Sobre a hierarquia das leis no Direito brasileiro

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08/06/2020 às 00:01

Resumo:


  • O Direito Constitucional envolve o estudo da Constituição Federal de 1988 e das leis que compõem o ordenamento jurídico brasileiro, como as leis complementares e ordinárias.

  • A hierarquia normativa é relevante para o controle de constitucionalidade e para resolver conflitos entre normas, sendo que normas de igual ou superior hierarquia podem revogar normas anteriores.

  • Normas constitucionais originárias, incluindo direitos fundamentais e cláusulas pétreas, estão no mesmo nível hierárquico, e a doutrina de Otto Bachof sobre a superioridade das cláusulas pétreas não é aceita no Brasil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Entender a formação do ordenamento jurídico brasileiro é importante para entender o funcionamento das leis e da justiça no Brasil. O presente texto tenta didaticamente explicar a teia complexa existente e resistente até hoje.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Constituição Federal brasileira de 1988. Lei Complementar. Lei Ordinária.


É importante conhecer e compreender corretamente a relação hierárquica existente entre as diferentes espécies normativas que integram nosso ordenamento jurídico.

Cumpre primeiramente esclarecer que a noção de hierarquia ou subordinação existente entre as normas é relevante principalmente para o controle de constitucionalidade das leis, bem como para resolver eventual conflito intertemporal.

Ressalte-se que por vezes, como há normas sucessivas no tempo, haja vista que a norma só pode ser revogada por outra norma de igual ou superior hierarquia.

A norma revogadora quando cuida de certa matéria só revogará a norma anterior, se possuir igual ou superior hierarquia daquela.

Cumpre primeiramente elucidar que não existe uma hierarquia entre normas constitucionais originárias. De sorte, que todas as normas elaboradas pelo Poder Constituinte originário, independentemente de seu conteúdo, posicionando-se no mesmo nível hierárquico.

Portanto, tanto as normas que consagram os direitos fundamentais como as cláusulas pétreas1, bem como as normas de conteúdo formalmente constitucional e até mesmo as normas integrantes do Ato das Disposições Transitórias (ADCT) pois todas essas normas se situam no mesmo patamar hierárquico.

Para o doutrinador Otto Bachof2, vislumbram-se duas grandezas de normas originárias, a saber: as normas consagradas como cláusulas pétreas seriam hierarquicamente superiores às demais normas constitucionais originárias.

Ipso facto, seria possível a declaração de inconstitucionalidade de normas constitucionais originárias que ofendessem as cláusulas pétreas.

Vale lembrar ainda que a tese do doutrinador alemão Oto Bachof não é admitida no Brasil.

Identificam-se duas correntes doutrinárias que informam a tese da inconstitucionalidade de normas constitucionais:

a) corrente que admite a inconstitucionalidade de normas constitucionais originárias; e

b) corrente que admite a inconstitucionalidade de normas oriundas de processo de revisão ou de emenda, sugerindo apenas contradição aparente entre as normas constitucionais originárias.

O ordenamento jurídico brasileiro acata a segunda corrente que sustenta que a inconstitucionalidade de normas constitucionais decorre do processo de reforma da Constituição pelo constituinte derivado, sempre que haja afronta às chamadas cláusulas pétreas3 (limitação de ordem material) ou ao próprio processo de reforma (limitação de ordem formal).

O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Ferreira Mendes registra que, após o advento da Constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal deparou-se com casos daquela natureza, todos consubstanciados nos seguintes julgados: ADI 3.367/DF, Relator Cezar Peluso, DJ 17.3.2006; ADI 3685/DF, Relatora Ellen Gracie, DJ 10.8.2006; ADI 3.128/DF Relator p/ acórdão Cezar Peluso, DJ 18.2.2005; ADI 3.105/DF, Relator Cezar Peluso, DJ 18.2.2005; MS 24.642/DF, Relator Carlos Velloso, DJ 18.06.2004; ADI 1.946/DF, Relator Sydney Sanches, DJ 16.5.2003; ADI-MC 1.946/DF, Relator Sydney Sanches, DJ 14.9.2001; ADI-MC 1.805/DF, Relator Néri da Silveira, DJ 14.11.2003; ADI-MC 1.497/DF, Relator Marco Aurélio, DJ 13.12.2002; ADI-MC 1.420/DF, Relator Néri da Silveira, DJ 19.12.1997; ADI 997/RS, Relator Moreira Alves, DJ 30.8.1996; ADI 815/DF, Relator Moreira Alves, DJ 10.5.1996; ADI 939/DF, Relator Sydney Sanches, DJ 18.3.1994; ADI-MC 926/DF, Relator Sydney Sanches, DJ 6.5.1994; ADI 830/DF, Relator Moreira Alves, DJ 16.9.1994; ADI 466/DF, Celso De Mello, DJ10.5.1991.

As cláusulas pétreas4 não se situam em patamar superior hierarquicamente ao das normas constitucionais originárias.

Lembremos que as cláusulas pétreas5 correspondem às limitações do Poder Constituinte derivado reformador, na modificação ulterior do texto constitucional, pois estas não constituem limites impostos à atuação do poder constituinte originário, na feitura das normas constitucionais originárias.

Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é inviável o controle de constitucionalidade de norma constitucional originária em face da outra norma constitucional originária de hierarquia inferior.

Normas constitucionais derivadas são as resultantes de emendas à Constituição, por labor do poder constituinte derivado reformador. E, distinguem-se das normas constitucionais originárias que são aquelas inseridas pelo poder constituinte originário na Constituição no momento de sua elaboração.

Tais normas constitucionais derivadas ingressam no ordenamento jurídico no mesmo nível hierárquico das originárias, portanto, entre essas normas não existe hierarquia.

Há, entretanto, relevante distinção entre essas, pois enquanto as normas constitucionais originárias não se submetem ao controle de constitucionalidade, as normas derivadas poderão ser declaradas inconstitucionais em caso de violações aos limites estabelecidos pela Constituição Federal6 (art. 60).

Analisando as normas federais, estaduais e municipais e distritais convém ressaltar que também não existe hierarquia entre as normas oriundas de diferentes entes da federação brasileira.

Portanto, descabe afirmar a superioridade da lei federal em face da lei estadual ou municipal. Afinal, o exercício de suas competências legislativas constitucionais, cada ente federado é dotado de autonomia política, inexistindo subordinação entre estes.

A prevalência em caso de conflito de normas federais, estaduais e municipais, não ocorre por critério hierárquico, mas ocorre através de regras de competência fixadas pelo texto constitucional.

No eventual conflito, a lei que prevalecerá será aquela oriunda do ente federado competente para o tratamento da matéria, conforme a repartição de competências estabelecida na CF/1988.

Deve-se ressalvar que existe relação hierárquica entre a Constituição Federal e as constituições estaduais e Leis Orgânicas municipais. Pois nesse caso, a Carta Magna situa-se em plano superior em relação a todas as demais. Por sua vez, a Constituição Estadual está situada de forma superior à Lei Orgânica do Município. A Lei Orgânica do Distrito Federal é equiparada à Constituição Estadual.

As espécies normativas primárias são as que integram o processo legislativo constitucional, ou seja, as emendas constitucionais, leis7 complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias8, decretos legislativos e resoluções.

As normas primárias porque derivam diretamente da Constituição Federal, vale dizer, porque retiram o seu fundamento de validade diretamente da Constituição Federal.

Com exceção das emendas à Constituição (que, propriamente, constituem normas constitucionais0 todas as demais espécies normativas primárias que integram o processo legislativo situam-se no mesmo plano hierárquico.

Desta forma, ratifico que não há hierarquia entre lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto legislativo e resolução.

A referida distinção entre tais espécies normativas é fixada pela Constituição Federal, mediante a reserva de matérias a cada uma das espécies.

Trata-se de mera reserva constitucional de competências e, não de relação hierárquica. Todas as normas que integram o processo legislativo situam-se no mesmo plano hierárquico.

É curial para compreender o Direito Constitucional, estudar a hierarquia de normas, pelo que a doutrina denomina pirâmide de Kelsen9. Tal pirâmide fora concebida pelo jurista austríaco para fundamentar a sua teoria baseada na ideia de que as normas jurídicas inferiores (normas fundadas) retiram seu fundamento de validade das normas jurídicas superiores (normas fundantes).

A referida pirâmide de Kelsen tem a Constituição como seu vértice, por ser esta o fundamento de validade de todas as demais normas do sistema jurídico. Assim, nenhuma norma do ordenamento jurídico pode se opor à Constituição: esta é superior a todas as demais normas jurídicas, as quais são, por isso mesmo, denominadas infraconstitucionais.

