Novidades da Lei nº 13.846/2019: Auxílio-Reclusão

Leia nesta página:

O artigo analisa as alterações realizadas pela Lei nº 13.846/2019 sobre o benefício previdenciário de auxílio-reclusão.

No dia 18 de janeiro de 2019 foi publicada a Medida Provisória nº 871/2019, que entrou em vigor na mesma data (na maior parte de suas regras) e alterou vários dispositivos das Leis nº 8.212/91 e 8.213/91, que tratam do custeio e dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

A MP nº 871/2019 foi convertida na Lei nº 13.846/2019, em vigor desde 18 de junho de 2019, que, com algumas modificações, manteve diversas inovações sobre as regras do RGPS.

Neste artigo serão analisadas as novas regras sobre o benefício de auxílio-reclusão.

 

Auxílio-Reclusão: Aspectos Básicos

O auxílio-reclusão é previsto nos arts. 18, II, ‘b’, e 80 da Lei nº 8.213/91, regulamentado pelos arts. 116/119 do Decreto nº 3.048/99, e concedido aos dependentes de segurado do RGPS.

Nos termos do referido art. 80, “o auxílio-reclusão, cumprida a carência prevista no inciso IV do caput do art. 25 desta Lei, será devido, nas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão em regime fechado que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço”.

Assim, há seis requisitos para a concessão do benefício:

(a) a qualidade de segurado do recluso;

(b) a qualidade de dependente do postulante do benefício;

(c) um requisito negativo, que é o não recebimento de determinados rendimentos;

(d) o recolhimento à prisão;

(e) a baixa renda do segurado (requisito incluído pela Constituição);

(f) e a carência de 24 contribuições (exigida para as prisões ocorridas a partir de 18/01/2019).

As novidades incidem do terceiro ao sexto requisitos, que serão analisados em sequência.

 

Recolhimento à Prisão

O § 5º do art. 116 do Decreto nº 3.048/99 especifica que “o auxílio-reclusão é devido, apenas, durante o período em que o segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado ou semiaberto”. A prisão em regime aberto não gera direito ao benefício por não importar em perda total da liberdade e não impedir que o segurado desempenhe atividades laborativas, logo, igualmente deverá sustentar economicamente seus dependentes.

Contudo, a partir de partir de 18/01/2019 (data da entrada em vigor da MP 871/2019, convertida na Lei nº 13.846/2019), deve ser observada a nova redação do art. 80 da Lei nº 8.213/91, que restringe a concessão do auxílio-reclusão aos dependentes do segurado preso em regime fechado. Portanto, o requisito varia de acordo com a data da prisão:

(d.1) até 17/01/2019: pode ser concedido aos dependentes do segurado recluso em regime fechado ou semiaberto (§ 5º do art. 116 do Decreto nº 3.048/99);

(d.2) e a partir de 18/01/2019: pode ser concedido aos dependentes do segurado recluso em regime fechado (art. 80 da Lei nº 8.213/91 – MP 871/2019 e Lei nº 13.846/2019).

O requerimento do auxílio-reclusão deve ser instruído com a certidão judicial que ateste o recolhimento efetivo à prisão e a manutenção do benefício é condicionada à apresentação de prova de permanência na condição de presidiário (art. 80, § 1º, da Lei nº 8.213/1991).

Para a verificação do recolhimento do segurado à prisão e as respectivas informações (data da reclusão, natureza jurídica, regime de cumprimento da pena etc.), o INSS deve celebrar convênios com os órgãos públicos responsáveis pelo cadastro dos presos (art. 80, § 2º, da Lei nº 8.213/1991).

A certidão da prisão e a prova de permanência do recluso podem ser substituídas pelo acesso à base de dados eletrônica do Conselho Nacional de Justiça, com dados cadastrais que assegurem a identificação plena do segurado e da sua condição de presidiário (art. 80, § 5º, da Lei nº 8.213/1991). Para esse fim, a Resolução nº 230/2019 do CNJ instituiu o Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU), que permite o controle informatizado da execução penal e das informações relacionadas ao sistema carcerário nacional.

 

Baixa Renda do Segurado

Além da previsão legal, o art. 201, IV, da Constituição (com a redação modificada pela EC nº 20/98), assegura a concessão do benefício de auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda.

O Pleno do STF, no dia 25/03/2009, julgando dois recursos extraordinários interpostos pelo INSS (de nº 486413 e 587365), decidiu por 7 x 3 votos que a renda a ser considerada é a do segurado (e não a dos dependentes).

