RESSOCIALIZAÇÃO E REINTEGRAÇÃO SOCIAL

Método APAC: ferramenta eficaz para a ressocialização do preso.

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28/06/2019 às 02:52

Resumo:


  • A pena de prisão, como medida punitiva, não tem sido eficaz na ressocialização de detentos no Brasil, com instalações superlotadas e condições desumanas.

  • As taxas de reincidência são altas, indicando que a atual abordagem do sistema prisional não está conseguindo reformar os detentos ou dissuadir o crime.

  • Alternativas como as APACs (Associações de Proteção e Assistência aos Condenados) mostram resultados mais promissores na ressocialização e apresentam índices de reincidência significativamente mais baixos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Entenda os fundamentos da ineficiência dos estabelecimentos prisionais na REINTEGRAÇÃO SOCIAL, desde os fundamentos e finalidades da pena ate a atual ineficiência na ressocialização. Os sistema atual NÃO EH RESSOCIALIZADOR.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

1 CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL E HISTÓRICA DA PENA 10

1.1 CONCEITO DE PENA 10

1.2 ORIGEM DA PENA 11

1.3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS 14

1.3.2 Princípio da Humanidade 15

1.3.3 Princípio Individualização da Pena 17

1.3.4 Princípio da Proporcionalidade 18

2 FINALIDADES DA PENA 20

2.1 FUNDAMENTOS DA PENA 20

2.2 TEORIAS DA PENA 21

2.2.1 Teorias Absolutas 21

2.2.2 Teorias Relativas 22

2.2.3 Teorias Mistas ou Unitárias 24

3 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO 26

3.1 A PREVISÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO BRASIL 26

3.2 OS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS 28

3.3 O PROBLEMA DO CÁRCERE NO BRASIL 29

4 A INEFICIÊNCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO DO PRESO 34

4.1 OS NÚMEROS DA REINCIDÊNCIA E A INEFICIÊNCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO 34

4.2 DA RESSOCIALIZAÇÃO E REINTEGRAÇÃO SOCIAL 38

CONSIDERAÇÕES FINAIS 43

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 45

INTRODUÇÃO

A intenção de punir acompanha a civilização humana desde que ela se formou. Remonta aos primeiros agrupamentos sociais a necessidade do homem em proteger seu patrimônio, sua vida, sua sobrevivência. Tem-se assim o controle social, o controle de um homem sobre outro através da punição.

A visão de uma pena de prisão como finalista é mais contemporânea, mais atual, anteriormente servia somente como um local onde um acusado aguardava seu julgamento final, hoje, serve como forma de execução final da punição.

O primeiro capítulo traz um breve estudo acerca do conceito de pena, a definição do exercício do direito de punir do Estado, estabelecendo ainda sua origem e evolução em breve síntese até o surgimento da pena de prisão. Traz ainda, uma abordagem acerca dos princípios constitucionais aplicáveis a seara penal no intuito de estabelecer norteadores a imposição e execução da pena, onde com essa observância se deveria proteger direitos e obedecer a limites.

O segundo capítulo tem como objeto de estudo as teorias que objetivam explicar a finalidade da pena, de forma que se possa compreender a temática proposta acerca de como os altos índices de reincidência, a falta de ressocialização e a situação do sistema prisional brasileiro contrariam a finalidade acolhida pelo ordenamento jurídico pátrio.

O terceiro capítulo traz uma abordagem específica sobre a pena privativa de liberdade, sua previsão na lei brasileira, como é feita a divisão dos estabelecimentos prisionais, ou seja, de forma deveriam ser os presos direcionados a cada local conforme suas finalidades e características, mais uma situação que demonstra estar o sistema na contramão dos ditames legais, encerrando o tópico analisa-se brevemente a questão da crise existente no sistema prisional do Brasil.

Por último, a abordagem final vai ao cerne do objetivo deste trabalho analisando as taxas da reincidência no Brasil, verificando situações influenciadoras na crise existente, na falta de ressocialização, concluindo com a apresentação do método apaqueano de execução da pena, onde o objetivo primordial é a reabilitação do condenado ao convívio social, demonstrando que existe a possibilidade de diminuir os números da reincidência criminal.

1 CONTEXTUALIZAÇÃO GERAL E HISTÓRICA DA PENA

1.1 CONCEITO DE PENA

Pena é a medida imposta pelo Estado, ao infrator que comete um ato típico, ilícito e culpável, mediante o devido processo legal. O Estado tem o dever/poder de aplicar a sanção penal ao autor da conduta ilícita culpável como forma de retribuição do mal provocado por tal conduta, “castigando” o agente da conduta criminosa, e com a finalidade de evitar que novos crimes possam ser cometidos.

Conceitualmente, Damásio de Jesus ensina que pena é: “a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos”1.

No mesmo sentido Fernando Capez: “sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”.2

A pena é uma consequência do ato ilícito cometido, assim explica Luiz Regis Prado:

A pena é a mais importante das consequências jurídicas do delito. Consiste na privação ou restrição de bens jurídicos, com lastro na lei, imposta pelos órgãos jurisdicionais competentes ao agente de uma infração penal.3

Na lição de Victor Eduardo Rios Gonçalves encontra-se a seguinte definição:

Pena é a retribuição imposta pelo Estado em razão da prática de um ilícito penal e consiste na privação de bens jurídicos determinada pela lei, que visa à readaptação do criminoso ao convívio social e à prevenção em relação à prática de novas transgressões.4

É a punição recebida pelo transgressor da lei e violador do bem jurídico tutelado. Verificando a etimologia do termo tem-se que a palavra pena deriva do latim poena ou poiné5, o qual designa o significado de castigo ou punição ao transgressor de uma lei.

1.2 ORIGEM DA PENA

A origem da pena reside no intento do ser humano de proteger a si mesmo, sua sobrevivência e suas posses. De início pode-se entender que a não havia um sistema destinado a execução do direito de punir, que analisasse e julgasse as transgressões cometidas, a pena podia ser então executada por chefes de clãs, por particulares, pelo clero e ainda, por ordem direta de um soberano.