Dentro da Constituição, existem normas constitucionais originárias e normas constitucionais derivadas. As originárias são fruto do Poder Constituinte Originário10 (o poder que elabora a nova Constituição); elas integram o texto constitucional desde que ele foi promulgado, em 1988.

Enquanto que as normas derivadas são aquelas que resultam da manifestação do Poder Constituinte Derivado (poder que altera a Constituição), são as chamadas emendas constitucionais que também se situam no topo da pirâmide de Kelsen.

Cumpre destacar que não existe hierarquia entre as normas constitucionais originárias; não existe hierarquia entre normas constitucionais originárias e normas constitucionais derivadas.

Apesar de inexistente hierarquia, há uma importante diferença entre estas: as normas constitucionais originárias não podem ser declaradas inconstitucionais.

Assim, as normas constitucionais originárias não podem ser objeto de controle de constitucionalidade. Já as emendas constitucionais, as derivadas, poderão, efetivamente, ser alvo de controle de constitucionalidade.

Com a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004 abriu-se uma nova e importante possibilidade no ordenamento jurídico brasileiro. Pois os tratados e convenções internacionais de direitos humanos aprovados em cada Casa do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, passaram a ser equivalentes às emendas constitucionais. Situam-se, portanto, no ápice da pirâmide de Kelsen11, tendo status de emenda constitucional.

Diz-se que os tratados de direitos humanos, ao serem aprovados por esse rito especial que ingressaram no chamado bloco de constitucionalidade. Em virtude da matéria de que tratam (direitos humanos), esses tratados estão gravados por cláusula pétrea, e, estando, portanto, imunes à denúncia pelo Estado brasileiro.

O primeiro tratado de direitos humanos a receber o status de emenda constitucional foi a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo”.

Os demais tratados internacionais sobre direitos humanos, aprovados pelo rito ordinário, têm, segundo o STF, “status” supralegal. Isso significa que se situam logo abaixo da Constituição e acima das demais normas do ordenamento jurídico

A EC nº 45/2004 trouxe ao Brasil, portanto, segundo o Prof. Valério Mazzuoli, um novo tipo de controle da produção normativa doméstica: o controle de convencionalidade das leis.

Assim, as leis internas estariam sujeitas a um duplo processo de compatibilização vertical, devendo obedecer aos comandos previstos na Carta Constitucional e, ainda, aos previstos em tratados internacionais de direitos humanos regularmente incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro.

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As normas imediatamente abaixo da Constituição (infraconstitucionais) e dos tratados internacionais sobre direitos humanos são as leis (complementares, ordinárias e delegadas), as medidas provisórias, os decretos legislativos, as resoluções legislativas, os tratados internacionais em geral incorporados ao ordenamento jurídico e os decretos autônomos.

Neste momento, é importante perceber quais são as normas infraconstitucionais e que elas não possuem hierarquia entre si, segundo doutrina majoritária.

Essas normas são primárias, sendo capazes de gerar direitos e criar obrigações, desde que não contrariem a Constituição.

As normas federais, estaduais, distritais e municipais possuem o mesmo grau hierárquico. Assim, um eventual conflito entre normas federais e estaduais ou entre normas estaduais e municipais não será resolvido por um critério hierárquico; a solução dependerá da repartição constitucional de competências.

Deve-se perguntar o seguinte: de qual ente federativo (União, Estados ou Municípios) é a competência para tratar do tema objeto da norma? Nessa ótica, é plenamente possível que, num caso concreto, uma lei municipal prevaleça diante de uma lei federal.

Questiona-se, afinal: Existe hierarquia entre a Constituição Federal, as Constituições Estaduais e as Leis Orgânicas dos Municípios? Sim, a Constituição Federal está num patamar superior ao das Constituições Estaduais que, por sua vez, são hierarquicamente superiores às Leis Orgânicas.

As leis complementares12, apesar de serem aprovadas por um procedimento mais dificultoso, têm o mesmo nível hierárquico das leis ordinárias.

O que as diferencia é o conteúdo: ambas têm campos de atuação diversos, ou seja, a matéria (conteúdo) é diferente. Como exemplo, citamos o fato de que a CF/88 exige que normas gerais sobre direito tributário sejam estabelecidas por lei complementar.

As leis complementares podem tratar de tema reservado às leis ordinárias. Esse entendimento deriva da ótica do quem pode mais, pode menos”.

