Responsabilidade civil na área da saúde.

A incidência da responsabilidade civil sobre a reprodução assistida dentro do direito brasileiro

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Resumo:

Resumo sobre Responsabilidade Civil em Clínicas de Reprodução Assistida


  • A responsabilidade civil em clínicas de reprodução assistida no Brasil é regida pelo Código Civil e pelo Código de Defesa do Consumidor, além de ser influenciada pela resolução 1.358/1992 do Conselho Federal de Medicina, que estabelece deveres para médicos e clínicas.

  • As clínicas podem ser responsabilizadas civilmente por danos materiais e morais decorrentes de procedimentos de reprodução assistida, baseando-se na relação de consumo entre clínica e paciente, onde a clínica deve fornecer um serviço seguro e eficaz.

  • A responsabilidade das clínicas é objetiva, baseada no risco da atividade, enquanto a responsabilidade dos médicos é subjetiva, baseada na culpa, exigindo a comprovação de negligência, imprudência ou imperícia para a configuração do dever de indenizar.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Como proceder caso o procedimento de inseminação artificial não progrida de acordo com as expectativas fundadas na esperança de vida futura? Saberemos de quem é a responsabilidade — e se existe e em que casos — e como quantificar o dano.

INTRODUÇÃO

Pode-se conceituar responsabilidade civil como a obrigação de reparar um dano material ou moral causado a outrem, em decorrência do descumprimento de um dever jurídico, cometido de forma direta ou indireta pelo autor do dano. Isto quer dizer que a responsabilização pode não depender do prejuízo ter sido causado por fato de terceiros ou de coisas que sejam de dependência do responsável (GAGLIANO, 2014).

A responsabilização civil de clínicas de reprodução assistida não possui regras específicas trazidas em uma lei que trate deste tema particular. Assim, no Brasil, este assunto é tratado pelo Código Civil e pelo Código de Defesa do Consumidor. São nestes diplomas legais que se encontram a base para que se possa imputar o dever de indenizar à clínica de reprodução assistida (GAGLIANO, 2014).

Ainda, além das leis citadas, a reprodução assistida é objeto da resolução 1.358/1992 do Conselho Federal de Medicina. Esta resolução traz alguns deveres impostos aos médicos e às clínicas de reprodução assistida, os quais, se descumpridos, podem gerar responsabilização civil (BRASIL, 1992).

O presente artigo tem como objetivo discutir como dar-se-á a responsabilização civil da reprodução assistida tendo em vista que este é um assunto pouco explorado e, até mesmo, com poucos casos concretos a serem analisados. Portanto, tratando-se do âmbito do Biodireito, procura-se observar o cabimento dos danos morais e materiais dentro dessa expectativa de vida que se encontra nas técnicas de reprodução assistida.


1. A responsabilidade civil médica na reprodução assistida

Cabe neste tópico apresentar o cabimento da responsabilidade civil médica na reprodução assistida tendo em vista que muito há a se discutir sobre a possibilidade ou não da responsabilidade civil dentro desse âmbito da saúde. Portanto, analisar-se-á as técnicas de reprodução assistida no Brasil e os dispositivos legais que possam fazer com que a responsabilização médica seja cobrada pelos pacientes como consumidores dos procedimentos realizados.

Entre as técnicas de reprodução assistida mais comuns no Brasil existe a inseminação artificial (IUI, do inglês Intra-Uterine Insemination) que possui baixo custo e é um método simples, foi a primeira técnica de reprodução humana. Dentre outras técnicas existe a transferência tubária de gametas, técnica que é amplamente adepta aos mais religiosos, pois se trata de uma fecundação mais natural e afastada da concepção em laboratórios; a fertilização in vitro que é o procedimento mais adotado na reprodução humana assistida, pois abarca casos de infertilidade tanto masculina quanto feminina e a gestação de substituição na qual é, famosamente, conhecida como “barriga de aluguel” (REIS, 2017). Disposto nos princípios gerais sobre as técnicas de reprodução assistida, tem-se que elas “[...] têm o papel de auxiliar na resolução dos problemas de infertilidade humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenham sido ineficazes ou ineficientes para a solução da situação atual de infertilidade” (BRASIL, 1992). Portanto, tem-se a criação da expectativa de vida mediante intervenção médica e científica.