Cleber Masson traz a seguinte narrativa acerca da origem da pena:

De fato, o ponto de partida da história da pena coincide com o ponto de partida da história da humanidade. Em todos os tempos, em todas as raças, vislumbra-se a pena como uma ingerência na esfera do poder e da vontade do indivíduo que ofendeu e porque ofendeu as esferas de poder e da vontade de outrem.6

Em complemento as palavras de Gabriel Barbosa Gomes de Oliveira Filho:

A acumulação de riqueza e do poder das armas e a constituição do poder judiciário nas mãos de alguns, ambas partes de um mesmo processo histórico ligado ao momento medieval, só vem a amadurecer no final do século XII com a formação da primeira grande monarquia medieval. Com isso a justiça passou a ser imposta do alto, e a ofensa a um indivíduo passou a ser considerada uma ofensa também ao Estado, a ordem, a lei e ao poder soberano. A reparação já não pode concluir-se com a satisfação do ofendido, sendo necessária a reparação da ofensa contra o soberano, razão do surgimento dos mecanismos de multas e confiscações.7

O surgimento e a necessidade do homem de viver em sociedade trouxe a necessidade de regras que regulamentassem a vida coletiva, segundo Rogério Greco “o homem, como ser dotado de consciência moral, teve, e terá sempre noções e delito e pena”.8

A história da pena está ligada a história do homem, de modo que a própria bíblia traz em seu livro de Gênesis o que pode ser visto como a primeira forma de punição existente, uma vez que por agir de forma contrária aos mandamentos estabelecidos por seu Criador, o homem recebe como punição a expulsão do paraíso.9

A Bíblia traz ainda outros exemplos que remontam os primórdios da humanidade, em que houve a necessidade da aplicação de penas ante as transgressões ocorridas, dentre elas o primeiro homicídio que se tem conhecimento na humanidade:

E falou Caim com o seu irmão Abel; e sucedeu que, estando eles no campo, se levantou Caim contra o seu irmão Abel, e o matou.

E disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, teu irmão? E ele disse: Não sei; sou eu guardador do meu irmão?

E disse Deus: Que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a mim desde a terra.

E agora maldito és tu desde a terra, que abriu a sua boca para receber da tua mão o sangue do teu irmão.

Quando lavrares a terra, não te dará mais a sua força; fugitivo e vagabundo serás na terra.10

[...]

E viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente.

Então arrependeu-se o Senhor de haver feito o homem sobre a terra e pesou-lhe em seu coração.

E disse o Senhor: Destruirei o homem que criei de sobre a face da terra, desde o homem até ao animal, até ao réptil, e até à ave dos céus; porque me arrependo de os haver feito.

E viu Deus a terra, e eis que estava corrompida; porque toda a carne havia corrompido o seu caminho sobre a terra.

Então disse Deus a Noé: O fim de toda a carne é vindo perante a minha face; porque a terra está cheia de violência; e eis que os desfarei com a terra11

Assim, não há outra compreensão senão a de que com o surgimento da civilização houve a necessidade de estabelecer regras de convivência e assim, consequentemente a necessidade de meios de punição às violações.

Cesare Beccaria ilustra a origem das penas do seguinte modo:

Cansados de só viver no meio de temores e de encontrar inimigos por toda parte, fatigados de uma liberdade que a incerteza de conservá-la tornava inútil, sacrificaram uma parte dela para gozar do resto com mais segurança. A soma de todas essas porções de liberdade, sacrificadas assim ao bem geral, formou a soberania da nação; e aquele que foi encarregado pelas leis do depósito das liberdades e dos cuidados da administração foi proclamado o soberano do povo. Não bastava, porém, ter formado esse depósito; era preciso protegê-lo contra as usurpações de cada particular, pois tal é a tendência do homem para o despotismo, que ele procura sem cessar, não só retirar da massa comum sua porção de liberdade, mas ainda usurpar a dos outros. Eram necessários meios sensíveis e bastante poderosos para comprimir esse espírito despótico, que logo tornou a mergulhar a sociedade no seu antigo caos. Esses meios foram as penas estabelecidas contra os infratores das leis.12

As violações das normas legais e morais acarretavam ao indivíduo penas de sacrifício corpóreo, conforme relata Michel Foucault13, que a propósito inicia a narrativa da execução da pena de um personagem, Damien, um parricida. Ao longo da obra o autor vai explanando acerca do tema, inclusive fazendo comentários sobre a repreensão imposta aqueles que delinquiam:

Apresentamos exemplo de suplício e de utilização do tempo. Eles não sancionam os mesmos crimes, não punem o mesmo gênero de delinquentes. Mas definem bem, cada um deles, um certo estilo penal.14

[...]

desapareceu o corpo supliciado, esquartejado, amputado, marcado simbolicamente no rosto ou no ombro, exposto vivo ou morto, dado como espetáculo. Desapareceu o corpo como alvo principal da repreensão penal.

As formas de punição passaram por uma ordem evolutiva, no sentido de que inicialmente utilizava-se uma prática particular de penalizar um indivíduo, a punição tinha única e exclusivamente o caráter de retribuição, era mais uma forma de vingança. A fase da vingança privada surge com crescimento e evolução populacional e consequentemente como forma de controle social dada a necessidade de regular as relações existentes.

Neste sentido leciona Cleber Masson:

Era uma vingança entre os grupos, eis que encaravam a infração como uma ofensa não relacionada diretamente à vítima, mas, sobretudo, ao grupo a que pertencia. O homem primitivo tinha forte laço com sua comunidade, uma vez que, fora dela, sentia-se desprotegido ante sua imaginação mágica. Fica nítida a inter-relação entre a vingança divina e a privada. Desse modo, imperava a lei do mais forte, a vingança de sangue, em que o próprio ofendido ou outra pessoa do seu grupo exercia o direito de voltar-se contra o agressor, fazendo “justiça peias próprias mãos”, cometendo, na maioria dos casos, excessos e demasias, o que culminava com a disseminação do ódio e consequentes guerras entre grupos.15

André Estefam explica o que foi o período da vingança privada:

Já em tempos muito remotos, o homem fazia justiça pelas próprias mãos. A vingança privada caracterizava -se por reações violentas, quase sempre exageradas e desproporcionais. As penas impostas eram a “perda da paz” (imposta contra um membro do próprio grupo) e a “vingança de sangue” (aplicada a integrante de grupo rival). Com a “perda da paz”, o sujeito era banido do convívio com seus pares, ficando à própria sorte e à mercê dos inimigos. A “vingança de sangue” dava início a uma verdadeira guerra entre os agrupamentos sociais. A reação era desordenada e, por vezes, gerava um infindável ciclo, em que a resposta era replicada, ainda com mais sangue e rancor. Travavam -se lutas intermináveis, imperando o ódio e a guerra. Com o fortalecimento do poder social, a vingança privada, aos poucos, cedeu lugar à justiça privada, atribuindo -se ao chefe da família, clã ou tribo o poder absoluto de decidir sobre a sorte dos infratores.16

Nesse momento da evolução punitiva é que se tornou conhecida a máxima “olho por olho e dente por dente” uma forma de “justiça” propagada pela Lei de Talião.

1.3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS

Os princípios penais consistem em conduzir o processo e a execução penal, e devem ser observados porque servem de fundamento para aplicação da pena e de limite à responsabilidade punitiva do Estado. São crucialmente importantes para se alcançar a justiça e a correta aplicação das normas penais.

1.3.1 Princípio da Legalidade

O princípio da legalidade, diz respeito aos limites impostos a atuação estatal, é uma garantia fundamental do indivíduo, e está previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal:

Art. 5°(....)

