Resumo: O ordenamento jurídico tipifica as condutas de dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção relativamente ao sufrágio. Trata-se do crime de corrupção eleitoral, insculpido no art. 299 do Código Eleitoral. O legislador pátrio procura, deste modo, proteger a livre manifestação de vontade do eleitor aquando da realização das eleições, resguardando, assim, a legitimidade dos resultados alcançados nas urnas. Em caso do descumprimento da norma, aplicam-se sanções que respeitam desde a privação de liberdade à aplicação de multa ao agente infrator. Portanto, a conduta dos candidatos que compram o voto – corrupção ativa, como a dos eleitores que o vendem – corrupção passiva, são merecedoras de reprimenda legal.
Palavras-chave: Código Eleitoral. Crime. Corrupção Eleitoral. Compra. Venda. Voto. Eleições. Reclusão. Multa.
Abstract: The legal system specifies the conduct of giving, offering, promising, soliciting or receiving, for oneself or others, money, gift, or any other advantage, to obtain or give a vote and to obtain or promise abstention from the suffrage. This is the crime of electoral corruption, inscribed in art. 299 of the Electoral Brazillian Code. Thus, the national legislature seeks to protect the free will of the voter when the elections are held, thus safeguarding the legitimacy of the results achieved at the polls. In the event of non-compliance with the norm, sanctions apply from the deprivation of liberty to the imposition of a fine on the offending agent. Therefore, the conduct of candidates who buy the vote - active corruption, like that of voters who sell it - passive corruption, deserve legal reprimand.
Keywords: Electoral Code. Crime. Electoral Corruption. Purchase. Sale. Vote. Elections. Confinement. Fine.
Sumário: Introdução. 1. Da natureza jurídica dos crimes eleitorais. 2. Do delito de corrupção no Código Penal. 3. Do crime de corrupção eleitoral. 4. Da recente jurisprudência do colendo Tribunal Superior Eleitoral. Conclusão. Referências.
Introdução
Antes de tudo o mais, apontemos que a República Federativa do Brasil, constituída em um Estado Democrático de Direito, tem como princípios fundamentais a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e, por fim, o pluralismo político.
Dito isto, tem-se que a Constituição Federal, ainda, disciplina em seu art. 1º, parágrafo único, que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 1988). Seguindo neste diapasão, põe-se o art. 14 da Carta Magna privilegiando a soberania popular, a ser exercida pelo “sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”, mediante plebiscito, referendo ou iniciativa popular (BRASIL, 1988). Sobre o sufrágio universal propriamente dito, temos a apontar que foi recebido pela Constituição da República, o Código Eleitoral, instituído pela Lei nº. 4.737, de 15 de julho de 1965, retratando, claramente, a preocupação do legislador infraconstitucional em garantir a livre manifestação de vontade do eleitor, de acordo com sua consciência cívica.
Ante o elenco de máculas impostas no comprometimento da livre manifestação da vontade do eleitor, cuidou o Código Eleitoral de insculpir, então, o crime de corrupção eleitoral, mais propriamente em seu art. 299, de maneira que, um vez conformada a prática ilícita, com fulcro na garantia da democracia participativa, impõem-se sanções que respeitam desde a aplicação da pena de privação de liberdade como a aplicação de multa ao agente infrator, nos termos da lei e isto de modo a resguardar-se como bem jurídico aqui, a expressão volitiva do eleitor, exigindo o dispositivo legal apontado apenas a ocorrência das ações trazidas nele (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção relativamente ao sufrágio), com o objetivo espúrio de cooptar o voto, gerando influência sobre a liberdade de votar, quando sequer é necessário mensurar-se a potencialidade lesiva do ato praticado neste sentido para se o abjetar.
Ademais, o tema é absolutamente atual dado que a corrupção eleitoral, exatamente nos termos que a temos aqui parametrizada, assola o Brasil, imputando a degenerescência da representação política que termina por não reverberar da vontade do povo, esteja a Constituição da República fundada também nela.
1. Da natureza jurídica dos crimes eleitorais
Quanto à natureza jurídica dos crimes eleitorais, ainda se não pode tomar por pacífica a doutrina, sendo possível identificar-se de pronto duas correntes, sendo que para uma delas, inclusive, os crimes eleitorais teriam natureza de crime político e não apenas natureza de crime comum como defende a outra.
Ora, embora a Constituição Federal faça referência expressa ao crime político propriamente dito, coube ao Supremo Tribunal Federal a tarefa de o definir e guiar o intérprete na fixação de seus contornos jurídicos. Assim, para o Pretório Excelso, crime político são os tipos penais descritos na Lei nº. 7.170/83, mais conhecida como Lei de Segurança Nacional – LSN, a que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, e estabelece seu processo e julgamento, sendo de se destacar que em se tratando de crime político, dessarte, a “materialidade da conduta deve lesar real ou potencialmente ou expor a perigo de lesão a soberania nacional, de forma que, ainda que a conduta esteja tipificada no artigo 12 da LSN, é preciso que se lhe agregue a motivação política” (BRASIL, 2000).
Pela valoração do mote político, filiam-se a esta corrente Nélson Hungria (1958, p. 187), tanto ressalte que os crimes eleitorais “são dirigidos, subjetiva e objetivamente, de modo imediato, contra o Estado como unidade orgânica das instituições políticas e sociais” e, também, Aristides Junqueira (1978, p. 21), ao precisar que os crimes eleitorais são caracteristicamente políticos, “força convir que a colaboração do indivíduo na atividade estatal por meio do voto representa, em última análise, antes que um direito individual, uma função orgânica do próprio Estado”. Merecem destaque os posicionamentos: de Suzana de Camargo Gomes (2010, p. 37), para quem “não é possível deixar de enquadrar os crimes eleitorais como espécie dos crimes políticos, posto que as condutas delituosas atingem justamente as instituições democráticas, desvirtuando-as”; de Fávila Ribeiro, quem sustenta que os crimes eleitorais assumem a roupagem de crimes políticos, uma vez que afetam “primordialmente instituições democráticas consagradas pelo Estado” (1998, p. 623); e o posicionamento de Vera Maria Nunes Michels, seja dela a afirmação de que o ilícito eleitoral deriva “da subdivisão dos crimes políticos, sendo, portanto, sua natureza jurídico política, pois, como se sabe, os crimes eleitorais são cometidos contra a ordem política e social” (2006, p. 163).
De todo modo, estira-se em antinonímia uma segunda corrente, quando já não se dá à valorização do percentual político enquanto liame para a prática criminosa, sendo, então, os crimes eleitorais trabalhados pela doutrina sob a consciência de que se tratam, simplesmente, de crimes comuns, ou seja, praticados por qualquer pessoa física. Nesta linha de raciocínio, os ensinamentos de Marcos Ramayana, ressaltando que os delitos eleitorais:
(...) atingem não a organização política do Estado de forma direta, mas a organização do processo democrático eleitoral, atingindo os direitos públicos políticos subjetivos ativos e passivos e a ordem jurídica da relação pública da legitimidade política dos mandados eletivos (RAMAYANA, 2006, p. 448).
Neste lado, também, temos a abalizada doutrina de José Jairo Gomes. Para Gomes, “os ilícitos eleitorais visam resguardar bens e valores clara e especificamente definidos em lei”, como, por exemplo, a lisura do processo eleitoral, e não “coibir a desestruturação ou a desarticulação da organização política do Estado seja do ponto de vista interno, seja do externo” (GOMES, 2016, p. 11).
E, ainda, filiado à segunda corrente, Rodrigo López Zilio, destacando que:
Assim, quando a Constituição Federal adota a expressão “crimes comuns”, na parte relativa à competência, deve-se estender a abrangência dessa locução para os crimes eleitorais – não importa em qual legislação estejam previstos (seja no Código Eleitoral ou em leis extravagantes) (ZILIO, 2017, p. 18).
Neste mesmo sentido, remansosa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, in verbis:
PENAL. PROCESSO PENAL. INQUÉRITO. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. ART. 1º, I, DA LEI 8.137/90. CRIME MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. CRIME ELEITORAL. ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. RECEBIMENTO. CRIME COMUM. COMPETÊNCIA DO STF. ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONDIÇÕES DE AMPLA DEFESA.
I - Cabe ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar membros do Congresso Nacional por crimes comuns, os quais alcançam os crimes eleitorais.
II - Crime material. A ausência de processo administrativo fiscal impede o recebimento da denúncia quanto ao crime contra a ordem tributária.
III - Crime de falso eleitoral. Registro de valores substancialmente inferiores aos efetivamente utilizados em campanha à Justiça Eleitoral.
IV - Alegações da defesa preliminar que não afastam, de pronto, as acusações imputadas. A comprovação da materialidade delitiva e a suficiente exposição dos fatos tidos por criminosos permitem o exercício da ampla defesa.
V - O recebimento da denúncia é mero juízo quanto à procedibilidade da ação, e não quanto à formação da culpa.
VI - Denúncia recebida em parte.
(STF – INQ. Nº. 1872/DF – PLENO – MIN. RICARDO LEWANDOWSKI – DJ 20-04-2007, P. 508-522) (d.n.)
- Inquérito. 2. Parlamentar federal. 3. Denúncia por crime eleitoral oferecida em primeiro grau. 4. Recebimento da denúncia por magistrado eleitoral. 5. Incompetência do Ministério Público para apresentar a denúncia e do Juiz Eleitoral para recebê-la. 6. Enquadram-se os crimes eleitorais entre os crimes comuns. 7. Competência originária do STF (CF, art. 102, I, letra "b"). 8. Incidência do art. 53, § 1º, da Constituição. 9. Habeas Corpus, de ofício, concedido para anular a denúncia e seu recebimento bem assim o processo, desde a denúncia inclusive. 10. Após, os autos devem ser encaminhados à Procuradoria-Geral da República, conforme por ela requerido.
(STF – INQ. Nº. 1391/PR – PLENO – MIN. NÉRI DA SILVEIRA – DJ 23-06-1999) (d.n.)
Conforme se põe, diante do atual sistema jurídico brasileiro, valora-se os crimes eleitorais enquanto crimes comuns, exatamente como se verifica, inclusive, ante a Suprema Corte Federal.
2. Do delito de corrupção no Código Penal
No título XI do Código Penal, que aborda os crimes praticados contra a Administração Pública, destaca-se o delito de corrupção, tanto em sua modalidade passiva, quanto na ativa.
O crime de corrupção passiva está insculpido no art. 317, in litteris:
Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa (BRASIL, 1940).
A conduta delitiva, acima transcrita, consiste em solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida, para si ou para outrem, em razão do exercício de função pública, ainda que fora dela ou antes de assumi-la, mas, sempre, em razão desta.
Assim, temos como bem jurídico protegido a moralidade e a probidade da função pública junto à Administração Pública, razão pela qual somente quem é funcionário público pode ser o sujeito ativo do delito.
Quanto ao conceito de funcionário público para fins do Direito Penal, Cézar Roberto Bitencourt o define como sendo o indivíduo que “embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública” (BITENCOURT, 2010, p. 243).
Lado outro, são sujeitos passivos deste crime a União, os Estados, o Distrito Federal e os Município, além das entidades de direito público e, eventualmente, o particular lesado.
No tocante a vantagem indevida – vantagem presente ou futura não amparada pelo ordenamento jurídico, Bitencourt afirma que “não é qualquer oferta, qualquer regalo ou qualquer mimo que terá idoneidade material ou, se preferirem, relevância social de forma a lesar o bem jurídico tutelado materializando a tipicidade do crime de corrupção” (BITENCOURT, 2010, p. 114).
Neste sentido, também, Hungria assevera:
Deve notar-se, porém, que as gratificações usuais, de pequena monta, por serviços extraordinários (não se tratando, é bem dever, de ato contrário à lei), não podem ser consideradas material de corrupção. Também não se entendem como tal as tradicionais ‘boas festas’, de Natal ou Ano Novo, aos carteiros ou lixeiros. Não incorrem igualmente na censura penal as dádivas em galardão de um mérito excepcional, as quais, como diz Manzini, ‘são símbolos morais, expressos materialmente, e não equivalentes econômicos’. (HUNGRIA, 1959, p. 370-371).
Ademais, cumpre ressaltar, que a doutrina não é uníssona quanto a necessidade da vantagem indevida ter natureza econômico-patrimonial. Para uma corrente minoritária, a qual se filia Hungria, a dádiva solicitada, recebida ou prometida, há de ter caráter patrimonial. Entretanto, uma segunda corrente, majoritária, destaca que a vantagem indevida não precisa ter, necessariamente, valor econômico, podendo ser, inclusive, de natureza moral. Esta é a posição adotada por Luiz Regis Prado:
(...) embora para alguns a vantagem deva ser de natureza patrimonial, acolhe-se aqui o entendimento de que sua acepção deve ser entendida em sentido amplo, já que o funcionário pode se corromper traficando com a função, sem que a retribuição almejada tenha necessariamente valor econômico (PRADO, 2006, p. 379-380).
Alfim, o delito de corrupção passiva trata-se de crime próprio – praticado apenas por funcionário público. Ainda, conforme abalizada doutrina de Rogério Sanches Cunha, o crime é de natureza formal nas modalidades solicitar e aceitar promessa de vantagem, consumando-se ainda que a gratificação não se concretize. Lado outro, na modalidade receber, o crime é de natureza material, exigindo efetivo enriquecimento ilícito do autor. “Admite-se a tentativa apenas na modalidade solicitar, quando formulada por meio escrito (carta interceptada)” (CUNHA, 2018, p. 833).
Já o crime de corrupção ativa encontra-se inscrito no art. 333, in verbis:
Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional (BRASIL, 1940).
A presente conduta criminosa se aperfeiçoa com a oferta ou promessa de vantagem indevida, realizada de forma espontânea pelo agente, a funcionário público que, no exercício de suas atividades, pratica, omite ou retarda ato de ofício. Entretanto, ao contrário da modalidade passiva do delito, é necessário que as hipóteses oferecer ou prometer ocorram antes da execução do ato pelo servidor público.
Em relação ao bem jurídico protegido, temos, de igual modo, a moralidade e a probidade da função pública junto à Administração Pública.
Ainda, qualquer pessoa física pode ser o sujeito ativo no delito de corrupção ativa, inclusive o próprio funcionário público, desde que agindo como particular em relação a outro servidor. Já o sujeito passivo é a Administração Pública.
Quanto a vantagem indevida no crime de corrupção ativa, esta é, nas palavras de Magalhães Noronha, “o preço do funcionário corrupto” (1995, p. 249), ou seja, será relevante quando for suficiente para corromper o servidor público, levando-o a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. Outrossim, Bitencourt destaca que “para caracterizar vantagem indevida é preciso que a ação traduza ‘comércio’ da função, isto é, deve existir mercancia da função pública” (2010, p. 243).
Além disso, cumpre destacar, que a corrupção ativa trata-se de crime de mera conduta, tendo em vista que a consumação do delito ocorre no momento em que o funcionário público tem o conhecimento da oferta de vantagem indevida pelo agente, mesmo que esta não venha a ser aceita. Ademais, é considerado crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa física; crime formal, uma vez que não exige a produção de qualquer dano à Administração Pública, bastando tão somente a oferta ou promessa de vantagem indevida a funcionário público para que pratique, retarde ou omita ato de ofício.
Finalmente, no que se refere à possibilidade de tentativa no crime de corrupção ativa, para Rogério Sanches Cunha, dependerá do modus operandi escolhido pelo corruptor:
(...) isto é, se a corrupção for praticada por meio verbal ou gestual, o crime será unissubsistente, não comportando fracionamento da execução; já na forma escrita é possível o conatus quando interceptada a comunicação, deixando de atingir o servidor destinatário por circunstâncias alheias à vontade do agente (CUNHA, 2018, p. 884).
3. Do crime de corrupção eleitoral
O crime de corrupção eleitoral – definição atribuída ao professor Nélson Hungria, encontra-se disposto no art. 299 do Código Eleitoral, in verbis:
Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:
Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa (BRASIL, 1965).
A objetividade jurídica da norma, ora analisada, está expressa no interesse do legislador em salvaguardar a liberdade de sufrágio, ou seja, garantir ao eleitor que determinado candidato seja merecedor de seu voto de acordo com a sua consciência cívica e critérios próprios, e não pelo recebimento de dinheiro, dádiva ou qualquer outro tipo de vantagem.
Desta forma, como bem destacado por Marcos Ramayana, “a lei criminaliza o aspecto mercantil da votação”, evitando-se “o comércio dos votos, o toma ‘lá dá cá’ entre candidatos e eleitores” (RAMAYANA, 2008, p. 430).
Neste sentido, também, Pedro Henrique Távora Niess, para quem “o voto não é uma mercadoria exposta à venda ou troca, mas uma premiação que deve ser conquistada após justa disputa pelas ideias e pela história de cada competidor” (NIESS, 1994, p. 128).
Quanto a descrição do crime de corrupção eleitoral, este é um delito de ação múltipla – o seu tipo penal contém várias condutas – razão pela qual o delito pode ser configurado quando da entrega, do oferecimento, da promessa, da solicitação ou do recebimento de efetiva benesse, para si ou para outrem, em troca do voto ou da abstenção, mesmo que a oferta seja recusada.
Nas hipóteses de dar, oferecer e prometer, temos configurado o crime de corrupção eleitoral ativa, uma vez que a conduta é praticada pelo agente com intuito de alcançar o voto ou a abstenção do eleitor.
Ainda, cumpre ressaltar, que para a configuração desta modalidade de corrupção eleitoral, o autor do delito não precisa ser candidato ou mesmo ter com este um vínculo. Isto porque, como já abordado, o delito de corrupção eleitoral tem natureza jurídica de crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa física, sendo admissível, também, o concurso de pessoas.
Pela pertinência, colaciona-se recente julgado do colendo Tribunal Superior Eleitoral, in litteris:
HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ELEITORAL. NOTICIA CRIMINIS ANÔNIMA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. AVERIGUAÇÕES PRELIMINARES. EXISTÊNCIA. MEDIDAS ALTERNATIVAS. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE SUA EFETIVIDADE NO CASO CONCRETO. INQUÉRITO INSTAURADO SOB A SUPERVISÃO DE JUIZ ELEITORAL. NENHUMA MEDIDA INVESTIGATÓRIA DETERMINADA CONTRA AUTORIDADE DETENTORA DE PRERROGATIVA DE FORO. PESSOA SEM PRERROGATIVA DE FORO QUE DEVE SER INVESTIGADA SOB A SUPERVISÃO DE JUIZ SINGULAR.
1. Conquanto não possa servir como parâmetro único da persecução penal, a delatio criminis anônima pode servir para dar início às investigações e colheitas de elementos acerca da possível prática de infração penal, de sorte a desencadear medidas cautelares de maior peso.
2. No caso concreto, constata-se que a comunicação anônima não foi o único dado que serviu para embasar a interceptação telefônica autorizada judicialmente, uma vez que existentes diligências prévias à medida constritiva.
3. Existência de meios investigativos alternativos às autoridades para a elucidação dos fatos à época na qual a medida invasiva foi requerida. Representação policial suficientemente fundamentada, respaldada pelo MP e deferida pelo Juízo.
4. Paciente sem prerrogativa de foro. As normas constitucionais sobre prerrogativa de foro devem ser interpretadas restritivamente, o que determina o desmembramento do processo criminal sempre que possível, mantendo-se sob a jurisdição especial, em regra e segundo as circunstâncias de cada caso, apenas o que envolva autoridades indicadas na Constituição. Precedentes do STF.
5. Possível a investigação de corrupção eleitoral restrita aos autores imediatos do delito, pois o crime pode ser praticado por qualquer pessoa, não sendo necessário, na sua modalidade ativa, seja o candidato agente da infração.
6. Ordem negada.
(TSE – HC Nº. 39073/MT – MIN. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA – DJE 27-03-2015, P. 39) (d.n.)
Lado outro, nas hipóteses de solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita, tem-se a modalidade de corrupção eleitoral passiva.
No tocante ao delito de corrupção eleitoral passiva, a doutrina é divergente quanto ao fato de a conduta ilícita somente poder se cometida por eleitor ou, também, por qualquer pessoa física.
Uma primeira corrente defende que esta modalidade de corrupção eleitoral só poderá ser praticada caso o agente seja eleitor, uma vez que o bem jurídico protegido é a liberdade de sufrágio e aquele cidadão que não é eleitor não tem o direito ao voto, tratando-se, portanto, de crime impossível.
Merece destaque o posicionamento de Pedro Roberto Decomain e Péricles Prade:
Na perspectiva, porém, de solicitar ou receber vantagem, para dar voto ou para abster-se de votar, é necessária a qualidade de eleitor. Se aquele que faz a solicitação ou recebe a vantagem não é eleitor, o crime previsto neste artigo não se configura (DECOMAIN; PRADE, 2004, p. 382).
Também, seguindo esta linha de raciocínio, a lição de Rodrigo López Zilio:
De outro passo, a corrupção eleitoral passiva, em regra, somente pode ser cometida por eleitor. Se alguém que não ostenta a condição de eleitor (ex. pessoa com os direitos políticos suspensos ou, mesmo, adolescente menor de 16 anos no dia do pleito) solicitar dinheiro para votar em determinada pessoa, a hipótese será de crime impossível (em relação à modalidade passiva) já que existe uma inviabilidade total do exercício do direito do voto (ou seja, impropriedade absoluta do objeto). (ZILIO, 2017, p. 114).
Entretanto, esta corrente deve ser adotada com ressalvas, já que as hipóteses de solicitar ou receber benesses podem ser para conseguir ou prometer abstenção.
Discrepante desta primeira corrente Gomes, ao enfatizar em sua abalizada doutrina:
Uma pessoa cujos direitos políticos estejam suspensos, portanto um não eleitor, pode solicitar ou receber vantagem ou benefício (para si, para outrem, para si e para outrem) para obter voto de terceiro ou para conseguir abstenção de outrem. Isso, aliás, aconteceu incontáveis vezes – e ainda hoje ocorre -, bastando pensar em situações em que alguém recebe vantagem não só para apoiar determinada candidatura, como também para obter o apoio de seus familiares (GOMES, 2016, p. 63-64).
Além disso, é imperioso ressaltar que tanto a corrupção eleitoral ativa, como a corrupção eleitoral passiva, são crimes comissivos – consistentes na realização de uma ação positiva visando um resultado tipicamente ilícito – e podem suceder em um mesmo fato.
Nota-se, por exemplo, que um cabo eleitoral, ao oferecer dádiva a eleitor com o intuito de cooptar o seu voto para determinado candidato, pratica a modalidade ativa do crime, enquanto o eleitor, ao aceitar a benesse, comete a modalidade passiva do delito.
Contudo, é interessante pontuar que alguns Tribunais Regionais têm aplicado a causa de exclusão de ilicitude prevista no art. 23, I, c/c art. 24 do Código Penal, quando comprovado que os eleitores beneficiados agiram em estado de necessidade. Vejamos:
CRIME ELEITORAL. CORRUPÇÃO. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. DENÚNCIA. RECEBIMENTO.
Revelando as provas orais que cabo eleitoral promoveu a distribuição de cestas básicas a mando do candidato à reeleição, a denúncia deve ser recebida.
CORRUPÇÃO ELEITORAL PASSIVA. Beneficiários de cestas básicas. Pessoas simples, com dificuldades de promover a sua própria subsistência. Eleitores procurados em suas residências. Estado de necessidade. Arquivamento do inquérito em relação a estes.
(TRE/PR – PROC. Nº. 35 – CORNÉLIO PROCÓPIO/PR – RELATOR NILSON MIZUTA – DJ 24-08-2001, P. 0) (d.n.)
PROCESSO CRIMINAL. DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS EM TROCA DE VOTOS. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL.
1 - Os elementos probatórios constantes dos autos demonstram a prática de atos de corrupção ativa e passiva, por parte dos denunciados, à exceção de dois deles.
2. Estando comprovado que os denunciados por corrupção passiva agiram em estado de necessidade, é de se lhes aplicar a causa de exclusão da ilicitude prevista no art. 23, I c/c art. 24 do Código Penal.
Denúncia julgada procedente em parte.
(TRE/MG – PROC. Nº. 51997 – BUGRE/MG – RELATORA MARIA DAS GRAÇAS S. ALBERGARIA S. COSTA – DJMG 01-03-2000, P. 48) (d.n.)
Ademais, importante destacar que o delito de corrupção eleitoral é considerado crime instantâneo, ou seja, sua consumação é imediata, ocorrendo com a simples prática de um dos núcleos do tipo (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber).
Por fim, se qualifica como crime formal, vez que sua consumação independe do resultado, da efetiva entrega da benesse em troca do voto ou da abstenção, sendo irrelevante, inclusive, se o eleitor corrompido efetivamente votou no candidato indicado, bastando apenas a oferta, a promessa ou a solicitação. Para a doutrina majoritária, por esta razão, não se admite a forma tentada, sendo o resultado mero exaurimento da conduta criminosa.
Neste sentido, inclusive, já decidiu o c. Tribunal Superior Eleitoral, in verbis:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CRIME ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. DELITO FORMAL. ALEGAÇÃO. OMISSÃO. IMPROCEDÊNCIA. PRETENSÃO. NOVO JULGAMENTO DA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Conforme consignado no acórdão embargado, o crime de corrupção eleitoral, por ser crime formal, não admite a forma tentada, sendo o resultado mero exaurimento da conduta criminosa.
2. Os embargos declaratórios não se prestam para provocar novo julgamento da causa, senão para afastar do julgado contradição, omissão ou obscuridade, o que não se verifica na espécie. Embargos de declaração desprovidos.
(AG Nº 8905 – UBERABA – MG – ACÓRDÃO DE 19/02/2008 – RELATOR MIN. CAPUTO BASTOS – PUBLICAÇÃO: DJ – DIÁRIO DE JUSTIÇA, DATA 03/04/2008, PÁGINA 10) (d.n.)
CRIME ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL.
1. Conforme já reiteradamente decidido, o exame pelo Presidente de Tribunal Regional Eleitoral de questões afetas ao mérito do recurso especial, por ocasião do juízo de admissibilidade, não implica invasão de competência do Tribunal Superior Eleitoral.
2. O crime de corrupção eleitoral, por ser crime formal, não admite a forma tentada, sendo o resultado mero exaurimento da conduta criminosa.
3. A decisão em sede de representação por captação ilícita de sufrágio não impede seja julgada procedente ação penal por crime de corrupção eleitoral, ainda que os fatos sejam os mesmos, tendo em vista a independência entre as esferas cível-eleitoral e penal.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 8905 – UBERABA – MG – ACÓRDÃO DE 27/11/2007 – RELATOR MIN. ARNALDO VERSIANI – PUBLICAÇÃO: DJ – DIÁRIO DE JUSTIÇA, VOLUME 1, DATA 19/12/2007, PÁGINA 224) (d.n.)
Todavia, conforme já exposto quando da análise do crime de corrupção inserido no Código Penal, na seara eleitoral, também, dependendo da maneira como o agente praticar o crime de corrupção, é possível, em tese, admitir a sua forma tentada.
4. Da recente jurisprudência do colendo Tribunal Superior Eleitoral
Inaugura-se este capítulo como a ele dá consistência objetiva, jurisprudência colacionada de forma exemplificativa, dando a saber como se vem comportando a Corte Eleitoral no c. TSE no que respeita ao percurso de convencimento até defluir na condenação pela prática do crime de corrupção eleitoral em todas as suas modalidades.
ELEIÇÕES 2012. AGRAVOS REGIMENTAIS. AGRAVOS. RECURSOS ESPECIAIS. PREFEITO. AÇÃO PENAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA ACERCA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DO DELITO, BEM COMO DO DOLO ESPECÍFICO DO CANDIDATO. PROVIMENTO.
1. A condenação, no que tange à alegada transgressão ao art. 299 do Código Eleitoral, baseou-se em prova testemunhal frágil e discrepante.
2. A dúvida a respeito do que teria efetivamente ocorrido já seria bastante para conduzir à absolvição, pois a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é firme no sentido de que "a condenação deve amparar-se em prova robusta pela qual se demonstre, de forma inequívoca, a prática de todos os elementos do fato criminoso imputado aos réus" (AgR-REspe 52-13, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 14.3.2017).
3. Para a caracterização do crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral, não basta desqualificar a versão defensiva sobre quem estaria dirigindo o veículo no momento do acidente, sendo necessário demonstrar que o pagamento do conserto teve por finalidade a corrupção eleitoral.
4. No caso, não houve a comprovação do dolo específico, isto é, que o pagamento do conserto do veículo teria por finalidade a compra dos votos, tendo a condenação sido baseada na presunção de que não haveria razão plausível para o então candidato a prefeito ter arcado com os custos do conserto.
5. A condenação merece ser revista, haja vista a ausência de prova robusta acerca da materialidade e da autoria do delito, bem como do dolo específico do candidato consistente na finalidade de obter ou dar voto ou prometer abstenção mediante entrega ou promessa de benesse ou vantagem a eleitor, necessário para a configuração do crime de corrupção eleitoral.
6. O reconhecimento da deficiência nos fundamentos da condenação não implica o revolvimento da moldura fático-probatória, vedada pelo verbete sumular 24 desta Corte, mas, sim, o reenquadramento jurídico dos fatos, providência admitida na estreita via do recurso especial eleitoral. Precedentes.
Agravos regimentais a que se dá provimento, a fim de, desde logo, prover os recursos especiais.
(AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 47570 – TAIÚVA – SP – ACÓRDÃO DE 30/10/2018 – RELATOR MIN. HERMAN BENJAMIN – RELATOR DESIGNADO MIN. ADMAR GONZAGA – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, DATA 13/12/2018) (d.n.)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2012. VEREADOR. AÇÃO PENAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL.
1. Na decisão agravada, manteve-se acórdão unânime do TRE/RO por meio do qual se absolveu o agravado - Vereador de Rolim de Moura/RO reeleito em 2016 - da prática do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral).
DOLO ESPECÍFICO. BENESSE CONDICIONADA A PEDIDO DE VOTO. INOCORRÊNCIA. REEXAME. FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 24/TSE.
2. A teor do art. 299 do Código Eleitoral, constitui crime "dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita".
3. O crime de corrupção eleitoral requer dolo específico de se obter o voto mediante promessa ou oferta de vantagem indevida. Precedentes.
4. Na espécie, não há prova de que o agravado ofereceu transporte a Adriana Cherubim em troca do voto dela e de outras seis pessoas, evidenciando-se apenas que o candidato e terceiros, sabedores que a filha da eleitora necessitava de urgente atendimento médico por fratura de um dos membros superiores há mais de uma semana, procuraram auxiliá-la, mas sem a condicionante do sufrágio.
5. Segundo o TRE/RO: a) a eleitora, em juízo, assinalou que "estava com uma filha com o braço quebrado e [...] precisava de ajuda para ser encaminhada para o hospital; que Messias [agravado] comprometeu a ajudar, porém pediu para que [...] as demais pessoas que estavam no bar que lhe ajudasse"; b) a testemunha Sirlene Gomes consignou que "apenas ligou para o Sr. José Messias, para perguntar se sabia de alguém que naquele momento estava indo para a cidade de Cacoal/RO, e se poderia dar uma carona para a Sra. Adriana, no que o Sr. José Messias respondeu que ele estava indo para Cacoal para uma reunião com o Deputado Nilton Capixaba"; c) Geni Moraes, agente administrativo da área de saúde, assentou que "em nenhum momento o então candidato a vereador [...] chegou a intermediar a cirurgia ou a frequentar o hospital, até porque tinha sido proibida a entrada de candidatos à eleição" (fls. 520-521).
6. Concluir acerca da existência de dolo específico demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.
CONCLUSÃO. DESPROVIMENTO.
7. Agravo regimental desprovido.
(AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 6308 – ROLIM DE MOURA – RO – ACÓRDÃO DE 25/06/2018 – RELATOR MIN. JORGE MUSSI – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 157, DATA 08/08/2018, PÁGINA 121/122) (d.n.)
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CRIME ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. GRAVAÇÃO AMBIENTAL. CONDUTA INDUZIDA. ILICITUDE. DEPOIMENTO TESTEMUNHAL DE COAUTOR. INADMISSIBILIDADE. CONFISSÃO INSUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO.
1. Não há violação ao art. 275 do Código Eleitoral quando o Tribunal enfrentou todos os argumentos levantados pela parte, ainda que de forma contrária aos seus interesses.
2. Alegação de ilicitude de provas (gravação ambiental e depoimento de coautor do delito) que confirmam fatos confessados pelo réu em seu interrogatório.
3. A confissão do réu é uma prova independente, não contaminada por eventual ilicitude da gravação ou do depoimento das testemunhas (art. 157, § 2º, do CPP).
4. A parte não pode alegar a ilicitude de provas que confirmam a própria versão dos fatos. Mesmo que ilicitude houvesse, não haveria prejuízo, na medida em que a parte optou validamente por produzir prova contra si mesma, confessando os fatos corroborados pelas provas supostamente ilícitas. Se a prova ilícita confirma a versão da parte, a ilicitude não lhe causa prejuízo. Na forma do art. 563 do CPP, à mingua de prejuízo, não se pronuncia invalidade.
5. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral faz uma distinção, em relação à gravação de conversas ocorridas no período eleitoral, para a prova de crimes eleitorais. Admite-se a prova, se utilizada para a demonstração de conversas em ambientes públicos, ou para as quais não há expectativa de privacidade. Pelo contrário, rejeita-se a utilização de gravações de conversas privadas, tendo em vista que a disputa eleitoral é propícia para a indução à prática de crimes. Precedentes.
6. Há uma conexão da distinção com o direito penal material subjacente. O fundamento da distinguishing é justamente o ambiente de disputa eleitoral, propício ao induzimento da prática de crimes. A situação se assemelha ao chamado flagrante preparado, em que a atividade criminosa é planejada e induzida por agentes alheios com o fim de surpreender o indivíduo em prática criminosa. Isso representa, aliás, o teor da Súmula nº 145/STF, segundo a qual "não há crime, quando a preparação do flagrante torna impossível a sua consumação".
7. O caso deve ser avaliado à luz do art. 17 do Código Penal, que trata do crime impossível. A conduta de membros de campanha eleitoral que, induzidos por partidários de campo político diverso, praticam conduta formalmente típica, mas sem possibilidade de atingir o bem jurídico protegido pela norma, é atípica.
8. Eleitor que admitiu ter solicitado vantagem ilícita ao candidato e efetuado a respectiva gravação mediante paga, por adversários políticos do réu.
9. Tendo em vista o induzimento, a conduta não colocou o bem jurídico protegido em risco, nem ao menos em tese. Via de regra, a reserva mental, por parte do eleitor, não impede a consumação do crime do art. 299 do Código Eleitoral - crime formal. O relevante é que a própria negociação do voto é insincera. O eleitor policitante tem por objetivo principal obter uma prova incriminatória contra o candidato.
10. Do ponto de vista do direito penal, a conduta é atípica, porque o crime é impossível, por absoluta impropriedade do objeto, na forma do art. 17 do Código Penal.
11. Ainda que tenha caído em emboscada, o candidato oblato agiu de forma moralmente reprovável, ao aceitar a proposta ilícita e pagar a vantagem indevida.
12. Agravo de instrumento provido. Recurso especial eleitoral provido, para absolver o recorrente.
(AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 153370 – PINHAL GRANDE – RS – ACÓRDÃO DE 08/05/2018 – RELATOR MIN. GILMAR MENDES – RELATORA DESIGNADA MIN. ROSA WEBER – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 110, DATA 06/06/2018, PÁGINA 60/61) (d.n.)
HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. DENÚNCIA. FATO ATÍPICO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
1. Para a caracterização do crime de corrupção eleitoral é imprescindível que a entrega, o oferecimento ou a promessa de dinheiro, dádiva ou vantagem seja condicionada à obtenção de voto, ao que não se equipara o alegado intuito de obter apoio político na campanha eleitoral. Precedentes: RHC 22-11, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 7.10.2016; HC 31-60, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 3.4.2014; RHC 43, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, DJ de 26.4.2002; STF, Inq 3.693, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJE de 30.10.2014; STJ, AP 1-49, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, Corte Especial, DJ de 14.8.2000.
2. Na espécie, a despeito de fazer menção ao intuito de obter-se voto, a denúncia assinala, apenas, que a materialidade e a autoria do fato estariam comprovadas pela prova testemunhal e documental, segundo a qual a beneficiária era líder comunitária e trabalhou na campanha do denunciado à reeleição ao cargo de prefeito nas Eleições de 2012, tendo sido por ele investida, de fato, na função de Coordenadora de Posto Municipal de Saúde, sob a promessa de posterior nomeação formal para o citado cargo em comissão, a título de contraprestação pelo trabalho, o que ao fim não se cumpriu. Em tais circunstâncias, é forçoso reconhecer que a conduta atribuída ao paciente visou à obtenção de apoio político, o que não se subsume ao tipo penal do art. 299 do Código Eleitoral.
Ordem de habeas corpus concedida, a fim de trancar a ação penal por atipicidade da conduta.
Agravo regimental prejudicado.
(HABEAS CORPUS Nº 060277537 – SANTA MARIA – RS – ACÓRDÃO DE 14/11/2017 – RELATOR MIN. ADMAR GONZAGA – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 93, DATA 11/05/2018) (d.n.)
AGRAVO REGIMENTAL. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. REEXAME DE PROVAS.
1. O Tribunal de origem rejeitou denúncia oferecida pela prática do delito do art. 299 do Código Eleitoral, sob o fundamento de que não foi configurado o crime de corrupção eleitoral, por ausência de lastro mínimo para o processamento de ação penal, ante o caráter genérico da promessa de regularização fundiária feito a uma comunidade com 144 famílias.
2. A reforma do julgado implicaria, necessariamente, o reexame de fatos e provas, providência que ultrapassa os estreitos limites da via recursal extraordinária, atraindo, portanto, a incidência do verbete sumular 24 do TSE.
3. O posicionamento adotado pela Corte de origem está em consonância com a jurisprudência do TSE, firmada no sentido de que, "a realização de promessas de campanha, as quais possuem caráter geral e usualmente são postas como um benefício à coletividade, não configuram, por si só, o crime de corrupção eleitoral, sendo indispensável que a promessa de vantagem esteja vinculada à obtenção do voto de determinados eleitores" (AI 586-48, rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJe de 13.9.2011).
4. Segundo a orientação desta Corte, "na acusação da prática de corrupção eleitoral (Código Eleitoral, art. 299), a peça acusatória deve indicar qual ou quais eleitores teriam sido beneficiados ou aliciados, sem o que o direito de defesa fica comprometido" (RHC 452-24, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 25.4.2013).
