Direito das sucessões: há igualdade de direitos entre cônjuges e companheiros?

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Reflexos decorrentes da equiparação entre cônjuge e companheiro, após a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002 pelo STF - análise da real situação de ambos quando da partilha dos bens deixados pelo "de cujus".

 

RESUMO: O presente artigo versa sobre os reflexos decorrentes da equiparação entre companheiro e cônjuge, conforme julgado do Supremo Tribunal Federal - STF, no ano de 2017, em especial, no que tange ao artigo 1.830 do Código Civil de 2002 - CC/2002. Tem como escopo analisar a real situação dos cônjuges e companheiros quando da partilha dos bens deixados pelo de cujus, após a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, utilizando-se do método de pesquisa bibliográfica, consistente na busca de informações em doutrinas e em legislações.

PALAVRAS-CHAVE: Cônjuge. Companheiro. Sucessões.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. REGRAS GERAIS DO DIREITO SUCESSÓRIO. 3. SISTEMA CÍVEL DE 1916 EM COMPARAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 4. TRATAMENTO DADO AO CÔNJUGE NO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 5. DIREITOS DO COMPANHEIRO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 6. DISPOSITIVOS GERADORES DE IGUALDADE DA CONDIÇÃO DE COMPANHEIRO E CÔNJUGE. 7. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 8. DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS A EQUIPARAÇÃO ENTRE CÔNJUGE E COMPANHEIRO. 8.1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 8.2. Princípio da Vedação ao Retrocesso. 8.3. Princípio da Igualdade. 9. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO. 10. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 E SEUS EFEITOS SOB O ARTIGO 1.830 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 11. A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 E SUA ABRANGÊNCIA. 12. CONCLUSÃO. 13. REFERÊNCIAS.

1. INTRODUÇÃO

Antes de adentrar-se a discussão acerca da possibilidade de direitos equitativos ou não entre companheiros e cônjuges, se faz necessário o esclarecimento acerca do que se trata o direito sucessório.

O direito sucessório é um direito fundamental, previsto no artigo 5º, inciso XXX, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - CRFB/1988, que tem como base o direito de propriedade e sua função social, além da valorização da dignidade da pessoa humana, tanto do ponto de vista individual quanto do coletivo (TARTUCE, 2015).

O fundamento que serve de base para o Direito das Sucessões é a necessidade de engajamento entre o Direito de Família e o direito de propriedade, visto que a justificativa da transmissão via causa mortis não reside tão somente na continuidade patrimonial, isto é, na preservação dos bens na família como meio de acumulação de riqueza (que por sua vez estimularia a economia), mas também pela proteção e perenidade familiar (HINORAKA, 2007).

A sucessão abrange vários ramos do direito, inclusive as garantias fundamentais previstas no texto constitucional, de forma a preservar a tradição familiar e assegurar aos herdeiros a conservação do patrimônio, que muitas vezes é dotado de valor sentimental.

2.   REGRAS GERAIS DO DIREITO SUCESSÓRIO

Passando ao estudo de suas regras gerais, estabelece o artigo 1.784 do Código Civil de 2002 - CC/2002, que uma vez aberta à sucessão, a herança se transmite imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários. Mas quando se abre a sucessão? Quem são os herdeiros legítimos? E os testamentários?

A sucessão é aberta quando da morte da pessoa, comumente denominada de cujus.

Os herdeiros legítimos são aqueles definidos em lei. Já os testamentários são os que têm direito ao legado (bem individualizado) por determinação do testador, que é a pessoa que vem a falecer.

De grande relevância para aplicação correta e eficaz do direito sucessório, é a regra prevista no artigo 1.787 do CC/2002, pela qual a sucessão e a legitimação para suceder são reguladas pela lei vigente no momento de abertura daquela. Quanto a tal dispositivo legal, o Superior Tribunal de Justiça - STF, inclusive, já deu parecer entendendo pela não retroatividade de norma que entrou em vigor depois de aberta a sucessão, ainda que beneficie os herdeiros ou legatários (STF, RE 162.350, Rel. Min. Octavio Gallotti, j. 22.08.1995, 1.ª Turma, DJ 22.09.1995).

Ainda no que concerne ao aspecto temporal de qual legislação a ser aplicada quando da sucessão, enuncia o artigo 2.041 do CC/2002: “As disposições deste Código relativas à ordem de vocação hereditária (arts. 1.829 a 1.844) não se aplicam à sucessão aberta antes de sua vigência, prevalecendo o disposto na lei anterior” (BRASIL, 2002). Dispositivo que, quando interpretado por analogia, faz a doutrina majoritária entender que somente depois de cumprido o período da vacatio legis do CC/2002, é que há de se falar da aplicação das normas deste código em qualquer aspecto relacionado à sucessão.