Ora, se a CF/88 exige lei ordinária (cuja aprovação é mais simples!) para tratar de determinado assunto, não há óbice a que uma lei complementar regule o tema.

No entanto, caso isso ocorra, a lei complementar será considerada materialmente ordinária; essa lei complementar poderá, então, ser revogada ou modificada por simples lei ordinária.

Diz-se que, nesse caso, a lei complementar irá subsumir-se ao regime constitucional da lei ordinária.

As leis ordinárias não podem tratar de tema reservado às leis complementares. Caso isso ocorra, estaremos diante de um caso de inconstitucionalidade13 formal (nomodinâmica).

Os regimentos dos tribunais do Poder Judiciário são considerados normas primárias, equiparados hierarquicamente às leis ordinárias. Na mesma situação, encontram-se as resoluções do CNMP (Conselho Nacional do Ministério público) e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Os regimentos das Casas Legislativas (Senado14 e Câmara dos Deputados), por constituírem resoluções legislativas, também são considerados normas primárias, equiparados hierarquicamente. às leis ordinárias.

Finalmente, abaixo das leis encontram-se as normas infralegais. Elas são normas secundárias, não tendo poder de gerar direitos, nem, tampouco, de impor obrigações.

Não podem contrariar as normas primárias, sob pena de invalidade. É o caso dos decretos regulamentares, portarias, das instruções normativas, dentre outras. É preciso ter cuidado para não confundir os decretos autônomos (normas primárias, equiparadas às leis) com os decretos regulamentares (normas secundárias, infralegais).

Considerando as mais recentes decisões do STF15, verifica-se realmente uma nova configuração na pirâmide de Kelsen. No topo da pirâmide que hierarquiza o ordenamento jurídico brasileiro está a Constituição Federal, as Emendas Constitucionais e os Tratados Internacionais que tratam de Direitos Humanos que passaram pelo procedimento de emendas constitucionais.

No segundo patamar estão situados os tratos internacionais de direitos humanos que não passaram pelo procedimento de emenda constitucional, pois, segundo o STF, atualmente, os mesmos, possuem status de norma supralegal, portanto, estão acima das leis, mas abaixo da Constituição Federal.

No terceiro patamar situam-se as Leis Ordinárias, Leis Complementares, Leis Delegadas, Resoluções, Decretos Legislativos, Tratados Internacionais que não tratem de direitos humanos e, por fim, medidas provisórias. Na base da pirâmide constam ainda os Decretos, Portarias e demais atos infralegais.

A Reforma Trabalhista introduzida pela Lei 13.467/201716 e nos chama atenção pelo acréscimo do segundo parágrafo do artigo 8º da CLT, que dispõe: "Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.".

É essencial para entender a aplicabilidade das normas constitucionais que ocorra a escorreita interpretação da Constituição Federal. Daí se pode deduzir seu alcance e realizabilidade dos diversos dispositivos da Constituição. Lembrando que todas as normas constitucionais apresentam juridicidade. Portanto, são imperativas e cogentes, pois surtem seus efeitos, o que varia é o grau de eficácia.

A doutrina norte-americana(clássica) distingue duas espécies de normas constitucionais quanto à aplicabilidade: normas autoexecutáveis (self executing) e as normas não-autoexecutáveis.

As normas autoexecutáveis17 são as que podem ser aplicadas sem a necessidade de qualquer complementação, assim são normas completas, bastantes em si mesmas. Enquanto que as não-executáveis são dependentes de complementação legislativa antes de serem aplicadas.

Trata-se de normas incompletas ou programáticas (pois definem diretrizes para as políticas públicas) e as normas de estruturação (que instituem órgãos, mas deixam para a lei a tarefa de organizar o seu funcionamento).

Apesar da doutrina norte-americana seja bastante didática, a classificação de normas com relação à sua aplicabilidade mais aceita no brasil foi a proposta pelo Professo José Afonso da Silva.

Assim, a partir da aplicabilidade das normas constitucionais o referido doutrinador classifica as normas constitucionais, em três grupos, a saber: 1. normas de eficácia plena; 2. normas de eficácia contida; 3. normas de eficácia limitada.

Normas constitucionais de eficácia limitada18 são aquelas que dependem de regulamentação futura para produzirem todos os seus efeitos.

É um exemplo, o artigo 37, inciso VII, da CF/1988 que trata do direito de greve dos servidores públicos (o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica).