Ao aplicar o entendimento do STF, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese no julgamento do Tema nº 896 dos Recursos Repetitivos: “Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição”.

A questão controvertida foi afetada ao Tema nº 1017 da Repercussão Geral do STF, que não a apreciou, por entender que se trata de matéria infraconstitucional (STF, Plenário Virtual, ARE 1163485 RG/SP, rel. Min. Presidente, j. 15/11/2018, DJe 30/11/2018).

Porém, a controvérsia não está definitivamente resolvida, considerando que a MP 871/2019 (convertida na Lei nº 13.846/2019) promoveu alterações sobre o art. 80 da Lei nº 8.213/1991, entre as quais está a inclusão dos §§ 3º e 4º, que estabeleceram as seguintes regras:

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(e.1) o segurado de baixa renda é aquele que, no mês de competência de recolhimento à prisão, tenha renda de valor igual ou inferior àquela prevista no art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/98, atualizada na data da prisão;

(e.2) a renda do segurado é calculada com base na média dos salários-de-contribuição apurados no período de doze meses anteriores ao mês da prisão.

Ao regulamentar a matéria, o art. 11, § 2º, da Instrução Normativa nº 101/2019 do INSS, prevê que “quando não houver salário-de-contribuição no período de doze meses anteriores à prisão, será considerado segurado de baixa renda”.

Portanto, a (baixa) renda do segurado não corresponde ao valor da renumeração no mês da privação da liberdade, mas é aquela apurada a partir da média dos últimos doze salários-de-contribuição.

Em consequência, os §§ 3º e 4º do art. 80 da Lei nº 8.213/1991 preencheram as lacunas que existiam sobre o assunto, mas de forma diferente da interpretação até então conferida pelo Superior Tribunal de Justiça. Por isso, a questão deve gerar polêmica e voltar a ser debatida no Judiciário.

 

Carência

Com as alterações realizadas pela MP nº 871/2019 e a Lei nº 13.846/2019, o último requisito (carência) deve ser analisado de acordo com dois momentos temporais, e de acordo com o fato gerador do benefício:

(f.1) para as prisões ocorridas até 17/01/2019 (dia anterior à entrada em vigor da MP nº 871/2019), não é exigida carência para a concessão do auxílio-reclusão;

(f.2) e para as prisões ocorridas a partir de 18/01/2019 (dia da entrada em vigor da MP nº 871/2019), exige-se a carência de 24 contribuições para a concessão do auxílio-reclusão.

Assim, até 17/01/2019, bastava que o segurado tivesse recolhido uma contribuição, para que o benefício fosse devido aos seus dependentes. Ainda, mesmo que a contribuição não tivesse sido paga no mês de sua prisão, os dependentes teriam direito ao benefício se existisse a qualidade de segurado na data da reclusão, conforme as regras do art. 15 da Lei nº 8.213/91. Nesse sentido, o art. 116, parágrafo 1º, do Decreto nº 3.048/99, prevê que “é devido auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado”.

A partir de partir de 18/01/2019, data da entrada em vigor da MP 871/2019 (convertida na Lei nº 13.846/2019), passou a se exigir a carência de 24 contribuições para a concessão do auxílio-reclusão, diante do acréscimo realizado sobre o art. 25, IV, da Lei nº 8.213/91.

Se o segurado fugir da prisão antes de 18/01/2019 e for capturado após essa data, a nova concessão do auxílio-reclusão aos seus dependentes passará a contar com o requisito da carência. Neste caso, deverão ser consideradas as contribuições pagas antes da prisão anterior à fuga, eventuais contribuições pagas durante o período de fuga e levada em consideração a manutenção da qualidade de segurado durante a reclusão e nos 12 meses seguintes (art. 15, IV, da Lei nº 8.213/91).

Sobre os autores
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Adir José da Silva Júnior

Mestre em Direito - PPGD/UFSC (Área de Concentração: Direito, Estado e Sociedade). Graduado em Ciências Jurídicas pela UFSC. Especialista em Direito Processual Civil (UNISUL), Gestão Pública (UNISUL) em Direito Previdenciário (CESUSC). Formado pela Escola Superior de Magistratura Federal de Santa Catarina (ESMAFESC). Analista Judiciário Federal. Ocupa a função de Diretor de Secretaria da 1a Vara Federal de Capão da Canoa-RS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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