XXXIX – Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; 17

O código penal em seu primeiro artigo adotou a mesma redação. Seus valores estão em proteger a liberdade, a igualdade e a segurança jurídica, vincula o Poder Público à lei, não pode constituir infração penal nem sanção penal sem que a conduta esteja prevista em lei (stricto sensu). “Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege”.

Nesse sentido Fernando Capez:

Trata-se de garantia constitucional fundamental do home. O tipo exerce função garantidora do primado da liberdade porque, a partir do momento em que somente se pune alguém pela prática de crime previamente definido em lei, os membros da coletividade passam a ficar protegidos contra toda e qualquer invasão arbitrária do Estado em seu direito de liberdade.

Fica estabelecido uma regra: ninguém será submetido a sanção penal imposta pelo Estado, nem terá o direito de liberdade violado. O indivíduo só será punido se vierem a praticar condutas tipificadas na lei penal. O princípio da legalidade traz uma série de garantias, entre elas a garantia a liberdade individual e garantia jurisdicional, e impõe restrições ao legislador e interpretes das leis.

1.3.2 Princípio da HumanidadE

O princípio da humanidade apresenta salvaguarda a dignidade do réu. Num Estado democrático de Direito, é proibido a aplicação ou execução de penas que atente a dignidade humana. Conforme o estabelecido na Declaração dos Direitos do Homem: “todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Assim como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e políticos, Art. 7º “ninguém será submetido à tortura, nem apenas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas”.

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, estabelece diretrizes do Estado Democrático de Direito, no que diz respeito à dignidade humana, e prevê que a lei punirá qualquer discriminação que atente os direitos e as garantias fundamentais. Também está expressamente proibido pela Constituição as penas de morte, de trabalho forçado, de caráter perpetuo e penas cruéis. Assegura ainda aos presos o respeito à integridade física e moral (art. 5°, XLIX, CF).

Art. 5°(...)

III - Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; 

[...]

XLVII - Não haverá penas: 

a) - de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84, XIX; 

b) - de caráter perpétuo; 

c) - de trabalhos forçados; 

d) - de banimento; 

e) - cruéis; 

[...]

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; 

[...]

L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; 18

Segundo Luiz Regis Prado:

A ideia de humanização das penas criminais tem sido uma reivindicação constante no perpassar evolutivo do Direito Penal. Das penas de morte e corporais, passe-se, de modo progressivo, às penas privativas de liberdade e destas às penas alternativas.19

Também encontramos o princípio da humanidade na legislação infraconstitucional, na lei n° 9.455, de 1997 que define o crime de tortura. Também a Lei 7.210, de 1984, que regula sobre a execução penal e diz no art. 3º que ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei, e não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.

1.3.3 Princípio Individualização da Pena

A responsabilidade penal é própria do ser humano, é pessoal e subjetiva, decorre somente da ação ou omissão do indivíduo, não admitindo punição por fato alheio. Conforme o previsto na Constituição Federal.

Art; 5º...

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;20

A pena é pessoal e não pode ser transmitida para terceiro. Conforme Prado, é matéria que versa sobre autoria e participação, com seus elementos objetivos e subjetivos.21

A individualização da pena estabelece que o julgador não pode deixar de aplicas a pena, “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos. (Art. 5º, XLVI, CF)22

Conforme os ensinamentos de Luiz Regis Prado a individualização das penas é dividida em três fases: Legislativa, judicial e executória.

Na primeira delas. A lei “fixa para cada tipo penal uma ou mais penas proporcionais a importância do bem tutelado e a gravidade da ofensa”, na segunda, o julgador, tendo em conta as particularidades da espécie concreta e determinado fatores previstos em lei, fixa a pena aplicável, obedecendo o marco legal; e a terceira, é a que diz respeito ao cumprimento da pena – fase de execução da pena, que é basicamente de ordem administrativa.”23

Pode-se compreender então, que no ordenamento jurídico pátrio é vedado que uma punição atinja a terceiros, se estenda a indivíduos que não fizeram parte da persecução penal com a finalidade punitiva.

1.3.4 Princípio da Proporcionalidade

A pena deve ser aplicada na mesma proporção/medida da afronta ao bem jurídico tutelado, em outras palavras esse princípio estabelece que a pena não pode ultrapassar a necessidade evidente, deve ser impedido o excesso, e por outro lado, a pena aplicada deve ser suficiente para a reprovação e prevenção do crime a fim de encontrar proporcionalidade entre o delito e a penal.

O princípio da proporcionalidade não está previsto expressamente na Constituição Federal, como os demais princípios, não há uma redação legal mencionando tal princípio, mas aparece de forma insculpido nas normas constitucionais, prevendo penas mais leves para infrações menos gravosas e penas mais graves para crimes com maior potencial ofensivo como o crime de racismo, tortura e tráfico:

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Art. 5°(...)

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;          

 XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático24;

Segundo esse princípio a aplicação da pena é necessária e indispensável para a garantia do bem jurídico e para chegar ao fim desejado pela sociedade. Nesse sentido Regis Prado explica a necessidade da cominação proporcional da sanção penal:

Para a cominação e imposição da pena, agregam-se, além dos requisitos de idoneidade e necessidade, a proporcionalidade. Pela adequação ou idoneidade, a sanção penal deve ser um instrumento capaz, apto ou adequado à consecução da finalidade pretendida pelo legislador (adequação do meio ao fim). Além da aptidão da pena para a garantia do bem jurídico, a idoneidade implica que ela seja adequada para conseguir a finalidade e que seja de factível realização por meio de normas processuais e de execução penal.25

Cesare Beccaria em sua obra dos delitos e das penas já dizia que deve existir uma proporção entre crimes e panas26, ele explica que se a pena for prevista pelo legislador e aplicada de igual forma à crimes de gravidades diferentes o infrator ao cometer o crime escolherá o mais grave por ser mais vantajoso: “Se uma pena igual for aplicada a dois crimes que prejudicam a sociedade em graus diferentes, nada impedirá o homem de cometer o crime pior se com ele obtiver maior vantagem.”27

2 FINALIDADES DA PENA

As penas devem ser necessárias e suficientes para a reprovação e prevenção do crime, de acordo com a legislação penal entende-se que a pena deve ser aplicada com a finalidade de reprovar o mal praticado pelo criminoso e prevenir posteriores condutas semelhantes.

Segundo Beccaria,

“O objetivo da pena, portanto, não é outro que evitar que o criminoso cause mais danos à sociedade e impedir a outros de cometer o mesmo delito. Assim, as penas e o modo de infligi-las devem ser escolhidas de maneira a causar a mais forte e duradoura impressão na mente de outros, com o mínimo tormento ao corpo do criminoso³”.

A pena nada mais é que a restauração da ordem que foi violada. A desordem como violação da lei deve seguir de algo valido à elimina-la, é necessário por em movimento forças para restabelece-la. Francesco Carnelutti ensina que a pena deve ser vista como um igual porque é o contrário do delito.