As normas constitucionais de eficácia limitada possuem as seguintes características: a) são não-autoaplicáveis, ou seja, dependem de complementação legislativa para que possam produzir os seus efeitos. b) possuem aplicabilidade indireta (dependem de norma regulamentadora para produzir seus efeitos) mediata (a promulgação do texto constitucional não é suficiente para que possam produzir todos os seus efeitos) e reduzida (possuem um grau de eficácia restrito quando da promulgação da Constituição.

As normas de eficácia contida estão aptas a produzir todos os seus efeitos desde o momento em que a Constituição é promulgada. A lei posterior, caso editada, irá restringir a sua aplicação. As normas de eficácia limitada não estão aptas a produzirem todos os seus efeitos com a promulgação da Constituição; elas dependem, para isso, de uma lei posterior, que irá ampliar o seu alcance.

José Afonso da Silva subdivide as normas de eficácia limitada em dois grupos, a saber: normas declaratórias de princípios institutivos ou organizativos: são aquelas que dependem de lei para estruturar e organizar as atribuições de instituições, pessoas e órgãos previstos na Constituição. É o caso, por exemplo, do artigo 88 da CF/1988, segundo o qual a lei disporá sobre a criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública.

As normas definidoras de princípios institutivos19 ou organizativos podem ser impositivas (quando impõem ao legislador uma obrigação de elaborar a lei regulamentadora) ou facultativas (quando estabelecem mera faculdade ao legislador).

O artigo 88, da CF/1988, é exemplo de norma impositiva, como exemplo de norma facultativa, o artigo 125, terceiro parágrafo, da CF/1988 que dispõe que a lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual.

As normas constitucionais de eficácia plena são aquelas, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos que o legislador constituinte quis regular. É o caso de artigo 2º da CF/1988, que diz: são Poderes da União, independentes e harmônios entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

As normas de eficácia plena possuem as seguintes características, a saber: são autoaplicáveis, independem de lei posterior regulamentadora que lhes complete o alcance e o sentido.

Isso não significa que não possa existir a lei regulamentadora versando sobre a norma de eficácia plena. Apesar disto, a norma em questão já produz todos seus efeitos de imediato, independentemente de qualquer tipo de regulamentação.

São não-restringíveis, ou seja, caso existe uma lei tratando de uma norma de plena eficácia, esta não poderá limitar sua aplicação. Possuem aplicabilidade direta, imediata e integral (sem sofrer limitações ou restrições).

Já as normas constitucionais de eficácia contida20 ou prospectiva, são normas que estão aptas produzir todos os seus efeitos desde o momento da promulgação da Constituição, mas que podem ser restringidas por parte do Poder Público.

Cabe destacar que a atuação do legislador, no caso das normas de eficácia contida, é discricionária: ele não precisa editar a lei, mas poderá fazê-lo;

Um exemplo clássico é o artigo 5º, inciso III da CF/1988, segundo o qual é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

Em razão desse dispositivo, é assegurada a liberdade profissional, desde a promulgação da Constituição, todos já podem exercer qualquer trabalho. Mas, a lei poderá estabelecer restrições ao exercício de algumas profissões. É o caso de aprovação no exame da OAB como pré-requisito no exercício da advocacia.

As normas de eficácia contida possuem as seguintes características, a saber: são autoaplicáveis, estão aptas a produzir todos os seus efeitos, independentemente da lei regulamentadora. Mas, depois da regulamentação poderá existir restrições ao exercício do direito.

São restringíveis, portanto, sujeitas às limitações ou restrições impostas por lei, ou por outra norma constitucional, artigo 139, da CF/1988 prevê a possibilidade que sejam impostas restrições a certos direitos e garantias fundamentais durante o estado de sítio.

Conceitos ético-jurídicos indeterminados21, é quando se estabelece o iminente perigo público, que poderá limitar o direito de propriedade.

Possuem aplicabilidade direta, não depende de norma regulamentadora para produzir seus efeitos, imediata, e possivelmente não-integral.

Normas constitucionais22 de eficácia limitada são aquelas que dependem de regulamentação futura para produzirem todos os seus efeitos.

É um exemplo, o artigo 37, inciso VII, da CF/1988 que trata do direito de greve dos servidores públicos (o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica).