3.      SISTEMA CÍVEL DE 1916 EM COMPARAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DE 2002

O estudo da regra de direito intertemporal se faz relevante em virtude do tratamento dado ao cônjuge e companheiro na vigência do Código Civil de 1916 - CC/1916 e o Código Civil de 2002, que dentre de uma das principais mudanças implementou o sistema de concorrência ao cônjuge/companheiro com os descendentes e ascendentes do de cujus.

Vejamos as principais semelhanças e diferenças: no sistema cível de 1916 não havia concorrência sucessória envolvendo as figuras do cônjuge e do companheiro; no sistema de 2002, há a concorrência de ambos, nos respectivos artigos 1.829 e 1.790 (TARTUCE, 2018). O CC/1916 previa a ordem de sucessão legítima, respectivamente, sem concorrência: aos descendentes; aos ascendentes; ao cônjuge sobrevivente; aos colaterais; aos entes federativos; atualmente, a sucessão legítima se dá nos mesmos moldes, porém com a exclusão dos entes federativos deste rol e com a implementação da concorrência do cônjuge em relação aos ascendentes e descendentes, salvo se casado com o extinto no regime de separação absoluta de bens, comunhão universal, ou comunhão parcial na qual o autor da herança não possuía bens particulares. Em divergência ao Código anterior, no CC/2002, não há mais a figura do usufruto vidual em benefício do cônjuge, em razão da concorrência sucessória.

No que tange a sucessão do companheiro, não havia previsão expressa no CC/1916, mas sim leis esparsas que regulamentavam a união estável, a Lei 8.971/1994 e a Lei 9.278/1996. Estabeleciam os artigos 1º e 2º da Lei 8.971/1994, ao tratar dos direitos sucessórios do convivente que:

Art. 1º A companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.

Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva.

 

Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições:

I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns;

II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes;

III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança. (BRASIL, 1994).

Diferentemente do CC/2002, que não prevê o direito do usufruto ao companheiro, tendo como justificativa a concorrência sucessória.

4.      TRATAMENTO DADO AO CÔNJUGE NO CÓDIGO CIVIL DE 2002

A legislação cível brasileira determina o rol de pessoas que não podem ser excluídas da sucessão, caso dos descendentes, ascendentes e cônjuge do falecido (os denominados herdeiros necessários), salvo nos casos de indignidade ou deserdação. Perceba-se que neste rol taxativo não se encontra presente a figura do companheiro, que nada mais é do que aquele que mantém união estável com alguma pessoa, dando o CC/2002 um tratamento diferenciado a este, mais precisamente no seu artigo 1.790, in verbis:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. (BRASIL, 2002).

Mas tal tratamento seria constitucional, visto que apesar de se tratar de matéria sucessória, envolve questões relativas também ao Direito de Família, que tem como um de seus princípios a igualdade dentre as pessoas que a compõem? Questão esta que será resolvida adiante.

Ademais, no Direito das Sucessões existem diversos dispositivos legais que protegem de forma ampla o cônjuge, e menospreza a figura do companheiro, de forma que não acompanha a evolução da sociedade, eis que atualmente a maioria das pessoas optam pelo casamento informal, pelo “morar junto”, “amigar”, entre outras expressões utilizadas, tendo em vista a facilidade que este vínculo propicia, não necessitando de tantas formalidades e burocracias, principalmente no momento da dissolução da relação existentes entre os companheiros.

Certo é que as pessoas que vivem em união estável em território brasileiro não encontram grande proteção legal em muitas situações, paradigma que vem sendo mudado, primordialmente pelo Direito Previdenciário. Outrora, parece justo uma companheira que passou algum tempo ao lado do de cujus, ajudando-o na construção do seu patrimônio ser preterida de herdá-lo? Tal situação se agrava ainda mais nas situações em que os colaterais são chamados a suceder em detrimento do companheiro, mesmo quando aqueles não guardam nenhum vínculo com o hereditando.

Dentre os “privilégios” dados aos cônjuges, podem ser citados à ordem de vocação hereditária constante do artigo 1.829 do CC/2002, pela qual os cônjuges sucedem em concorrência com os descendentes do falecido a depender do regime de bens do casamento, além de herdarem em concorrência com os pais do falecido, ou sozinho. Veja-se:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais. (BRASIL, 2002).

