Responsabilidade social

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15/01/2020 às 18:46
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A evolução da responsabilidade social nas empresas deve-se à preocupação e à necessidade de adotar um modelo de processo integrado com uma visão ampliada e com espírito de cooperação para solucionar as mazelas sociais e ambientais.

Resumo:O tema Responsabilidade Social é um dos temas mais discutidos no meio acadêmico e empresarial. O objetivo deste trabalho é contribuir para um melhor entendimento dos conceitos de responsabilidade social.

Este trabalho busca identificar o que se entende por Responsabilidade Social, em seguida determinar de que forma a implantação da responsabilidade social transforma as empresas em diferencial competitivo e a importância da ética no cenário empresarial.

Este artigo busca ainda trazer alguma contribuição no sentido de uma melhor compreensão da importância dessa estratégia e dos benefícios que a mesma pode trazer para a corporação.

METODOLOGIA:Para a elaboração deste trabalho utilizou-se a pesquisa bibliográfica onde buscou-se pesquisar os principais autores que referenciam o tema em questão. Utilizou-se também a análise documental e referências históricas.


INTRODUÇÃO

A Responsabilidade Social

O tema responsabilidade social não é novo, o direito de conduzir negócios de forma corporativa era uma questão de prerrogativa do Estado ou Monarquia, a responsabilidade corporativa era aceita como doutrina nos EUA e Europa até o século XIX(Hood, 1998).

Em pelo menos um século de existência o tema passou por momentos de avanço e de retrocesso. Algum questionamento judicial apresentado por Ashley, Coutinho e Tomei demonstram essa trajetória. No entanto, a partir da década de noventa do século XX, é que o assunto começa a tomar a forma que possui hoje. Ashley, Coutinho e Tomei, ao citarem Wood, determinam os princípios da Responsabilidade Social (legitimidade da empresa, responsabilidade pública, arbítrio gerencial), os processos de Responsividade Social (diagnóstico ambiental, gestão da relação com os stakeholders, gestão de questões sociais) e os resultados sociais corporativos (política, programa e impacto social).

A principal colaboração da década de 90 foi vincular ao conceito de Responsabilidade Social o aspecto normativo, ou seja, percebeu-se que todos os modelos de Responsabilidade Social possuíam ideias, moral e ética próprios da cultura que o originava. Isso levava à diferenciação entre os conceitos de Responsabilidade Social e de Responsividade Social. Enquanto o primeiro tratava da questão abstrata: valores, ética, aspecto filosófico; o segundo tratava das ferramentas teóricas que poderiam dar suporte às organizações, quando buscassem mecanismos de respostas às demandas sociais criadas. A Responsividade Social buscava identificar os processos que poderiam alinhar a busca do lucro e a Responsabilidade Social das empresas. Nesse ponto não se discute mais se existe ou não essa responsabilidade, ela já é considerada atribuição organizacional.

No Brasil a própria Carta Magna de 1988, chamada também de Constituição Cidadã, estabelece que a propriedade privada deverá atender à sua função social.

Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I – soberania nacional;

II – propriedade privada;

III – função social da propriedade;

IV – livre concorrência;

V – defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII – redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII – busca do pleno emprego;

IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Parágrafo único – É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

É importante reparar que a Constituição Federal estabelece a função social da propriedade privada, não a limitando, portanto, às empresas, ao contrário estendendo-a a todos os proprietários de bens.

Nesse ínterim, cabe tentar entender onde a Responsabilidade Social está alocada. Os neoliberais dividem a sociedade em três grandes setores, o governo (primeiro setor), o mercado (segundo setor) e o terceiro setor (composto por organizações da sociedade civil, ongs, oscips). Normalmente a literatura tende a vincular a Responsabilidade Social ao terceiro setor. No entanto essa vinculação não é correta. È preciso identificar que o terceiro setor presta serviços de interesse social sem foco lucrativo. A Responsabilidade Social corporativa não compartilha dessa última característica uma vez que seu fim último é também o lucro dos acionistas. Dessa forma percebe-se que as atividades de Responsabilidade Social enquadram-se no segundo setor, não no terceiro.

