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Responsabilidade civil pelos danos ambientais decorrentes da expedição da licença ambiental para os dutos de gás natural

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19/10/2005 às 00:00
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3. Da Responsabilidade Civil pelo Licenciamento Ambiental

3.1. Aspectos Gerais da Responsabilidade Civil Ambiental

A responsabilidade civil ambiental, em virtude das peculiaridades dos danos ambientais, é regida por regras e princípios próprios, que agora passaremos a abordar.

O Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pertence à categoria dos direitos ou interesses difusos [15], tendo como titulares pessoas indeterminadas ou indetermináveis.

Disto decorre a primeira peculiaridade dos danos ambientais, qual seja, a pluralidade difusa de vítimas. O dano considerado na sua concepção tradicional, ao contrário, atinge apenas vítimas individualizadas ou individualizáveis.

Em segundo lugar, o dano ambiental caracteriza-se pela sua dificuldade ou, até mesmo, por sua impossibilidade de reparação natural (in specie), que é a modalidade de reparação que deve ser buscada primordialmente.

Por fim, destaca-se que o dano ambiental caracteriza-se por ser de difícil valoração econômica, haja vista que qualquer valor a ele atribuído, a título de indenização, será sempre considerado insuficiente.

Vale ressaltar, ainda, que quando se fala em danos ambientais, devemos considerá-lo em seu duplo aspecto, qual seja, o dos danos causados ao meio ambiente propriamente dito e o dos danos causados a terceiros. Isto é assim, pois um dano ocasionado ao meio ambiente, além de constituir uma lesão aos recursos ambientais, atingindo os interesses de toda a coletividade, pode repercutir, ainda que de forma reflexa, nos interesses patrimoniais ou extrapatrimoniais de pessoas individualmente consideradas.

Na construção dos dutos de gás natural geralmente são constatados desmatamentos e erosão do solo, além dos riscos de acidentes com prejuízos para a fauna, a flora e a vida humana.

3.1.1. Princípios basilares da responsabilidade civil ambiental

A responsabilidade civil ambiental é regida por alguns princípios básicos, quais sejam, o princípio da prevenção, o princípio do poluidor-pagador e o princípio da reparação integral.

Considerando as características do dano ambiental, acima estudadas, podemos afirmar que a prevenção constitui elemento de fundamental importância e o objetivo primordial do Direito Ambiental. Por esta razão, o princípio da prevenção aparece, também, como princípio básico da responsabilidade civil ambiental, ainda que a sua incidência ocorra antes mesmo que se dê a consumação do dano, com a propositura da ação inibitória.

O princípio da prevenção estabelece que devam ser adotadas medidas efetivas para evitar a concretização do dano ambiental, considerando, apenas, a existência de um simples risco de danos graves e irreversíveis ao meio ambiente.

Cabe frisar que, na atualidade, o princípio da prevenção encontra-se abarcado pelo princípio da precaução [16], que preconiza que a prevenção deve ocorrer não apenas quando o risco do dano ambiental é incontestável, mas, também, quando não há certeza científica absoluta acerca da sua existência.

Com a concretização do dano ao meio ambiente, o fundamento primordial da responsabilidade civil passa a ser o princípio do poluidor-pagador, estabelecendo que sobre o autor do dano ambiental deva recair o ônus decorrente dos custos sociais externos de sua atividade. Entendendo-se por custos sociais externos, não só os resultantes da repressão e da reparação dos danos ambientais, mas, principalmente, os que são oriundos das medidas de prevenção.

Importante observar que o princípio do poluidor-pagador, de forma alguma, implica na tolerância dos danos ambientais, simbolizada pela expressão "quem paga polui", mas representa uma forma de prevenir o dano, desestimulando a prática de atos que possam resultar na degradação do meio ambiente.

Por fim, temos o princípio da reparação integral que preconiza que o dano ao meio ambiente deve ser reparado integralmente, ou seja, de forma ilimitada.

No direito ambiental brasileiro, a adoção deste princípio tem respaldo legal no art. 225, § 3º da Constituição Federal e no art. 14, § 1º da Lei n.º 6.938/81, que tratam da obrigação de reparar o dano, sem estabelecem qualquer limite ao valor da indenização.

3.1.2. Da responsabilidade civil objetiva pelos danos causados ao meio ambiente.

A responsabilidade civil pode ser subjetiva, fundada na culpa, ou objetiva, com respaldo na teoria do risco, que preconiza que aquele que exerce uma atividade que expõe terceiros ao risco de sofrer algum dano tem o dever de repará-lo, independentemente da indagação acerca da sua culpabilidade.

A teoria objetiva é aplicada nos casos expressamente previstos em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano, implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem [17].

No tocante aos danos causados ao meio ambiente, o legislador brasileiro, considerando que a responsabilidade subjetiva, por suas limitações, não é adequada para ensejar a reparação destes danos, optou por consagrar a responsabilidade objetiva.

Neste sentido, estabelece o art. 14 § 1º da Lei n.º 6.938/81 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente:

Art. 14. § 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente. (destacamos).

O artigo em tela foi recepcionado pela Constituição Federal, que estabelece em seu art. 225, § 3º que:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

A análise dos transcritos diplomas legais não evidencia se a modalidade da teoria do risco adotada como fundamento da responsabilização pelos danos causados ao meio ambiente é a do risco criado, segundo a qual deve ser objetivamente responsabilizado pelo dano causado, todo aquele que exerce uma atividade de risco, independentemente da prova da obtenção de proveitos, ou a do risco integral, que reza que haverá responsabilidade mesmo quando inexiste o nexo de causalidade, bastando apenas que o dano esteja concretizado.

Em defesa da teoria do risco criado, Toshio Mukai [18], comparando a responsabilidade objetiva ambiental à responsabilidade objetiva do Estado, que adota a teoria do risco administrativo (admitindo excludentes), argumenta que o legislador, ao dispor no art. 14 § 1º da Lei nº 6.938/81 que o poluidor deve responder pelos danos que causar ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, exclui qualquer fato que não possa ser atribuído ao poluidor, como a ação de terceiros, da vítima, o caso fortuito e a força maior.

Em sentido contrário, entendendo que o poluidor deve assumir de forma integral os riscos inerentes à sua atividade, no que concerne à seara ambiental, estão os defensores da aplicação da teoria do risco integral, lecionando que o dever de arcar com os custos da reparação do dano surge pelo simples fato de existir a atividade de risco. Por esta teoria, albergada pela maioria dos doutrinadores brasileiros [19], só não haverá responsabilidade, se ficar comprovada a inexistência do dano ou que este não possui qualquer tipo de ligação com o risco da atividade.

Considerando que o meio ambiente é um bem jurídico de suma importância para toda a coletividade; as peculiaridades do dano ambiental, que o torna devastador, e, tendo em vista, ainda, que pela teoria do risco criado a defesa do meio ambiente não é exercida de forma satisfatória, dando margem para que existam situações em que danos fiquem sem a devida reparação, nos posicionamos em favor da doutrina que defende a aplicação da teoria do risco integral.

3.2. Das Peculiaridades da Responsabilidade Civil pela Expedição da Licença Ambiental para os Dutos de Gás Natural

A construção dos dutos de gás natural, como já ressaltado, é um empreendimento considerado potencialmente capaz de causar danos significativos ao meio ambiente, de sorte que, é essencialmente necessária para a sua execução, a expedição da licença ambiental baseada no estudo de impacto ambiental.

Convém observar, ainda, que a potencialidade de causar danos significativos ao meio ambiente persiste mesmo que o empreendimento seja realizado em cumprimento a todas as condições impostas pela licença ambiental.

Na ocorrência de danos ambientais decorrentes exclusivamente do cumprimento das regras estabelecidas pela licença ambiental é importante definirmos, com base nas regras e princípios aplicáveis à responsabilidade civil ambiental, quem pode ou não ser responsabilizado por tais danos: a empresa licenciada, as entidades ambientais responsáveis pela expedição das licenças ambientais ou as duas conjuntamente.

3.2.1. Da responsabilidade civil da empresa licenciada

Considerando que a responsabilidade civil ambiental, como já estudado, é pautada na teoria objetiva do risco integral, segundo a qual deve ser responsabilizado pelos danos ambientais todo aquele que exerce uma atividade de risco e tendo em vista, ainda, o princípio do poluidor-pagador que estabelece que o poluidor tem o dever arcar com os custos da prevenção, reparação e repressão da poluição, observa-se que a empresa licenciada será sempre responsável pelos danos que decorrerem da sua atividade, visto que é ela quem lucra economicamente com a atividade de construção dos dutos de gás natural e suporta os riscos ambientais dela advindos.