Agravo regimental a que se nega provimento.
(AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 157622 – PORTO VELHO – RO – ACÓRDÃO DE 17/10/2017 – RELATOR MIN. ADMAR GONZAGA – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 218, DATA 10/11/2017, PÁGINA 106) (d.n.)
ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DE INCURSÃO NO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. No caso, o TRE de origem, soberano na análise das provas, concluiu que não ficou demonstrado o dolo específico do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE), consubstanciado na finalidade eleitoral, pelo fornecimento de medicamento a eleitor.
2. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, é necessária a ocorrência de dolo específico, consistente no especial fim de obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção. Precedente: AgR-AI 7497-19/RJ, Rel. designado Min. DIAS TOFFOLI, DJe 23.2.2015.
3. Para se alterar a conclusão do Tribunal Regional quanto à existência ou não de dolo específico, seria necessário o reexame do conjunto probatório dos autos, o que não é possível em Recurso Especial, de acordo com o enunciado sumular 24 do TSE.
4. Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 4244 – MARAU – RS – ACÓRDÃO DE 17/10/2017 – RELATOR MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, DATA 10/11/2017) (d.n.)
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. ART. 299. CORRUPÇÃO ELEITORAL. PROMESSA DE PAGAMENTO DE FATURAS DE ENERGIA ELÉTRICA E ADIMPLEMENTO DE DÍVIDAS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NEXO CAUSAL.
1. Segundo a denúncia, o acusado foi flagrado prometendo o pagamento de faturas de energia elétrica e adimplemento de dívidas com a Companhia de Água e Esgoto da Paraíba em busca de votos para candidatos à eleição.
2. O crime de corrupção eleitoral ativa é crime instantâneo, cuja consumação é imediata, ocorrendo com a simples prática de um dos núcleos do tipo (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber), bem como se qualifica como crime formal, pois a consumação independe do resultado, da efetiva entrega da benesse em troca do voto ou da abstenção, sendo irrelevante se o eleitor corrompido efetivamente votou no candidato indicado. Precedente: AI 209-03, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 5.3.2015.
3. Havendo indícios de autoria e materialidade do delito, não se deve admitir o trancamento da ação, sobretudo porque, apenas mediante a colheita de provas e a instrução processual, será possível discutir a fundo a efetiva comprovação da prática do delito e do elemento subjetivo.
4. "O trancamento de ação penal pelo estreito viés do remédio heroico é providência excepcional, sendo somente possível quando se evidenciar, de plano e extreme de dúvida, imputação de fato atípico, inexistência de indício mínimo de autoria e materialidade do delito, ou ainda, extinção da punibilidade. Precedentes" (RHC 233-04, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 16.3.2017).
Recurso ordinário a que se nega provimento.
(RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 060009596 – JOÃO PESSOA – PB – ACÓRDÃO DE 22/08/2017 – RELATOR MIN. ADMAR GONZAGA – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 179, DATA 15/09/2017) (d.n.)
ELEIÇÕES 2012. HABEAS CORPUS. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. GRAVAÇÃO AMBIENTAL REALIZADA PELOS ELEITORES QUE VENDERAM O VOTO. LICITUDE DA PROVA.
1. A gravação ambiental que registra o crime de corrupção, quando realizada pelos próprios eleitores que venderam o voto, pode ser utilizada contra eles no processo penal. Do contrário, a eles seria permitido aproveitar-se da ilicitude a que deram causa.
2. A gravação ambiental não viola a privacidade e intimidade de quem teve a iniciativa da diligência.
3. É irrelevante que a gravação ambiental tenha sido considerada ilícita em relação ao prefeito em ações eleitorais julgadas por esta Corte.
4. Ordem denegada.
(HABEAS CORPUS Nº 44405 – REGENERAÇÃO – PI – ACÓRDÃO DE 01/03/2016 – RELATORA MIN. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – RELATOR DESIGNADO MIN. GILMAR MENDES – PUBLICAÇÃO: DJE – DIÁRIO DE JUSTIÇA ELETRÔNICO, TOMO 86, DATA 05/05/2016, PÁGINA 39-40) (d.n.)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO PENAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, VII, DO CPP.
1. A condenação pelo crime de corrupção eleitoral deve amparar-se em prova robusta na qual se demonstre, de forma inequívoca, a prática do fato criminoso pelo réu.
2. No caso dos autos, não houve provas aptas a comprovar a autoria do crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral, pois os dois depoimentos prestados em juízo mostraram-se contraditórios.
3. Agravo regimental não provido.
(AGR-AGR-RESPE Nº. 569549/RJ – MIN. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – DJE 10-04-2015, P. 36) (d.n.)
CRIME ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL.
1. Conforme já reiteradamente decidido, o exame pelo Presidente de Tribunal Regional Eleitoral de questões afetas ao mérito do recurso especial, por ocasião do juízo de admissibilidade, não implica invasão de competência do Tribunal Superior Eleitoral.
2. O crime de corrupção eleitoral, por ser crime formal, não admite a forma tentada, sendo o resultado mero exaurimento da conduta criminosa.
3. A decisão em sede de representação por captação ilícita de sufrágio não impede seja julgada procedente ação penal por crime de corrupção eleitoral, ainda que os fatos sejam os mesmos, tendo em vista a independência entre as esferas cível-eleitoral e penal.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(HC Nº. 39073/MT – MIN. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA – DJE 27-03-2015, P. 39) (d.n.)
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CRIME ELEITORAL. CONDENAÇÃO COM BASE NO ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO QUE NÃO INFIRMOU OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. REGIMENTAL QUE NÃO INFIRMA OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Agravo de instrumento que não infirmou minimamente os fundamentos da decisão da Presidência do TRE que inadmitira o recurso especial eleitoral (não ocorrência da prescrição da pretensão punitiva - ausência de ofensa a dispositivos legais - não demonstração de divergência jurisprudencial).
2. Agravo regimental que não ataca especificamente os fundamentos da decisão agravada.
3. Suposto crime impossível. O art. 299 do Código Eleitoral, ao qualificar como crime "dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita", tutela justamente o livre exercício do voto (o direito do eleitor de votar livremente em algum candidato, em branco ou nulo) ou a abstenção do eleitor no processo eleitoral.
4. O crime de corrupção eleitoral ativa é crime instantâneo, cuja consumação é imediata, ocorrendo com a simples prática de um dos núcleos do tipo (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber), bem como se qualifica como crime formal, pois a consumação independe do resultado, da efetiva entrega da benesse em troca do voto ou da abstenção, sendo irrelevante se o eleitor corrompido efetivamente votou no candidato indicado.