Vale lembrar, no entanto, que não é consenso na literatura a existência dos três setores. Como já dito anteriormente, é a visão dos neoliberais, outras correntes de pensamento, no entanto, reúne no primeiro setor tanto a sociedade política (governo) quanto a sociedade civil. Esses grupos não acreditam ser possível a desvinculação da sociedade política da sociedade civil, por acreditarem que a primeira só existe para viabilizar a realização dos interesses coletivos, presentes na segunda.

Se a Responsabilidade Social é um dever constitucional e se as organizações podem beneficiar-se com ela, é de se estranhar que as empresas tenham demorado tanto tempo para começar a valorizar esse assunto. Essa lentidão pode ser atribuída a diversos fatores, entre eles: lentidão da sociedade absorver as questões sociais e ambientais como valores, dificuldade de estabelecer e perceber os benefícios que o investimento em social traz para a empresa, dificuldade de definição do que seria exatamente a função social da propriedade privada e de como efetivá-la, incapacidade dos governos de cobrarem a efetivação da função social da propriedade. Por todos esses motivos a questão sócio-ambiental demorou a atingir o status de Agenda Governamental. Apesar disso diversos encontros internacionais ocorreram, encontrar soluções para esses problemas. Foram pungentes a Rio 92, a Rio + 10, e os Fóruns Sociais Mundiais. Embora diversos outros encontros tenham ocorrido a partir da década de 70, quando o mundo começou a acordar para o problema ambiental e a partir da década de 80, quando o mesmo ocorreu com os problemas sociais.

Normalmente vincula-se a Responsabilidade Social com o Desenvolvimento Sustentável. Embora exista uma articulação entre os dois temas, eles não se confundem. A Responsabilidade Social diz respeito basicamente a empresas, enquanto que o Desenvolvimento Sustentável é uma preocupação de toda a sociedade. Além disso, a Responsabilidade Social é uma visão mais restrita – pois se vincula às atividades da empresa e às atividades que possam beneficiar-lhe lucrativamente depois – enquanto o Desenvolvimento Sustentável possui uma preocupação ampliada que leva em conta perspectivas de longuíssimo prazo e temas como saúde pública, política monetária, equilíbrio ambiental, crescimento populacional, além, é claro, das questões sociais e ambientais como um todo.

Em Estocolmo, 1972, vinte anos antes da Eco-92, dois estudiosos já falavam em eco desenvolvimento, ou seja,

um processo criativo de transformação do meio com a ajuda de técnicas ecologicamente prudentes, concebidas em função das potencialidades deste meio, impedindo o desperdício inconsiderado dos recursos, e cuidando para que estes sejam empregados na satisfação das necessidades de todos os membros da sociedade, dada à diversidade dos meios naturais e dos contextos culturais (Wikipédia).

O conceito de ecodesenvolvimento é que sustenta o conceito de Desenvolvimento Sustentável, embora esse leve em conta também os aspectos sociais de pobreza, analfabetismo, saúde pública, entre outros.

Na Eco-92, também conhecida como Rio 92, criou-se um documento que mais tarde ficou conhecido como Agenda 21. Esse documento possui 40 capítulos que delimitam o que o mundo entende por Desenvolvimento sustentável:

  • Cooperação internacional para acelerar o desenvolvimento sustentável dos países em desenvolvimento de das políticas internas conexas.

  • Luta contra a pobreza.

  • Evolução das modalidades de consumo.

  • Dinâmica demográfica e sustentabilidade.

  • Proteção e fomento da saúde humana.

  • Fomento do desenvolvimento sustentável dos recursos humanos.

  • Integração do meio ambiente e o desenvolvimento na tomada de decisões.

  • Proteção da atmosfera.

  • Enfoque integrado do planejamento e da ordenação dos recursos das terras.

  • Luta contra o desmatamento.

  • Ordenação dos ecossistemas frágeis: luta contra a desertificação e a seca.

  • Ordenação dos ecossistemas frágeis: desenvolvimento sustentável das zonas montanhosas.