Outra situação tange ao artigo 1.830 do CC/2002, que dispõe:

Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente. (BRASIL, 2002).

Como é possível auferir, as normas dos artigos 1.829 e 1.830 não fazem qualquer menção no sentido de proteger a pessoa do companheiro, quando da sucessão; tal discriminação se revela mais evidente, em relação à divisão das quotas partes quando da concorrência entre cônjuge e companheiro com os descendentes do de cujus.

Pois, quando o cônjuge herda em concorrência com os descendentes, deverá aquele receber quinhão no mesmo montante dos que sucederem por direito próprio, nunca podendo a sua quota ser menor que à quarta parte do espólio, caso seja ascendente dos herdeiros com quem concorrer (artigo 1.832 do CC/2002). Já caso concorra com os ascendentes em primeiro grau (pais) do de cujus, consoante o artigo 1.837 do CC/2002, caberá ao cônjuge um terço da herança, se ambos forem vivos ao tempo da abertura da sucessão; ou a metade desta, caso somente um dos pais se encontre vivo quando da abertura da sucessão. Por fim, estabelece o artigo 1.838 do CC/2002 que “em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente” (BRASIL, 2002); dessa forma todos os bens deixados pelo de cujus serão destinados à esposa ou ao marido sobrevivente daquele, sem benefícios aos seus colaterais.

5.      DIREITOS DO COMPANHEIRO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Outrora, o artigo 1.790 do CC/2002 traz as regras do direito sucessório do companheiro, o que abrange tão somente os bens adquiridos a título oneroso durante a união estável (diferente do tratamento dado ao cônjuge, o qual herda bens de quaisquer naturezas). Estabelece o inciso I, do dispositivo em tela, que sempre que o companheiro concorrer com filhos comuns deverá receber por quota equivalente à por lei destinada ao filho; observe-se que diferentemente do direito dado ao cônjuge, nesta hipótese não há a reserva legal da quarta parte do patrimônio do falecido. Pelo inciso II, quando da sucessão concorrente entre o companheiro e os descendentes somente do hereditando, caberá àquele, somente metade do que estes herdarem.

Já o inciso III do artigo 1.790, determina a concorrência entre o companheiro com outros parentes do de cujus, caso dos colaterais, destinando para o primeiro apenas um terço da herança. Motivo pelo qual, tal norma é veementemente criticada pela doutrina, pois parentes que sequer conhecem o defunto, herdariam na mesma proporção ou até mesmo mais que o companheiro, que muitas vezes ajudou na construção do patrimônio sujeito a sucessão. Tratamento este não dado ao cônjuge, visto que na falta de descendentes e ascendentes do autor da herança, aquele herdará sozinho, só vindo a suceder os colaterais na falta dos maridos e esposas.

Por fim, o inciso IV (artigo 1.790), confere ao companheiro o direito da totalidade da herança, quando da falta de descendentes, ascendentes e colaterais do falecido. Assim, percebe-se que o companheiro não é tratado de forma equitativa ao cônjuge perante o CC/2002, vez que diferentemente deste, somente vem a herdar com integralidade o patrimônio do falecido, caso os colaterais não quiserem ou não puderem herdar.

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6.      DISPOSITIVOS GERADORES DE IGUALDADE DA CONDIÇÃO DE COMPANHEIRO E CÔNJUGE

Norma prevista no CC/2002 que atenua a discriminação dada ao companheiro, no tangente ao Direito das Sucessões, é o artigo 1.797, que determina as pessoas aptas à administração da herança até quando firmado o compromisso do inventariante, estabelecendo em seu inciso I, a possibilidade do cônjuge e do companheiro exercer tal direito, desde que conviventes com o outro no momento da abertura da sucessão.

Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:

I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão;

II - ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho;

III - ao testamenteiro;

IV - a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz. (BRASIL, 2002).

O Código de Processo Civil de 2015 - CPC/2015, em consonância com os ditames sociais da atualidade, e em respeito à igualdade entre as famílias, não faz tal distinção entre as figuras do companheiro e do cônjuge, tratando ambos de forma equitativa. Exemplo são os artigos 616 e 617 (CPC/2015), que possibilitam ao companheiro o direito de requerer o inventário e a partilha, assim como de ser nomeado inventariante, em posição igualitária ao cônjuge:

Art. 615. O requerimento de inventário e de partilha incumbe a quem estiver na posse e na administração do espólio, no prazo estabelecido no art. 611 .

Parágrafo único. O requerimento será instruído com a certidão de óbito do autor da herança.

 

Art. 616. Têm, contudo, legitimidade concorrente:

I - o cônjuge ou companheiro supérstite;

II - o herdeiro;

III - o legatário;

IV - o testamenteiro;

V - o cessionário do herdeiro ou do legatário;

VI - o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança;

VII - o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes;

VIII - a Fazenda Pública, quando tiver interesse;

IX - o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supérstite.

 

Art. 617. O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem:

I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;

II - o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não puderem ser nomeados;

III - qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio;

IV - o herdeiro menor, por seu representante legal;

V - o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados;

VI - o cessionário do herdeiro ou do legatário;

VII - o inventariante judicial, se houver;

VIII - pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial.

Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhar a função. (BRASIL, 2015).

No que concerne a tais dispositivos, verifica-se total consonância com a CRFB/1988, visto que a lei processual cível de 2015 não promove qualquer discriminação entre as figuras do companheiro e do cônjuge em se tratando de matéria sucessória.

7.      DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Percebendo o tratamento dessemelhante que o CC/2002 dá entre o cônjuge e o companheiro em matéria sucessória, vários doutrinadores entendiam pela inconstitucionalidade do artigo 1.790, principal dispositivo discriminatório entre tais pessoas, o que resultaria numa interpretação diferente aos artigos 1.829, 1.830, 1.831, 1.832, 1.837 e 1.838, acima referidos (TARTUCE, 2018).

Ratificando o posicionamento destes doutrinadores, em 2017, o Supremo Tribunal Federal – STF proferiu decisão concluindo pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, que discorria sobre os direitos sucessórios do companheiro; igualando para todos os fins sucessórios o casamento e a união estável, devendo sempre ser seguido em ambos os casos o artigo 1.829 do CC/2002, conforme o Ministro Dias Toffoli (apud TARTUCE, 2018), tendo por base os princípios da igualdade, da dignidade da pessoa humana e da vedação do retrocesso.

Em corroboração, Informativo n. 864 do STF explica que:

[...] a Constituição prevê diferentes modalidades de família, além da que resulta do casamento. Entre essas modalidades, está a que deriva das uniões estáveis [...]. Frisou que, após a vigência da Constituição de 1988, duas leis ordinárias equipararam os regimes jurídicos sucessórios do casamento e da união estável (Lei 8.971/1994 e Lei 9.278/1996). O Código Civil, no entanto, desequiparou, para fins de sucessão, o casamento e as uniões estáveis. Dessa forma, promoveu retrocesso e hierarquização entre as famílias, o que não é admitido pela Constituição, que trata todas as famílias com o mesmo grau de valia, respeito e consideração. O artigo 1.790 do mencionado Código é inconstitucional, porque viola os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade na modalidade de proibição à proteção deficiente e da vedação do retrocesso. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2017).

A declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790, em consonância com o princípio da segurança jurídica, somente gera efeitos aos processos judiciais em que ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado da sentença que decreta a partilha, ou às partilhas extrajudiciais nas quais não tenha ainda lavrada escritura pública (TARTUCE, 2018).

Dentre os efeitos gerados pela inconstitucionalidade do artigo 1.790, cite-se à inclusão do companheiro no rol dos herdeiros necessários, fazendo com que aquele se sujeite as normas dos artigos 1.846 (direito a legítima) e 1.848 (restrições à cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade sobre os bens da legítima) do CC/2002, o que implica em restrições ao seu parceiro quando da doação ou testamento, em razão da legítima que passa a ser assegurada.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.

 

Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.

§ 1o Não é permitido ao testador estabelecer a conversão dos bens da legítima em outros de espécie diversa.

§ 2o Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser alienados os bens gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que ficarão sub-rogados nos ônus dos primeiros. (BRASIL, 2002).

Outro impacto é a inclusão do convivente no artigo 1.974 do CC/2002, nos casos em que se compreenda o cônjuge quando do rompimento do testamento (que “ocorre quando há a superveniência de uma circunstância relevante, capaz de alterar a manifestação de vontade do testador como, por exemplo, o aparecimento de um herdeiro necessário” (ARROYO JUNIOR, 2014)) – “Art. 1.974. Rompe-se também o testamento feito na ignorância de existirem outros herdeiros necessários” (BRASIL, 2002). Por fim, sendo reconhecida ao cônjuge a obrigação de colacionar os bens auferidos em regime de antecipação, sob penalidade de considerá-los sonegados, tal regra também se aplicará ao companheiro, conforme artigos 1.992 a 1.996 do CC/2002 (TARTUCE, 2018).

Art.1.992. O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia.

 

Art. 1.993. Além da pena cominada no artigo antecedente, se o sonegador for o próprio inventariante, remover-se-á, em se provando a sonegação, ou negando ele a existência dos bens, quando indicados.

 

Art.1.994. A pena de sonegados só se pode requerer e impor em ação movida pelos herdeiros ou pelos credores da herança.

Parágrafo único. A sentença que se proferir na ação de sonegados, movida por qualquer dos herdeiros ou credores, aproveita aos demais interessados.

 

Art. 1.995. Se não se restituírem os bens sonegados, por já não os ter o sonegador em seu poder, pagará ele a importância dos valores que ocultou, mais as perdas e danos.

 

Art. 1.996. Só se pode argüir de sonegação o inventariante depois de encerrada a descrição dos bens, com a declaração, por ele feita, de não existirem outros por inventariar e partir, assim como argüir o herdeiro, depois de declarar-se no inventário que não os possui. (BRASIL, 2002).

Desse modo, aufere-se que a igualdade entre companheiros e cônjuges gerada pela declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002 não se dá tão somente para os benefícios gerados por tal equivalência, como também a possíveis consequências negativas.

8.      DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS A EQUIPARAÇÃO ENTRE CÔNJUGE E COMPANHEIRO

O entendimento estatal sobre o conceito de família passou por significativas mudanças no transcorrer dos tempos. Como corolário desse entendimento, surgiram diversos dispositivos normativos para regular e proporcionar proteção ao instituto familiar, assim como o patrimônio hereditário.

A organização familiar há muito deixou de ser constituída tão somente conforme os moldes legislativos, isto é, a sociedade passou a reconhecer as incontáveis formas de se construir uma família. Devido a uma expansão jurídico-social, antigos institutos tornam-se cada vez menos invocados, à medida que surgem novas formas de se instituir um vínculo matrimonial.

Nesse sentido, imputam-se às normas concernentes ao Direito de Família, bem como o Direito das Sucessões, mais do que nunca, a observância de preceitos fundamentais. Em outras palavras, é dizer que os princípios constitucionais que aludem o tema, atualmente, são os instrumentos mais fiéis para resguardar os anseios e necessidades da sociedade, pois possuem a aptidão para servir como diretriz na atividade interpretativa de normas infraconstitucionais. Em decorrência dessas mudanças, a equiparação pela ótica legislativa e jurídica entre o casamento e a união estável, assunto que será tratado posteriormente, deverá seguir um norte principiológico, respeitando dispositivos constitucionais.

8.1. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Diz o artigo 1.º, III, da CRFB/1988, que o Estado Democrático de Direito brasileiro tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. É forçoso ressaltar que a definição exata desse princípio é árdua, pois se trata de uma cláusula geral, sujeita a incontáveis interpretações. É visível sua influência sobre as normas jurídicas como preleciona Flávio Tartuce:

Em suma, a dignidade humana deve ser analisada a partir da realidade do ser humano em seu contexto social. Ilustrando, pela vivência nacional, o direito à casa própria parece ter relação direta com a proteção da pessoa humana. Isso gera interpretações extensivas para o amparo da moradia. Cite-se o entendimento consolidado do STJ no sentido de que o imóvel em que reside pessoa solteira, separada ou viúva constitui bem de família, sendo, portanto, impenhorável (Súmula 364 do STJ). Firmou-se a premissa que o almejado pela Lei 8.009/1990 é a proteção da pessoa e não de um grupo de pessoas. Ampara-se a própria dignidade humana e o direito constitucional à moradia, direito social e fundamental (art. 6.º da CF/1988) (TARTUCE, 2018).

Assim, é possível dizer que o Princípio Dignidade da Pessoa Humana é tido como o respaldo para aplicação de demais preceitos, à medida que norteia todos aqueles contidos no bojo constitucional. Não é possível conceituá-lo de forma isolada, pois ele decorre do contexto social, permeando a realidade de cada indivíduo.

8.2. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO

Por sua vez, outro princípio que conserva a proteção ao instituto da união estável trata-se da Vedação do Retrocesso, “desenvolvido inicialmente por J.J.Gomes Canotilho, esse superior princípio traduz a ideia de que uma lei posterior não pode neutralizar ou minimizar um direito ou uma garantia constitucionalmente consagrado” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2016). Assim, para compreender sua interpretação e respectiva aplicabilidade, é indispensável analisar o tratamento normativo para união estável até os moldes atuais.