Que sua função seja expressada, além de deduzir-se racionalmente da existência de uma lei, que a pena ao delito, empiricamente se evidencia pela conformidade que os homens experimentam perante a pena expiada por quem cometeu o delito. A consciência não é talvez outra coisa, depois de tudo, que sensibilidade à ordem, cuja turbação provoca em nós um sofrimento, e cujo restabelecimento, porém, ao eliminar o sofrimento, satisfaz uma necessidade. Que a morte do matador ocasione aos terceiros um estado de ânimo, mais que diverso, contrário àquele derivado da morte da vítima”.28

2.1 FUNDAMENTOS DA PENA

A aplicação da pena ao criminoso condenado, devido as consequências práticas da condenação, possui fundamentos que explicam a razão da existência do sistema penal.

  1. Prevenção: para manter a ordem social, intimida a sociedade com as normas penais punitivas ao tomarem ciência de que um infrator foi condenado. Fazendo com que o indivíduo condenado não volte a delinquir.

  2. Retributivo: a pena serve como um castigo ao infrator de forma proporcional ao mal que causou, dentro dos limites constitucionais.

  3. Reparatório: como efeito secundário da condenação penal, consiste na reparação dos danos consequentes à vítima do ato ilícito.

  4. Readaptação: a aplicação da pena visa também reeducar o infrator condenado e reabilita-lo ao convívio em sociedade caso alcance os objetivos estabelecidos.

2.2 TEORIAS DA PENA

Existem várias teorias que tentam explicar as finalidades e os fundamentos da pena, são reunidas em três grandes grupos; Segundo a classificação doutrinária existente, as finalidades da pena são explicadas a partir de três teorias: Teorias Absolutas que apregoam a retribuição, Teorias Relativas que apregoam a prevenção e as Teorias mistas ou unitária que tenta unir a finalidade retributiva da pena com a prevenção geral e prevenção especial.

2.2.1 Teorias Absolutas

As Teorias Absolutas apregoam a retribuição, a finalidade da pena é punir o agente da infração penal pelo ato cometido à vítima, sua família e a sociedade. Essa teoria fundamenta a pena unicamente pela existência da conduta criminosa. A pena, como o nome já diz, é a retribuição do mal injusto praticado pelo criminoso, aplicando o mal justo, previsto pelas leis penais.

A pena decorre da necessidade de justiça e ética, baseado na moral kantiana com origem no idealismo alemão, não é aplicada para fomentar outro bem, mesmo que em prol da sociedade, mas aplica-se a pena pelo simples fato de delinquir.

Neste sentido a Lição de Rogerio Grego:

“Na reprovação, conforme preconiza a teoria absoluta, reside o caráter retributivo da pena. A punição se justifica pelo fato de ter o agente cometido uma infração penal. Ao mal do crime, retribui-se com o mal da pena. Emanuel Kant foi o grande expoente da teoria absoluta. Para ele, a pena é imperativo categórico e deve ser aplicada porque a exigem a razão e a justiça. Ao lado de Kant, Hegel foi outro grande defensor da teoria absoluta da pena”.29

Cezar Roberto Bitencourt assim explica a teoria absoluta:

A característica essencial das teorias absolutas consiste em conceber a pena como um mal, um castigo, como retribuição ao mal causado através do delito, de modo que sua imposição estaria justificada, não como meio para o alcance de fins futuros, mas pelo valor axiológico intrínseco de punir o fato passado: quia peccatum. Por isso também são conhecidas como teorias retributivas.30

Não se encontra na teoria absolutista da pena justificativas para a finalidade preventiva, para os partidários dessa teoria isso significa afronta à dignidade do criminoso, que serviria de instrumento para obtenção de fins sociais. A ideia de retribuição consiste na aplicação da pena proporcionalmente ao injusto culpável.

Assim para teorias absolutas a pena tem a finalidade única de retribuir o mal cometido.

Para os partidários das teorias absolutas da pena, qualquer tentativa de justifica-la por seus fins preventivos (razões utilitárias) implica afronta à dignidade humana do delinquente, já que este seria utilizado como instrumento para a consecução de fins sociais. Isso significa que a pena se justifica em termos jurídicos exclusivamente pela retribuição, sendo livre de toda consideração relativa a seus fins (pena sbsoluta ab effectu). A ideia de retribuição em seu sentido clássico, como aliás é mais conhecida, além de indemonstrável, tem base ética e metafísica despida de racionalidade.31

A teoria absoluta reza que a justiça reside em uma retribuição – ou uma vingança – pela conduta praticada, uma punição jurídica, coloca o condenado em uma situação de submeter-se a punição na extensão e rigorosidade do mal por ele causado.

2.2.2 Teorias Relativas

Apregoam a prevenção, a finalidade da pena é intimidar o infrator a fim de impedi-lo de voltar a delinquir, evitando que outros delitos venham a ser cometidos por outros indivíduos da sociedade. Fundamenta-se na ocorrência de delitos futuros (punitur ut ne peccetur) – Pena utilitária. Diferente das teorias absolutas não se fundamenta na necessidade de justiça mas na necessidade de prevenir crimes futuros, ou seja tem função social com fins preventivos, gerais ou especiais.

Na prevenção geral, também chamada de prevenção por intimidação, a pena aplicada ao infrator tende a refletir na sociedade, fazendo com que estas não venham a cometer os mesmos erros. A pena é imposta como forma de intimidar a sociedade em geral e olha para o futuro, fazendo que a sociedade reflita em razão do medo de sofrer a aplicação de pena.

A doutrina moderna defende a teoria da prevenção geral positiva ou integradora, que justifica a pena como forma de produzir efeitos positivos, entre eles o de aprendizagem, que ensina ao indivíduo as regras sócias que são reprovados pelo direito penal; o efeito de confiança do indivíduo quando o Direito se impões; e o efeito de pacificação social, que ocorre quando há a intervenção do Estado para resolução pacífica.

De acordo com Regis Prado:

Em síntese, uma pena justificada pela denominada prevenção geral positiva nada mais é do que a pena retributiva, pois que a aplicação de uma pena à infração delitiva perpetrada conduz à realização de seus efeito preventivo estabilizador, de maneira que a mudança de etiquetas não afeta em absoluto o conteúdo da pena, que é reafirmação do ordenamento jurídico, ou seja, retribuição justa.32

Por outro lado, existe o modo de prevenção especial que age sobre o criminoso, para evitar que ele volte a delinquir.

Conforme Rogerio Grego:

Pela prevenção especial negativa, existe uma neutralização daquele que praticou a infração penal, neutralização que ocorre com sua segregação no cárcere. A retirada momentânea do agente do convívio social o impede de praticar novas infrações penais, pelo menos na sociedade da qual foi retirado. Quando falamos em neutralização do agente, deve ser frisado que isso somente ocorre quando a ele for aplicada pena privativa de liberdade. Pela prevenção especial positiva, a missão da pena consiste unicamente em fazer com que o autor desista de cometer futuros delitos. Denota-se, aqui, o caráter ressocializador da pena, fazendo com que o agente medite sobre o crime, sopesando suas consequências, inibindo-o ao cometimento de outros.33

Na prevenção especial a imposição de pena ao autor da conduta criminosa tem como finalidade primordial a inibição de outras condutas criminosas por ele. O caráter ressocializador da pena induz o criminoso à repensar sobre sua conduta e lembrando de suas consequências.

Magalhães Noronha leciona:

As teorias relativas procuram um fim utilitário para a punição. O delito não é causa da pena, mas ocasião para que seja aplicada. Não repousa na idéia de justiça, mas de necessidade social {punitur ne peccetur). Deve ela dirigir-se não só ao que delinqüiu, mas advertir aos delinqüentes em potência que não cometam crime. Conseqüentemente, possui um fim que é a prevenção geral e a particular.34

Além disso, a reeducação do preso se faz necessária para a realização do caráter ressocializador do preso. Através dos efeitos positivos da teoria relativa, em especial o efeito de aprendizagem, o criminoso preso poderá retornar ao convívio pacífico na sociedade, evitando a reincidência criminal.

2.2.3 Teorias Mistas ou Unitárias

Também conhecidas como ecléticas, intermediárias ou conciliatórias, são adotadas pelo Brasil. O Código Penal brasileiro em vigência, traz no caput do artigo 59 o acolhimento dessa teoria no ordenamento jurídico pátrio, prevendo expressamente que a punição seja retributiva e preventiva.

Para as Teorias Unitárias a pena tem a finalidade de punir e de prevenir, ou seja, buscou-se unir a necessidade jurídica de punir com as finalidades de prevenção geral e especial.

Assim explica Luis Regis Prado:

A pena encontra sua justificação no delito praticado e na necessidade de evitar a realização de novos delitos. Para tanto, é indispensável que seja justa, proporcional à gravidade do injusto e à culpabilidade de seu autor, além de necessária à manutenção da ordem social. Não se pode admitir a imposição de um único paradigma para a matéria; muito ao contrário, exige-se uma espécie de solução de compromisso teórico.35

É evidente a conexão da finalidade retributiva da pena com a finalidade de prevenção. E levando em consideração que a retribuição também é uma forma de prevenção, conforme as palavras de Prado: “A aplicação da pena importa reafirmação do ordenamento jurídico e, nesse sentido, é, de certo modo, retribuição.”

É preciso ressalvar que a finalidade da pena não se fundamenta somente no fim de retribuição. A exigência de aplicação de penal proporcional ao delito cometido é necessária para o equilíbrio da justiça e para prevenção do aumento da reincidência criminal (prevenção especial) e prevenir o aumento de indivíduos criminosos (prevenção geral):

De acordo com esse direcionamento, assevera-se que a pena justa é provavelmente aquela que assegura melhores condições de prevenção geral e especial, enquanto potencialmente compreendida e aceita pelos cidadãos e pelo autor do delito, que só entra nela (pena justa) a possibilidade de sua expiação e de reconciliação com a sociedade. Dessa forma, a retribuição jurídica trona-se um instrumento de prevenção.36

Assim, o que se pode compreender é que a finalidade retributiva da pena tem em seu objetivo principal não somente afligir o indivíduo punindo na severidade dos atos cometidos, mas, deve prever que com a exemplar punição outros crimes venham a ocorrer.

3 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

3.1 A PREVISÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO BRASIL

Tendo por base o estudo feito acerca da evolução da pena pode-se então compreender que a pena privativa de liberdade não funcionava como um destino final da forma de punir, passando a ter esse caráter mais recentemente, ou seja, a prisão como finalista do cumprimento de pena é uma visão, um conceito mais contemporâneo.

A pena de prisão é por si só definida, ou seja, literalmente um instrumento coercitivo e castrador da liberdade um indivíduo. Essa modalidade punitiva consiste na restrição do direito de ir e vir que o indivíduo possui em decorrência de prática delituosa, seja em medida acautelatória ou por força de condenação.

Guilherme Nucci sobre a pena de prisão leciona:

É a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere. Não se distingue, nesse conceito, a prisão provisória, enquanto se aguarda o deslinde da instrução criminal, daquela que resulta de cumprimento de pena. Enquanto o Código Penal regula a prisão proveniente de condenação, estabelecendo as suas espécies, formas de cumprimento e regimes de abrigo do condenado, o Código de Processo Penal cuida da prisão cautelar e provisória, destinada unicamente a vigorar, quando necessário, até o trânsito em julgado da decisão condenatória.37

A pena privativa de liberdade poderá ser aplicada nas fases pré-processuais, processuais ou como execução de condenação. Entretanto, a prisão é vista pelo ideal de que seja a última medida a ser imposta, devendo ser imposta quando outra forma de punição não for possível, quando realmente se fizer necessária sua imposição.

Encontra-se tutelada na Constituição Federal em seu artigo 5º, LXI que prevê: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”.38

Consoante a previsão constitucional, o Código Penal elenca os seguintes tipos de penas restritivas de liberdade – a reclusão e a detenção e prisão simples, esta última regulada pela Lei de Contravenção Penal – conforme se vê:

Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º - Considera-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 4º O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. (Incluído pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)39

O texto do artigo 283 do Código de Processo Penal em conformidade ao disposto pela Constituição tutela os momentos em que a pena privativa de liberdade poderá ocorrer: [...] “em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso de investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.40

3.2 OS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS

Segundo regulamento das normas aplicáveis ao tema, os estabelecimentos prisionais são organizados conforme o regime de pena a ser cumprido. Conforme definido pela Lei de Execução Penal, o Ministério da Justiça aponta a organização do sistema prisional da seguinte forma:

Conceituação e classificação de Estabelecimentos Penais

a) Estabelecimentos Penais: todos aqueles utilizados pela Justiça com a finalidade de alojar pessoas presas, quer provisórios quer condenados, ou ainda aqueles que estejam submetidos à medida de segurança;

b) Estabelecimentos para Idosos: estabelecimentos penais próprios, ou seções ou módulos autônomos, incorporados ou anexos a estabelecimentos para adultos, destinados a abrigar pessoas presas que tenham no mínimo 60 anos de idade ao ingressarem ou os que completem essa idade durante o tempo de privação de liberdade;

c) Cadeias Públicas: estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas em caráter provisório, sempre de segurança máxima;

d) Penitenciárias: estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas com condenação à pena privativa de liberdade em regime fechado;

d.1) Penitenciárias de Segurança Máxima Especial: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas com condenação em regime fechado, dotados exclusivamente de celas individuais;

d.2) Penitenciárias de Segurança Média ou Máxima: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas com condenação em regime fechado, dotados de celas individuais e coletivas;

e) Colônias Agrícolas, Industriais ou Similares: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena em regime semi-aberto;

f) Casas do Albergado: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto, ou pena de limitação de fins de semana;

g) Centros de Observação Criminológica: estabelecimentos penais de regime fechado e de segurança máxima onde devem ser realizados os exames gerais e criminológico, cujos resultados serão encaminhados às Comissões Técnicas de Classificação, as quais indicarão o tipo de estabelecimento e o tratamento adequado para cada pessoa presa;

h) Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico: estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas submetidas a medida de segurança41.

