Ventos de extrema direita

15/11/2019 às 11:29
Leia nesta página:

O artigo remete à memória as ideias dos pensamentos fascista e integralista e ainda lembra a antiga Aliança Renovadora Nacional que deu sustentação ao regime militar.

Os filhos do presidente Jair Bolsonaro Flávio e Eduardo divulgaram as redes sociais do partido Aliança pelo Brasil, que o clã pretende criar. Nos perfis do projeto de legenda, três palavras aparecem seguidas: “Deus”, “pátria” e “família”. Juntas, elas formam o lema da Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento conservador, ultranacionalista, com viés fascista e fundado na década de 1930.

integralismo é um movimento partidário, com posicionamento político de extrema-direita com inspiração fascista que surge sob idealização de Plínio Salgado, líder e organizador do Partido que recebe o nome “Ação Integralista Brasileira”. Sob o lema de “Deus, Pátria e Família” Plínio Salgado lançou o Manifesto da AIB em outubro de 1932.

O Integralismo de Plínio Salgado configurou-se como o maior movimento nacionalista da história do Brasil, o primeiro a aceitar negros e mulheres, um movimento verdadeiramente nacionalista, anticomunista e antiliberal que, sob o lema "Deus, pátria e família", conseguiu reunir setores da classe média e intelectuais. Os milicianos obedeciam a uma série de regulamentos, entre os quais o uso de uniformes (camisas-verdes) e da saudação Anauê, uma saudação em língua tupi.

O símbolo do Integralismo é a letra grega Sigma (∑) simbolizando a máxima do movimento que buscava a integração da sociedade brasileira. A partir da integração da família como menor instituição da sociedade e tendo o Estado forte para tomada do eixo, a sociedade se integraria e o Brasil se fortaleceria.

O lema do Integralismo “Deus, pátria e família” serve como ponto de partida para se entender as propostas do movimento que ficou conhecido como o fascismo brasileiro.

A palavra “Deus” indica a influência religiosa cristã dos integralistas, estando a figura divina em primeiro lugar e ocupando o cimo da estrutura hierárquica social, como era entendido pelos integralistas, já que era Deus “que dirigia o destino dos povos”.

A pátria era definida pelos integralistas como “nosso lar”. A pretensão era apresentar uma unidade da população brasileira dentro do território, principalmente como uma contraposição à divisão da sociedade em classes. Os integralistas pretendiam alcançar essa unidade através da constituição de um Estado integral, que harmonizaria os diferentes interesses existentes no seio da sociedade.

Por fim, temos a família como a menor unidade de organização social dentro da proposta integralista. A família seria o “início e fim de tudo”, a garantia da manutenção da tradição, veiculada através dessa forma de organização social.

As ideias integralistas chegaram ao Brasil nos anos 30 com repercussão entre as camadas médias urbanas e intelectuais do país. O integralismo brasileiro não apenas contrapôs-se às instituições liberais, que desde a Proclamação da República vigoravam na ordem política nacional, mas também combateu o nascente movimento comunista.

A base das ideias do integralismo no Brasil é o fascismo italiano.

Já em 1922 surgiu, com clara inspiração fascista, a Legião Cruzeiro do Sul. Os movimentos posteriores, como o Partido Nacional Fascista/Ação Social Brasileira de J.. Fabrino, a Legião Cearense do Trabalho, o Partido Nacional Sindicalista de Olbiano de Mello, o Partido Fascista Brasileiro, a Ação Imperial Patrianovista Brasileira e a Legião 3 de Outubro também tiveram, ao lado de um enraizamento no clima intelectual brasileiro, uma inspiração – que era expressa diretamente em seus manifestos e que, obviamente, variou de movimento para movimento – na Itália de Mussolini. Nesse ponto, concordamos com Carone quando ele identifica, no Brasil dos anos 20, duas correntes de pensamento e ação de extrema direita que se interligavam: a fascista italiana e as pequenas tentativas de criação de um Fascismo indígena. A influência italiana nesse momento estava, pois, mais que clara.