A partir dessa explanação sobre qual o papel da reprodução assistida e quais são as suas técnicas, torna-se essencial adentrar na noção jurídica da responsabilidade civil a qual consiste em atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente, subordinando-se, assim, às consequências do seu ato. Portanto, a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse iminentemente particular, dessa forma, sujeitando o infrator ao pagamento de uma compensação pecuniária à vítima, caso não possa repor, da mesma natureza, o estado anterior das coisas. Quanto à responsabilidade civil é importante consultar a conduta, o dano e o nexo de causalidade (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, p. 36, 2014). O art. 5º, V, da Constituição Federal também expressa importante texto no qual informa que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, dessa forma, nota-se que a responsabilidade civil, além do Código Civil, está fixada nas garantias fundamentais dos indivíduos.

Tendo em vista a apresentação sobre a reprodução assistida e da responsabilidade civil, passa-se a coadunar os assuntos apresentados de maneira que se perceba como aplicar a responsabilidade civil dentro do âmbito da saúde, especificamente, na reprodução assistida. É possível ter essa verificação inicial a partir dos artigos 186, CC, o qual diz que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”; 187, CC, que menciona que “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” e o 927, CC, que prevê que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186. e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Ao todo, esses artigos passam a significar o ato ilícito, dano, obrigação e reparação os quais são as palavras-chave para a responsabilidade civil.

Já no Código de Ética Médica, no capítulo III que fala sobre a responsabilidade profissional, ao disposto do art. 1º, parágrafo único, “a responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida” ao causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência. Também é vedado ao médico, segundo os arts. 3º e 4º, deixar de assumir responsabilidade sobre procedimento médico ou qualquer ato que indicou ou praticou ou participou (BRASIL, 2009). No art. 1.545, CC, dispõe a obrigação que os médicos têm de satisfazer o dano, sempre que dá imprudência, negligência, ou imperícia, em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir ou ferimento. Nesse sentido, reafirma- se a responsabilidade civil sobre os profissionais liberais nas relações de consumo inferindo o caráter intencional na situação em questão (GLAGLIANO; PAMPLONA FILHO, p. 183, 2014).

Por falta de regras específicas, a responsabilidade civil no Brasil é alvo do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor e da Resolução 1.358/1992 do Conselho Federal de Medicina, a qual também engloba o Código de Ética Médico de 2009, que responsabiliza as clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de reprodução assistida como responsáveis pelo controle de doenças infectocontagiosas, coleta, manuseio, conservação, distribuição e transferência de material biológico humano para a usuária das referidas técnicas. Assim, é considerada de inteira responsabilidade das clínicas e demais instituições tanto o procedimento médico, quanto a sua organização interna da empresa e aos cuidados no devido armazenamento do material a ser utilizado na reprodução assistida (PERES, 2016).

Para tanto, Reis (2017) conecta o art. 3º, CDC, que dispõe como fornecedor toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira que desenvolvem atividade de prestação de serviços, com o art. 1º, do CFM da resolução nº 1.627/2001, que define “o ato profissional de médico como todo procedimento técnico-profissional praticado por médico legalmente habilitado e dirigido” de forma que promova “a saúde e prevenção da ocorrência de enfermidades ou profilaxia”; “a prevenção da evolução das enfermidades ou execução de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos” e “a prevenção da invalidez ou reabilitação dos enfermos” (BRASIL, 2001). Portanto, o médico é uma pessoa física que presta serviço à saúde pública, de modo profissional, mediante pagamento, enquanto que o paciente está na figura do consumidor nessa relação visto que os serviços adquiridos por ele promovem a sua saúde mediante procedimentos realizados pelo médico (REIS, 2017).


2. Danos morais e materiais na reprodução assistida

Como visto no tópico anterior, é possível utilizar diversos dispositivos legais no ordenamento jurídico brasileiro para estabelecer a responsabilidade civil no âmbito da reprodução assistida. A partir deste tópico, tomar-se-á pretensão sobre os danos morais e materiais no âmbito da saúde, precisamente, na reprodução assistida.

Os danos na área da reprodução assistida estão regulados no art. 951, CC, que manda aplicar os arts. 948, 949 e 950 do Código Civil àquele que no exercício de sua atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causa morte do paciente ou agrava-lhe o mal, causa-lhe lesão ou inabilita-o para o trabalho. Em caso de homicídio (art. 948, CC), a indenização consiste no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, a estabelecer a provável duração de vida da vítima. Silva (p. 236, 2009) explica que esse dispositivo legal não exclui outras reparações as quais podem ser aquelas que são destinadas à compensação do dano moral sofrido pelos familiares do falecido, isto tanto no tocante à perda das afeições legítimas, que são a base da instituição da família, quanto ao que se refere ao dano reflexo em que o familiar sofre, pela via reflexa, o dano causado à vida de seu parente próximo, cônjuge ou mesmo o qual é/era companheiro.

Em caso de lesão ou outra ofensa à saúde (art. 949, CC), o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de qualquer outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido. E, se da ofensa, resultar defeito (art. 950, CC) pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe for diminuído a capacidade de trabalho, portanto, caberá a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, ainda, incluindo pensão fixada correspondente às perdas de trabalho que não pode exercer.

Aos artigos citados anteriormente cabe o dano material, quanto ao dano moral, o artigo anterior exige prova, o que não está em adequação com o art. 5º da Lei Maior que dispõe a plena indenizabilidade dessa espécie de dano, também em divergência com o posicionamento doutrinário e jurisprudencial a respeito da presunção da sua existência na qual se funda na realidade fática e emerge da ofensa grave a um direito da personalidade quando se tratando da integridade física. Portanto, concluiu-se que o dano moral na reprodução assistida resulta do fato da violação a um direito da personalidade, prescindindo de prova, na qual, dentre elas, está a impossibilidade de adentrar na esfera mais íntima do ser humano para efetivamente dispor se existe ou não sofrimento (SILVA, p. 237, 2009). Silva (p. 237, 2009) insiste que a imposição legal da prova do dano moral é inconstitucional.

Possui-se, também, a violação à integridade psíquica e à honra, bem como às partes separadas do corpo e ao sigilo, tal qual à informação sobre a origem genética são atos ilícitos e, percebendo tão grande gravidade da violação, geram dano moral podendo, ainda, acarretar em dano material, fundamentados no ordenamento constitucional, vide o art. 5º, X, como, também, no ordenamento civil (SILVA, p. 237, 2009).

Como foi visto no tópico anterior, embora existe a relação entre médico e paciente como uma relação de consumo, em caso de ação que viola o direito e ocorrência de dano, para a responsabilidade civil na reprodução assistida, não cabe a responsabilidade objetiva como determina o art. 14, § 4º, do CDC, portanto, emplacando a responsabilidade subjetiva no médico a qual se fundamenta na culpa e não no risco (SILVA, p. 237, 2009). Como também já mencionado anteriormente, a culpa do médico é sempre pessoal e não pode ser presumida, dessa forma, essa culpa deverá ser provada pela vítima se a obrigação contratual descumprida for de meio, invertendo-se o ônus da prova da inexistência de culpa para o agente se a obrigação for de resultado.