Cabe destacar que, do ponto de vista da responsabilidade civil do empreendedor, é completamente irrelevante analisar a licitude ou ilicitude da atividade, ou seja, é indiferente observar se o poluidor agiu ou não em desacordo com os padrões estabelecidos pela licença ambiental, posto que isto tem apenas o condão de afastar a culpabilidade do agente, o que é totalmente desnecessário em face da teoria objetiva da responsabilidade prevista no art. 14, § 1º, da Lei n.º 6.938/81, que requer apenas os pressupostos da conduta, o dano ao meio ambiente e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano ocasionado.

Neste contexto, Maria Izabel de Matos Rocha [20] salienta que:

A permissão de atividade, mediante certos requisitos, e o fato de a empresa estar agindo com a observância desses requisitos não exclui a responsabilidade, pois não se trata de analisar a violação de uma norma preestabelecida, mas de verificar se houve dano causado pelo risco dessa atividade.

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Salienta-se, porém, que não obstante a verificação da licitude ou ilicitude da atividade seja desnecessária para configurar a responsabilidade civil da empresa licenciada, essa distinção se revela extremamente importante nos campos da responsabilidade penal e administrativa.

Pelos motivos acima já apontados, é também desnecessário, para estabelecer a responsabilidade civil do empreendedor, verificar se o estudo de impacto ambiental foi realizado, ou não, fora dos parâmetros estabelecidos pelo órgão ou entidade ambiental competente para o licenciamento ambiental ou se foram utilizadas, ou não, as técnicas mais avançadas.

Neste ultimo caso, a existência de um estudo de impacto ambiental irregular será apenas importante para configurar a responsabilidade civil, penal e administrativa da equipe multidisciplinar que realizou o estudo, mas não para afastar a responsabilidade civil ambiental do empreendedor.

Neste ínterim, encontra-se a seguinte afirmação de José Afonso da Silva [21]:

Não libera o responsável nem mesmo a prova de que atividade foi licenciada de acordo com o respectivo processo legal, já que as autorizações e licenças são outorgadas com a inerente ressalva de direitos de terceiros; nem que exerce a atividade poluidora dentro dos padrões fixados, pois isso não exonera o agente de verificar, por si mesmo, se sua atividade é ou não prejudicial, está ou não causando dano. (destaque do autor)

Por fim, é importante enfatizar que, na hipótese de existir mais de um empreendedor, haverá entre eles o vínculo da solidariedade passiva, de forma que todos os empreendedores ou cada um individualmente poderá ser responsabilizado pela integralidade do dano. Todavia, aos que responderem pela totalidade do dano fica assegurada a ação de regresso em face dos demais co-responsáveis.

Esta solidariedade encontra seu fundamento legal no art. 942, parte final, do Código Civil que preconiza que se o dano tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação e, principalmente, na Constituição Federal que dispõe, em seu art. 225, § 3º, que aqueles que praticarem condutas e atividades lesivas ao meio ambiente deverão reparar os danos causados.

Cumpre mencionar, ainda, que a solidariedade passiva na reparação dos danos ambientais também decorre do art. 3º, IV, da Lei de Política Nacional do meio Ambiente, que conceitua o poluidor como sendo a pessoa física ou jurídica, de direito público interno ou externo, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.

3.2.2. Da responsabilidade da equipe multidisciplinar

Como já abordamos, a equipe multidisciplinar é uma equipe composta por profissionais especializados em diversas áreas da ciência e que é contratada pelo empreendedor para realizar o estudo de impacto ambiental que irá embasar a expedição da licença ambiental para a construção dos dutos de gás natural.

Tendo em vista que a equipe multidisciplinar é a responsável pela elaboração do estudo de impacto ambiental, mas que não é ela que irá realizar o empreendimento de construção dos dutos de gás natural, não assumindo, portanto, os riscos dele advindos, entendemos que a sua responsabilidade civil pelos danos decorrentes do licenciamento ambiental é subjetiva, de sorte que ela apenas estará configurada quando se provar que o estudo de impacto ambiental foi elaborado de forma irregular, por estar fora dos parâmetros fixados pelo órgão ou entidade competente para o licenciamento ambiental ou por não terem sido observadas as técnicas mais avançadas para mitigar os impactos ambientais resultantes do empreendimento.

Anota-se, ainda, que como na ação de reparação dos danos ambientais não se perquire a culpabilidade do poluidor e que a responsabilidade civil da equipe multidisciplinar é fundada na teoria subjetiva, podemos concluir que é o empreendedor quem responderá inicialmente pelos danos ambientais decorrentes da expedição da licença ambiental, cabendo, no caso, a ação regressiva contra a equipe multidisciplinar que elaborou o estudo de impacto ambiental irregular.

