A responsabilidade tributária dos sucessores e a cláusula de disposição da solidariedade na cisão parcial de empresas.

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10/05/2020 às 17:42
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É regra quase que absoluta, os particulares não podem dispor sobre a responsabilidade tributária. Porém, o mesmo dispositivo legal prevê a possibilidade excepcional de lei estabelecer ao contrário, e a Lei das Sociedades Anônimas vem com a exceção.

INTRODUÇÃO

O ordenamento jurídico brasileiro, (in)felizmente, consagra o princípio da supremacia do interesse público em um patamar mais elevado do que o necessário e do que realmente convêm.

O Estado, ao invés de servir a sociedade, é servido por ela, possuindo diversas prerrogativas, as vezes privilégios, fora da compreensão natural das coisas. Não que o Estado deva se portar e ter os mesmos limites que o particular, longe disso. Ele deve possuir prerrogativas necessárias para tutelar os seus direitos e interesse públicos, mas apenas o primário, aquele interesse da coletividade.

Percebemos que a Administração Pública possui certas prerrogativas, verdadeiros privilégios, que não inconcebíveis e afrontam os modernos e até os mais básicos princípios, direitos e limites que se espera do Estado. Um desses privilégios é aqui debatido. O particular não pode, através de mero pacto com outro particular, acordar que não serão responsáveis pelo pagamento de algum débito.

Concordamos. Um contrato apenas pode gerar efeito entre os seus sujeitos, nos limites ali estabelecidos, não atingindo a esfera patrimonial de terceiros alheiros às suas cláusulas.

Atento a isso, o Código Tributário Nacional previu tal possibilidade em seus dispositivos, blindando de certa forma o Fisco dos efeitos nocivos da criatividade humana.

Concordamos em gênero, número e grau com essa disposição legal, e reconhecimento que ela é fundamental para evitar fraude e inadimplência dos débitos fiscais que, em última visão, são de toda a coletividade.

Porém, ao prever a regra, o Estado autorizou, ele próprio, a prever exceções legais. E dez anos depois o legislador ordinário fez constar uma hipótese excepcional na Lei das Sociedades por Ações.

O presente estudo não visa conceder um salvo-conduto às empresas em débito com o fisco. Buscamos aqui fazer com que a Fazenda Pública reconheça a existência de uma exceção legalmente autorizada e prevista, e que deve ser respeitada acima de qualquer princípio.

Não há supremacia do interesse público que autorize o Estado a “atropelar” a lei. Tal ideia beira à ditadura, flagrantemente afastada pelo atual Estado Democrático de Direito. Devemos ter consciência de que o Estado, através do Poder Legislativo, pode prever regras e exceções legais, e que o próprio Estado, por meio do Poder Judiciário, deve respeitar tais previsões, no elegante equilíbrio e harmonia que deve existir entre os Poderes Constitucionais.


1. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

Em princípio, o tributo deve ser cobrado do sujeito que tiver relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador.

Esse é o conceito trazido pelo Código Tributário Nacional para definir a figura do contribuinte (sujeito passivo direto).

No entanto, em situações específicas, o Fisco tem a necessidade de cobrar o tributo de terceira pessoa que, não vinculada direta e pessoalmente, tenha, inevitavelmente, certa relação com a situação caracterizadora do fato gerador.

Surge aqui o sujeito passivo indireto (responsável tributário).

Igualmente, o Código Tributário Nacional, constatando a necessidade de um conceito legal, definiu o responsável no inciso II, logo após o contribuinte.

Ocorre que o legislador não possui “carta branca” para designar qualquer pessoa como responsável tributário. O Código Tributário Nacional, em seu artigo 128 , dispõe que a lei pode atribuir a terceira pessoa a responsabilidade pelo crédito tributário, porém, desde que vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação.

Aqui há a necessidade de analisar a intensidade do vínculo do sujeito passivo com o fato gerador, caracterizando-o como contribuinte ou responsável.

De maneira acertada, Hugo de Brito Machado estabelece que a responsabilidade pode ser analisada sob dois aspectos.

  • No “sentido amplo, é a submissão de determinada pessoa, contribuinte ou não, ao direito do Fisco de exigir a prestação da obrigação tributária.

  • Em um sentido estrito, é a submissão, em virtude de disposição legal expressa, de determinada pessoa que não é contribuinte, mas está vinculada ao fato gerador da obrigação tributária, ao direito do Fisco de exigir a prestação respectiva” .

Quanto à forma de responsabilização do sujeito passivo indireto (responsável), o Código Tributário Nacional elegeu a necessidade de lei formal para tanto.

Nunca é demais relembrar a aplicação do Princípio da Legalidade no ordenamento jurídico brasileiro, expressamente disposto no artigo 5º, II da Constituição da República Federativa do Brasil , no Capítulo destinado aos direitos e deveres individuais e coletivos.

Além do mais, o artigo 97 do Código Tributário Nacional é categórico ao estabelecer que somente a lei pode definir o sujeito passivo da obrigação tributária principal.

É corriqueiro ainda a discussão com relação à abrangência das expressões “lei” e “legislação”, também abarcada pelo Código Tributário Nacional em seus dispositivos legais.

O artigo 96 do Código Tributário Nacional define a expressão ‘legislação tributária” como sendo as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.

Segundo Ricardo Alexandre, “todo ato normativo que verse sobre matéria tributária integra a denominada legislação tributária” .

Por sua vez, o artigo 97 do Código Tributário Nacional, “trilhando os caminhos da democracia representativa” , elencou as hipóteses em que são necessárias leis em sentido estrito, à luz do princípio da legalidade (art. 5º, II da Constituição da República Federativa do Brasil), do paralelismo das formas e da indisponibilidade do patrimônio público, mais especificamente à reserva legal.

Entre as situações listadas no referido dispositivo legal, encontra-se o inciso III que determina somente à lei a “definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo”.

Ora, quem é o sujeito passivo da obrigação tributária principal? Como vimos, é o contribuinte ou o responsável, a depender da intensidade de vinculação com a situação caracterizadora do fato gerador.

Observe ainda que há vedação na transferência implícita do encargo de responsável a outrem, uma vez que o legislador exigiu lei, em sentido formal, para que terceiro seja responsabilizado pelo pagamento de tributo de outrem.

Essa é a dicção do já mencionado inciso II do parágrafo único do artigo 121 do Código Tributário Nacional.


2. MODALIDADES DE RESPONSABILIDADE

A responsabilidade tributária pode ser analisada, a princípio, em duas espécies, a dependente do “momento em que surge o vínculo jurídico entre a pessoa designada por lei como responsável e o sujeito ativo do tributo” .

Se, no momento em que surge a obrigação tributária, uma pessoa figura como sujeito passivo, sendo, após um evento legalmente definido, trocada por outra, há a responsabilidade “por transferência”.

A mudança de sujeito passivo deve ser prevista em lei, e decorrer da ocorrência de um determinado fato.

Caso contrário, se o sujeito passivo surge contemporaneamente ao fato gerador, a responsabilidade será “por substituição”, ou seja, desde a ocorrência do fato gerador, o sujeito passivo é uma pessoa que não possui relação direta e pessoal com a hipótese de incidência.

A responsabilidade na sucessão empresarial é uma espécie de responsabilidade “por transferência”, tendo em vista que há um sujeito passivo quando da ocorrência do fato gerador, sendo que um fato determinado (fusão, cisão, incorporação, alienação de filial etc) tem o condão de trocar este sujeito passivo por outrem, o responsável.

Nesta hipótese de responsabilidade, o sucessor assume todos os débitos tributários, dos fatos geradores ocorridos antes da data do ato ou fato, na condição de responsável.

Os fatos geradores ocorridos após esse momento serão de responsabilidade do sujeito passivo, como contribuinte, pois passará a ter relação direta e pessoal com a hipótese de incidência.


