Imposto sobre produtos industrializados (IPI):o direito ao creditamento em razão do princípio da não-cumulatividade na cadeia plurifásica

Resumo:


  • O princípio da não-cumulatividade do IPI permite compensar o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores.

  • O crédito de IPI não se confunde com o crédito presumido de IPI, sendo essencial atentar para a não incidência do imposto sobre imposto.

  • A jurisprudência tem reconhecido o direito ao creditamento do IPI decorrente da exportação de produtos industrializados, desde que observadas as normas legais e constitucionais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

No presente artigo será demonstrado como funciona o direito ao crédito básico de IPI decorrente da exportação de Produtos Industrializados. Bem como, com noções da jurisprudência e da lei.

Avaliando a estrutura jurídica que alberga o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), em se tratando de uma mesma cadeia plurifásica, deve-se redobrar a atenção do contribuinte para a hipótese de não incidência do famoso “imposto sobre imposto”.

Para o efeito anunciativo pretende-se explicar, não apenas sobre o princípio da não-cumulatividade, mas também sobre o saldo do crédito de IPI (crédito básico) não utilizado em razão da imunidade tributária decorrente da exportação de produtos industrializados.

Cabe ressalvar, desde logo, que o crédito de IPI não se confunde com o crédito presumido de IPI.

O princípio da não-cumulatividade do IPI, bem como a imunidade tributária nas exportações de produtos industrializados estão contidos na Constituição da República, no art. 153, §3, II e III, a saber:

“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

(...)

IV - produtos industrializados;

(...)

§3º O imposto previsto no inciso IV:

(...)

II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

III - não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao exterior.”[1]

Por sua vez, o caput do artigo 49 do CTN (Código Tributário Nacional) e o parágrafo único do mesmo dispositivo também expressam essa não-cumulatividade do IPI[2].

No contexto da norma legal, o contribuinte tem o direito de utilizar o saldo em comentário para compensar (abater) ou a restituir-se de tais valores.

A jurisprudência tem assim se posicionado:

TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. CREDITAMENTO DECORRENTE DE AQUISIÇÃO DE INSUMOS E MATÉRIAS-PRIMAS TRIBUTADOS OU NÃO, UTILIZADOS NA FABRICAÇÃO DE PRODUTO NÃO TRIBUTADO (ÁLCOOL CARBURANTE). PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. LEI Nº 9.779/99. EXPORTAÇÃO. INCENTIVO. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 491/69, RESTABELECIDA PELA LEI Nº 8.402/92.  PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. DECRETO Nº 20.910/32. (...).

XII. O benefício fiscal previsto no art. 5º do DL n. 491/1969 (restabelecido pelo art. 1º, II, da Lei n. 8.402/1992) legitima o creditamento de IPI relativo às matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem tributados efetivamente utilizados na industrialização dos produtos exportados. O valor do imposto pago nas etapas anteriores da cadeia produtiva pode ser creditado na contabilidade do exportador, ou repetido, evitando-se sua inclusão no preço do bem a ser exportado (que não está sujeito ao IPI).

XIII. Os insumos utilizados na industrialização dos produtos exportados cuja aquisição é não tributada, isenta ou sujeita à alíquota zero não autorizam o creditamento de IPI, porquanto já destacado que o princípio da não cumulatividade não legitima creditamento nas hipóteses de entradas exonerativas.

XIV. Apelação parcialmente provida, para reconhecer o direito de creditamento de IPI da empresa contribuinte com relação às exportações, com base no art. 1º, II. da Lei nº 8.402/92 (art. 5º do DL n. 491/69), nas hipóteses em que houve a incidência do citado tributo na aquisição de insumos e matérias-primas para a produção do produto a ser exportado, o que deve ser efetivamente demonstrado quando da liquidação da decisão, cabendo à execução do julgado definir se a produção contempla também álcool não carburante.

(TRF4. PROCESSO: 200280000098543, DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO, Segunda Turma, JULGAMENTO: 18/08/2015, PUBLICAÇÃO: DJE - Data::27/08/2015 - Página::129).