É fato que CRFB/1988 reconhece a união estável como entidade familiar, haja vista que prevê uma determinação no sentido de facilitar sua conversão em casamento. Assim, a partir da Constituição afere-se que a união estável não é pariforme ao casamento, são categorias diversas, além de que, no âmbito do Direito de Família, se diferenciam quanto à caracterização e a forma pela qual se constituem. Malgrado essa previsão ressalte a diferença entre os institutos, ela também proporcionou igualdade hierárquica entre ambos, tendo em vista que são apenas entidades familiares diferentes, mas que possuem mesma proteção constitucional.

Em sentido completamente contrário ao constitucional, o CC/2002, em diversos dispositivos, dentre eles o artigo 1.790, enfraqueceu o instituto da união estável, uma vez que não equiparou os companheiros aos cônjuges para fins sucessórios. Desse modo, a fim de estabelecer a equiparação em sua totalidade, em maio de 2017, ao julgar o Recurso Extraordinário Nº 878.694, o STF decidiu pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002.

No entanto, a nova tese que imputou aos companheiros a aplicação do artigo 1.829 (CC/2002), que regula a ordem de vocação hereditária, não rendeu todos os frutos esperados. O que acontece é que, o acórdão teria sido omisso com relação aos demais dispositivos que amoldam esse regime jurídico, não determinando o alcance dos efeitos da tese de repercussão geral. Sendo assim, não foi possível delimitar quais as regras exatas do regime sucessório dos cônjuges devem ser aplicadas também aos companheiros.

Essa medida se deu justamente para vedar um eventual retrocesso. O CC/2002 foi concebido após debates realizados nos anos de 1970 e 1980, melhor dizendo, ele entrou em vigor posteriormente a profundas mudanças no bojo familiar, possuindo um conteúdo divergente até mesmo com relação à Constituição. Outrora, apesar de diferentes entendimentos doutrinários quanto à equiparação entre cônjuges e companheiros para fins sucessórios, ficou firmado o entendimento de que caso os dispositivos do CC/2002 fossem de fato aplicados, haveria um retrocesso inegável ao direito certo e adquirido dos que optaram por esse instituto.

8.3. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Por fim, o terceiro princípio vital que norteia a equiparação entre os institutos supracitados corresponde ao Princípio da Igualdade. Instrui José Afonso da Silva que: “A igualdade constitui o signo fundamental da democracia. Não admite os privilégios e distinções que um regime simplesmente liberal consagra.” (SILVA, 2017). Destarte, o dispositivo que outorga determinado benefício legítimo a certas pessoas ou grupos, de modo a discriminá-los favoravelmente em detrimento de outros ajuntamentos, levando em consideração que essa discriminação não foi autorizada pela Constituição, será um dispositivo manifestamente inconstitucional. Nesse caso

Como então resolver a inconstitucionalidade da discriminação? Precisamente estendendo o benefício aos discriminados que o solicitarem perante o Poder Judiciário, caso por caso. Tal ato é insuscetível de declaração genérica de inconstitucionalidade por vida de ação direta. Gilmar Ferreira Mendes, a esse propósito, opta também pelo reconhecimento do direito dos segmentos eventualmente discriminados, mas pondera que, na impossibilidade, se tem que suprimir o tratamento discriminatório incompatível com a ordem constitucional pela declaração de inconstitucionalidade. (SILVA, 2017).

O enunciado n. 3 do IX Congresso Brasileiro de Direito de Família, realizado em 2013 pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM harmoniza-se com esse entendimento já que dispõe o seguinte: “Em face do princípio da igualdade das entidades familiares, é inconstitucional tratamento discriminatório conferido ao cônjuge e ao companheiro” (INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA, 2013).

Em suma, reitera-se a equiparação entre as entidades familiares, independentemente da forma como se constituíram, seja por união estável ou por casamento. Além disso, quando a norma constitucional aduz que a união estável é uma entidade familiar, do mesmo modo como o casamento, fica claro que as obrigações e os direitos consagrados pelo Código Civil aos cônjuges também recaem sobre os companheiros.

9.      DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO

Leciona o artigo 1.831 do CC/2002, que:

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar. (BRASIL, 2002).