3. RESPONSABILIDADE POR SUCESSÃO EMPRESARIAL

Disposta no artigo 132 do Código Tributário Nacional, que a responsabilidade por sucessão empresarial é uma das hipóteses de responsabilidade de devedores sucessores, também denominada simplesmente como responsabilidade dos sucessores.

Antes de detalharmos esta hipótese em particular, é necessário analisar o artigo 129 do Código Tributário Nacional, de leitura confusa, porém, com uma essência simples. Vejamos:

Art. 129. O disposto nesta Seção aplica-se por igual aos créditos tributários definitivamente constituídos ou em curso de constituição à data dos atos nela referidos, e aos constituídos posteriormente aos mesmos atos, desde que relativos a obrigações tributárias surgidas até a referida data.

A truncada redação do dispositivo pode ser resumida da seguinte maneira, segundo o professor Eduardo Sabbag: “o sucessor assume todos os débitos tributários do sucedido, relativos a fatos geradores ocorridos antes da data do ato ou fato que demarcou a sucessão, sendo irrelevante o andamento da constituição definitiva do crédito” .

Assim, regra geral, podemos afirmar que a sucessão tributária está diretamente ligada à sucessão empresarial.

Mas quais são os valores que devem estar inclusos na expressão “crédito tributário”? Aqueles relativos a multas também serão de responsabilidade do sucessor? Como ficaria o princípio da intranscendência subjetiva das sanções? Por mais que não caiba a nós esmiuçar esta discussão, o Superior Tribunal de Justiça sumulou o seu entendimento no seguinte sentido:

Enunciado 554 da súmula da jurisprudência do STJ:

“Na hipótese de sucessão empresarial, a responsabilidade da sucessora abrange não apenas os tributos devidos pela sucedida, mas também as multas moratórias ou punitivas referentes a fatos geradores ocorridos até a data da sucessão”.

Para o Superior Tribunal de Justiça:

“[...] tanto o tributo quanto as multas a ele associadas pelo descumprimento da obrigação principal fazem parte do patrimônio (direitos e obrigações) da empresa incorporada que se transfere ao incorporador, de modo que não pode ser cingida a sua cobrança, até porque a sociedade incorporada deixa de ostentar personalidade jurídica”

(grifo nosso).

Pois bem, voltemos ao cerne da responsabilidade na sucessão empresarial, artigo 132 do Código Tributário Nacional. O artigo estabelece:

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Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas.

(Grifo nosso).

Chama a atenção a ausência do instituto da “cisão”. Ocorre que, quando da publicação do Código Tributário Nacional no ano de 1966, a cisão ainda não era conhecida pelo ordenamento jurídico brasileiro, que só passou a ser prevista com a Lei das Sociedades por Ações (Lei n. 6.404/1976).

Por mais que se tente aplicar o caput do artigo 132 à cisão, utilizando como sustentação legal o seu parágrafo único , ousamos discordar. O referido parágrafo menciona que o disposto no artigo se aplica aos casos de extinção de pessoa jurídica de direito privado, quando há continuidade na exploração da atividade desenvolvida até então.

Ocorre que, quanto à cisão parcial, a pessoa jurídica cindida não deixa de existir. O cerne da responsabilidade tributária do parágrafo único é a continuação da atividade da empresa extinta, nada se relacionando com uma situação de cisão parcial da pessoa jurídica.

A definição legal de cisão é trazida pelo artigo 229 da Lei n. 6.404/1976:

Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão. (Grifo nosso).

Diferente das situações de fusão (união de sociedades para formar uma sociedade nova) e incorporação (absorção de uma sociedade por outra), onde há extinção da pessoa jurídica fusionada ou incorporada, na cisão, especificamente a parcial, há uma reorganização societária.

André Luiz Santa Cruz Ramos resume perfeitamente o instituto como a “transferência de patrimônio de uma sociedade para outra”.