Na mesma linha interpretativa, o Superior Tribunal de Justiça — STJ, por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.528.764, a respeito do direito ao creditamento do saldo do Imposto sobre Produto Industrializado decorrente da exportação de produtos em que incide esse tributo, decidiu:

TRIBUTÁRIO. IPI. CREDITAMENTO. EXPORTAÇÃO. DL N. 491/1969 E LEI N. 8.402/1992. INCENTIVO À EXPORTAÇÃO. CREDITAMENTO. POSSIBILIDADE NAS ENTRADAS DE MATÉRIAS-PRIMAS, PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS E MATERIAL DE EMBALAGEM TRIBUTADOS.[3]

Conforme o entendimento jurisprudencial mais recorrente, a compensação prevista na Constituição da República, para fins da não-cumulatividade, depende do cotejo de valores apurados entre o que foi cobrado na entrada e o que foi devido na saída, ou seja, o crédito do adquirente se dará em função do montante cobrado do vendedor do insumo e o débito do adquirente existirá quando o produto industrializado é vendido a terceiro, dentro da cadeia produtiva (cadeia plurifásica).

Assim, para acontecer o direito ao creditamento do IPI, o vendedor de matérias primas, produtos intermediários e material de embalagem, utilizados na industrialização, deve ter recolhido o valor referente a esse tributo.

Esse mesmo raciocínio, em tese, não se aplica quando a entrada desses produtos tenha sido feita de forma isenta, sujeita a alíquota zero ou imune, todavia a questão aqui é polêmica, considerando-se a existência de precedentes albergando o creditamento mesmo nestas hipóteses, como é o caso do RE 615929/2012, em cujo julgamento sustentou-se que “se não houver o creditamento, a imunidade, isenção ou tributação à alíquota zero de determinada operação anular-se-á na operação seguinte. Teríamos, então, mero diferimento de imposto. Este efeito, além de violar o princípio da não cumulatividade, compromete os objetivos extrafiscais pretendidos com o benefício da isenção ou taxação à alíquota zero, pois a carga fiscal apenas se transfere para uma etapa seguinte do processo produtivo (RE 615929 AgR/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe-126, 28/06/2012).  

 De qualquer forma, e para o efeito almejado no presente estudo, vale lembrar que a variação de alíquota depende de cada produto industrializado, devendo-se consultar a Tabela TIPI (tabela do IPI).

Para exemplificar, cabe a seguinte ilustração:

 

Hipótese/Exemplo. A alíquota — 10%

Base de cálculo                                      100 ----------> 150-------------->200------------->1000

Credita-se do anterior                              10<-------------15<----------------20<--------------100

Resultado                                                10       +           5            +          5    +   80   = 100

Al: 10%

Fabricante 1

Fabricante 2

Fabricante 3

F. Exportador 4

Base de cálculo

100

150

200

1000

Creditamento

10

15

20

100

Resultado

10+

5+

5+

80

= 100

LEGENDAS: X1       – Matéria prima

P1        – Produto 1

P2        – Produto 2

P3        – Produto 3

P4        – Produto 4

Desdobrando-se o exemplo/hipótese, pode-se estabelecer que:

  • O Fabricante 1 compra a matéria prima (X1) de forma não tributada, com a qual faz o produto (P1) e vende para o Fabricante 2 por R$ 100,00.

O crédito aproveitado do Fabricante 1 foi de R$ 00,00 (zero), pois quando a entrada da mercadoria acontece de forma não tributada, imune, isenta, ou sujeita a alíquota zero, ele não tem de onde se creditar.

O Fabricante 1 paga R$ 10,00 a título de IPI (base de cálculo 100, alíquota de 10% =10).

  • O Fabricante 2 compra o produto (P1) do Fabricante 1 e transforma no produto (P2), revendendo-o por R$ 150,00 para o Fabricante 3.