Questão pouco discutida a respeito da igualdade entre cônjuges e companheiros é relativa ao direito real de habitação dos últimos, isto porque tal direito já era reconhecido antes mesmo do CC/2002, no parágrafo único, do artigo 7º, da Lei 9.278/1996. Apesar da legislação cível brasileira prevê o direito em questão unicamente aos cônjuges, continou a ser aplicada a Lei de 1.996, tendo em vista que o Código Civil não revogou a matéria da legislação especial no que concerne ao direito dos conviventes, havendo discussão tão somente quanto à extensão desse direito, e após 2017 (inconstitucionalidade do artigo 1.790), sobre a forma que lhe recai esse direito, subsistência do artigo 7º da Lei 9.278/1996 ou equiparação entre companheiro e cônjuge, incidindo o artigo 1.831 do CC/2002.

10. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 E SEUS EFEITOS SOB O ARTIGO 1.830 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Mas, a grande discussão acerca da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, se dá em relação aos efeitos produzidos sobre o artigo 1.830 do mesmo diploma legal. Isto porque estabelece tal dispositivo legal que:

Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente. (BRASIL, 2002).

Para solucionar tal questão destacam-se algumas propostas: I - que o patrimônio do hereditando seja repartido de forma equitativa entre cônjuges e companheiros (OLIVEIRA, 2005); II - que a concorrência quanto aos bens do falecido se dê tão somente a aqueles adquiridos de forma onerosa durante a união estável - Enunciado n. 525 da V Jornada de Direito Civil (apud TARTUCE, 2018); III - que seja seguido o artigo 1.790, pelo qual o companheiro herdaria um terço dos bens onerosamente adquiridos na união estável, e o cônjuge ficaria com o restante do patrimônio (ALMEIDA, 2003); IV - que o convivente tenha direito a todo o espólio do falecido, pois vigera a união estável quando da morte do de cujus CASSETTARI, 2008); V – o patrimônio do hereditando deve ser dividido em 2 (duas) partes, a primeira constante com os bens adquiridos durante o casamento fático, e a segunda com os bens advindos na constância da união estável, ficando respectivamente o cônjuge com aqueles bens e o companheiro com estes (SIMÃO; TARTUCE, 2010). Consoante à interpretação dada ao artigo 1.790 pelo STF, resultando na inclusão do companheiro na ordem de vocação hereditária (artigo 1.829), parece mais correta à primeira proposta, mas por se tratar de decisão recente (ano de 2017), se faz necessário observar como se posicionará sobre o assunto a jurisprudência, especialmente o Superior Tribunal de Justiça - STJ.

11.  A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 E SUA ABRANGÊNCIA

Por fim, indaga-se, se a equiparação entre conviventes e cônjuges incluiria também os fins familiares, logo, sendo total? Para uma primeira corrente sim, acompanhando o tratamento dado a ambos pelo CPC/2015. Já para outra parte da doutrina, tal igualdade se daria para os fins de solidariedade, como as regras de alimentos, de regime de bens, e principalmente, sucessórias. Uma terceira corrente defende a equiparação, unicamente para fins sucessórios, eis que o dispositivo legal declarado inconstitucional se encontra presente no Capítulo do CC/2002, no “Direito das Sucessões” (TARTUCE, 2018).

Em complemento a segunda corrente:

No que diz respeito às normas de formalidade, como as relativas à existência formal da união estável e do casamento, aos requisitos para a ação de alteração do regime de bens do casamento (art. 1.639, § 2.º, do CC e art. 734 do CPC) e às exigências da outorga conjugal, a equiparação não deve ser total. (TARTUCE, 2018).

Sob outra ótica, a respeito da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, estipula a legislação processual cível brasileira que os juízes e tribunais devem observar as decisões do STF acerca do controle de constitucionalidade, de forma que aqueles seguindo as interpretações adotadas pelo órgão superior, provavelmente formarão conjunto de jurisprudência sobre o tema, de forma a acabar com qualquer discussão que ainda sobrevenha à questão.

Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.

§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.

 

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II - os enunciados de súmula vinculante;

III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.

§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.

§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores. (BRASIL, 2015).

Logo, tanto a primeira quanto a segunda instância do poder judiciário brasileiro tem o condão de julgarem as controvérsias que cheguem ao seu conhecimento, seguindo a interpretação do STF de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, resolvendo as causas colocando em pé de igualdade o cônjuge e o companheiro.

12.  CONCLUSÃO

Em linhas gerais, salienta-se que é inegável a grande controvérsia que gira em torno do tema. A união estável, bem como a figura do companheiro, mesmo depois de regulamentadas e reconhecidas constitucionalmente, ainda encontram percalços em âmbito legislativo. Esses enfrentamentos se evidenciam, principalmente, na seara sucessória, visto que os companheiros e cônjuges não foram plenamente equiparados.