Analisando a disposição acima transcrita, pode-se compreender como deveria ser o direcionamento de presos para cada unidade conforme finalidade do local e situação do preso, ou seja, como deveria ser a divisão dos habitantes do sistema carcerário conforme previsão de lei.

3.3 O PROBLEMA DO CÁRCERE NO BRASIL


 

Conforme exposto no tópico anterior a Lei de Execução Penal estabelece e organiza os estabelecimentos prisionais conforme as características de seus habitantes, na teoria deveriam existir locais destinados a cumprimento de pena definitiva, a prisão provisória, a abrigar presos em progressão de regime, a cumprimento de medidas de segurança, entre outros, contudo, não é o que ocorre na realidade.

A crise no sistema prisional brasileiro inicia-se justamente pelo descumprimento dessa “divisão” legal dos estabelecimentos verificando-se a superlotação existente nesses locais, é evidente o descumprimento de lei no que diz respeito a instalação dos presos no país e sobre isso comenta Rafael Damasceno:

A lei deixa bem claro que é pressuposto da ressocialização do condenado a sua individualização, a fim de que possa ser dado a ele o tratamento penal adequado. Já encontramos aqui então o primeiro grande obstáculo do processo ressocializador do preso, pois devido à superlotação de nossas unidades prisionais torna-se praticamente impossível ministrar um tratamento individual a cada preso.42

Em desacordo aos ditames legais, os números do cárcere no Brasil sobrem a cada dia, fazendo o país “subir” no hanking sobre a população carcerária, se até 2014 o Brasil ocupava a 4ª posição em número de habitantes, no ano passado, em recente levantamento alcançou a 3ª posição.43

Resta ainda mais evidente a situação caótica que se instalou no sistema prisional brasileiro ao analisar o artigo 85 da Lei de Execução Penal que traz de forma expressa a previsão acerca da quantidade de presos que um estabelecimento deve suportar, devendo ser essa quantidade compatível com a estrutura e finalidade de cada local:

Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.

Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades. 44

As “peculiaridades” apontadas no parágrafo único acima transcrito referem-se justamente a divisão dos estabelecimentos prisionais. Conforme estabelece a lei os estabelecimentos penais deveriam atender somente dentro de suas capacidades, cada um conforme sua natureza e finalidade, assim explica Guilherme de Souza Nucci:

Controle populacional do presídio: não há dúvida de ser ideal haver estabelecimentos penais com lotação compatível com o número de vagas oferecidas. Somente desse modo se pode falar em cumprimente) satisfatório dá pena, com um processo de reeducação minimamente eficiente. O contrário, infelizmente, constitui o cenário da maioria dos estabelecimentos nacionais. Muitos dos referidos estabelecimentos penais, até mesmo os recém-construídos, atingem a superlotação assim que são inaugurados. E pode-se observar que inúmeros presídios já são erguidos em desacordo com os preceitos desta Lei, que prevê isolamento noturno do preso, quando, na realidade, as celas são moldadas para receber vários condenados. Hã, até mesmo, decisão do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária autorizando a construção em molde incompatível com o previsto nesta Lei (consultar a nota 169 ap art. 64, VI, desta Lei). A principal fiscalização é de responsabilidade do juiz da execução penal, que deverá, inclusive, sendo o caso, providenciar a interdição do estabelecimento que ultrapasse a sua capacidade, tomando insalubre a vida dos condenados (art. 66, VI, VII e VIII, LEP).45

As condições encontradas no cárcere brasileiro são totalmente desumanas e violadoras de direitos, há quem pense que a prisão é uma pena branda para um indivíduo que comete determinados crimes, pensando que sua finalidade é apenas uma forma de vingança contra a conduta delituosa praticada, quando na verdade além de punir a finalidade deveria ser a de reabilitar o indivíduo para eventual regresso a sociedade.

Rogério Greco assevera:

O sistema prisional agoniza enquanto a sociedade, de forma geral, não se importa com isso, pois crê que aqueles que ali se encontram recolhidos merecem esse sofrimento. Esquecem-se, contudo, que aquelas pessoas, que estão sendo tratadas como seres irracionais, sairão um dia da prisão e voltarão ao convívio em sociedade. Assim, cabe a nós decidir se voltarão melhores ou piores. 46

Sobre as condições da prisão no Brasil Ana Oliveira faz a análise de dados colhidos em 2014:

Deficiente, insalubre e superlotado, o sistema carcerário brasileiro tem 237.313 presos a mais que a sua capacidade. Segundo levantamento realizado pelo Instituto Avante, em 2012 eram 548.003 pessoas vivendo em espaços onde cabem 310.687, o equivalente a 1,76 detento por vaga.47

Não há obediência no quesito lotação de um estabelecimento prisional e, de igual forma não uma observância do mandamento legal a respeito das características que devem ser equivalentes entre presos e locais de cumprimento de pena, tal situação se evidencia constatando que 40% da população prisional é de presos temporários, de indivíduos que após recolhidos sequer foram levados a presença da autoridade competente para a averiguação da necessidade de continuarem presos, essas pessoas misturam-se àquelas que estão em fase de cumprimento de pena. 48

A coleta de dados mais recente feita pelo Departamento Penitenciário Nacional – Depen, constou haver no Brasil atualmente o número de 2 presos para cada vaga do sistema prisional, o número de vagas é de 368.049 mil, onde habitam hoje 726.712 mil presos.49

Rogério Greco aponta que "a crise carcerária é o resultado, principalmente, da inobservância pelo Estado, de algumas exigências indispensáveis ao cumprimento da pena privativa de liberdade” 50

A respeito da situação carcerária no Brasil Fiona Macaulay comenta:

