O direito processual penal vem passando por profundas transformações, estimuladas por novos diplomas legais, a exemplo daqueles que consubstanciam a delação premiada. Além disso, há novos crimes previstos em lei, a exemplo da organização criminosa e da lavagem de dinheiro. Tais modificações legais implicaram mudanças jurisprudenciais e de natureza comportamental.
De natureza jurisprudencial, pois foi necessário que os tribunais compreendessem o instituto da delação, a qual não é aceita se fruto de coação, mas, necessariamente, passa pelo intenso diálogo entre os interessados. De igual forma, os tribunais passaram a impor penas mais elevadas aos criminosos de organizações estruturadas, exatamente pela existência do concurso daqueles novos crimes.
Sob a ótica comportamental, esperava-se que alguns possíveis criminosos não incidissem no fato criminoso, acuados pela recrudescimento das penas. Mas isso não aconteceu, pois, sabidamente, o mero aumento da pena não diminui a criminalidade. Mas o aspecto comportamental viu-se influenciado por mudanças relevantes sim, sobretudo quanto aos procedimentos. Assim é que, a partir da delação premiada, Ministério Público, polícia e a defesa dos réus passaram a negociar, validamente, sanções em troca de desbaratamento de organizações criminosas. Alguns preferiram ver suas penas diminuídas, em troca da entrega de comparsas e seus esquemas, em vez de correrem atrás de nulidades processuais junto aos Tribunais Superiores.
Novos tempos, sem dúvida. E – em sã consciência – ninguém pode negar que a operação Lava Jato foi responsável por dar visibilidade a esses novos instrumentos do direito. Alguns poderosos, com riqueza de provas, foram condenados e presos. Diversas delações premiadas, decorrentes de diálogos entre todos os envolvidos, inclusive com participação dos magistrados, permitiram que a institucionalização da corrupção, em especial por meio da Petrobrás, viesse à tona.
Agora, no afã de encontrar nulidades no processo que gerou a condenação do ex-presidente Lula, seus simpatizantes divulgam os tais diálogos entre o ex-juiz Sérgio Moro e os Procuradores.
Não bastasse a ilegalidade da obtenção deste material, o mesmo não compromete a prova colhida e os fundamentos da condenação do processo de Lula mais avançado, a qual foi confirmada por dois colegiados (TRF e STJ). Chega a ser ingênuo, por outro lado, imaginar que o diálogo entre sujeitos do processo, ainda que sobre fatos processuais, signifique a suspeição do magistrado. Pode até não ser recomendável sob o ponto de vista ético, a depender do conteúdo do diálogo, mas, no que diz ao que foi divulgado sobre a operação Lava Jato, nada se verifica que traga a tão subjetiva suspeição.
Ora, até pela dinâmica das operações implementadas, a exigir ações policiais sigilosas e que atingem poderosos, é necessário o diálogo entre quem julga e quem as implementam. Há abusos na Lava Jato? Por certo sim, inclusive quanto ao vazamento do diálogo entre os ex-presidentes Dilma e Lula. Mas só os que encaram tudo sob o rótulo político-partidário é que podem pensar em tripudiar o que ali de positivo foi feito.
Sobre Luiz Fernando Valladão Nogueira
Luiz Fernando Valladão Nogueira é advogado, procurador do Município de Belo Horizonte; Coordenador de Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil no CEDIN; professor e coordenador de Pós- Graduação na Faculdade de Direito Arnaldo Janssen; autor de diversas obras jurídicas, dentre elas, “Recursos e Procedimentos nos Tribunais no novo CPC” (Ed. D’Plácido) e "Recurso Especial" (Ed. Del Rey); coautor da obra “O Direito Empresarial no enfoque do Novo Código de Processo Civil”, membro do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro.