Penhora “on line” em contas salários e ou conjuntas, possibilidades e limites.

Penhora “on line” em contas salários e ou conjuntas, possibilidades e limites.

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01/09/2019 às 22:03
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Este estudo que ora é produzido é uma tentativa de reconstrução de um debate candente existente sobre a aplicação sob o pálio de princípios fundamentais constitucionais ou não da Penhora “on line”.

 

 

Penhora “on line” em contas salários e ou conjuntas, possibilidades e limites.

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Alberto Luiz Alves[1]

 

 

 

 

SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Histórico, conceito e finalidade; 2.1 Da penhora; 2.2 Da penhora “on line”; 3. Penhora “on line” em contas salários ou conjuntas; 3.1 Possibilidades da penhora “on line” em contas salários ou conjuntas; 3.2 Limites da penhora “on line” em contas salários ou conjuntas; 4. Conclusão; 5. Referências.

 

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

Ocasião em que temos uma Constituição Democrática e de Direito já há 31 anos, a sociedade brasileira vê-se tomada por distintas e contraditórias manifestações a respeito desse tão importante instrumento de fortalecimento da democracia. Ao mesmo tempo em que se louvam as conquistas, vozes não faltam a dilapidá-la como instrumento de atraso e engessamento das relações políticas, econômicas e jurídicas. Assim ao tratar da Penhora “on line”, procedimento previsto pela Lei 11.328/2006, que notabilizou o acréscimo do Artigo 655-A, no Código de Processo Civil de 1973, donde consagrou-se esse Instituto, ao estabelecer a reforma da Execução Extrajudicial, o qual conferiu mais efetividade ao processo executivo, tão almejado pelos operadores do direito[2]. Hoje, esse instituto está estatuído no art. 854 do CPC/2015[3].

Por isto, há que percorrer por análises que pressupõem algumas contradições quanto à aplicação desse instituto. Todavia, essa análise possa pretender ir além dos insondáveis desígnios da defesa do exequente diante da reclamação da satisfação de seu crédito junto à prestação jurisdicional, parece haver algo mais, que permeia o cenário de incompreensão – até ousa-se dizer, má interpretação – Constitucional.

São pré-compreensões historicamente construídas que, perpassam aos períodos de efervescência democrática e de mutação social que marcam uma visão malformada ou distorcida sobre o fenômeno satisfativo do exequente consoante princípios e preceitos constitucionais. Assim, hoje, mais do que nunca, precisa-se retomar uma vez e sempre a famosa provocação lançada pelo filósofo alemão Immanuel Kant, no alvorecer da Era Moderna: “sapere aude!” Ouse conhecer! Ouse conhecer e procure conhecer do por que da criação desse instituto judicial para aplicar celeridade, seus pressupostos e possibilidades[4].

Só a partir de então uma visão mais clara acerca dos verdadeiros significados e importância em um Estado Pós-Modermo possa justificar sua aplicação, permitindo-se entender mais e melhor sobre este Instituto, e do que a prestação Jurisdicional pode ou deve fazer em um Estado Democrático de Direito para aplicá-lo, a fim de atender ao Exequente – credor de dívida não paga. Talvez seja possível, a partir daí, compreender e aceitar a imperfectibilidade inerente e existente também nesse Instituto. Este estudo que ora é produzido é uma tentativa de reconstrução de um debate candente existente sobre a aplicação sob o pálio de princípios fundamentais constitucionais ou não da Penhora “on line”[5], destacando e apresentando tanto os seus pressupostos filosóficos, políticos e jurídicos quanto sua inserção paradigmática na vivência da pós-modernidade ocidental.

Bem como analisando as possibilidades e limites de sua aplicação quanto à penhora de contas salários e conjuntas. Daí verificar sua importância na justificativa, como posto por Chamon Júnior (2005, p. XXVI, p. 222-226) apud Souza Straioto e Morh Funes (?), que a compreensão da legimitidade do Direito na Modernidade deve comportar um permanente entrelaçamento com os aspectos dogmáticos, históricos e sociológicos. Portanto, constituir uma análise crítica e reflexiva sobre o instituto consoante suas limitações e o exercício do poder do Estado-Juiz em nome das liberdades fundamentais do indivíduo, consagrado pela constituição, mesmo que seja na condição de executado (devedor) diante depósitos financeiros que se destinem a suprir suas necessidades básicas e alimentares.

 

Ademais avaliar a situação de bifurcação, ou seja, o ponto crítico em que a mínima discussão propõe acerca da reflexão quanto a dúvida que paira sobre a crítica sistemática a este tipo de Penhora eletrônica conhecida no âmbito jurídico como instituto BACEN JUD que, nada mais é, do que um convênio de cooperação técnico-institucional, celebrado entre o Banco Central do Brasil e o Poder Judiciário, a fim de encontrar uma solução por meio da tecnologia moderna visando à celeridade e evitando à morosidade do processo de execução[6].

Esta reflexão apresenta duas facetas, no mínimo antagônicas. Por meio desse convênio, os magistrados que tiverem interesse em se cadastrar no sistema poderão oficiar eletronicamente, solicitando informações sobre a existência de conta-correntes e aplicações financeiras dos devedores, em todo o território nacional, e consequentemente, determinar o bloqueio e o desbloqueio dessas contas, envolvendo pessoas físicas e jurídicas clientes do sistema Financeiro Nacional.

Doutro lado, a criação desse sistema demonstra à descrença da sociedade em relação à prestação jurisdicional, que clama por celeridade e eficiência, de acordo com o que preconiza a Constituição Federal, em seu Art. 5º, inciso LXXVIII[7]. Na onda da tecnologia contemporânea é indubitável que a justiça busque viabilizar meios para cumprir o comando Constitucional da celeridade do processo, qual seja: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (BRASIL, 1998)”. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).

Vale notar que não restam dúvidas de que em sede processual, esse fundamento impõe maior agilidade na prestação jurisdicional. E quanto a isto o Instituto da Penhora “on line apresenta-se com características de maior efetividade às decisões judiciais. Todavia, resta compreendido que esse Instituto trata-se ainda de um sistema novo e que por razões outras é alvo de inúmeras críticas por aqueles operadores do direito que salientam violações de direitos fundamentais no âmbito de sua aplicação.

Diante desta compreensão, não é arriscado dizer que há um entendimento aberto quanto à locução “razoável duração” do processo. Ao contrário é possível ver que na justiça do trabalho a Penhora “on line tem sido mais empregada, e dizer, a título de exemplo, que os devedores/empregadores que mais tem sofrido prejuízos com a efetiva aplicação desse instituto são os empregadores na Justiça do Trabalho. Em consequência, tratando-se de empresas que por vezes tem suas contas bloqueadas chegando ao ponto de muitas serem conduzidas a uma crise financeira, o que, por vezes, inviabiliza suas atividades, doutro lado, promove o comprometimento do pagamento de sua folha de prestação trabalhista com os demais funcionários da empresa que não fazem parte da demanda[8].

Como se pode observar, o tema em questão discorre acerca de um Instituto que traz em si pontos polêmicos, dos quais este trabalho buscará promover um debate quanto à adaptação do processo de execução às novas tecnologias do mundo contemporâneo dentro da limitação e possibilidade de discorrer sobre o tema.

 

2 HISTÓRICO, CONCEITO E FINALIDADE

A ênfase histórica aspira ao sôfrego desejo por aprender sobre o passado, o caminho que pavimentou a trajetória da Penhora até a constituição da Penhora “on line. Por isto dizer que todo conhecimento implica uma passagem, uma progressão de um ponto de partida, designado por ignorância, aqui entendido, por desconhecimento, até a chegada a um ponto designado por saber. Supera-se tal situação quando busca na história a clareza do que efetivamente seja a prestação jurisdicional, por meio da execução de uma dívida.

Disto resulta, portanto, que na construção do ordenamento jurídico o Estado passou a ocupar um papel imprescindível na aplicação de sanções. Fixado essa ideia parte-se do entendimento de que quando não havia o cumprimento da obrigação, a parte que se julgava prejudicada, ou seja, o credor valia-se da força -, uma autotutela[9], a fim de obter a satisfação do seu direito que permitia o exercício de uma coerção pelo particular, em defesa de seus interesses.