5. Exige-se (i) que a promessa ou a oferta seja feita a um eleitor determinado ou determinável; (ii) que o eleitor esteja regular ou que seja possível a regularização no momento da consumação do crime; (iii) que o eleitor vote no domicílio eleitoral do candidato indicado pelo corruptor ativo.
6. No momento da consumação do crime oferta de pagamento de multas eleitorais em troca do voto , era possível a regularização do título de eleitor e a consequente transferência para o domicílio eleitoral de Primavera do Leste/MT, como de fato ocorreu, pois a conduta fora praticada antes do fechamento do cadastro eleitoral para as eleições municipais de 2008.
7. Configuraria impropriedade absoluta do objeto se a oferta de pagamento de multas eleitorais tivesse ocorrido após o fechamento do cadastro eleitoral para as eleições de 2008, pois, nesse momento, não mais seria possível regularizar e transferir o título eleitoral e, consequentemente, ofender o bem jurídico tutelado pelo art. 299 do Código Eleitoral: o livre exercício do voto ou da abstenção.
8. Recurso desprovido.
(AGR-AI Nº. 20903/MT – MIN. GILMAR FERREIRA MENDES – DJE 05-02-2015, P. 44/45) (d.n.)
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO CRIMINAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. CÓDIGO ELEITORAL. ART. 299. PROVIMENTO.
1. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, além de ser necessária a ocorrência de dolo específico, qual seja, obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção, é necessário que a conduta seja direcionada a eleitores identificados ou identificáveis, e que o corruptor eleitoral passivo seja pessoa apta a votar. Precedentes.
2. Não há falar em corrupção eleitoral mediante o oferecimento de serviços odontológicos à população em geral e sem que a denúncia houvesse individualizado os eleitores supostamente aliciados.
3. Agravos regimentais providos.
(AGR-AI Nº. 749719/RJ – MIN. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI – DJE 23-02-2015, P. 54) (d.n.)
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CRIME ELEITORAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. CONCURSO FORMAL IMPERFEITO. CARACTERIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO DE FATOS E PROVAS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO.
1. Não há violação ao art. 275 do Código Eleitoral quando as teses da defesa são examinadas.
2. O recurso especial não se presta ao reexame de matéria fático-probatória.
3. O crime de corrupção eleitoral (Cód. Eleitoral, art. 299), na modalidade "prometer" ou "oferecer", é formal e se consuma no momento em que é feita a promessa ou oferta, independentemente de ela ser aceita ou não.
4. A oferta de dinheiro em troca do voto, realizada em ação única, a mais de uma pessoa, caracteriza o tipo do art. 299 em relação a cada um dos eleitores identificados.
5. Há concurso formal impróprio, ou imperfeito, quando o candidato, em conduta única, promete bem ou vantagem em troca do voto de dois ou mais eleitores determinados, agindo com desígnios autônomos (Cód. Penal, art. 70, segunda parte).
Recurso especial desprovido.
(RESPE Nº. 1226697/MG – MIN. HENRIQUE NEVES DA SILVA – DJE 30-09-2014, P. 487/488) (d.n.)
RECURSO EM HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ELEITORAL. CÓDIGO ELEITORAL. ARTIGO 299. DENÚNCIA. REQUISITOS.
1. A denúncia deve conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias.
2. Na acusação da prática de corrupção eleitoral (Código Eleitoral, art. 299), a peça acusatória deve indicar qual ou quais eleitores teriam sido beneficiados ou aliciados, sem o que o direito de defesa fica comprometido.
3. Recurso em habeas corpus provido.
(RHC Nº. 45224/MG – MIN. HENRIQUE NEVES DA SILVA – DJE 25-04-2013, P. 55) (d.n.)
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENAL. PREFEITO, VICE-PREFEITO E VEREADOR. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. DOLO ESPECÍFICO. COMPROVAÇÃO. PROVA INDIRETA. PRAZO PRESCRICIONAL. CONTAGEM. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 115 DO CP. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. CRITÉRIOS ABSTRATOS E GENÉRICOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para a configuração do delito de corrupção eleitoral exige-se a finalidade de obter ou dar o voto ou conseguir ou prometer a abstenção, o que não se confunde com o pedido expresso de voto. Precedentes.
2. A verificação do dolo específico em cada caso é feita de forma indireta, por meio da análise das circunstâncias de fato, tais como a conduta do agente, a forma de execução do delito e o meio empregado.
3. A redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP aplica-se somente ao réu que possua mais de setenta anos na data da primeira decisão condenatória, seja sentença ou acórdão. Precedentes.
4. A pena-base não pode ser fixada com fundamento em critérios abstratos e genéricos, notadamente a gravidade em abstrato do delito - que já foi considerada pelo legislador ao prever o tipo penal e delimitar as penas mínima e máxima. Caso esse equívoco ocorra, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal. Precedentes.
5. Agravos regimentais não providos.
(AGR-AI Nº. 7758/SE – MIN. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI – DJE 09-04-2012, P. 16) (d.n.)
Conclusão
Em uma sociedade na qual as agremiações partidárias e os políticos travam uma ferrenha batalha pela captação dos votos dos eleitores, a Justiça Eleitoral vem ganhando, cada vez mais, relevância em nosso ordenamento jurídico.
Contudo, infelizmente, uma das principais razões desta ascensão é o desrespeito às regras eleitorais impostas pelo legislador pátrio por grande parte dos cidadãos que disputam vagas nos mais altos cargos dos Poderes Executivo e Legislativo, que lançam das mais sórdidas ferramentas na tentativa de lograrem êxito nos pleitos municipais, estaduais e federal.
Dentre as condutas criminosas eleitorais, sem dúvida alguma, o delito de corrupção é considerado o mais repugnante, repulsivo, indo de encontro aos princípios do Estado Democrático de Direito.
Ao tipificar-se a entrega, o oferecimento, a promessa, a solicitação ou o recebimento de efetiva benesse, para si ou para outrem, em troca do voto ou de sua abstenção, mesmo que a oferta seja recusada, a legislação especializada tem o objetivo de prevenir ou inibir esse ato ilícito, buscando excluir da corrida eleitoral a ameaça de quem não respeita o sufrágio universal e a liberdade de voto, impondo uma sanção de até quatro anos de reclusão e o pagamento de cinco a quinze dias-multa.
Por fim, cumpre ressaltar, que essa cominação de pena vem sendo aplicada de forma eficaz, conforme se apreende da recente jurisprudência da Justiça Eleitoral, punindo, inclusive, a corrupção passiva com a mesma veemência que a corrupção ativa.
Referências
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