sociedade que não se utiliza de movimentação de dados bancários e tributar essas pessoas acima da média resultará em um sistema desproporcional e desigual.
Apesar das inúmeras controversas, é possível encontrar um ponto de convergência entre os autores. Ambos entendem que a centralização tributária favorece a fiscalização e arrecadação dos órgãos fazendários. Simplesmente, ocorre uma filtragem em um determinado momento já que as transações passam por um único ponto. Por fim é importante esclarecer que não se está aqui defendendo ou criticando o projeto. Na verdade, buscou-se pesquisar um ponto relevante discutido na proposta que é de grande relevância para a administração tributária. Aliás, é inegável a vantagem obtida pela concentração de dados em uma única base de dados, ainda mais quando o processamento e a checagem são feitas por sistemas de computadores.
Considerações finais
Conclui-se que o tema é de grande relevância para a sociedade moderna. Primeiro, porque a sonegação tributária implica investimentos menores em programas sociais; segundo, pois se trata de aplicar o princípio da eficiência administrativa em busca da supremacia do interesse público sobre o particular. De todo modo, a evasão fiscal é um problema intrinsecamente relacionado com a ordem social, pois menos recursos, menos direitos.
Ademais, o foco do estudo limitou-se a algumas ferramentas, métodos e técnicas, sendo elas: substituição tributária, centralização de dados e cruzamento de informações. No entanto, há muitos itens que podem auxiliar os órgãos tributários a busca pela plena eficiência. Em tese, é uma área que pode ser explorada de várias formas, mas deve seguir o caminho digital, pois a cada dia, as pessoas tendem a ficar mais conectadas.
Na verdade, é importante frisar que todas essas ferramentas demandam de projetos legislativos. Essas medidas devem estar repousadas na Constituição Federal, respeitando os direitos fundamentais do cidadão. Aliás, não pode o Estado – pelo poder-dever - desrespeitar os direitos basilares da sociedade. Nessa linha, o desempenho de atividades administrativas por parte dos órgãos públicos deve andar em consonância com os preceitos morais e éticos. Um servidor público precisa atuar dentro dos parâmetros da legalidade, portanto é importante o apoio do Congresso Nacional aos avanços da forma de arrecadar e fiscalizar, assim como a ampliação aos poderes dos agentes tributários.
Referências
ALBUQUERQUE, M. C. C. de. O imposto único sobre transações (iut). In: . [s.n.], 1990. [Online; accessado em 14-05-2019]. Disponível em: <https: //bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/1861/TD06.pdf>.
ALEXANDRE, R. Direito Tributário esquematizado. São Paulo, 2015.
DEVEREUX, M.; VELLA, J. Implications of digitalisation for international corporate tax reform. Digital Revolutions in Public Finance, p. 91–112, 2017.
ECONOMIC, O. for. Base erosion and profit shifting. In: . [s.n.], 2018. [Online; accessado em 14-02-2019]. Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/beps/>.
FéLIX, G. V.; HENRIQUE, M. A. I. Direito Tributário - direito constitucional tributário. Editora e distribuidora educacional s.a. [S.l.: s.n.], 2018.
LAKS, L. R. Liberdade de informação e privacidade: o debate sobre a constitucionalidade da transferência do sigilo bancário à administração tributária. In: REVISTA DO DIREITO PúBLICO. Londrina, 2017.
LEBOULANQER, Y. Z. e Y. Li e M. National and cultural differences in the c2c electronic marketplace: An investigation into transactional behaviors of chinese, american, and french consumers on ebay. Tsinghua Science and Technology, v. 14, n. 3, p. 383–389, June 2009. ISSN 1007-0214.
LEE, C. M. K. C. e X. Zheng e M. K. O. Customer loyalty to c2c online shopping platforms: An exploration of the role of customer engagement. In: 2014 47th Hawaii International Conference on System Sciences. [S.l.: s.n.], 2014. p. 3065–3072. ISSN 1530-1605.
LUDíCIBUS, S. de; MARTINS, E.; CARVALHO, L. N. Contabilidade: aspectos relevantes da epopéia de sua evolução. In: REVISTA CONTABILIDADE E FINANçAS. São Paulo, 2005.
MORAES, A. de. Direito Constitucional. [S.l.], 2017.
MORENO, Y. B. e A. B. Withholding Taxes in the Service of BEPS Action 1: Address the Tax Challenges of the Digital Economy. In: .[s.n.], 2015. [Online; accessado em 11-02-2019]. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2591830>.
NETO, A. M. Imposto Único sobre transações: Algumas considerações. In: . [s.n.], 1991. [Online; accessado em 14-05-2019]. Disponível em: <https://revistas.dee.spgg.rs.gov.br/index.php/indicadores/article/download/502/740>.
PINHEIRO, P. P. Direito Digital. 5. ed. [S.l.: s.n.], 2012. RFB, R. F. do B. Irpf (imposto sobre a renda das pessoas físicas). In: . [s.n.], 2019. [Online; accessado em 14-05-2019]. Disponível em: <http://receita.economia.gov.br/acesso-rapido/tributos/irpf-imposto-de-renda-pessoa-fisica>.
RIBEIRO, A. de P. Substituição tributária para frente. In: REVISTA CEJ - CONSELHO DA JUSTIçA FEDERAL. [S.l.], 1997.
VALADãO, M. A. P.; ARRUDA, H. P. de. Direitos fundamentais, privacidade, intimidade, sigilos bancário e fiscal, e o consenso internacional. São Paulo, 2014.