Analisando esta questão, Paulo Affonso Leme Machado [22] nos ensina que: "Pelas omissões e erros do Estudo de Impacto e de seu Relatório responde civilmente, de forma direta, o empreendedor ou proponente do projeto, através do seu patrimônio".

Acrescenta-se, ainda, o entendimento de Helli Alves de Oliveira [23], que analisando a responsabilidade civil da equipe multidisciplinar escreve que:

Uma vez contratado um terceiro para efetuar os estudos, este terceiro não poderá ser responsável pelo conteúdo e resultados desses estudos, senão em relação ao próprio empreendedor que contratou e a quem este terceiro deverá reportar-se.

E mais adiante afirma que:

Portanto, a responsabilidade objetiva prevista na lei somente é admissível contra o proponente do projeto. Contudo, poderá este, numa ação regressiva, virar-se contra a equipe multidisciplinar contratada. Mas, para isso, terá que provar a culpa desta.

3.2.3. Da Responsabilidade civil do Estado

Analisada a responsabilidade civil da empresa licenciada e da equipe multidisciplinar pelos danos causados exclusivamente em razão da expedição das licenças ambientais, cumpre agora estudarmos a polêmica questão da responsabilidade civil do Estado por estes danos.

Considerando, porém, que a responsabilidade civil do Estado possui um tratamento diferenciado, em razão da sua natureza de direito público, estando, portanto, pautada em regras e princípios que lhe são peculiares, faremos breves considerações acerca da responsabilidade civil do Estado, antes de adentrarmos nesta temática.

3.2.3.1. Aspectos gerais da responsabilidade civil do Estado

A responsabilidade civil do Estado tem fundamento na Constituição Federal de 1988 que determina, em seu art. 37, § 6º, que:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Da interpretação deste dispositivo constitucional, infere-se que a teoria adotada para a responsabilidade dos entes estatais é a do risco administrativo, admitindo as excludentes de caso fortuito, força maior, fato de terceiro e culpa exclusiva da vítima.

Respondem, pois, com base na teoria do risco administrativo, as pessoas jurídicas de direito público, que são a União, Estados, Municípios, Distrito Federal, Territórios e autarquias, e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, que são as fundações governamentais de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviços públicos.

A responsabilidade civil destes entes configura-se com a presença dos seguintes pressupostos: a ocorrência do dano, a conduta do agente público no exercício da função pública e o nexo de causalidade entre o dano e a conduta do agente público.

No que concerne às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos é necessário, ainda, verificar se o dano foi causado em razão da prestação do serviço público, pois se o dano foi causado em função da prestação de atividade de natureza privada a sua responsabilidade não é regida pelo art. 37, § 6º da Constituição Federal, mas sim pelas normas de direito privado.

Quanto à expressão agente público, é necessário enfatizar que ela deve ser interpretada em seu sentido mais amplo, abrangendo agentes políticos, agentes administrativos e, ainda, os particulares em colaboração com o Poder Público. O que é essencial é que os mesmos estejam agindo a serviço do Poder Público quando o dano tiver sido causado.

A este respeito Sergio Cavallieri Filho [24] preconiza que:

[...] o mínimo necessário para determinar a responsabilidade do Estado é que o cargo tenha influído como causa ocasional do ato, ou que a condição de funcionário tenha sido a oportunidade para a prática do ato ilícito. Sempre que a condição de agente do Estado tiver contribuído de algum modo para a prática do ato danoso, ainda que simplesmente lhe proporcionando a oportunidade para o comportamento ilícito, responde o Estado pela obrigação ressarcitória.

Por fim, é interessante enfatizar que a conduta do agente público que configura a responsabilidade do ente estatal engloba a conduta comissiva e a omissiva. Logo, a responsabilidade do Estado por atos omissivos também se encontra pautada na teoria objetiva do risco administrativo.

Há, porém, quem sustente [25] que a responsabilidade do Estado por atos omissivos seja subjetiva, com fundamento da teoria da culpa anônima do serviço e sob o argumento de que o Estado não pode ser responsabilizado por tudo o que acontece, ou seja, o grande segurador de todas as desgraças e infortúnios [26].