  • Fomento da agricultura e do desenvolvimento rural sustentável.

  • Conservação da diversidade biológica.

  • Gestão ecologicamente racional da biotecnologia.

  • Proteção dos oceanos e dos mares de todo tipo, incluídos os mares fechados e semi-fechados e as zonas costeiras, e o uso racional e o desenvolvimento de seus recursos vivos.

  • Proteção da qualidade dos recursos de água doce: aplicação de critérios integrados para o aproveitamento, ordenação e uso dos recursos de água doce.

  • Gestão ecologicamente racional dos produtos químicos tóxicos, incluída a prevenção do tráfico internacional ilícito de produtos tóxicos e perigosos

  • Gestão ecologicamente racional dos rejeitos perigosos, incluída a prevenção do tráfico internacional ilícito de rejeitos perigosos

  • Gestão ecologicamente racional dos rejeitos sólidos e questões relacionadas com as matérias fecais

  • Gestão inócua e ecologicamente racional dos rejeitos radioativosSeção III. Fortalecimento do papel dos grupos principais.

  • Medidas mundiais em favor da mulher para atingir um desenvolvimento sustentável e eqüitativo.

  • Participação da infância e a juventude no desenvolvimento sustentável.

  • Reconhecimento e fortalecimento do papel das populações indígenas e suas comunidades.

  • Fortalecimento do papel das organizações não-governamentais associadas na busca de um desenvolvimento sustentável.

  • Iniciativas das autoridades locais em apoio ao Programa 21.

  • Fortalecimento do papel dos trabalhadores e seus sindicatos.

  • Fortalecimento do papel do comércio e da indústria.

  • Participação da comunidade científica e tecnológica.

  • Fortalecimento do papel dos agricultores.

  • Implementação de recursos e mecanismos de financiamento.

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  • Transferência de tecnologia ecologicamente racional, cooperação e aumento da capacidade.

  • Reconhecimento da ciência para o desenvolvimento sustentável.

  • Fomento da educação, a capacitação e a conscientização.

  • Mecanismos nacionais e cooperação internacional para aumentar a capacidade nacional nos países em desenvolvimento.

  • Acordos institucionais internacionais.

  • Instrumentos e mecanismos jurídicos internacionais.

  • Informação para a adoção de decisões.

A Responsabilidade Social nunca foi discutida a ponto de estabelecer-se o que se espera das empresas, também por isso, ainda é algo pouco estruturado. Além disso, outra diferença da Responsabilidade Social e do Desenvolvimento Sustentável é que os atores envolvidos são diferentes, enquanto no primeiro as empresas são os grandes agentes; no segundo, os protagonistas são os governos. Mas nem só de diferenças vivem os conceitos, ambos acabam se apoiando nas ações de Organizações não Governamentais para executarem suas ações. Além disso, o princípio que rege os dois é o mesmo: responsabilidade para com a qualidade de vida das pessoas desta e das próximas gerações.

Atualmente existe um desafio de evoluir o modelo sustentável voltado predominantemente para o progresso econômico, tecnológico e industrial sem preocupar-se com as conseqüências desse ato, refletindo desta forma no aspecto social e ambiental. O progresso social não está sendo alcançado na mesma proporção do econômico no que diz respeito à qualidade de vida.

Devido a essa falta de conscientização de reverter esse molde, o ambiente está sofrendo as consequências através de catástrofes ambientais que estão ameaçando a sobrevivência das futuras gerações e do próprio planeta.

É preciso garantir a sustentabilidade encontrando, o modelo social pautado na preservação das conquistas alcançadas capaz de manter um sistema social justo, ambientalmente equilibrado e economicamente próspero por um período indeterminado.

É necessário adotar um modelo de processo integrado com uma visão ampliada e com espírito de cooperação para solucionar as mazelas sociais e ambientais.

Dessa forma é preciso sair do estado de acomodação, de aceitar e agir como se não existisse um futuro ameaçado por mentalidades invertidas em valores financeiros.

Existe uma necessidade de comprometimento com a ética das pessoas para empenharem-se de forma integrada e equilibrada nos aspectos ambientais, sociais e econômicos; honrar os direitos do ser humano; cumprir os seus deveres, evitando prejudicar o presente e o futuro das próximas gerações.

Como a responsabilidade social pode se tornar um diferencial competitivo?

A resposta para esse questionamento começa por uma preocupação da década de 80. Existia uma preocupação em tornar o processo produtivo mais eficiente. A diferença é que, enquanto antigamente essa necessidade se dava por uma necessidade de se padronizarem os produtos e abaixarem preços, agora essa necessidade é evidenciada pela necessidade de utilizar-se menos matéria-prima e tratar os dejetos produtivos que serão devolvidos ao ambiente. O processo produtivo foi, portanto, alongado. Não termina mais na efetivação do produto e sim na devolução propicia de recursos ao ambiente.

Outra resposta interessante a esse questionamento é a utilização de matérias-primas recicladas. Não se trata apenas de ajudar o meio ambiente, mas também de construir-se uma cadeia de suprimentos renovada de tal maneira a baratear os custos de produção. Enquanto no primeiro parágrafo, o termo responsabilidade é aplicado com todo o seu valor, a final é de responsabilidade da empresa o tratamento de seus dejetos. Neste parágrafo a responsabilidade possui valor não apenas social, mas em grande parte econômico e diferencial para a própria organização.

Uma terceira resposta à pergunta são os ganhos empresariais a partir da responsabilidade social, cada vez mais, valoriza-se a consciência de que uma gestão socialmente responsável pode trazer inúmeros benefícios às empresas. Em muitos depoimentos e pesquisas, a responsabilidade social aparece como responsável pelo apoio da sociedade e dos consumidores, pela preferência de investidores internacionais, por um espaço crescente aberto pela mídia, por um bom clima organizacional, pelo recrutamento e retenção de pessoas talentosas.

De acordo com Melo Neto e Fróes (citados em Guedes, 2000), esses ganhos com a responsabilidade social resultariam no chamado retorno social institucional:

O retorno social institucional ocorre quando a maioria dos consumidores privilegia a atitude da empresa de investir em ações sociais, e o desempenho da empresa obtém o reconhecimento público. Como conseqüência, a empresa vira notícia, potencializa sua marca, reforça sua imagem, assegura a lealdade de seus empregados, fideliza clientes, reforça laços com parceiros, conquista novos clientes, aumenta sua participação no mercado, conquista novos mercados e incrementa suas vendas. (MELO NETO e FRÓES citados em GUEDES, 2000, p. 56).

Com base no que foi dito acima, Guedes (2000) afirma que podemos considerar que o retorno social institucional empresarial se concretiza através dos seguintes ganhos:

  • Em imagem e em vendas, pelo fortalecimento e fidelidade à marca e ao produto.

  • Aos acionistas e investidores, pela valorização da empresa na sociedade e no mercado.

  • Em retorno publicitário, advindo da geração de mídia espontânea.

  • Em tributação, com as possibilidades de isenções fiscais em âmbitos municipal, estadual e federal para empresas patrocinadoras ou diretamente para os projetos.

  • Em produtividade e pessoas, pelo maior empenho e motivação dos funcionários.

  • Em ganhos sociais, pelas mudanças comportamentais da sociedade.

Surge um novo conceito de competitividade entre as empresas, além de tecnologias avançadas, qualidade de atendimento, produtos e serviços, transparência, habilidade, atitude e conhecimento. Atualmente os consumidores estão priorizando as organizações com ações socialmente responsáveis, que geram um bom relacionamento com o meio ambiente, com a sociedade, cliente interno, imprensa, fornecedores e governo, ou seja, responsabilidade social constitui hoje uma rede de relacionamento entre a empresa e os stakeholders.

Responsabilidade social é um diferencial competitivo para as organizações, visto que o consumidor atual exige muito mais do que preço, qualidade e benefícios, eles esperam que as empresas transcendam seus interesses, entrando em sintonia com as necessidades da própria sociedade proporcionando ao terceiro setor resultados efetivos e transparentes.

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