Essa situação de inspiração num referencial externo foi não apenas mantida, como ampliada no pós 1932, período em que surgiu a Ação Integralista Brasileira. Não era esse certamente o momento para rediscutir em profundidade as influências do Fascismo italiano na ideologia integralista ou fazer comparações pontuais entre elas. Era impossível não reconhecer no Integralismo, porém, uma série de influências do Fascismo italiano e também de outros movimentos fascistas europeus. Essas influências passavam especialmente pelo campo ideológico, como a doutrina corporativa, a descrença na democracia, a priorização do Estado em relação à sociedade, etc., mas também se manifestavam em itens aparentemente secundários, como a mística e a simbologia, em que eram evidentes as influências do Fascismo italiano na mitologia do líder, na coreografia das grandes manifestações, na doutrinação da juventude (na qual a organização dos "plinianos" se assemelhava notavelmente à dos "balilas" italianos), etc.

O fascismo, eminentemente nacionalista, apresentou-se com as características do velho cesarismo romano, sonhando com o restabelecimento das glórias do passado imperial. Mas radical do que o bonapartismo, amparou-se na teoria do poder absoluto, segundo a fórmula do Leviatã de Hobbes. Não obstante tivesse antecedido uma ideologia própria, um sistema político especialíssimo, e sobretudo, uma teoria original de soberania e de justificação do Estado que Mussolini e Rocco assim enunciaram: “La dotrina fascista nega il dogma dela sovranità populare, che é ogni giorno smentido dela realità, e proclama in sua vece il dogma dela sovranità dello Stato.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O fascismo tinha uma forma peculiar de sustentação política: O Estado é criador exclusivo do direito e da moral; os homens não têm mais do que o direito que o Estado lhes concede; o Estado é personificado no partido fascista e este não encontra limites morais ou materiais à sua autoridade; todos os cidadãos e seus bens lhe pertencem; os opositores são considerados como traidores e sujeitos à justiça que é controlada pelo órgão executivo.

A nação, segundo a Carta de Lavoro, de 1927, “é a unidade moral, política e econômica, que se realiza integralmente no Estado fascista”. E o Estado é a reunião formada pela série infinita de gerações passadas, presentes e futuras, superando os indivíduos, com vida, fins e meios de ação superiores, no poder e na duração, ao das pessoas que o compõem”.

Para Mussolini a nação não é um elemento integrante do Estado. Ao revés, é criada  pelo Estado cabendo a este dar ao povo consciente da sua unidade moral, uma vontade, consequentemente, uma existência efetiva. O Estado é absoluto como dizia Hegel.

Assim para essas ideias o partido que assume o poder não é um órgão de representação política, mas depositário único da confiança nacional e o intérprete exclusivo da vontade do povo. Por isso mesmo, o fascismo não admitia nem tinha interlocução com outros partidos.

Surgia do fascismo o sistema corporativista.

O trabalho foi considerado um dever social. O direito de greve foi abolido e considerado qualquer movimento paredista como um crime contra a organização corporativista estatal. A liberdade do trabalhador – doutrinou Chimienti – realizava-se de uma maneira certa e institucional na igualdade de todos os trabalhadores perante a lei e na proteção e assistência social que o Estado lhe assegura.

Some-se a isso que esse partido que virá trará em seu nome a expressão aliança.

No passado, na sustentação do governo militar, tivermos a Aliança Renovadora Nacional (ARENA).

Em 27 de outubro de 1965, o Ato Institucional Número Dois que concentrou mais poderes nas mãos do Executivo, estabeleceu eleições indiretas para Presidente da República e para os governos estaduais a partir do ano seguinte e por fim decretou a extinção dos partidos políticos no país e a criação de um sistema bipartidário onde o governo seria representado pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e a oposição caberia ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB).

A ARENA foi basicamente um partido de sustentação do governo militar que houve no Brasil entre 1964 e 1985. Constituía-se num partido de direita que se colocava contra as ideias socialistas, tendo um alinhamento com as propostas americanas no combate ao comunismo.

 Do que foi dito observa-se que as visões de extrema-direita integrantes do partido que se quer fundar estão diametralmente opostos às diretrizes, princípios e normas da Constituição de 1988, uma Constituição-cidadã, de perfil eminentemente democrático que não se atrela a ideias que repugnam à democracia.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos