Reserva legal e sua exploração econômica

30/06/2019 às 12:01
Leia nesta página:

A Reserva Legal desempenha importantíssimo papel enquanto área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural “[...] com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural [...].

De modo geral, toda propriedade ou posse rural brasileira possui limitações de caráter ambiental em seu uso, definidas as “áreas protegidas” pelo Código Florestal, ou seja, as áreas de preservação permanente (APP’s), as áreas de uso restrito (pantanal e inclinações de 25º a 45º, artigos 10 e 11 do Código Florestal) e ainda a reserva legal, esta última, a motivação do presente texto.

 

 Divulgado no mês de maio de 2018, uma edição especial de quatro anos de Cadastro Ambiental Rural, no boletim informativo do Serviço Florestal Brasileiro, órgão do Ministério do Meio Ambiente, foi demonstrado que, dos 441.644.957 hectares de área cadastrada em 5.119.780 imóveis rurais brasileiros, 64% representam áreas de reserva legal, vegetação nativa e áreas de preservação permanente.

 

 Deste número apontado, 36% seriam área de reserva legal plantadas ou exóticas, enquanto 57% estariam em áreas de vegetação nativa, sendo que os 7% restantes são as áreas de preservação permanente. O mesmo informativo também demonstra, em área cadastrada, o total de 102.024.137 hectares de reserva legal.

 

 A Reserva Legal desempenha importantíssimo papel enquanto área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural “[...] com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa” (art. 3º, III, Código Florestal).

 

O detalhe. Uso econômico de modo sustentável.

 

Em regiões onde o percentual exigido a título de reserva legal é menor do que nas regiões compreendidas dentro da Amazônia Legal (80% em floresta amazônica, 35% no imóvel cerrado amazônico e 20% em campos gerais amazônicos), é cultural entender a Reserva Legal como “área de mata fechada e intocável”.

 

Contudo, a própria definição da reserva legal trazida pelo Código Florestal garante seu “uso econômico de modo sustentável”. E como isso acontece?

 

O próprio Código Florestal garante que é admitida a exploração econômica da Reserva Legal mediante “manejo sustentável previamente aprovado pelo órgão competente” (Art. 17, §1º, Código Florestal), em duas modalidades.

 

A primeira delas “sem propósito comercial” (art. 20), quando apresentado o plano de manejo sustentável e o aproveitamento da reserva legal seja para uso próprio do que ali seja cultivado, o que eventualmente acontece no caso de árvores frutíferas, sementes, cipós e folhas, dentre outras possibilidades, observadas as orientações da lei quanto aos períodos e épocas permitidos para não colocar em risco as espécies (art. 21).

 

A segunda modalidade, “com propósito comercial”, também demanda apresentação do chamado “manejo sustentável”, não podendo descaracterizar a cobertura vegetal, não prejudicar a conservação da vegetação nativa da área; assegurar a manutenção da diversidade das espécies; e conduzir o manejo de espécies exóticas com a adoção de medidas que favoreçam a regeneração de espécies nativa (art. 22).

 

Exceção à estas duas modalidades é o manejo sustentável para exploração florestal sem propósito comercial, para consumo no próprio imóvel, a qual, embora independa de autorização, DEVE ser declarada previamente no órgão ambiental sua motivação e volume explorado, limitada a 20 (vinte) metros cúbicos no ano (art. 23).

 

Em um estudo bastante pertinente ao caso, a ESALQ divulgou alguns exemplos que demonstram tamanha sustentabilidade e rentabilidade na exploração de reserva legal, no caso do manejo de florestas, cita que, “Para a Amazônia Legal, é permitida a exploração de madeira nativa na RL de até 30 m³ de toras/ha, no caso de ciclos mínimos de 35 anos, e de 10m³ de toras/ha, com ciclos de 10 anos (IN nº 05/06)”.

 

No caso da exploração florestal, atividades que se mantêm ao longo do tempo, os valores médios aplicados para madeira em tora e madeira serrada na Amazônia Legal, foram verificados, no ano de 2010, pela tabela abaixo:

 

Tabela 1. Preços médios (R$/M³) por classe de valor econômico de madeiras exploradas na Amazônia legal, 2009*

 

 

 

Fonte: Adaptado de Pereira et al. (2010).

