6. ANÁLISE SOBRE RECENTES ACONTECIMENTOS
No dia 04 de dezembro de 2018, a Receita Federal publicou Ato Declaratório Interpretativo nº 5, que prevê a probabilidade de o contribuinte ter que comprovar, através de documentos, a origem lícita dos recursos regularizados, além da exclusão do RERCT, perda dos benefícios da Lei e potenciais adversidades penais. Essa tentativa de inversão do ônus probatório causou insegurança jurídica e não possui qualquer suporte constitucional, pelo contrário. Fere princípios como o da proteção da confiança do Estado e da boa-fé do contribuinte, visto que, caso os contribuintes não depositassem confiança na lei, certamente teriam mantido os seus bens na obscuridade. Cabe à Receita apresentar provas contra os contribuintes.
A lei dispõe que, feita a DECART e quitada a obrigação em sua totalidade, ocorre extinção imediata da punibilidade e, por conseguinte, a presunção da regularidade jurídica do contribuinte. Porém, muitos contribuintes não têm como comprovar a origem dos recursos, principalmente pelo fator “tempo”. Mesmo sem provas, entretanto, não precisam se desesperar, pois a referida lei não obriga tal prova. A pretensão da Receita Federal afronta a lei. É uma tentativa de transferir aos contribuintes uma função que cabe a ela.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de a Lei de Repatriação ter gerado inúmeros benefícios financeiros ao país, existem diversos benefícios conferidos aos declarantes, que acabam por inviabilizar quaisquer investigações tanto na esfera tributária quanto criminal, permitindo que estes não sejam penalizados por crimes como evasão de divisas e sonegação fiscal, uma vez que, ao retornar seus objetos econômicos para o Brasil, a Lei de Repatriação descriminaliza suas ações, restando como penalidade apenas o pagamento de uma multa sobre a tributação destes bens.
O Ato Declaratório Interpretativo nº 5, norma publicada pela Receita Federal em 2018, veio prever a possibilidade de intimação do contribuinte declarante de ser intimado para apresentar “comprovação sobre a origem lícita dos recursos regularizados”. Referido ato, porém, não é compatível com o Estado Democrático de Direito e viola normas constitucionais, sendo considerado desleal.
Com relação aos municípios assegurados com recursos advindos da Lei de repatriação, indiscutível que receberam um valor considerável, em que pese estes recursos dificilmente chegarem como benefícios à população, principalmente em cidades de estados em crise econômica. Assim, é necessário que haja um planejamento por parte dos municípios para que toda a população seja beneficiada de fato, com investimentos relevantes na saúde, educação, transporte e infraestrutura.
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NOTA
[2] São as infrações penais praticadas pela elite e que não são reveladas ou apuradas, envolvendo tipicamente de colarinho branco, tais como sonegação fiscal, lavagem de dinheiro crimes eleitorais, etc.