Para resolver a discrepância proporcionada pelo CC/2002 entre o companheiro e o cônjuge (até a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790), prática comum nos dias atuais é a contemplação do primeiro em testamento, o que é válido desde que o de cujus tenha respeitado a legítima (cinquenta por cento do patrimônio que deve ser resguardado aos herdeiros necessários). Ato que se perdura em razão da declaração de inconstitucionalidade acontecer recentemente, não havendo um número passível de jurisprudências resolvendo totalmente à questão, subsistindo alguns pontos a serem resolvidos.

Ao declarar a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, o STF, busca equiparar em todos os aspectos, a condição de companheiro e cônjuge, inclusive no que tange a partilha do patrimônio deixado pelo hereditando, de maneira que tal deve ser repartido igualitariamente entre ambos; mas por se tratar de decisão recente, é imprescindível observar como se posicionará sobre o assunto a jurisprudência, em especial o STJ.

Dessa forma, cumpre ressaltar a importância da aplicação dos princípios constitucionais tratados ao longo do texto. Isto é, o órgão responsável pela resolução do litígio e aplicação da lei, deve valer-se dos Princípios da Dignidade da Pessoa Humana, da Vedação do Retrocesso e da Igualdade, para nortear sua decisão. É essencial que, contemplando determinado ponto controvertido na lei, e em seguida, ao aplicá-la diante o caso concreto, o julgador motive sua decisão conforme os preceitos basilares do ordenamento jurídico, no sentido de sempre proferir uma decisão mais justa, bem como coerente à CFRB/1988.

13.  REFERÊNCIAS

ALMEIDA, José Luiz Gavião de. Código civil comentado. Coord. Álvaro Villaça Azevedo. São Paulo (SP): Editora Atlas, 2003.

 

ARROYO JUNIOR, João Paulo Meneia. Do rompimento do testamento. Disponível em: https://jpmaj.jusbrasil.com.br/artigos/152848076/do-rompimento-do-testamento. Acesso em: 11/06/2019 às 20h.

 

BRASIL. Código civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 29/05/2019 às 18h.

 

BRASIL. Código de processo civil de 2015. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 29/05/2019 às 19h.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 18/06/2019 às 17h.

 

BRASIL. Lei nº 8.971, de 29 de dezembro de 1994. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8971.htm. Acesso em: 11/06/2019 às 18h.

 

BRASIL; SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Informativo STF: Brasília, 8 a 12 de maio de 2017 - Nº 864. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo864.htm. Acesso em: 11/06/2019 às 17h.

 

BRASIL; SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Notícias STF: julgamento afasta diferença entre cônjuge e companheiro para fim sucessório. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=342982. Acesso em: 12/06/2019 às 20h.

 

CASSETTARI, Christiano. Direito civil: direito das sucessões. Orientação: Giselda Maria Fernandes Novaes Hinoraka. Coord. Christiano Cassettari; Márcia Maria Menin. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais, 2008.

 

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. 6. ed. São Paulo (SP): Editora Saraiva, 2016.

 

HINORAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito das sucessões: introdução. In: HINORAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coords.). Direito das Sucessões. 2. ed. Belo Horizonte (MG): Editora Del Rey, 2007.

 

INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA – IBDFAM. Enunciados do IBDFAM. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfam/enunciados-ibdfam. Acesso em: 12/06/2019 às 19h29min.

 

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São Paulo (SP): Editora Atlas, 2003.

 

OLIVEIRA, Euclides de. Direito de herança. São Paulo (SP): Editora Saraiva, 2005.

 

SIMÃO, José Fernando; TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das sucessões. 3. ed. São Paulo (SP): Editora Método, 2010.

 

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 5. ed. Rio de Janeiro (RJ): Editora Forense; São Paulo (SP): Editora Método, 2015.

 

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 8. ed. Rio de Janeiro (RJ): Editora Forense; São Paulo (SP): Editora Método, 2018.

 

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 40. ed. São Paulo (SP): Editora Malheiros, 2017.

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Sobre os autores
Rodrigo Dantas Dias

Mestre em Direito Público pela PUC/MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2011). Pós-graduado em Direito Econômico Empresarial e Direito Processual pela UNIMONTES - Universidade Estadual de Montes Claros (2007 - 2008). Graduado em Direito pela FADOM - Faculdades Integradas do Oeste de Minas (2005). Atualmente é professor na Universidade Estadual de Montes Claros; [email protected]. Orientador deste artigo.

Raimundo Ribeiro Alves Júnior

Graduando de Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

Ana Luiza Araújo Barros

Graduanda do 7º período em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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