4. ATRIBUIÇÃO DE RESPONSABILIDADE SEM PREVISÃO LEGAL

Indubitavelmente, o ordenamento jurídico brasileiro adotou, em seu vértice, o Poder Legislativo como órgão responsável por elaborar, discutir e aprovar as leis que regem a sociedade. Modo geral, e conforme normas constitucionais, a ninguém é imposto uma obrigação se não houver previsão legal. Pois bem.

Com antecedentes históricos de envergadura , o Princípio da Legalidade foi alçado pela Constituição de República Federativa do Brasil como um direito individual fundamental, sem o qual o ser humano não conseguiria viver em harmonia.

Mais do que um direito, o referido Princípio também deve ser considerado uma garantia, tendo em vista que ao Estado não é devido impor uma obrigação, salvo previsão legal, ou seja, somente após a observância do procedimento devido do processo legislativo, é que o Estado poderá obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa.

Ora, se o ordenamento jurídico pátrio estabeleceu a garantia de que somente podemos fazer algo se houver previsão legal, e nas disposições de competência constitucional estabeleceu a função de elaborar leis ao Poder Legislativo , não podemos aceitar que outros órgãos venham subverter tal sistema.

É uma garantia constitucional e deve ser respeitada. Mais, é uma garantia constitucional originária, listada no artigo 5º desde a promulgação da Constituição pelo Poder Constituinte Originário. Quaisquer emendas ou legislação infraconstitucional deve observar sua norma e respeitá-lo, sob pena afronta à segurança jurídica e às normas mais sagradas, os direitos e garantias fundamentais.

Como reforço argumentativo, devemos relembrar que os direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas, e uma emenda constitucional tendente a aboli-la sequer pode ser objeto de deliberação:

Art. 60 (CRFB/88): [...]

§ 4º. Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: [...]

IV – os direitos e garantias individuais.

Se ao Poder Constituinte Derivado Reformador não lhe é atribuído a função de extinguir os direitos e garantias individuais, com menor competência tem um órgão do Poder Judiciário.

Mesmo que a Corte Constitucional tenha a última palavra para interpretar as normas constitucionais, a ela não é atribuída a possibilidade de afrontar a cláusulas pétreas, sob o risco de desestabilizarmos a separação e harmonia entre os Poderes.

Não se está aqui defendendo que empresas particulares possam, por mero acordo contratual, afastar inteiramente sua responsabilidade pelo pagamento dos débitos tributários.

O cerne da questão em estudo é a possibilidade legal das empresas disporem sobre a solidariedade da responsabilidade. Se há um débito e este é válido, deve ser honrado e quitado. Porém, o legislador estabeleceu claramente a possibilidade de as empresas acordarem se atuaram solidariamente no pagamento ou não. E com certeza, tal ponto é levado em consideração quando da fixação do preço do negócio envolvido.

Com a autoridade que lhe é peculiar, Bernardo Gonçalves Fernandes invoca Kant para dizer sobre a liberdade, o mais valioso de todos os direitos do homem: Segundo a doutrina filosófica de Kant, a liberdade constitui o maior direito do ser humano, sendo o único direito inato daquele. Aqui, liberdade é compreendida como autonomia (capacidade de autodirigir sua vida e suas escolhas a partir da razão). Nesse aspecto, o direito no pensamento do filósofo prussiano tem um papel fundamental, que é o de limitar arbítrios através do conceito de legalidade.

E continua o autor, com atenção voltada à liberdade de ação e o órgão constitucionalmente encarregado de, nas situações excepcionais, restringir o direito de atuação do ser humano:

[...] Nesses termos, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei.

Lei aqui tem sentido formal, de ato emanado através de um procedimento legislativo regular de tramitação no Congresso Nacional.

Apenas excepcionalmente há que se admitir a produção legislativa pelo Poder Executivo, mas sempre condicionada à apreciação do Congresso Nacional.

(grifo no original).