O Fabricante 2 tem um direito de crédito de R$ 10,00 referente ao valor já recolhido pelo Fabricante 1, podendo se creditar (base de cálculo 150, alíquota de 10%= 15-10=5).

  • O Fabricante 3 compra o produto (P2) do Fabricante 2 e transforma no produto (P3), revendendo-o para o Fabricante/Exportador 4 por R$ 200,00.

O Fabricante 3 tem um direito de crédito de R$ 15,00 referente ao valor já recolhido pelo Fabricante 2, podendo se creditar (base de cálculo 200, alíquota 10%=20-15=5).

  • O Fabricante Exportador 4 compra o produto (P3) do Fabricante 3 e transforma no produto (P4), EXPORTANDO-O por R$ 1.000,00.

Considerando-se que o Fabricante/Exportador do produto (P4) tem imunidade tributária referente ao imposto de IPI na exportação, ele não recolherá como nas outras cadeias demonstradas anteriormente. Isto quer dizer que não irá recolher o valor sem creditamento de R$ 100,00 e nem mesmo o valor com creditamento, que seria de R$ 80,00 (base de cálculo 1000, alíquota de 10%=100-20=80).

Conclui-se que o Exportador tem a imunidade tributária de IPI e também um incentivo fiscal para aproveitar o crédito da cadeia anterior não utilizado. Crédito esse de R$ 20,00, segundo o exemplo acima.

Como visto o princípio da não-cumulatividade cumpre o seu papel constitucional, evitando-se acúmulo do imposto nas diversas fases do processo industrial.

O regime constitucional do Imposto sobre Produtos Industrializados determina a compensação do que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações antecedentes, caracterizando-se a substância jurídica do princípio da não-cumulatividade, não aperfeiçoado quando não houver produto onerado na saída (que é o caso da imunidade do IPI na exportação), pois o ciclo não se completa.

Assim sendo, é necessário que aconteça a incidência do IPI na entrada e a desoneração na saída, porém apenas isso não é suficiente para dar direito ao crédito de IPI ao exportador. O contribuinte (exportador) apenas passou a ter direito ao referido crédito com a entrada em vigor da Lei 9.779/99, artigo 11[4], que estabeleceu o marco legal da possibilidade de compensação do IPI incidente na etapa anterior, exceto em relação a saídas isentas, sujeitas à alíquota zero e imunes, fazendo, assim, com que o contribuinte tenha um crédito a ser compensado ou restituído.

Diante da autorização do direito ao crédito de IPI consagrado no art. 11 da Lei 9.779/99, o Decreto Lei n° 491/69, em seu art. 5º, assegura o direito a esse crédito decorrente da utilização de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem utilizados na industrialização de produtos no mercado interno que serão exportados, conforme expressão abaixo:

“(...)

Art. 5º É assegurada a manutenção e utilização do crédito do IPI relativo às matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem efetivamente utilizados na industrialização dos produtos exportados.”[5]

Agregue-se aos fundamentos legais o disposto na Lei 8.402/92, que, em seu art. 1º, reafirma o contido no art. 5º do Decreto Lei nº 491/69:

Art. 1° São restabelecidos os seguintes incentivos fiscais: II - manutenção e utilização do crédito do Imposto sobre Produtos Industrializados relativo aos insumos empregados na industrialização de produtos exportados, de que trata o art. 5° do Decreto-Lei n° 491, de 5 de março de 1969.[6]

O Decreto n. 7.212/2010, em seu art. 238 (Regulamento do IPI - RIPI), também autoriza tal incentivo fiscal.[7]

Deste modo, para ter-se direito ao crédito de IPI decorrente da imunidade de produto industrializado destinado ao exterior, é necessário que a matéria-prima, produto intermediário e as embalagens destinadas à industrialização tenham entrado de forma tributada, sendo vedada sua entrada de forma exonerativa, permitindo-se que apenas sua saída tenha sido exonerada, conforme entendimento dos Tribunais Superiores. Porém, como visto, também é necessária a expressa autorização do incentivo fiscal por lei.