Obviamente, que na atualidade, a sociedade tem restringido, em sua total aplicação, formas do exercício da autotutela privada, pelo uso da força, transferindo ao Estado as diversas e principais modalidades de exercício de solução dos conflitos, das lides. Conforme lição de Didier Jr apud Borges e Mota (2012, p.70) a execução e a satisfação de uma pretensão podem ser espontânea, na medida em que o devedor cumpre sua obrigação de maneira voluntária, ou pode ser forçada, quando o cumprimento dessa obrigação se obtém através da prática de atos aplicados pelo Estado. Há, portanto, a necessidade, para entender, sumamente a evolução desse estágio que propor uma breve digressão histórica.

Houve um tempo, que o instituto da execução esteve presente na maioria das civilizações. Da perspectiva da antiguidade, antes da instituição da Lei das XII Tábuas, essa ordenação romana deixava de ser uma atuação no campo simbólico para tornar-se um processo civil dividido em três fases: “legis actiones”, o período formulário e o da “cognitio extra ordinem”. Na consagração da “legis actiones” os litígios consistiam em ser solucionados por meio da justiça privada que era subjetivamente resolvido pelo próprio credor[10].

Ocasião que não figurava-se o poder de “imperium”. A ênfase era nessa época que as sentenças condenatórias não satisfeitas pelo devedor poderiam ser objeto de “actio” pelo credor e, caso novamente, não efetuasse o pagamento de seu débito, o devedor poderia ser vendido como escravo ou até ser morto pelo credor.

 

Isto ajuda-nos entender que a execução das sentenças que determinava uma condenação não era realizada nos processos em que havia sido proferida, sendo necessária em caso de descumprimento das obrigações nelas estabelecidas, a propositura de nova ação, a “actio iudicati” em que segundo Marinoni (2007, p.27) “o réu poderia reconhecer a condenação e o inadimplemento ou apresentar defesa. Nesse último caso, o credor pedia que o réu fosse condenado a pagar o dobro do valor da condenação”.

Na visão de Noronha (1995, p. 98) apud Souza Straioto e Morh Funes (?) “[...] a insuficiência do sistema das ações da lei, muitas pretensões legítimas ficassem ao desamparo da tutela jurisdicional, não só por se aplicar a ‘actio’ apenas aos cidadãos romanos e não aos estrangeiros, [...] o processo ao fracasso ou a soluções injustas, começou-se a esboçar uma maneira de complementar o sistema. Assim, com a edição da ‘Lex Aebutia’ foi instituído o período em que se manteve a dualidade de ações, porém, houve significativas mudanças nas fases dessas ‘actios’ ”.

       Nestas circunstâncias, todas e quaisquer prática do período conhecido como formular, conforme a solução provida da demanda que era da alçada de um juiz privado, uma pessoa do povo e não de uma autoridade do poder estatal. Essa forma de encarar a prestação da demanda desagradava ao Imperador e, sobretudo, às demais autoridades do Poder. Daí a tensão surge por que era subtraída parcela de comando estatal, qual seja o de aplicar a lei e decidir sobre os litígios. É, pois, evidente que a partir desse período formular é que o Poder Estatal concebe o direito de se jusrisdicionalizasse e a execução passa a ter caráter eminentemente patrimonial, afastando-se o direito de proteção apenas ao credor, mas passando a ter atenção ao direito de defesa do devedor.[11]

Há, portanto a substituição da “manus iniectio” pela “actio iudicati” neste contexto. Pois bem, todavia, a doutrina romanista não é certa quanto à origem desta “actio iudicati”. Além do mais, a “actio iudicati” era muito similar com a “manus iniectio”, uma vez que, a decisão do juiz privado, por não possuir o poder do “ius imperium”, apenas constituía nova obrigação diante da colaboração das partes envolvidas.

Nesse período a “manus iniectio” foi substituída pela “actio iudicati”. Contudo, a doutrina romanista não é pacífica acerca da origem desta “actio”. A “actio iudicati” é muito semelhante à “manus”, pois, segundo Noronha (1995, p.109) apud Souza Straioto e Morh Funes (?) “a sentença do juiz privado, por ser este destituído do ‘ius imperium’, não refletia outra eficácia senão a de constituir nova obrigação, nos termos prefixados na fórmula elaborada pelo magistrado com a colaboração das partes”.[12] Concebida nestes moldes, o sistema da “actio iuducati” citado o devedor esse apresentava sua defesa, a fim de impugnar a tese do autor ou confessar a existência do débito e de seu inadimplemento, por meio da “confessio”[13].

À medida que a defesa fosse apresentada e com isto impugna-se a tese do autor e ao final sua tese defensiva não fosse acolhido, ele era condenado ao pagamento do dobro do débito, ou seja, ao dobro da condenação. Em resumo, traz à colação Noronha (1995, p. 109) apud Morh Funes e Souza Straioto (?) que se o devedor optasse pela “confessio”, o pretor designaria a maneira de execução que quase sempre era a alienação integral dos bens do devedor para o cumprimento de sua obrigação e, por conseguinte da satisfação do direito do credor. Assim, o processo terminava na fase “in iure”.

Convém acrescentar que no período da “cognitio extra ordinem” o modelo processual foi substancialmente modificado de maneira que a figura do juiz privado desapareceu, pois todas as questões passaram a ser decididas pelo Estado que soberanamente detinha o poder de “imperium”.[14]Há, alías, a nítida ideia de que apesar de toda essa trajetória o processo passa por uma transformação extraordinária que fez com que o procedimento tivesse duas fases.

De modo geral, tornando-o um processo unificado e conduzido por um único magistrado. Assim, de outra perspectiva, atos como a citação, guarda e alienação dos bens do devedor e demandado não era mais realizados pelo credor, o que até, então, não era surpreendentemente uma maneira inconcebível, passando a ser todos esses atos realizados por um magistrado e seus órgãos auxiliares todos imparciais.[15]

Após voltar alguns anos atrás para resgatar algumas impressões sobre a temática. É possível avançar e demonstrar que ao longo de todos os séculos que deixa-se de mencionar, sobretudo, o período das transformações da execução ocorridas na Idade Média. O que de maneira nenhuma prejudicará a análise até então desenvolvida, e por variadíssimas formas, há necessidade de citar que nas ocorridas transformações algumas ambíguas e outras traiçoeiras, pois pode fazer crer que só com o passar dos tempos houve a sistematização e organização da execução satisfativa.

A título de exemplo, cita-se o aparecimento do título executivo extrajudicial, que dá lugar à execução quase que de maneira instantânea, o que mostrou, por sua vez, uma autonomia do processo de execução, o qual já emancipado de qualquer dependência do processo de cognição, entendido como maneira diversa, mas perfeita garantia processual. Fundamentalmente, para Liebman (2001, p.33) o órgão jurisdicional e as partes desempenham atividades diferentes tanto na cognição, quanto na execução, e os atos dos dois processos são diferentes em si por sua natureza e efeitos.

Para este autor, na cognição “a atividade do juiz é estudar o caso submetido ao seu exame, investigar os fatos, escolher e aplicar as normas legais adequadas, fazendo, em suma, um trabalho intelectual que não difere, sob certos pontos de vista, do que um historiador, quando reconstrói e avalia os fatos do passado (LIEBMAN, 2001, p.33)”. Já na execução, Liebman (2001, p.33) entende que o trabalho do juiz é prático e com efeito material. Visa produzir no mundo dos fatos modificações que tornem a realidade conforme àquela vontade. Nesse sentido muito específico, portanto, é legítimo dizer que para Liebman.

Quando as partes estão elas, na cognição, em posição de igualdade, pois o princípio do contraditório é essencial a este tipo de processo; e todas cooperam, cada uma no sentido do próprio interesse, para as investigações do juiz, objetivando um resultado que pode ser favorável tanto a uma quanto à outra. Muito pelo contrário, na execução, não há mais equilíbrio entre as partes, não há contraditório; uma exige que se proceda, a outra não o pode impedir e deve suportar o que se faz em seu prejuízo, podendo pretender unicamente que, no cumprimento desta atividade, seja observada a lei. É certo que a controvérsia e o contraditório podem reaparecer durante a execução, mas isto somente em um novo processo de cognição, de caráter incidente, em que é autor o executado, processo que não faz propriamente parte da execução, mas pode somente influir no seu curso (LIEBMAN, 2001, p.33-34).

              No avançar nos tempos, ao mesmo tempo dizer que na dinâmica do direito processual civil endógeno local houve no Código Processual Brasileiro em 1916 a unificação de dois institutos amplamente debatidos ao passar dos anos – a ação executiva e a ação executória. Ao unificar esses dois institutos, segundo Liebman (2001, p.56), apenas na figura da ação executiva, indubitavelmente, viu-se o desapego à tradição de longa coexistência de dois tipos de processos com a mesma finalidade e com a mesma finalidade e com poucas diferenças práticas de funcionamento.

Mas as práticas e alguns doutrinadores sustentam que a ação executiva continua a ter a sua função característica e tradicional. A ideia para Liebman (2001, p.56) é a de que a ação executiva ainda destina-se a promover a execução de crédito ainda não verificada e declarada judicialmente, mas que são, ou fundados em provas merecedores de uma tutela particular, rápida e fundamental para assegurar a satisfação do crédito.

Esse autor dentro de uma vertente conservadora diz que “a ação executiva, tal como disciplinou o Código vigente (1916), se bem que se inicie por uma ordem de prestação de caráter cominatório e permita a apreensão prévia de bens do devedor, não pode ser classificada como processo executivo; é antes um processo misto de processo declaratório e processo acautelatório, ou um processo declaratório qualificado por uma inicial medida acautelatória” (LIEBMAN, 2001, p. 56).(Grifo Nosso).

Embora todas as transformações ao longo da história tenham contribuído para fortalecer o processo de execução, sobretudo, no Direito Processual Civil, deve salientar que, nas décadas que principiam o Novo Código de Processo Civil de 2016, por certo o processo de execução ganhou eficazmente institutos que o permitisse cumprir sua finalidade, como o próprio Liebman (2001, p.57) apresenta a ideia que permite não olhar para um passado que, provavelmente, nunca foi satisfatório e justo na consecução do pagamento da dívida; mas, no entanto, são propostas e institutos mais progressistas, a título de exemplo, que a lei não exigia-se em todos os casos de ação executiva a apresentação de um título executivo. Outra situação moral-prática e cognitivo-instrumental é a penhora inicial de um bem com a finalidade acautelatória. Com isto, a penhora conquistou a primazia sobre a vindoura satisfação da dívida. Para o autor, a penhora segue-se uma cognição com caráter pleno e se observam as formas do processo ordinário.

Daí Liebman (2001, p.58) entender que a penhora implica em determinar, imobilizar, guardar, reservar um bem ou bens sobre o qual deverá fazer-se a execução. Uma das positividades é a ideia de que como a execução leva certo tempo para chegar ao momento da alienação do bem, a primeira coisa que deve ser feita, desde o primeiro momento, é impedir que esse seja vendido ou no caso de valor pecuniário (dinheiro) seja gasto ou repassado a terceiro. Isto permitir deduzir que a penhora cumpre a função conservadora e acautelatória. Não é, porém, razão para que ela seja confundida com os provimentos acautelatórios em sentido estrito.

Ademais, o autor deixa bem claro que “a penhora, tanto na ação executiva quanto na executória, faz parte integrante e indispensável desta cadeia: por isso, ela é um ato executivo e, no quadro dos atos executivos aquele que realiza uma função acautelatória” (LIEBMAN, 2001, p.58). Em particular, até aqui, embora de maneira sumária foi necessário estabelecer uma versão levemente abreviada, mas que introduz de forma simplificada uma constituição histórica do instituto da penhora na execução.

 

2.1 Da Penhora

Nessa linha de argumentação, sabe-se hoje que conceitualmente a Penhora, definida por Frederico Marques apud Borges e Mota (2012, p.73) é a atitude inicial de expropriação do processo de execução, ou seja, como define Medina (2015, p.1023) “[...] particularização dos bens que devem se sujeitar aos atos de expropriação”, a fim de definir a responsabilidade de execução, por meio de uma apreensão de um bem do devedor, de maneira direta ou indireta.

Conforme enfatiza Graselli (2007, p.50) inúmera correntes que buscam promover o entendimento acerca da natureza jurídica da penhora. Para essa autora há três vertentes que se destacam pela sua relevância. Na primeira a penhora tem essência autêntica de medida cautelar. Já a segunda corrente reputa à penhora hipótese de sê-la apenas um ato executivo. A terceira e última corrente mais expressiva e prevalente no Direito Processual moderno, a penhora consubstancia-se em verdadeiro ato executório, porém revestido de efeitos de bases conservativa. Assim sendo, trata-se de um ato do processo de execução, cuja finalidade reside na individualização e preservação dos bens a serem submetidos à execução. Portanto, seus efeitos consubstanciam em um ato executório de natureza material, que se revela pela agilidade de obtenção de bens pertencentes ao devedor que podem ser assegurados para a prestação jurisdicional exigida pelo credor.

Em outras palavras, é ação pela qual se apreende bens tantos quantos forem necessários para assegurar a execução de uma dívida. No que se refere à etimologia do termo Penhora tem-se que “pignus = garantia, mas que não deve ser confundido com penhor – pacto adjeto ou obrigação acessória, em virtude da qual o devedor entrega coisa móvel sua ou de outrem, por este autorizado, para nela ser cumprida a obrigação principal, quando não resgatada à dívida” (GOLDSCHMIDT, 2006, p.48). Entende-se, portanto, que esse é o primeiro ato executório aplicado pelo Estado, por meio do qual inicia-se o processo de desapropriação ou apropriação forçada por lei, privando o proprietário da coisa que lhe pertence. Também é correto considerar que seja um ato de confisco da coisa, a fim de transferir bem do devedor ao credor, objetivando satisfazer o direito do credor, independente da anuência do devedor.[16]

            É preciso salientar que a penhora é o primeiro ato executivo realizado no curso do processo de execução. Contudo, ressalva-se, Medina (2015, p. 1021) “[...] a possibilidade de realizarem-se outros atos executivos, anteriormente”. Cita o autor, atos que tendem a converter-se em penhora, tais como, o arresto (art. 830, §3º, do CPC/2015) ou, como é possível pensar, provocam que se penhore determinado bem, pode-se mencionar o caso da averbação em registro de bem, como descrito no art. 828 do CPC/2015. Acerca disto, Medina (2015, p.1021) assevera, a penhora para esse autor, judicialmente, é o bem sobre o qual recaem os atos executivos processuais.

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            É certo que a penhora concentra, ou individualiza tudo aquilo que, até a decisão, manifesta-se, apenas “in abstracto”, como responsabilidade executiva patrimonial. Nessa perspectiva residem os traços característicos da penhora, apesar da lei disciplinar contornos e definir os efeitos, os quais não recaem em sua natureza jurídica.[17] Assim, salienta a doutrina que a penhora, no entanto, não retira, como regra, o poder de disposição, mas é indiscutível que esse instituto modifica, em certa medida, o poder do exequente sobre o bem. Para Medina (2015, p. 1022) “[...] o grau de debilidade dos direitos do executado sobre o bem penhorado pode variar, mas isso não define a penhora”.

Para esse autor, com o cumprimento da penhora, o bem não sai da posse do executado, no caso de depositário conforme os termos do art. 840, III e § 2º do CPC/2015[18]. Todavia, no caso de dinheiro depositado ou aplicado em instituição financeira, têm-se, também nos termos do art. 854 do CPC/2015[19], que na sequência dos fatos processuais, a indisponibilidade. A qual converte em penhora e transfere o dinheiro da conta vinculada do exequente à execução. Assim sendo, fica o executado afastado do poder de disposição sobre o bem, ou seja, poder de disposição daquela importância penhorada.

Para Iris Vânia Santos Rosa algumas situações não tratam-se de apenas fatos, mas condições, uma vez que possuem a capacidade de modificar uma conjuntura. Neste contexto, para essa autora “a penhora funciona como instrumento de apreensão judicial garantidora da execução” (ROSA, 2014, p. 125). Pelo que se extrai de sua obra a penhora tem caráter de afetação[20] no processo executivo, apesar de ser salientado que afetar significa destinar algo que estaria fora do mundo jurídico, a fim de que este esteja apto a produzir efeitos desejados. Assim, a penhora tem exatamente esse objetivo, qual seja transformar o bem ou o direito acautelado para satisfazer a dívida.

No que tange à conceituação e finalidade da penhora o presente estudo tem por pontual sua definição, longe, todavia, de pretender um maior aprofundamento. Assim sendo, evitando-se não abstrair muito mais as possibilidades de discussão sobre a penhora em específico e pelo que se extrai do que até aqui se discorreu, é por oportuno, conceituar e demonstrar a finalidade da penhora “on-line”.

 

2.2 Da Penhora “on-line”

            No que diz respeito à penhora “on-line”[21] como se verá adiante, por longo tempo discutiu-se doutrinaria e jurisprudencialmente sobre a possibilidade de efetivar-se a penhora, por meio eletrônico (e-mail) -, usando-se a rede de computadores de depósitos em contas bancárias. Acerca do tema se antes havia maior dificuldade de se admitir tal procedimento, na lição de Dinamarco apud Borges e Mota (2012, p. 73) “[...] agora os tempos são outros e a tônica principal do processo civil instrumentalista é a efetividade do acesso à justiça para plena consecução da promessa constitucional de jurisdição efetiva”.

Objetivamente, conforme contextualização do tema, apresentada por Borges e Mota (2012, p. 73) a origem do instituto da penhora “on line”[22] surgiu por meio de um convênio entre o Banco Central do Brasil, o Superior Tribunal de Justiça e o Conselho da Justiça Federal em 2001. Por sua vez, o Tribunal Superior do Trabalho veio a utilizar o meio eletrônico, tendo em vista a sua permissibilidade na Justiça do Trabalho. Ademais, a Lei Complementar no 118/2005[23] trouxe a inovação nos termos da redação do artigo 185-A, do Código Tributário Nacional, o qual passou a prevê o instituto da penhora “on line” no âmbito das execuções fiscais por meio do Sistema Bacen Jud[24], a saber:

Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens a penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinara a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registro de transferência de bens, especialmente ao registro publico de imóveis e as autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, faça cumprir a ordem judicial (BORGES;MOTA, 2012, p.73).

            Não haveria motivo algum para impedir que os Tribunais Estaduais não passassem, também, a empregar esse instituto da Penhora “on line”, mediante convênio firmado com o Banco Central. Ora, se não havia nenhum impeditivo editou-se a Lei 11.382 de 2006[25], na qual permitiu e consagrou que a Justiça Comum Estadual, por meio eletrônico, enviada ao Banco Central, passasse a bloquear depósitos bancários em conta corrente, poupança ou qualquer outro tipo de aplicação financeira em nome do executado (devedor)[26].

 

            É importante salientar que a penhora “on-line” surgiu com maior efetividade com a Emenda constitucional nº 45, promulgada pelo Congresso Nacional em 2004, a conhecida minirreforma do Poder Judiciário, tendo a finalidade precípua de envidar esforços para proporcionar maior celeridade na prestação jurisdicional. Iris Vânia Santos Rosa (2014) em sua obra afirma que essa inovação do judiciário brasileiro ao firmar convênio com o Banco Central e estabelecer regras mínimas para disciplinar à penhora “on-line” buscava evitar a morosidade da justiça e propor medidas até então não previstas na Lei de Execuções Fiscais e, nem tampouco, no Código de Processo Civil que se aplicava subsidiariamente ao caso concreto da execução.

            Consoante a noção proposta por Arenhart e Marinoni (2008) essa penhora de dinheiro é forma mais eficaz de viabilizar a realização do direito de crédito, vez que torna-se indispensável o procedimento que impõem a justa e adequada transformação do bem penhorado – como o imóvel – em dinheiro, reduzindo o tempo e o custo de atos como a avaliação e a alienação do bem a terceiro. Há, por exemplo, além disto, a questão de que a penhora dá ao executado a condição de penhorar a quantia necessária ao pagamento do seu débito, o que torna-se mais difícil em sendo bens imóveis ou móveis, os quais os valores desses bens são considerados “relativos” e, por isto mesmo, são objeto de venda em complexos processos de leilão público, ocasião em que a arrematação pode ocorrer por preço inferior ao de mercado.

Poder-se-ia explicitar outras tantas situações. Porém, esses autores questionam diante do tema abordado, o conflito normativo de interpretação que torna a resolução da prestação jurisdicional mais difícil, compreensão que, com certeza, impedia a penhora de dinheiro, ao se interpretar equivocadamente o art. 655, I, do CPC, 1973. Para Arenhart e Marinoni (2008) a interpretação permitia o entendimento de que apenas incumbia “ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a seguinte ordem: I - dinheiro: ...”. Supondo, portanto, que o devedor tinha a obrigação de indicar à penhora apenas dinheiro em espécie e jamais dinheiro que estivesse depositado em instituição financeira (Grifo Nosso).

Tal interpretação inviabilizava a penhora de dinheiro, ou melhor, “equivocadamente e sem qualquer fundamento razoável deixava o devedor livre para indicar outro bem à penhora. Isto não só feria o princípio do meio idôneo como dava oportunidade para o devedor retardar a satisfação do direito do exequente” (ARENHART; MARINONI, 2008). Diante disto, é possível conceber que as sofisticadas construções dos estudiosos do processo renderam ao novo Código de Processo Civil novos frutos à interpretação quanto ao rol de bens a serem nomeados à penhora, dentre esses a teor do art. 854, o CPC/2015 dispõe que a penhora de dinheiro depositado em conta-corrente ou em aplicação financeira passa a ser penhorada. Esse dispositivo sustenta a aplicação da penhora “on line”. Como já observado, o CPC/2015 proporciona evidente prioridade à expropriação simples, por meio da apropriação e entrega de dinheiro do executado ao exequente.

Assim ressalte-se a importância do conceito do “princípio da menor onerosidade”[27] na apreensão da realidade da penhora. Assim, pode-se entender o princípio que representa o pressuposto constitucional consagrado no Art. 5º, inciso LXXVIII, CF, “a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”[28], pois, a expressão de sustentar e esclarecer as características essenciais desse instituto, de modo a individualizá-lo, é de extrema importância para a interpretação da proposta trazida ao CPC/2015, como pondera asseverando Medina (2015, p. 1052).

Todavia, a sociedade como todos conhecem, depende da existência e aplicação de princípios, ou seja, de Garantias Fundamentais consagradas na Constituição Federal. Para elucidar essa questão Rosa (2014, p. 161) “ao contrário do que muitos acreditam o desenvolvimento humano não se opera apenas quando aquela sociedade tem acesso à educação, saúde, transporte e moradia, essa qualidade de vida almejada também se estende à segurança jurídica nos processos e a certeza de que existem meios que autorizam o acesso ao poder judiciário para dissolução desses conflitos”.