Prisões mal administradas são incapazes de proporcionar a obtenção dos objetivos estabelecidos nas leis brasileiras, o primeiro dos quais é proteger o público pela neutralização dos ofensores através do encarceramento. A última década presenciou motins e fugas quase semanais nas prisões e carceragens policiais, especialmente nos estados com maior concentração de detentos. As ondas de violência orquestradas em maio, julho e agosto de 2006 pela organização criminosa Primeiro Comando da Capital – PCC, ilustram graficamente o modo pelo qual o sistema prisional incuba e exporta o crime e a violência, ao invés de contê-los. Os líderes do PCC, a maioria dos quais está cumprindo pena em prisões de alta segurança, usaram seu controle das prisões e o acesso a telefones celulares, introduzidos por guardas corruptos ou por familiares, para iniciar uma série coordenada de motins e tomada de reféns em 82 prisões no estado e em estados vizinhos e para ataques à justiça criminal e alvos econômicos na cidade (Caros Amigos, 2006). O segundo objetivo é punir os ofensores através da privação de liberdade. Contudo, a punição realizada nas prisões excede largamente a contemplada na Lei de Execução Penal – LEP). Negação de atendimento médico, comida intragável, sujeira, superlotação e brutalizações periódicas por guardas prisionais, através de espancamentos e mesmo tortura, constituem formas ilegais de punição coletiva e individual. Ironicamente, tal tratamento cruel, desumano e degradante, não contribui para a função de segurança do encarceramento, pois alimenta descontentamentos que resultam em apoio a organizações como o PCC e em violência dirigida contra a administração prisional e contra os demais detentos. Além disso, prejudica a obtenção do terceiro objetivo definido para o sistema prisional, que é a reintegração dos ofensores à sociedade. Num ambiente que funciona como uma “escola para o crime” e falha em proporcionar aos ofensores educação, treinamento, trabalho, tratamento para o vício em drogas e apoio às famílias, a experiência da prisão para a maioria dos detentos serve para aumentar, e não para diminuir, a probabilidade de reincidência no crime.51

A narrativa transcrita serve para confirma o que foi mencionado anteriormente, tais palavras servem para comprovar que o intuito da sociedade quando se pensa na punição de um indivíduo que delinquiu, através da pena privativa de liberdade, é mais por vingança do que por justiça, há sempre uma preocupação com o período em que uma pessoa ficará presa em cumprimento de pena, mas não há a mesma preocupação com o que ele possa fazer ou quais reflexos ele trará a sociedade quando regressar do estabelecimento prisional.

4 A INEFICIÊNCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO DO PRESO


 

4.1 OS NÚMEROS DA REINCIDÊNCIA E A INEFICIÊNCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO

Analisando o termo propriamente dito, reincidência é claro em seu significado: “reincidir”, “repetir um ato, uma conduta”, “teimosia”, “recaída”52, ou seja, a reincidência designa na prática a continuidade, a repetição de algo; no contexto aqui proposto, é reincidir na prática delituosa, é tornar a vida de condutas criminosas.

O sistema prisional brasileiro encontra-se em crise, conforme já exposto anteriormente, constata-se estabelecimentos penitenciários sem as menores condições de abrigo, superlotados, ou seja, locais que mais parecem com depósitos de pessoas do que com locais para cumprimento de pena. Essa crise, pode, em muito, ser credita as altas taxas de reincidência que ocorrem no país.

Faz-se necessário explicar que existência alguns tipos de reincidência, a saber:

Reincidência genérica: considera a pessoa que comete mais de um ato criminal, independentemente se há ou não condenação ou mesmo autuação. Ou seja, é o caso de muitos presos provisórios, que passam pelo sistema prisional mas no fim acabam sendo inocentados.

Reincidência legal: é o tipo de reincidência que aparece na Lei de Execução Penal (LEP), que considera a condenação judicial por um crime no período de até cinco anos após a extinção da pena anterior.

Reincidência penitenciária: ocorre quando um egresso retorna ao sistema penitenciário após uma pena ou por medida de segurança. Ou seja, é quando uma pessoa retorna ao sistema penitenciário após já ter cumprido pena em um estabelecimento penal.

Reincidência criminal: é quando uma pessoa possui mais de uma condenação, independentemente do prazo legal estabelecido pela legislação brasileira53

Pode-se assim compreender que não há uma única referência ou definição específica para o termo reincidência no âmbito penal, faz-se necessário compreender tais formas de ocorrência para que se possa entender qual nomenclatura foi utilizada para avalição e pesquisas sobre o tema, por exemplo.

Pertinente ao caso aqui estudado tem-se como base a reincidência penitenciária, onde um indivíduo egresso do sistema prisional torna a delinquir e volta ao estabelecimento prisional.

Entretanto pesquisas relacionadas a reincidência no Brasil trazem como definição a reincidência legal, a que está prevista no Código Penal em seu artigo 63: “Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”54, onde uma pessoa após ter uma condenação já transitada em julgado comete outro crime:

O que se pode verificar é que existem vários conceitos que distinguem o termo reincidência e sua aplicação e, isto tem tornado difícil existir uma conclusão específica sobre os verdadeiros índices, entretanto, o que se sabe é que é alto o volume de pessoas que saem do sistema prisional e para lá retornam por terem voltado para a prática de condutas delituosas.

Tentando traçar um panorama acerca dos índices da reincidência, o IPEA fez uma pesquisa a respeito da situação com os seguintes parâmetros da reincidência:

Esta pesquisa ocupa-se da reincidência em sua concepção estritamente legal, aplicável apenas aos casos em que há condenações de um indivíduo em diferentes ações penais, ocasionadas por fatos diversos, desde que a diferença entre o cumprimento de uma pena e a determinação de uma nova sentença seja inferior a cinco anos – Código Penal (CP), artigos 63 e 64. A reincidência legal atém-se ao parâmetro de que ninguém pode ser considerado culpado de nenhum delito, a não ser que tenha sido processado criminalmente e, após o julgamento, seja sentenciada a culpa, devidamente comprovada.55

Com base nesse levantamento chegou-se a conclusão de que um em cada quatro indivíduos já condenados anteriormente reincide. Tal pesquisa apresentou ainda que dados do Departamento Penitenciário Nacional, levando em consideração o índice de reincidência penitenciária, constatou que no Brasil, em geral, 70% dos presos já tiveram passagem pelo Sistema prisional anteriormente.56

Sobre a ineficácia da ressocialização com a situação encontrada no sistema prisional brasileiro Lourival Trindade comenta:

A pena de encarceramento, em absoluto, não representa para o delinquente qualquer oportunidade de reintegração, na sociedade, tratando-se, apenas, de um sofrimento inútil, que lhe é infligido, como castigo, pelo delito cometido. De outro ângulo, assevere-se que as concepções da Criminologia crítica, mediante seu novo paradigma, têm demonstrado a deslegitimação das funções reeducativas da pena de prisão, pomposamente, declaradas pelo neodefensismo social.57


 

Não se pode pensar em reabilitar o apenado através de um conjunto carcerário que sequer pode respeitar os direitos a este garantido, como acima mencionado – é mais certo que promova um maior distanciamento da ressocialização:

O sistema prisional brasileiro reflete a realidade social injusta do Brasil, e não se trata de ceder ao raciocínio fácil e mediano de que a pobreza e a carência facilitam, estimulam e propiciam ao crime, ou ainda, que levem os mais necessitados a violência e ao encarceramento. Trata-se somente de constatar que o sistema prisional é uma realidade mais viva e próxima da parte da população carente do Brasil, desde os tempos do Império, e que esse simples fato de constatação, por si só, alarma e constrange pela sua dimensão e potencial.58

O alcance impossível da ressocialização pelo sistema prisional atual encontra a seguinte narrativa na obra de Augusto Thompson:

Mesmo os mais otimistas partidários do tratamento penitenciário reconhecem que, até a presente data, a cadeia não logrou atingir o objetivo de transformar criminosos em não-criminosos.59

Infelizmente não há no sistema prisional brasileiro condições que possam propiciar reabilitação e ressocialização na prática tradicional, não há qualquer possibilidade de um detento aprender um ofício que o torne útil a sociedade dentro da “cadeia”.