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Conforme o Decreto 7.212/2010, em seu art. 226 (RIPI – Regulamento do IPI), os legitimados que têm o direito de se creditar são os estabelecimentos industriais e os que lhes são equiparados.

Os créditos deverão ser escriturados no Livro de Apuração do IPI, com os totais dos valores contábeis e dos valores fiscais das operações de entrada e saída, extraídos dos livros de Registro de Entrada e Saída, atendido o Código Fiscal de Operações e Prestações – CFOP.[8]

Em uma cadeia normal de industrialização, onde não exista a imunidade na saída do bem, o creditamento é imediato, sendo anotado o preço de entrada da mercadoria e o preço de venda, em que irá incidir o valor respectivo do imposto pago. Tal procedimento é feito pela contabilidade interna da empresa.

Conforme a IN RFB nº 1717/2017[9], os referidos créditos podem ser utilizados das seguintes formas: a) compensados com as saídas tributadas; b) compensação em período posterior; c) compensação com outros débitos federais administrados e permitidos pela RFB; ou d) restituição do valor.

A apuração do saldo dos créditos se dá a cada trimestre-calendário. Se, ao final deste trimestre-calendário, ainda houver saldo credor de IPI, este poderá ser compensado por tributo administrado e indicado pela Receita Federal do Brasil.

A compensação se dá através da guia Per/Dcomp, sendo registrado o Pedido de Ressarcimento (Per) e, em seguida, a Declaração de Compensação (Dcomp). Tal procedimento se dá na esfera administrativa.

Não conseguindo a compensação/restituição de valores a que a empresa tenha direito, por conta de indeferimento irregular ou arbitrário do fisco, deverá recorrer-se ao Poder Judiciário.

Caso existam estabelecimentos (matriz e filiais), a matriz poderá se compensar dos créditos das filiais, porém o contrário não é permitido.

Em regra, por se tratar de crédito de natureza escritural, não haverá correção monetária quando configurado o direito a restituição/compensação do crédito de IPI, exceto se ocorrer oposição injustificada da Fazenda Pública, hipótese de aplicação da Súmula nº 411 do Superior Tribunal de Justiça.[10]

Neste contexto, chama-se atenção para a complexidade das questões tributárias e o envolvimento do contribuinte em uma teia; um emaranhado de normas indutoras de um comportamento passivo, diante dos custos de transação que o comportamento ativo/diligente submete (processuais e ou extraprocessuais). Espera-se, de fato, que a reforma tributária contribua para a simplificação das normas de direito material e também das normas de procedimento, mediante a incorporação de inovações tecnológicas facilitadoras das relações fisco-contribuinte.

Notas e Referências

[1] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 22. maio. 2019.

[2] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 22. maio. 2019.

[3] Supremo Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 1.528.764.

[4] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9779.htm>. Acesso em: 22. maio. 2019.

[5] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0491.htm> Acesso em: 22. maio. 2019.

[6] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8402.htm>. Acesso em: 23. maio. 2019.

[7] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7212.htm#art617. Acesso em: 05. junho. 2019.

[8]PRESTES, Patricia .Disponível em: <https://www.econeteditora.com.br/boletim_comercio_exterior/11/boletim06/ipi_credito_basico_ipi.php>. Acesso em 11.junho.2019.

[9] Disponível em:<http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=84503&visao=original> Acesso em: 23. maio. 2019.

[10] MINARDI, Josiane. Manual de Direito Tributário. 2 ed. Salvador: JusPodium, 2015, p. 703. Súmula 411 do STJ: “É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco”.

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Sobre os autores
João Carlos Adalberto Zolandeck

advogado em Curitiba, professor universitário, especialista em Direito Processual Civil, pós-graduado pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos (IBEJ). mestrando em Ciência Jurídica pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro (FUNDINOPI)

Lucas Murilo Wojcik

Advogado no escritório Zolandeck Advogados. Com especialidade em Direito Tributário, Empresarial, Civil, Responsabilidade Civil e Consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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