Em contrapartida, não pode-se deixar de observar a violação do art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal, como evidencia a eminente jurista se assim proceder haverá “[...] privação de bens ou direitos de defesa, sem o Devido Processo Legal e a Ampla Defesa. Não pode-se, em prol da celeridade processual e da eficiência dos atos administrativos, suplantar as orientações constitucionais e infraconstitucionais” (ROSA, 2014, p. 161). O que claramente está explanado no julgado abaixo demonstrado em crédito tributário demonstrado:

EMENTA:

DIREITO TRIBUTÁRIO. INDISPONIBILIDADE DE BENS DO DEVEDOR TRIBUTÁRIO. EXAURIMENTO DAS DILIGÊNCIAS. É necessária a comprovação do esgotamento de diligências destinadas à localização de bens do devedor para a determinação de indisponibilidade de bens e direitos prevista no art. 185-A do CTN. A medida de decretação da indisponibilidade geral de bens, com fundamento no mencionado dispositivo do CTN, a qual é mais gravosa do que a simples penhora “on line” dos valores executados, exige o prévio esgotamento de todas as diligências possíveis tendentes à localização de bens do devedor. No AgRg no ag 1.429.330-BA, a Primeira Seção conceituou o esgotamento das diligências para localização de bens como o “uso dos meios ordinários que possibilitam o encontro de bens e direitos de titularidade da parte executada, como, por exemplo, o acionamento do sistema Bacen Jud e a expedição de ofícios aos registros públicos de bens para que informem se há patrimônio em nome do devedor”. Precedentes citados: Resp 1.184.765 – PA, DJ e 3/12/2010 (Repetitivo); AgRg no Ag 1.429.330-BA, DJe 3/9/2012. (AgRg no REsp 1.329.012-SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 13/11/2012) (ROSA,2014, p.161)-(Grifo Nosso).

Óbvio que há que festejar, tendo em vista a sociedade estar na Era da Informação e nada mais do que ser conveniente a utilização dos meios eletrônicos, a fim de agilizar os processos em geral e os instrumentos de soluções de conflitos. Ainda mais, no caso da garantia de tutela jurisdicional satisfativa de débito. Todavia, não é plausível como no julgado citado buscar a medida da penhora “on line” dos valores executados, sem o prévio esgotamento de todas as diligências possíveis tendentes à localização de bens do devedor conforme estabelece à Lei Infraconstitucional. Assim, resta claro que, garantias fundamentais não podem ser superadas em nome na celeridade da Tutela Jurisdicional.

Ora, não há dúvida, que como acrescenta Medina (2015, p. 1052) “Seja por ser mais célere, menos custosa, mas, sobretudo, por permitir que se obtenha desde logo o bem devido, deve-se sempre preferir a expropriação simples à expropriação por conversão de bens em dinheiro”. Certamente, que por meio da Penhora “on line” o dinheiro pode ser penhorado em espécie, embora isso, como o próprio Medina (2015, p. 1052) salienta, tenda a ficar cada vez menos comum. O autor afirma “[...] o dinheiro, antes usado no contexto do comércio para viabilizar a troca de bens ou realização de negócios, passa a ser acumulado como riqueza em aplicações financeiras. Essas aplicações financeiras, gradativamente, tornam-se cada vez mais requintadas, tornando-se o dinheiro aplicado, ele próprio, o objeto negociado. Esse dinheiro não é localizado em espécie (ou, ao menos, não é facilmente localizável em espécie), mas fica depositado ou aplicado em instituições financeiras” (MEDINA, 2015, p. 1052).

Assim, a fim de viabilizar a penhora de dinheiro depositado em conta-corrente ou aplicações financeiras, como dispõe o art. 854 do CPC/2015, o juiz determinará à instituição financeira que torne indisponíveis os ativos existentes em nome do executado. A determinação, ou seja, a ordem judicial será feita por meio eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional (art. 854, caput, do CPC/2015) já mencionado neste trabalho, como Bacen Jud. Em função disto, o dinheiro encontrado na conta do executado, conforme trata a lei, será tornado indisponível ao executado e colocado à disposição da justiça -, em conta vinculada do juízo da execução.

Contrário aos créditos Tributários, segundo Medina (2015, p. 1054) “É desnecessária a realização ou esgotamento de diligências para localização de outros bens penhoráveis”.[29]Segundo o eminente autor “Essa orientação é adotada pelo CPC/2015, que estabelece a primazia da execução por expropriação simples, deixando a execução por conversão de bens em dinheiro em segundo plano”(MEDINA, 2015, p.10).

 

Ademais, o juiz poderá ordenar a indisponibilidade da conta ou aplicação financeira sem prévio conhecimento do executado (art. 854, CPC/2015), tornando indisponível o ativo financeiro, intimando o executado (art. 854, §2º, CPC/2015) e, em cinco dias, poderá este demonstrar se houve excesso ou se o dinheiro tornado indisponível é impenhorável (art. 854, §3º, CPC/2015). A título de exemplo, conforme demonstra Medina (2015, p. 1055) isto se dera “[...] em relação a proventos de aposentadoria”[30].

Pois bem, definida essas questões fundamentadoras e preliminares é possível discorre sobre a aplicação da Penhora “on-line” em contas salários e ou conjuntas realçando as possibilidades e limites para que este instituto possa ser empregado.

 

3 PENHORA “ON LINE” EM CONTAS SALÁRIOS OU CONJUNTAS

            Determinar a intenção do legislador passa a ser imperativo diante da simplicidade, funcionalidade e rapidez da Penhora “on line”, principalmente, para os acostumados a não efetividade da tutela executiva processual. É preciso lembrar que a partir de agora, sobretudo, com a vigência do CPC/2015 a penhora de dinheiro baseada na comunicação por e-mail ao agente financeiro apresentará maior funcionalidade e resultados efetivos. Todavia, não vale tudo, nem para livrar-se dessa penhora de dinheiro por meio eletrônico, nem para penhorar qualquer importância em dinheiro. Deve-se lembrar que, nesse contexto de interpretação e lógica, permanecem velhos ensinamentos de Hermenêutica Jurídica, representados pela interpretação mediante a aplicação de princípios fundamentais e constitucionais. Daí pensar, também, que tudo tem limite.

 E é graças à interpretação constitucional e, sobretudo, com base em Direitos Fundamentais, em especial ao piso vital básico calcado pelo Princípio da Dignidade Humana que deve a jurisdição fazer-se de rogado a tal situação, tendo em vista que o direito processual e, principalmente, o processo de execução, em específico, necessita ser interpretados lógica e gramaticalmente, a fim de que o jurista cumpra o seu dever primordial de aplicador da lei, em conformidade com a intenção do legislador, exigindo-se reciprocamente que através de um nexo de razoabilidade e proporcionalidade a ratio juris explique e determine a aplicação do instituto da Penhora de dinheiro “on-line” em contas bancárias sendo essa referente ao salário do trabalhador ou estando essa conjuntamente estabelecida com um terceiro (cônjuge, por exemplo).

            Claro que verifica-se, então, compreensível desajuste entre a lei e a prática no cotidiano. Contudo, conforme Caruso Puchta (2008, p. 111) exageros precisam ser evitados. Como bem frisa a autora “Evitar excessos e insuficiências constituem sabedoria prática (phronesis) já difundida há mais de 2300 anos na visão filosófica aristotélica. Realmente, ceder às pressões do detentor de dinheiro em conta e proteger demasiadamente o devedor renitente é um excesso que necessita ser evitado. Ensejar também que a vítima de ilícitos reste sem a efetiva tutela de seus direitos é insuficiência jurisdicional condenável” (CARUSO PUCHTA, 2008, p.111).

            De fato, é perfeitamente perceptível que é necessário respeitar ao princípio da dignidade humana, inserido nas normas sobre impenhorabilidade de bens. Ao tratar dessa questão, Caruso Puchta (2008, p. 111) de maneira bastante sucinta diz, “o meio termo, o equilíbrio, a equidistância entre os extremos, é satisfazer o crédito plenamente, com garantia de direitos fundamentais, em especial o direito fundamental de ação e da dignidade humana, tanto do devedor como do credor”.

            Pois bem, diante do extenso rol de bens impenhoráveis, segundo a doutrina proposta por Caruso Puchta (2008, p. 111) vê-se uma exagerada proteção do devedor assegurando-lhe seu direito fundamental da Dignidade da Pessoa Humana e a execução pessoal. Não se trata de regressar ao passado quando esse respondia com seu próprio corpo por dívidas. Isto é fato passado. Já ficou na ciência denominada história. Isto não é mais admitido, aceitável ou necessário. Na contemporaneidade, ainda, há maneiras excessivas que protegem ao devedor inadimplente os quais causam danos a credor ao não receber o seu crédito.

Parece paradoxal e antagônico que as impenhorabilidades, instituto que de acordo com Caruso Puchta (2008, p. 112) “[...] vem proteger a dignidade humana do devedor, está violando a dignidade humana do cidadão lesado em seus direitos, como também a dignidade da justiça. Na realidade, trata-se de mais uma das mazelas do positivismo jurídico, visto que a lei tem lacunas e não consegue regular todas as situações, muito menos atingir o ponto de equilíbrio necessário ao enfrentar direitos fundamentais em rota de colisão”.

Se bem analisar o instituto da impenhorabilidade esse tem por meta proteger os hipossuficientes, jamais tutelar devedores com altos rendimentos. Para Marinoni apud Caruso Puchta (2008, p. 115) a “Impenhorabilidade excessiva no Brasil, em especial a de rendimentos da pessoa natural e de mansões, constitui flagrante afronta à dignidade da vítima de ilícitos e ao interesse público da idônea prestação jurisdicional”. Isso com a Penhora “on-line” visa extirpar anomalias do sistema e observar os valores preponderantes da Constituição da República. Em suma, para Marinoni apud Caruso Puchta (2008, p.115) “não é a Constituição que tem de se adaptar à lei processual e, sim, a lei processual necessita observar a Constituição Federal”.

O proteger o alto padrão de vida do devedor e restabelecer direitos violados, essa última é a tutela de direitos é que deve prevalecer. Valores que se opõem não restando dúvida qual deve prevalecer. A título de exemplo, cita-se aquele economicamente frágil que, segundo Caruso Puchta (2008, p.116) “[...] jamais será afetado pela penhora parcial de salários de 40 % do valor que exceder 20 salários mínimos. Se a impenhorabilidade visa protegê-lo, é evidente a incongruência da proteção ilimitada de qualquer rendimento da pessoa natural. Essa proteção indevida daquele que percebe altos salários enseja potencialização de desigualdades, sendo que diminuição de desigualdades sociais é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil”[31].

Há casos em que é necessário abrandar a aplicação da constrição do bem, no caso dinheiro depositado em conta salário ou conjunta, nesses casos operam-se um abrandamento através do qual vê-se a preponderância da observância de Princípios Constitucionais. Daí passa-se de maneira abreviada a discorre sobre as possibilidades da ocorrência da Penhora “on line” em contas salários e ou conjuntas.

 

3.1 POSSIBILIDADES DA PENHORA “ON LINE” EM CONTAS SALÁRIOS OU CONJUNTAS.

            A esse respeito é necessário retornar ao Princípio da Menor Onerosidade da Execução que está contido no art. 805 § Único do CPC/2015[32] no qual impõe ao juiz empregar o meio menos gravoso para o devedor. Isto quer dizer que deve-se observar na regra em questão a obediência à aplicação dos meios necessários para alcançar a efetividade do processo de execução. 

Esse princípio no processo de execução é fundante para a aplicação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana previsto no art. 1º, incisos II e III da Constituição Federal. Assim, descreve Souza (2014, p. 305) ao destacar “[...] a cidadania e a dignidade da pessoa humana, como uns dos principais fundamentos que alicerçam o Estado Democrático[33] de Direito[34]. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana se estende, em abstrato, a todos indistintamente. Porém, no plano concreto, a sua aplicação poderá depender de uma análise perfunctória, cabendo ao magistrado interpretar a necessidade ou não da sua aplicação”.

            A jurisprudência[35] tem acolhido o entendimento de que uma conta salário poderá apresentar saldo além dos rendimentos salariais obtidos e provenientes de aplicações financeiras e outros rendimentos, não podendo servir de meio para se criar obstáculo à efetividade do processo, fato que é perfeitamente razoável, no entendimento de Souza (2014, p. 313). Porém, pode haver casos, onde o simples fato do depósito, proveniente de salário que está na esfera de disponibilidade do devedor, não ser caracterizado como meio a criar óbice à efetividade do processo. Nesse particular, no que pese a decisão do C. STJ, no REsp. no 1.059.781/DF105, o referido julgado deve ser visto com reservas.

Conforme análise de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL interposto por MICHELA CRISTINA LOPES FIGUEREDO, em face da decisão de fls. 17-19-TJ, da lavra do MM.Juiz da primeira instância, Dr. Marcelo Carlos Cândido que, nos autos da "AÇÃO DE EXECUÇÃO", indeferiu o pedido de desbloqueio dos valores constantes do Detalhamento de Ordem Judicial de Bloqueio de Valores, no que tange à conta existente no Banco do Brasil[36].

Não há dúvidas acerca da redação insculpida no art. 649, IV, do CPC, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 11.382/2006, pelo qual se estabelece serem absolutamente impenhoráveis as remunerações-proventos recebidos pelo devedor. Na exegese do art. 649, IV do CPC, percebe-se que o legislador, ao acometer a determinados bens o caráter de impenhorabilidade, preocupou-se em limitar a busca desenfreada da satisfação do débito, em detrimento da mínima dignidade humana do devedor-executado. Importante ressaltar, por outro lado, que o fundamento do dispositivo, ao estabelecer a impenhorabilidade sobre o salário, é a de garantir a subsistência do trabalhador, residindo, portanto, na sua própria natureza alimentar. Ora, considera-se que os valores obtidos a título de salário e vencimentos são impenhoráveis somente nos limites do eventual comprometimento da receita mensal necessária à subsistência do devedor e de sua família. In casu, restou comprovado, consoante cópias do extrato bancário (fls. 21/TJ), que a remuneração mensal da agravante é depositada na conta corrente em que foram bloqueados os valores e que a mesma aufere mensalmente a quantia de R$ 2.050,54. Por outro lado, não há nos autos qualquer comprovante de suas despesas, bem como inexiste notícia acerca de eventuais dependentes seus, defluindo dos autos, inclusive, que trata-se de pessoa divorciada e independente. Se isso não bastasse o juízo singular salientou em sua decisão que o "extrato da conta corrente, onde se verifica a existência de diversos outros depósitos como créditos, inclusive com transações de origem exterior e aplicações em poupança", não tendo a agravante instruído o presente recurso com documentos capazes de desconstituir tal assertiva. Daí que, a solução justa, e que atende à equidade contratual e os princípios fundamentais do sistema jurídico brasileiro, está em limitar o comprometimento da verba salarial a patamar razoável, ou seja, há que se buscar o justo ponto de equilíbrio entre os interesses em conflito, que, ao meu sentir, se situa na fixação de um patamar de retenção que permita a amortização do débito, sem o comprometimento do sustento e manutenção da agravante. Neste aspecto, considerando a situação econômica da recorrente, bem como, o valor da parcela a ser constrita, aplicando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo pela possibilidade do bloqueio/penhora de até 30% (trinta por cento) do salário do devedor, em função da segurança das relações jurídicas e para se evitar a inadimplência, percentual este que não irá causar-lhe prejuízo no que diz respeito ao suprimento de suas necessidades básicas (MINAS GERAIS, TJ, 2014).

 

            Há, com efeito, nessa decisão, a título de exemplo a verificação da possibilidade de que ocorra a Penhora “on line” de conta salário desde que não vem contrariar Princípios Constitucionais Fundamentais. Ademais, buscou-se a interpretação análoga do art. 1º, I, da Lei 10.820/2003[37], analogia júris, observado os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, observando, sobretudo, a questão de não privilegiar a inadimplência do devedor, optou-se em penhorar em 30% do salário líquido, ressalvados os valores referentes à subsistência do executado.

Acórdãos do STJ veem decidindo, também, que o valor depositado em conta conjunta pode ser penhorado em garantia de execução, ainda que somente um dos correntistas seja o responsável pelo pagamento da dívida. Os ministros da 2ª Turma entenderam que se o valor pertence somente a um dos correntistas, não deve estar nesse tipo de conta, pois nela o dinheiro perde o caráter de exclusividade. Em outras decisões, os ministros da 1ª Turma entenderam que o ônus de comprovar a indispensabilidade dos valores depositados é do executado. Pelo Código de Processo Civil (CPC), a execução se processa no interesse do credor, que tem a prerrogativa de indicar bens à penhora. Na ordem preferencial, prevalece o dinheiro, depósito ou aplicações financeiras. De acordo com a 1ª Turma, compete ao executado comprovar que as quantias depositadas em conta corrente são impenhoráveis, isto cabendo a outra parte que conjuntamente seja possuidor da conta[38].

Entende-se, portanto, que há possibilidades de que valores previstos no Código de Processo Civil, tidos como impenhoráveis, sejam observados os princípios da dignidade humana, da razoabilidade e proporcionalidade. Por outro lado, tendo por analogia lei infraconstitucional que assegura a obtenção do trabalhador de créditos consignados em descontos em pagamento mensal reconhecidamente “o salário para sua subsistência”. Esclarecido esse ponto, observa-se que essa situação alcança também o cônjuge ou terceiro que possua conta bancária conjunta com o devedor. Haja vista, que esse deverá comprovar que a Penhora “on line” de parte dos valores em instituição financeira tratam-se de importância destinada a suprir sua mínima subsistência.

Isto posto, sob certo prisma de entendimento, a mera constituição de conta corrente conjunta não é suficiente para impor a responsabilidade de ambos os titulares pelo débito fiscal do qual apenas um figura como devedor, uma vez que segundo o art. 265 do Código Civil[39], a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes. - Não restando comprovado que o enriquecimento proporcionado pelo débito fiscal do executado aproveitou ao casal, conforme enuncia a Súmula 251 do STJ[40], não há que se entender pela solidariedade da embargante para responder com numerário em conta bancária conjunta por débito de seu cônjuge. Assim sendo, e à luz do que doutrinária e legalmente até se discutiu resta analisar sumamente os limites da Penhora “on line” em contas salários ou conjuntas.

 

3.2 LIMITES DA PENHORA “ON LINE” EM CONTAS SALÁRIOS OU CONJUNTAS.

É oportuno, portanto, entender que a regra contida no Princípio da Menor Onerosidade da Execução, nos termos do art. 805, § Único, do CPC/2015, devendo proteger ao devedor naquilo que configurar algum tipo de abuso de direito do credor que na opção pelo meio mais gravoso não prejudique ao devedor ao invés de obter sua prestação jurisdicional. Ao tratar desse tema Souza (2014, p. 306) diz que isto não significa que dê direito ao devedor de ficar imune ao cumprimento da obrigação da prestação jurisdicional e ser beneficiado com a redução de valores ou isenção da dívida.

 

É claro que com base nesse princípio, outro a ser observado é o da proporcionalidade o qual tem fundamental importância para dirimir os conflitos aparentes existentes entre princípios, conforme salienta Souza (2014, p. 308) quando afirma que “a exemplo do que ocorre no bloqueio da conta bancária do devedor, por meio eletrônico (penhora on-line), principalmente nos ativos financeiros da sociedade empresária, impossibilitando-a de dar continuidade às suas atividades. Esse fato demonstra a colisão aparente entre princípios, ou seja, o princípio da efetividade do processo judicial, diante do bloqueio on-line em dinheiro na conta bancária do ativo da empresa, confrontando com o princípio da menor onerosidade do devedor na execução e, consequentemente, o princípio da dignidade da pessoa humana, dependendo do caso concreto a ser analisado”.

Doutrina de Humberto Theodoro Júnior[41] apresenta a tese de que a verba salarial, ao entrar na esfera de disponibilidade do devedor, perde o caráter de alimentos pelo fato de não ter sido consumida integralmente para o suprimento de necessidades básicas, em razão de não se estabelecer definitivamente o que vem a ser “necessidade básica”, em determinada circunstância para o devedor. Não se restringindo, assim, a aplicação da Penhora “on-line” na verba que não seja caracterizada de caráter alimentar, configurando-se excedente daquela verba salarial.

Para Souza (2014, p. 314) além do consumo integral da verba salarial para suprir a sua necessidade básica, “[...] pode o devedor reservar um valor razoável para poder se socorrer no futuro, diante de uma situação econômica difícil”, a exemplo dos motivos que são elencados na impenhorabilidade da caderneta de poupança até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos.

Diante do entendimento de que a verba salarial, ao entrar na esfera de disponibilidade do devedor, perde o caráter alimentar, para Souza (2014. P. 314) “[...] deve o operador do Direito fazer uma análise profunda sobre os meios de provas pertinentes à situação fática a ser analisada, a fim de evitar a criação de uma situação antagônica de valores, perante o mesmo fato, ou seja, enquanto o valor no limite de até 40 (quarenta) salários mínimos depositados em caderneta de poupança é considerado impenhorável pela lei”.

Cita-se como exemplo, caso em que o valor excedente da verba salarial mensal, “equivalente a 20 (vinte) salários mínimos pode ser objeto de penhora, desde que seja o único rendimento do devedor e depositado o valor em conta salário, o que demonstra antagonismo no critério adotado para descaracterizar a verba salarial depositada em conta bancária. No exemplo ora mencionado, os valores equivalentes até 40 (quarenta) salários mínimos não podem ser penhorados em caderneta de poupança, enquanto que o valor equivalente até 20 (vinte) salários mínimos pode ser objeto de penhora, desde que se trate de conta salário” (SOUZA, 2014, p. 314).

Apesar de a lei amparar o devedor no processo judicial, excluindo a penhora em dinheiro na conta bancária, proveniente de salário, para o devedor fazer jus à impenhorabilidade do seu salário[42][43] diz Souza (2014, 315) “[...] deverá provar, nos autos, que o saldo positivo existente na conta bancária é proveniente da sua renda salarial, soldo ou remuneração. Não basta o devedor apenas argumentar para obter êxito na sua pretensão. Deverá comprovar. Por outro lado, há quem entenda que, mesmo se tratando de conta salário, dependendo do caso concreto, os valores existentes na conta bancária podem ser penhorados, eis que a partir do depósito os valores perdem característica de salário”, o que para o autor podem ser penhorados, também, valores depositados em conta salário sem a comprovação da sua procedência.

Entretanto, o que se percebe, mais uma vez, é a aplicação do princípio da efetividade do processo, confrontando com o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da menor onerosidade do devedor. Sabemos que a aplicação dos princípios não é uma regra absoluta, devendo prevalecer aquele que esteja de acordo com as exigências do bem comum e os fins sociais aos quais a lei se destina, dependendo do caso concreto a ser analisado.

Segundo o Código de Processo Civil de 1973 nos termos do art. 649, do e seus incisos e parágrafos há um rol de causas denominadas de impenhorabilidade no processo de execução. Para o presente trabalho interessam as causas previstas nos incisos IV, VI e X, bem como a regra prevista no parágrafo 2o, do referido artigo, que, respectivamente, trata dos vencimentos, subsídios, soldos, salários, remuneração, proventos de aposentadoria, pensões e pecúlios. Essas quantias recebidas e destinadas ao sustento do devedor e sua família o texto legal é taxativo em afirmar que são impenhoráveis, porém, doutro lado, essa afirmação e prática não é absoluta.

Segundo Souza (2014, p. 316) essa impenhorabilidade prevista no art. 649, do Código de Processo Civil, de 1973, hoje, previsto no CPC/2015, art. 833[44], visa atender ao princípio da dignidade da pessoa humana, em consonância ao que estabelece o art. 1o, inciso III, da Constituição Federal. Esse artigo, agora, estabelecido no CPC/2015 para esse autor “[...] tem aplicação até mesmo para a proteção do devedor de alimentos que sofre a constrição judicial, com o bloqueio on-line de valores na conta bancária provenientes de salário ou remuneração, tendo em vista que o devedor de alimentos não pode ficar sem o mínimo de condições para a sua subsistência” (SOUZA, 2014, 316).