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Exemplificando em caso prático, tem-se o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios na Segunda Turma Cível no qual a relatora Desª. Carvalho, na apelação de nº 2001.01.1.080294-4, decidiu sobre a ação de indenização por danos morais e materiais. O caso versa sobre o tratamento de fertilização in vitro em que houve a implantação de cinco embriões resultando em gravidez de quíntuplos e que nasceram com lesões cerebrais. Outro agravante a esse caso foi a ausência de consentimento válido ao procedimento realizado vide o CFM à época do caso apenas permitir a implantação de quatro embriões por vez. Portanto, comprovou-se que a genitora ficou impossibilitada de exercer atividade laboral em razão da necessidade de cuidar dos filhos portadores de necessidades especiais motivo pelo qual também lhe é devida pensão mensal fixada para as despesas das moléstias graves e incapacitantes ocorridas por causa da gestação de quíntuplos. Já o valor dos danos morais tem fundamento na compensação pelo sofrimento suportado pela pessoa e a punição pelo do causador do dano visando evitar novas condutas lesivas (BRASIL, 2014).

Já no caso do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a 3ª Câmara Direito Civil negou as perdas e danos ao casal que requereu indenização a um centro de reprodução humano alegando que a inseminação artificial é um procedimento que deve obrigatoriamente apresentar resultados satisfatórios tal qual a cirurgia plástica, sustentaram, ainda, que o ônus da prova cabe ao profissional e que este deveria ter esclarecido tudo o que envolvia o procedimento. A câmara rejeitou o pleito, porque, segundo a explicação dos embargadores do caso, a reprodução assistida e a inseminação artificial, em regra, são obrigações de meio e não de resultado (BRASIL, 2013).


3. A atribuição da responsabilidade objetiva às clínicas de reprodução assistida

Diferentemente de como foi apontado no tópico anterior no qual visa a responsabilização subjetiva referente ao médico-profissional quanto ao procedimento de reprodução assistida, neste tópico trabalhar-se-á a responsabilidade objetiva das clínicas de reprodução assistida, pois a elas também cabe responsabilidade civil nesses casos.

Os exames laboratoriais são imprescindíveis para a efetivação das técnicas de reprodução assistida, portanto são solicitados pelos médicos para complementar, confirmar ou contribuir para algum diagnóstico após exame clínico do paciente que estiver disposto ao procedimento em questão. Dessa forma, nas hipóteses em que ocorrem erros laboratoriais acaba, assim, diante da responsabilidade objetiva prevista no art. 14. do Código de Defesa do Consumidor, pois o paciente e o laboratório são, respectivamente, consumidor e fornecedor nos termos dos arts. 2º e 3º do CDC. (SILVA, p. 100, 2009). A responsabilidade ainda será objetiva se a culpa for do médico em razão do art. 932, III, CC que diz que também são responsáveis pela reparação civil o empregador, por seus empregados, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Obviamente, a instituição hospitalar poderá agir com uma ação de regresso contra o médico que realizou o procedimento após arcar com a sua própria responsabilidade civil.

É importante ressaltar que os laboratórios e clínicas também responderão pelas informações dadas de formas inadequadas aos pacientes ou, mesmo, informações equivocadas bem como as precisam de ressalvas de que o resultado depende de confirmação. Aos laboratórios, no âmbito da responsabilidade civil, inclui-se o conceito mais amplo daquela que genericamente é imputada aos hospitais. No entanto, os laboratórios não terão responsabilidade indenizatória pela imprecisão do resultado quando a ciência e seus elementos disponíveis não permitirem a certeza a que se visa (SILVA, p. 101, 2009).

Apesar de não encontrados casos no ordenamento jurídico brasileiro contando erros laboratoriais nos casos da reprodução assistida por se tratar de aplicação de ciência muito nova, viu-se importância em ressaltar a problemática visto que existem casos fora do núcleo brasileiro. Portanto, os laboratórios sendo passíveis de erros, os quais já foram mencionados, passam a responder por responsabilidade civil, neste caso sendo esta objetiva, mediante o CDC e CC.