Aprofundando a discussão, podemos ainda alegar que os direitos fundamentais são direitos de defesa, constituindo-se como “instrumentos de proteção da liberdade individual contra interferências ilegítimas (usurpadoras) do Poder Público, independentemente, de sua ordem (ou seja, quer o ato provenha do Executivo, quer do Legislativo, quer do Judiciário)” .

A função de defesa dos direitos fundamentais visa limitar a atuação estatal (seja qual for o Poder que represente o Estado na situação).

Gomes Canotilho estabelece duas dimensões para a função de defesa: “(1) constituem, nem plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implica, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)” .

Parece lógico que o Poder Judiciário, componente do Estado, não pode, sem previsão legal, responsabilizar alguém por alguma obrigação, em qualquer esfera jurídica, não ficando essa limitação restrita ao Direito Penal e seus bens jurídicos tutelados.

Mesmo que se utilize todos os métodos interpretativos, o Poder Judiciário não pode modificar o ordenamento jurídico a ponto de acrescentar uma situação não prevista pelo legislador, ainda mais quando o assunto é responsabilidade.

Deve-se observar mais fielmente a legalidade neste caso. A Constituição estabelece o princípio da legalidade, e não o princípio da “jurisdicionalidade”. A Carta do Povo Brasileiro determina um limite ao Estado, independente do Poder (Executivo, Legislativo e Judiciário), órgão, entidade e ente que venha a expressar tal força estatal.

Na referida sucessão empresarial, a responsabilidade pode ser solidária ou subsidiária.

O artigo 124 do Código Tributário Nacional estabelece que são solidariamente obrigadas:

I – as pessoas que tenha interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;

II – as pessoas expressamente designadas por lei.

(grifo nosso).

A solidariedade é definida pelo artigo 264 do Código Civil:

Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.

Segundo o Código Tributário Nacional, a solidariedade tributária pode ser natural ou legal.

Será natural (inciso I), quando as pessoas tiverem interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal.

Conforme Carlos Jorge Sampaio Costa, “há interesse comum imediato em decorrência do resultado do fato gerador quando mais de uma pessoa se beneficiam diretamente com sua ocorrência” .

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em decisão prolatada no ano de 2018, bem enfrentou a questão, entendendo que:

“O artigo 124 do CTN trata de solidariedade que pode atingir o contribuinte (pessoa que tem relação com o fato gerador) e o responsável (pessoa assim indicada por lei), a dependente da configuração do interesse comum (inciso I) ou da indicação da expressa previsão em lei (inciso II).

No caso do artigo 124, I, o interesse comum ali referido é jurídico e não meramente econômico.

O interesse jurídico comum deve ser direto, imediato, na realização do fato gerador que deu ensejo ao lançamento, e resta configurado quando as pessoas participam em conjunto da prática dos atos descritos na hipótese de incidência” .

(grifo nosso).

Devendo existir um interesse direto e imediato na realização do fato gerador, a responsabilidade na sucessão empresarial não pode ser solidária, tendo em vista que a figura do responsável aparece em momento posterior à realização do fato gerador.

Seria a responsabilidade do sucessor solidária com base no inciso II? Certamente, desde que a previsão legal existisse.

O Código Tributário Nacional, ao prever no artigo 132 as situações ensejadoras da responsabilidade “por transferência” apenas mencionam que a haverá responsabilidade do sucessor, não dizendo em qual intensidade. Se solidária, subsidiária, integral.

Há silêncio do legislador. Em havendo silêncio do legislador, o inciso II do artigo 124 não foi observado, pois a solidariedade deve ser expressamente designada por lei.

O legislador veio a prever expressamente a responsabilidade solidária no artigo 233 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/1976), quando estabelece que, na cisão com extinção da companhia cindida (ou seja, cisão total), as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da cindida responderão solidariedade pelas obrigações da companhia extinta.

Aqui há previsão expressa que deve ser observada. Ocorre que a cisão também pode ser parcial. Neste caso, o mesmo legislador autorizou que as partes possam estipular se serão responsáveis solidários entre si ou com a companhia cindida (parágrafo único do artigo 233 da Lei n. 6.404/1976).

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