 

* Taxa de conversão: US$1,00 = R$1,60

 

Já em outras atividades, o mesmo estudo estima (2012) que no estado de Goiás o pequi pode apresentar margem bruta superior à da soja (Sant’Anna, 2011), já que nas áreas onde há 10 pequizeiros/ha, haveria margem bruta de R$200,00 a R$600,00 por hectare. No mesmo período e região, a margem bruta para a soja foi de R$430/ha/ano (Sant’Anna, 2011).

 

No mais, além de plantas medicinais, o texto também demonstra que no caso da Pupunha (Bactris gasipaes) a produção pode chegar de 4 a 10t de frutos/ha, vendidos na faixa de preço entre R$10,00 e R$25,00 por kg; o Açaí-do-amazonas (Euterpe precatoria), 6 mil a10 mil kg de frutos/ha/ano, tendo de 200 a 500 plantas/ha; Açaí-do-pará (Euterpe oleracea), tem produção que pode variar de 6 mil a 12 mil kg de frutos/ha/ano, com 300 a 500 plantas/ha; e a Castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa), pode ter ocorrência de 1 a 5 árvores por hectare, por árvore cerca de 30 kg, atingindo de R$2,50 a R$5,00 por litro dessa semente com casca.

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Recomenda-se muito cuidado com a falta de comunicação ao órgão ambiental sobre a retirada de madeira, neste caso, pois pode gerar multa, crime ambiental, determinação de reparação de dano, embargo de área e ainda a apreensão da madeira sem qualquer possibilidade de recuperação do produto apreendido, dúvida bastante costumeira do produtor em consultorias jurídicas.

 

Por fim, uma preocupação bastante conveniente com relação à apresentação do manejo sustentável de reserva legal, já que, atualmente, todas as propriedades e posses rurais estão em fase de “inscrição” do cadastro ambiental rural (CAR), sendo este o momento adequado para declarar se haverá ou não utilização destas áreas, pois segundo determina o código florestal, as áreas de reserva legal deverão ser registradas por meio do CAR, “sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento” (art. 18).

 

Logo, sejam feitos neste momento – de inscrição no CAR – os cadastros para o aproveitamento econômico da reserva legal, mesmo que, a maioria dos sistemas estaduais do CAR não preveja um local específico para anexar estes planos de manejo sustentável, apresentando, até mesmo de outra forma, via protocolo impresso, registrando a intenção de exploração economicamente sustentável.

 

Recomenda-se muito cuidado com a falta de comunicação ao órgão ambiental sobre a retirada de madeira, neste caso, pois pode gerar multa, crime ambiental, determinação de reparação de dano, embargo de área e ainda a apreensão da madeira sem qualquer possibilidade de recuperação do produto apreendido, dúvida bastante costumeira do produtor em consultorias jurídicas.

 

Por fim, uma preocupação bastante conveniente com relação à apresentação do manejo sustentável de reserva legal, já que, atualmente, todas as propriedades e posses rurais estão em fase de “inscrição” do cadastro ambiental rural (CAR), sendo este o momento adequado para declarar se haverá ou não utilização destas áreas, pois segundo determina o código florestal, as áreas de reserva legal deverão ser registradas por meio do CAR, “sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento” (art. 18).

 

Logo, sejam feitos neste momento – de inscrição no CAR – os cadastros para o aproveitamento econômico da reserva legal, mesmo que, a maioria dos sistemas estaduais do CAR não preveja um local específico para anexar estes planos de manejo sustentável, apresentando, até mesmo de outra forma, via protocolo impresso, registrando a intenção de exploração economicamente sustentável.


[1] Disponível em: . Acesso em 21 de setembro de 2018.

Sobre o autor
Pedro Puttini Mendes

Advogado, Consultor Jurídico (OAB/MS 16.518, OAB/SC nº 57.644). Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Sócio da P&M Advocacia Agrária, Ambiental e Imobiliária (OAB/MS nº 741). Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA), Membro Consultivo da Comissão de Direito Ambiental e da Comissão de Direito Agrário e do Agronegócio da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA: "Pantanal Sul-Mato-Grossense, legislação e desenvolvimento local" (Editora Dialética, 2021), "Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor" (Editora Thoth, 2019, 2ª ed / Editora Contemplar, 2018 1ª ed) e "O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988" (Editora Thoth, 2018). Livros em coautoria: "Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988" (editora Thoth, 2018); "Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar" (Editora Thoth, 2018); "Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul - explicada e comentada" (Editora do Senado, 2017).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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