4. A reprodução assistida como matéria nova a ser discutida no ordenamento jurídico brasileiro.

A reprodução assistida, como algo relativamente novo, vem trazendo cada vez mais inovações científicas. É possível utilizar material genético de terceiro — reprodução heteróloga —, como nos casos em que o marido, por exemplo, é estéril. Também é possível se realizar reprodução assistida nos casos em que o cônjuge já faleceu — reprodução post mortem. Em todos os casos, consequências jurídicas são geradas.

Para que o casal possa se recorrer a um material genético estranho ao deles será necessária a autorização do cônjuge ou companheiro não participante da técnica para que o outro possa realizá-la. Esta autorização é chamada Termo de Consentimento Adequado, previsto na Resolução nº1358/92doCFM, também citado por Eduardo de Oliveira Leite. Para que possam assinar o Termo, o casal terá que preencher alguns requisitos como capacidade civil para o ato, consciência plena da técnica a ser implementada, consciência e concordância plenas quanto às conseqüências advindas deste ato.

Sem esta autorização não será possível a realização da fertilização, e se esta se realizar, será possível a contestação de paternidade, tendo em vista a não manifestação expressa do cônjuge em ter um filho. Conclui-se desta maneira, pois não há como se forçar uma paternidade, sem nenhum comportamento de risco. Entretanto, para que essa pessoa não tenha responsabilidades é necessário que ela se manifeste contra a gestação no início, pois se esta manifestação ocorrer depois de uma convivência longa e no bojo de uma separação judicial, por exemplo, esta não será aceita em decorrência da paternidade socioafetiva.

Caso a autorização tenha sido feita e a técnica realizada, não será cabível ar- rependimentos, e a paternidade será estabelecida através da manifestação expressa de vontade do pai. Por outro lado, entende-se mais modernamente que mais vale a paternidade socioafetiva do que a biológica. Isto é, tem mais valor aquela paternidade do dia-a- dia, da criação e educação, e não somente aquela que doou o material genético. Desta forma, é mais fácil estabelecer a paternidade com base na convivência da criança com o pai. Por conseguinte, nos casos das técnicas de reprodução humana nas quais não se utilizou a carga genética de um dos pais, a convivência entre eles ilide a paternidade biológica.

Diante da paternidade socioafetiva, não há que se falar em vínculo de consanguinidade. Assim, verifica-se uma verdadeira justiça em termos de paternidade, pois desta forma não haverá manipulação emocional por parte do pai que não é biológico, pois aquele que criou e manteve o “estado de filho” não terá como deixar este desamparado juridicamente.

O problema ainda se agrava se tal fertilização for realizada depois da morte de um dos genitores (inseminação post mortem). Neste caso, a dificuldade não reside no estabelecimento da paternidade, mas sim na sucessão, pois o Código Civil aceita a inseminação post mortem somente na modalidade homóloga,e assim realizando-se o exame de DNA, não haverá dúvidas quanto a paternidade. Considerando que o Código Civil, artigo 1597, permitiu a realização da inseminação post mortem e, que não existe legislação regulamentadora de tal situação, há a possibilidade de manipulação de tal situação por parte da companheira que foi autorizada a ter um filho do falecido. Por outro lado, há a necessidade de se estipular um prazo razoável para que tal criança nasça, para que não cause uma insegurança jurídica.

O mais razoável seria considerar tal possibilidade, analogicamente à prole eventual, ou seja, esta criança deverá nascer dentro de um prazo razoável de 2 anos (prazo previsto para a prole eventual) para que se possa dividir a herança dentre os demais herdeiros e no bojo do próprio inventário ou arrolamento reservar uma cota- parte para o eventual herdeiro. Desta forma, diminuiria os riscos de eventuais manipulações por parte da genitora em querer uma vantagem econômica. Cumpre ressaltar, que referido tema é ainda muito novo tanto na sociedade brasileira, como na mesa de discussões entre os juristas brasileiros.

Sobre as autoras
Mariana de Freitas Farias

bacharel em Direito pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco

Rayssa Scarlett Silva Veras

estudante de direito da UNDB

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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