As normas constitucionais de eficácia limitada possuem as seguintes características:

a) são não-autoaplicáveis, ou seja, dependem de complementação legislativa para que possam produzir os seus efeitos;

b) possuem aplicabilidade indireta (dependem de norma regulamentadora para produzir seus efeitos) mediata (a promulgação do texto constitucional não é suficiente para que possam produzir todos os seus efeitos) e reduzida (possuem um grau de eficácia restrito quando da promulgação da Constituição.

As normas de eficácia contida estão aptas a produzir todos os seus efeitos desde o momento em que a Constituição é promulgada. A lei posterior, caso editada, irá restringir a sua aplicação.

As normas de eficácia limitada não estão aptas a produzirem todos os seus efeitos com a promulgação da Constituição; elas dependem, para isso, de uma lei posterior, que irá ampliar o seu alcance.

José Afonso da Silva subdivide as normas23 de eficácia limitada em dois grupos, a saber: normas declaratórias de princípios institutivos ou organizativos: são aquelas que dependem de lei para estruturar e organizar as atribuições de instituições, pessoas e órgãos previstos na Constituição.

É o caso, por exemplo, do artigo 88 da CF/1988, segundo o qual a lei disporá sobre a criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública.

As normas definidoras de princípios institutivos ou organizativos podem ser impositivas (quando impõem ao legislador uma obrigação de elaborar a lei regulamentadora) ou facultativas (quando estabelecem mera faculdade ao legislador).

O artigo 88, da CF/1988, é exemplo de norma impositiva, como exemplo de norma facultativa, o artigo 125, terceiro parágrafo, da CF/1988 que dispõe que a lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual. normas declaratórias de princípios programáticos: são aquelas que estabelecem programas a serem desenvolvidos pelo legislador infraconstitucional.

Um exemplo é o art. 196. da Carta Magna (a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”).

Cabe destacar que a presença de normas programáticas24 na Constituição Federal é que nos permite classificá-la como uma Constituição- dirigente

É importante destacar que as normas de eficácia limitada, embora tenham aplicabilidade reduzida e não produzam todos os seus efeitos desde a promulgação da Constituição, possuem eficácia jurídica.

Frise-se que a eficácia dessas normas é limitada, porém existente! Diz-se que as normas de eficácia limitada possuem eficácia mínima. Diante dessa afirmação, cabe-nos fazer a seguinte pergunta: quais são os efeitos jurídicos produzidos pelas normas de eficácia limitada?

As normas de eficácia limitada produzem imediatamente, desde a promulgação da Constituição, dois tipos de efeitos: i) efeito negativo; e ii) efeito vinculativo.

O efeito negativo consiste na revogação de disposições anteriores em sentido contrário e na proibição de leis posteriores que se oponham a seus comandos. Sobre esse último ponto, vale destacar que as normas de eficácia limitada servem de parâmetro para o controle de constitucionalidade das leis.

O efeito vinculativo, por sua vez, se manifesta na obrigação de que o legislador ordinário edite leis regulamentadoras, sob pena de haver omissão inconstitucional, que pode ser combatida por meio de mandado de injunção ou Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO)25.

Ressalte-se que o efeito vinculativo também se manifesta na obrigação de que o Poder Público concretize as normas programáticas previstas no texto constitucional.

A Constituição não pode ser uma mera “folha de papel”; as normas constitucionais devem refletir a realidade político-social do Estado e as políticas públicas devem seguir as diretrizes26 traçadas pelo Poder Constituinte Originário.

As leis ordinárias são aprovadas por maioria27 simples de votos conforme prevê o artigo 47 da CF/1988, ao passo que as leis complementares exigem a maioria absoluta de votos, conforme prevê o artigo 69 da CF/1988.

E, a partir dessa distinção o texto constitucional vigente adota a seguinte regra para a reserva de matéria. Assim, quando se menciona in litteris: “A lei disporá ou “nos termos da lei”, e, etc, trata-se de lei ordinária.

E quando a Constituição quer reservar certa matéria à lei complementar, está o faz expressamente, “cabe a lei complementar”, “nos termos da lei complementar”.

Em face do referido tratamento constitucional brasileiro, a relação entre lei ordinária e lei complementar sempre foi alvo de discussão doutrinária desde a promulgação da CF/1988.

A lei ordinária não pode disciplinar matéria reservada constitucionalmente para lei complementar, sob pena de incorrer em inconstitucionalidade formal.