A prisão brasileira tem resultado em pessoas totalmente socializadas com a criminalidade e totalmente antissociais a preservação e respeito às normas legal e moralmente impostas. Pessoas que dantes não representavam alta periculosidade, mas que, ao sair tornaram-se verdadeiras máquinas criminosas.

A realidade das prisões brasileiras pode infelizmente ser descrita nos seguintes moldes:

Homicídios, abusos sexuais, espancamentos e extorsões são uma prática comum por parte dos presos que já estão mais “criminalizados” dentro do ambiente da prisão, os quais, em razão disso, exercem um domínio sobre os demais, que acabam subordinados a essa hierarquia paralela.60

A situação é tal que dentro dos estabelecimentos prisionais uma espécie de "lei interna" entre os presidiários impõe respeito, já que a lei em si é totalmente desrespeitada.

4.2 DA RESSOCIALIZAÇÃO E REINTEGRAÇÃO SOCIAL

A possibilidade de ressocialização e reintegração social do preso encontra validade quando se avista projetos desenvolvidos como alternativas à pena de prisão, ao simples encarceramento, como é o caso das APAC’s – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados.

Esses estabelecimentos tiveram sua origem idealizada e materializada pelo advogado Mário Ottoboni em conjunto com amigos, os quais visando uma contribuição na possibilidade de ressocialização do preso, colocaram em prática esse método que prioriza a figura digna do ser humano, mostrando que políticas e métodos voltados a reabilitação prisional podem funcionar, inclusive para humanizar a situação carcerária no país. Existem atualmente no Brasil aproximadamente 100 unidades das Associações, estando a maioria localizada no estado de Minas Gerais.61

A metodologia de trabalho das APACs tem alcançado resultado positivos no que diz respeito a ressocialização de presos e consequentemente diminuição dos índices de reincidência no âmbito em que atuam. São modelos que vem sendo exportado para diversos países, e, foi reconhecido pela organização Prison Fellowship Internacional – divisão da ONU (Organização das Nações Unidas) em tais tratativas.62

Victor Vieira faz a seguinte narrativa acerca das Associações:

Uma cadeia em que os presos têm as chaves das próprias celas. A ideia, a princípio inusitada, existe no Brasil há quatro décadas. O modelo de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apacs) é uma possibilidade para a execução penal fora de presídios tradicionais. O maior benefício, segundo defensores da proposta, é recuperar os detentos com tratamento mais humano. Há no país quase 150 Apacs em 17 estados.63

Apesar de reconhecido internacionalmente, infelizmente em solo brasileiro as APACs ainda enfrentam uma baixa popularidade, é pouco promovida, mesmo com seus índices positivos e custos menores em relação ao sistema prisional tradicional, ainda carece de uma maior atenção e investimento, da parceria do Poder Público com a sociedade.

Conforme bem cita Samuel Miranda Colares, Promotor de Justiça:

Por outro lado, aos poucos tem sido difundido no Brasil um método de execução penal que, margeando as prisões comuns, faz sobreviver uma esperança de que a pena criminal atinja seu objetivo de ressocialização: o método APAC, sigla que designa a entidade de direito privado Associação de Proteção e Assistência aos Condenados. Trata-se de um conjunto de princípios e práticas desenvolvidas pela referida associação a partir do axioma de que “ninguém é irrecuperável”. Desta premissa, desenvolve-se atuação junto a presídios nos quais são conferidos aos apenados diversas oportunidades de reinserção social, seja através do aprendizado profissional ou do estudo, além do estabelecimento de rígida disciplina pessoal. O método exige, ainda, forte presença da família do condenado e incentivo à espiritualidade como mecanismos da ressocialização.64

O Conselho Nacional de Justiça de igual forma reconhece o impacto que o método apaqueano tem no tocante a ressocialização dos presos, apontando que os números da reincidência nesse meio diminuem consideravelmente:

Entre os mais de 550 mil detentos do Brasil, aproximadamente 2,5 mil recebem tratamento diferenciado, que tem produzido resultados animadores em termos de reinserção social. Eles cumprem pena nas 40 unidades onde é aplicado o Método Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), responsável por índices de reincidência criminal que variam de 8% e 15%, bem inferiores aos mais de 70% estimados junto aos demais detentos. A expansão dessa metodologia tem sido recomendada durante os mutirões carcerários que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realiza em todo o País.65

Consoante aos apontamentos do Conselho Nacional de Justiça, a Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC) traz dados que comprovam a eficiência do trabalho desenvolvido pelas APACs, a média de diminuição das taxas de reincidência no caso das associações é de 70%, podendo chegar a 98% conforme a localidade averiguada.66

Reportagens sobre esse trabalho que já existe no país a pelo menos 40 anos dão que de não é uma utopia pensar em modificar a situação do sistema prisional investindo mais em medidas de ressocialização, novamente reafirmando os bons resultados alcançados pelas Associações:

As Apacs, administradas por associação de voluntários, muitos deles cristãos, podem soar uma utopia no país que iniciou o ano com matanças nos presídios do Norte e Nordeste, mas são consideradas pela ONU (Organização das Nações Unidas) como o único modelo prisional que deu certo no Brasil, o quarto país com maior população carcerária do mundo. São 50 associações pelo país com resultados semelhantes: custam R$ 800 por preso (contam com voluntários e funcionários), três vezes menos que a média nacional de 2.400 reais, e o índice de recuperação é de 95% contra 25% das cadeias padrões.67

Assim, em pesquisas sobre a forma de funcionamento e metodologia acerca das Associações pode-se compreender que existem formas plausíveis, reais e concretas de mudar a situação do sistema prisional brasileiro, de diminuir os índices da reincidência de forma certa, o que falta é mais investimento, mais vontade tanto da sociedade quanto do Estado em mudar esse cenário. Cadeias sem polícia, onde presos tem as chaves das próprias celas, é sim uma utopia real no Brasil.

Sobre a autora
Jennifer Leopoldo

Especialista em Direito Penal. Especializando em Direito Público pela ESMESC - Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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