No entanto, deve-se ter cautela na interpretação da aplicação desse dispositivo do CPC/1973 (doravante o art. 833, do CPC/2015), inciso IV, do CPC, sobre a possibilidade ou não de se penhorar provento salarial do devedor em execução judicial. Parece perigoso diante da jurisprudência vigente, ficar restrito ao silogismo dogmático, a fim de decidir observando apenas a interpretação literal do dispositivo infraconstitucional. O que pode proporcionar uma decisão injusta. Uma coisa é fato, o intérprete, em relação a essas circunstâncias, deve-se socorrer a uma interpretação prática, objetivando atingir aos fins sociais a que a lei se destina, amoldando-a ao caso concreto, almejando atingir ao padrão mínimo de subsistência do executado.

O referido artigo do CPC, seja o de 1973 ou CPC de 2015, no seu parágrafo 2º, descreve uma exceção à impenhorabilidade da importância pecuniária proveniente da renda menciona(s) no inciso IV. É mister lembrar que Souza (2014, p.318) de que “[...] a impenhorabilidade não se aplica aos casos referentes ao pagamento de prestação alimentícia, cuja regra se compatibiliza com a proporcionalidade na aplicação de conflito aparente entre o princípio da menor onerosidade para o credor e o princípio da dignidade da pessoa humana, voltado para amparar o alimentando, que se encontra em situação desconfortável na obtenção de meios necessários para a sua sobrevivência, sem, portanto, desprover o devedor por completo dos meios necessários para a sua subsistência”.

Ao retomar a questão da Penhora “on line” em conta corrente conjunta (Grifo Nosso) pode-se citar que a jurisprudência vem entendendo que em casos de conta corrente conjunta existe solidariedade apenas entre os titulares da conta e o Banco, em virtude do contrato firmado, não havendo que se falar em responsabilidade solidária entre cada um dos titulares da conta conjunta com terceiros. Desta feita, se um dos titulares da conta conjunta assume dívida com terceiro, o outro titular não se torna codevedor[45].

Nesse sentido, jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça descreve:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. BLOQUEIO DE VALOR DEPOSITADO EM CONTA CONJUNTA. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE 50% DO NUMERÁRIO. NÃO OCORRÊNCIA DE SOLIDARIEDADE PASSIVA EM RELAÇÃO A TERCEIROS. 1. A conta bancária coletiva ou conjunta pode ser indivisível ou solidária. É classificada como indivisível quando movimentada por intermédio de todos os seus titulares simultaneamente, sendo exigida a assinatura de todos, ressalvada a outorga de mandato a um ou alguns para fazê-lo. É denominada solidária quando os correntistas podem movimentar a totalidade dos fundos disponíveis isoladamente. 2. Na conta conjunta solidária prevalece o princípio da solidariedade ativa e passiva apenas em relação ao banco - em virtude do contrato de abertura de conta-corrente - de modo que o ato praticado por um dos titulares não afeta os demais nas relações jurídicas e obrigacionais com terceiros, haja vista que a solidariedade não se presume, devendo resultar da vontade da lei ou da manifestação de vontade inequívoca das partes (art. 265 do CC). 3. Nessa linha de intelecção, é cediço que a constrição não pode se dar em proporção maior que o numerário pertencente ao devedor da obrigação, preservando-se o saldo dos demais cotitulares, aos quais é franqueada a comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, sendo certo que, na ausência de provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em partes iguais. 4. No caso, a instância primeva consignou a falta de comprovação da titularidade exclusiva do numerário depositado na conta bancária pela recorrida. Contudo, não tendo ela participado da obrigação que ensejou o processo executivo, não há se presumir sua solidariedade com o executado somente pelo fato de ela ter optado pela contratação de uma conta conjunta, a qual, reitera-se, teve o objetivo precípuo de possibilitar ao filho a movimentação do numerário em virtude da impossibilidade de fazê-lo por si mesma, haja vista ser portadora do mal de Alzheimer. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1184584 / MG - Ministro Luis Felipe Salomão - 4ª Turma - Dje.: 15/08/2014) (MINAS GERAIS, TJ, 2014).

 

Vê-se, pois, que após toda a colocação teórica debatida que a mera constituição de conta-corrente conjunta não é suficiente para impor a responsabilidade de ambos os titulares pelo débito do qual apenas um figura como coobrigado, uma vez que segundo o art. 265, do Código Civil, já mencionado, neste trabalho, a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.

 

4 CONCLUSÃO

Neste trabalho discutiu-se o tema sobre a constrição judicial, por meio eletrônico, ou seja, e-mail por meio da rede mundial de computadores, de valor em pecúnia (dinheiro), pertencente ao executado, depositado em conta bancária ou outras aplicações em instituição financeira, cujo procedimento é denominado “penhora on-line”.

O propósito do trabalho foi discorrer sobre uma síntese histórica quanto ao surgimento na execução do instituto da Penhora e, consequentemente, tempos depois da Penhora “on line” que trata-se de uma modernização do judiciário, a fim de atender ao comando constitucional quanto ao razoável tempo na prestação jurisdicional, no caso, em questão, ao credor (exequente) ao possibilitara realização dos atos constritivos, por meio eletrônico, proporcionando a efetividade do processo de execução, no âmbito do processo civil. A conceituação e finalidade desses institutos no processo de execução, bem como, sem um maior aprofundamento verificar quais são as possibilidades e limitações na aplicação da Penhora “on line” em crédito de conta salário e conta bancária conjunta.

Donde se conclui que a penhora “on line” representa um avanço importantíssimo na sistemática processual civil vigente, constituindo um mecanismo econômico, ágil e eficaz para a proteção dos direitos do credor. Essa penhora proporcionou e continuará efetivando a celeridade da justiça. Isto assente, surgem os questionamentos deve prevalecer o direito do credor tendo o seu crédito ou do devedor, quanto à questão de abusos e/ou excessos e menos oneroso? Na realidade, limites e possibilidades, sempre existirão.

Certo é que a execução deve manter-se sempre útil ao credor, não sendo aceitável, contudo, ao nosso ver, levar o devedor a uma situação incompatível com sua realidade ao desconsiderando à sua dignidade de pessoa humana. Não é, por acaso, que a jurisprudência vem decidindo quanto a indisponibilidade de conta salário e conta conjunta. Em geral, para a conta salário estipulou-se um percentual de 30% do valor depositado para ser destinado ao abatimento da divida ou sua quitação, garantindo-se a mínima subsistência do devedor. Da mesma forma, o cônjuge ou terceiro que possua conta conjunta, ressalvado, provas produzidas, esse não terá sua cota parte 50% penhorada. Salientando essas questões, não é possível desconsiderar a importância da Penhora “on line”.

Negar sua aplicação no bloqueio de dinheiro em depósito ou em aplicação em instituição financeira é totalmente improvável e um terrível retrocesso ao que dispõem a Constituição Federal ao consagrar o Princípio da Celeridade e do Princípio da Menor Onerosidade estatuído em lei processual civil.

Lembrando sempre, que o direito à penhora “on line” é um direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, no que o referido instrumento deve ser direcionado na promoção de um processo de execução célere e eficaz, ao proporcionar a satisfação do crédito, o que, bem ver que não ofende o Princípio da Menor Onerosidade da Execução, nem tampouco, a direitos fundamentais.

Contudo, há necessidade, tão-somente, de observar o necessário equilíbrio entre a celeridade processual e a justa prestação jurisdicional, sem contudo, custar-nos crer na observância pela justiça dos Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade, para que propicie a segurança jurídica ao credor e ao executado. Considerando sempre e oportunamente as possibilidades e limitações da aplicação desse instituto do processo de execução.

 

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Sobre o autor
Alberto Luiz Alves

da Reserva da Polícia Militar de Minas Gerais. Especialista em Segurança Pública pela Escola de Governo de Minas Gerais. Especialista em Gestão Estratégica em Segurança Pública pela Escola de Governo de Minas Gerais. Especialista em Comunicação Social pela Universidade Newton Paiva. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS). Especialista em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS). Professor de Direito Penal e Processo Penal Comum e Militar. Professor de Direitos Humanos e Direito Constitucional. Professor de Comunicação Social.

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