A lei complementar, por sua vez, não pode disciplinar matéria reservada para a lei ordinária, sem incorrer no vício de inconstitucionalidade formal. Mas, in casu, a lei complementar perderá seu status de norma complementar e poderá ser depois revogada, por norma ordinária (trata-se de excepcional hipótese de revogação de lei complementar por lei ordinária).

Frise-se novamente que não existe hierarquia entre leis ordinárias e lei complementares. E, o eventual conflito se resolve pela distinção de matéria entre essas normas e conforme exista ou não, reserva constitucional específica.

Quanto aos tratados internacionais, compete ao Presidente da República, na condição do Chefe de Estado, em nome da República Federativa do Brasil, celebrar tratados internacionais (art. 84, VIII da CF/1988).

Depois de celebrado, caberá ao Congresso nacional aprová-lo, com a expedição de um decreto legislativo (art. 49, I da CF/1988). Para obter eficácia obrigatória, o tratado internacional precisa ser promulgado pelo Presidente da República, por decreto.

Os tratados internacionais28 sobre os direitos humanos (TTDH) são incorporados por rito especial do terceiro parágrafo do artigo 5º da CF/1988 e, serão equivalentes às emendas constitucionais brasileiros.

Os mesmos referidos tratados são incorporados pelo rito ordinário e, serão dotados do status supralegal (norma acima das leis, porém abaixo da Constituição).

Q uanto aos tratados internacionais em geral, que não versem sobre os direitos humanos têm hierarquia de lei ordinária federal. Quanto aos decretos do Presidente da República que são expedidos para fiel execução das leis (art.84, IV da CF/1988).

Compete ainda ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar em majoração de despesas e nem criação ou extinção de órgãos públicos, e ainda, extinção de funções de órgãos públicos, quando vagos (art. 84, IV da CF/1988).

Os Regimentos Internos29 dos Tribunais do Poder Judiciário, de acordo com a competência prevista no artigo 96, I, a da CF/1988 e, são, pois, normas primárias sendo equiparadas hierarquicamente às leis.

Também são normas primárias aquelas resoluções do Conselho nacional de Justiça (CNJ), do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e do Tribunal de Contas da União (TCU) no âmbito de suas competências constitucionais.

E , também os atos expedidos pelas Agências Reguladoras dentro do âmbito de suas competências técnicas30.

O status do direito pré-constitucional, editado na vigência das Constituições pretéritas, é determinado pela nova Constituição, de acordo com o tratamento por esta, determinado para cada matéria.

Desta forma, a Constituição federal brasileira de 1988 passou a exigir a lei complementar para disciplinar certa matéria que na vigência da Constituição pretérita, a de 1969, era disciplinável por lei ordinária.

A lei ordinária pré-constitucional, se houver compatibilidade material com a CF/1988, será recepcionada por uma lei com status de lei complementar.

De qualquer forma, é importante ressaltar que no direito constitucional moderno e mesmo no contemporâneo não existem direitos fundamentais e nem garantias fundamentais de natureza absoluta.

Até mesmo o direito à vida poderá ser legitimamente afastado, por exemplo, na hipótese de guerra declarada, vide o artigo 5º, XLVII da vigente Constituição federal brasileira.

A necessidade de haver de convivência harmonia31 entre os direitos e garantias constitucionais impede a existência de valores absolutos principalmente porque um direito fundamental deverá respeitar os demais que sejam igualmente protegidos constitucionalmente.

Ensina a boa doutrina que diante de eventual conflito de direitos fundamentais, deverá o aplicador do direito realizar, a saber: a) afastar a tese da existência da hierarquia ou subordinação entre os direitos fundamentais conflitantes (isto é, não deverá o intérprete, nunca partir da premissa de que um dos direitos fundamentais, abstratamente considerado, é superior ao outro e, que, portanto, deverá sempre prevalecer.

Ainda diante de colisão de direitos fundamentais no caso concreto, os dois direitos conflitantes continuarão a viger no ordenamento jurídico. Com a aplicação do princípio da harmonização ou de concordância prática, é possível emitir juízo da ponderação entre direitos fundamentais conflitantes, de forma que, partindo de características do caso concreto, possa decidir pela prevalência de um ou do outro direito fundamental, sem, contudo, aniquilar qualquer deles.

Com o princípio da harmonização afasta-se a noção de hierarquia, o caso concreto mediante a imposição de limites recíprocos aos valores conflitantes, de forma, a conseguir a concordância prática entre os direitos fundamentais em conflito.

Sobre a autora
Gisele Leite

Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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