Observa-se, todavia, que mesmo com a adoção da tese da responsabilidade objetiva para os danos causados por omissão, o Estado não se transforma em um segurador universal, haja vista que a teoria do risco adotada é a do risco administrativo, que admite as excludentes de culpa exclusiva da vítima, de terceiro, caso fortuito e força maior e que funcionam, conforme ensina Carlos Edison do Rego Monteiro Filho [27], como ponto de equilíbrio que afasta o risco de se transformar o Estado em um garante de tudo e de todos.

3.2.3.2. Da responsabilidade do Estado pelo licenciamento ambiental

Concluído o estudo relativo aos aspectos gerais da responsabilidade civil estatal, passaremos, enfim, a abordar a sua responsabilidade civil pelos danos ambientais decorrentes do licenciamento ambiental.

Conforme vimos, ao Estado foi atribuído o dever constitucional de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações [28]. E consoante nos ensina Vera Lúcia Rocha Souza Jucovsky:

Em tempos presentes, sob o ângulo da preservação e da reparação dos recursos naturais, o Estado vem sendo entendido como verdadeiro Estado Ambiente, de sorte que não pode o mesmo subtrair-se à responsabilidade civil extracontratual administrativa pela degradação ambiental que prejudica pessoas e bens [...]. [29]

Vimos, ainda, que, nos termos no art. 37 § 6º da Constituição Federal, a responsabilidade civil do Estado está pautada na teoria do risco administrativo, em conformidade com a qual responsabilidade civil dos entes públicos configura-se com a ocorrência do dano, a conduta comissiva ou omissiva do agente público no exercício da atividade pública e o nexo de causalidade entre o dano e a atividade exercida pelo Poder Público.

Considerando, então, estas duas particularidades da responsabilidade civil do Estado pelos danos causados ao meio ambiente e ressaltando, ainda, que pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, art. 14 § 3º, IV, poluidor é toda pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental, podemos concluir que o ente público é responsável não apenas pelos danos que diretamente causar ao meio ambiente, mas também pelos danos ambientais causados por terceiros que decorrerem da falta de fiscalização ou, ainda, da expedição das licenças ambientais.

Nesta linha de raciocino, o jurista Édis Milaré ressalta que:

[...] Afastando-se da imposição legal de agir, ou agindo deficientemente, deve o Estado responder por sua incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado que, por direito, deveria sê-lo. [...]

Ressalta-se que a responsabilidade civil do Estado, nestes casos, é solidária, de modo que o ente público poderá responder individualmente ou em conjunto com a empresa licenciada pelos danos ocorridos. A reparação do dano pela pessoa jurídica de direito púbico, porém, enseja a ação de regresso em face dos que diretamente tiverem causado o dano ao meio ambiente.

Cumpre anotar, ainda, que a responsabilidade solidária do ente público pelos danos que decorrerem da expedição das licenças ambientais fica configurada independentemente de se observar se as licenças foram concedidas de maneira regular ou irregular. Isto porque, conforme salientamos anteriormente, a responsabilidade do Estado é objetiva, de maneira que esta discussão se revela completamente irrelevante para fins de reparação do dano ambiental.

Todavia, a verificação da ocorrência de regularidade ou irregularidade na concessão das licenças ambientais é importante para configurar a parcela de responsabilidade do ente público e dos particulares na ação de regresso e também para apurar as responsabilidades penal e administrativa das pessoas físicas e jurídicas envolvidas no evento danoso.

Corroborando com o entendimento que acima externamos, convém citarmos os posicionamentos dos seguintes doutrinadores:

Paulo Affonso Leme Machado [30]:

Para compelir, contudo, o Poder Público, a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar, e ordenar a saúde ambiental nos casos em que haja prejuízo para as pessoas, para a propriedade ou para os recursos naturais mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular.

Vera Lúcia Rocha Souza Jucovsky [31]:

O licenciamento de atividade pela Administração acarreta a sua solidariedade na indenização, de conformidade à teoria objetiva se houver dano ou sacrifício especial ao meio ambiente.

Toshio Mukai [32]:

[...] a responsabilidade solidária pode exsurgir no caso de licenças (ou autorizações) legais, pelo critério da teoria objetiva, desde que haja um dano especial (sacrifício especial) ao meio ambiente, afetando certas e determinadas pessoas da comunidade [...].

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Sobre a autora
Mágila Maria Agostinho

Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN (2005), Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2011) e pela Escola da Assembleia Legislativa do RN (2018).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGOSTINHO, Mágila Maria. Responsabilidade civil pelos danos ambientais decorrentes da expedição da licença ambiental para os dutos de gás natural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 838, 19 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7439. Acesso em: 22 dez. 2024.

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