Tratamento jurídico aplicado aos portadores de personalidade psicopática no Brasil

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11/06/2019 às 18:00
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5. DA APLICABILIDADE DA MEDIDA DE SEGURANÇA AO PSICOPATA, E A QUESTÃO CURATIVA

Com relação ao tratamento jurídico e penal dispensado aos psicopatas, pode-se dizer que é polêmica. Ao mesmo tempo em que se compreende que os psicopatas não são seres humanos normais, aptos a conviver em sociedade, devido à instabilidade de personalidade que apresenta, é preciso reconhecer que não podem responder pelos atos ilícitos, por falta de autodeterminação.

Aos psicopatas são aplicadas Medidas de Segurança, sanções direcionadas a esses indivíduos que cometem crimes, na condição de inimputável. Ou seja, mesmo diante de isenção de pena, o Código Penal obriga ao cumprimento de uma Medida de Segurança.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, artigo 5º, § 1º “não haverá penas; b) de caráter perpétuo”. O artigo 97 do Código Penal determina que se o agente for inimputável, o juiz poderá determinar a sua internação. Se o crime na modalidade pena de detenção, o juiz poderá encaminhá-lo a tratamento ambulatorial, que será por tempo indeterminado, se alongando até que, comprovada por perícia médica, a cessação da periculosidade. É estabelecido somente o prazo mínimo de um a três anos.

Porém, o fato de não haver tempo determinado para o cumprimento da medida de segurança pelos inimputáveis, e nesta se classifica os psicopatas, acredita-se que não se pode ficar indeterminadamente exposto aos cuidados do Estado. Significa dizer que de acordo com o art. 75 do Código Penal “o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não poderá ser superior a trinta anos”.

Desta forma, compreende-se que mesmo diante do cumprimento de Medida de Segurança por tempo indeterminado, há a concepção de que na verdade o psicopata não está preso, mas em tratamento, e que assim a restrição sem previsão de término não seria um mal, ao contrário, contribuiria para a prevenção de novos crimes, ou até que cesse a periculosidade.

Porém, de toda forma há restrição da liberdade de locomoção garantida por direitos dos cidadãos. A única diferença da Medida de Segurança é que o psicopata precisa ficar detido por tempo indeterminado, ou até que cesse a periculosidade.

Vale ressaltar que a psicopatia é incurável e, desta forma, a Medida de Segurança não teria término, ou seja, esse indivíduo ficaria em prisão perpétua, se configurando pena privativa de liberdade. Por isto, as Medidas de Segurança aplicada aos psicopatas não cumprem o objetivo maior, que seria a cura, se transformando sim, em pena privativa de liberdade, em caráter perpétuo.

Devido a total falta de legislação sobre o tema, acredita-se ser fundamental a edição de leis específicas, que tratem das condições penais aplicadas aos psicopatas, que estejam em conformidade com a Constituição Federal do Brasil de 1988 e para evitar qualquer tipo de julgamento injusto.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo aborda a psicopatia e a impossibilidade de aplicação de medidas de segurança em caráter perpétuo com o objetivo de compreender como estão sendo tratados os criminosos portadores de psicopatia pelo ordenamento jurídico brasileiro

Pode-se afirmar que o problema inicial da pesquisa foi respondido, pois, as medidas de segurança, às quais os psicopatas são submetidos têm término quando se constata a cura ou controle da psicopatia. Porém, a literatura mostrou que a psicopatia não tem cura, o que faz com que esses indivíduos permaneçam por toda a vida encarcerada, mesmo sendo em instituições para tratamento.

Observou-se que os psicopatas são pessoas que conhecem que o ato cometido é ilícito, porém, não possuem responsabilidade, compromisso ético, e baixo controle dos impulsos. São extremamente inteligentes e podem manipular negativamente tentativas de impor-lhes a capacidade de autodeterminação. São considerados semi-imputáveis, por isso as penas de privação de liberdade não eficazes com relação a punição, ou ressocialização.

Grande parte dos legisladores e doutrinadores entende que, como no Brasil não existe prisão perpétua, as penas aplicadas aos psicopatas na forma de medida de segurança deve ser ampliada para trinta anos. Se comprovado que houve redução da periculosidade é reavaliado.

Porém, caso não apresentem evolução no tratamento, os psicopatas são encaminhados a instituições psiquiátricas, sanatórios onde permanecem detidos por tempo indeterminado, ou seja, até o final da vida, caracterizando prisão perpétua.

Considerando que no ordenamento jurídico brasileiro não há amparo legal para a prisão perpétua, se faz necessária a presença de profissionais qualificados para avaliar os psicopatas, quanto à cessação da periculosidade, assim como a edição de legislação específica. Atualmente os psicopatas são penalizados como se fossem criminosos comuns.

Devido à complexidade do tema merece ser mais bem explorado em novos trabalhos, servindo de suporte aos profissionais da área, aprofundando a legislação que subsidie formas de neutralizar o comportamento nocivo dos psicopatas grau grave.


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