Condição jurídica do estrangeiro

13/06/2020 às 11:39

Resumo:


  • O asilo territorial é concedido a estrangeiros em território nacional para evitar punição ou perseguição por motivos políticos ou ideológicos.

  • O refúgio é reconhecido a indivíduos que, devido a fundados temores de perseguição, não podem ou não desejam retornar ao seu país de origem, por motivos como raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas.

  • A expulsão de estrangeiros, diferentemente da deportação, é uma medida repressiva para retirar do território nacional aqueles que violaram as leis locais, visando à segurança e ordem pública do Estado expulsor.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Devemos distinguir asilo territorial, asilo diplomático e, por fim, refúgio.

No Direito Internacional Público, sabe-se que um Estado não é obrigado a aceitar, em seu território, o ingresso de estrangeiros, quer a título provisório, quer a título permanente. Sendo assim, o direito de admitir ou não estrangeiros em seu território, de admitir condicionalmente ou de expulsá-los é consequência necessária da soberania estatal.

O asilo territorial consiste no recebimento de estrangeiro em território nacional, sem os requisitos ordinários de ingresso, para evitar punição ou perseguição baseada em crime de natureza política ou ideológica, geralmente praticado em seu país de origem. Tal concessão tem por objetivo proteger a pessoa que, por motivos políticos ou ideológicos, se sinta perseguida ou ameaçada.

Independentemente do que enuncia a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, de 1948, em seu artigo 27 — ao prescrever que “Toda pessoa tem o direito de procurar e receber asilo em território estrangeiro, em caso de perseguição que não seja motivada por delitos de direitos comuns (crimes comuns), e de acordo com a legislação de cada país e com as convenções internacionais” —, a Constituição de 1988 prevê a concessão de asilo político, seja territorial, seja diplomático, sem quaisquer restrições, sendo este um dos princípios pelos quais a República Federativa do Brasil deve reger-se em suas relações internacionais, conforme o artigo 4º, inciso X.

Anoto, desde já, a lúcida ponderação do Ministro Nélson Hungria (Comentários ao Código Penal, v. I, tomo I, 5. ed., Rio de Janeiro, 1977, p. 367), para quem “a indagação para outorga de asilo, seja o diplomático, seja o territorial, não deve limitar-se ao caráter político deste ou daquele crime imputado, mas atender, também, ao móvel político da acusação, ainda que esta seja refalsadamente por crime comum”. Para o príncipe dos penalistas brasileiros, não só a perseguição por crimes políticos condiciona o asilo, mas também a perseguição por motivos políticos.

O asilo político, em regra, configura-se como asilo territorial, concedido ao estrangeiro que, tendo cruzado a fronteira e ingressado no território nacional, ali requereu o benefício. Já o asilo diplomático ou extraterritorial é modalidade de asilo dotada de provisoriedade e precariedade, concedida, no âmbito latino-americano, pelo Estado fora de seu território, isto é, no próprio território onde o indivíduo está sendo perseguido. Tal concessão ocorre em locais imunes à jurisdição daquele Estado, como embaixadas, representações diplomáticas, navios de guerra, acampamentos ou aeronaves militares.

A teor do artigo 5º da Convenção de Caracas, uma vez concedido o asilo, o Estado asilante pode solicitar a saída do asilado para território estrangeiro, sendo o Estado territorial obrigado a concedê-la imediatamente, salvo motivo de força maior. O salvo-conduto é requerido pela autoridade asilante — normalmente o embaixador —, a fim de que o asilado possa deixar o país com segurança e receber o asilo territorial no Estado disposto a acolhê-lo, impedindo que seja detido no percurso entre a embaixada e o aeroporto internacional da capital de seu país.

E se o Estado se negar a conceder o salvo-conduto? No precedente Haya de la Torre (chefe do Partido Aprista Peruano), em caso rumoroso envolvendo Peru e Colômbia, a Corte Internacional de Justiça entendeu que as partes, por princípios de cortesia e boa-vizinhança, devem chegar a solução prática, exigindo, contudo, a caracterização de urgência prevista na Convenção de Havana.

Por sua vez, o refúgio, tratado na Lei nº 9.474, de 22 de julho de 1997, reconhece como refugiado todo indivíduo que: (i) devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção desse país; (ii) não possuindo nacionalidade e estando fora do país em que antes residia habitualmente, não possa a ele regressar; ou (iii) em razão de grave e generalizada violação de direitos humanos, seja obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro.

Tal definição segue a estabelecida pela Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e por seu Protocolo de 1966. Observa-se que o status de refugiado decorre não apenas de perseguição política, mas também de perseguições por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política.

O artigo 8º da Lei nº 9.474 estabelece que o ingresso irregular em território nacional não constitui impedimento para que o estrangeiro solicite refúgio às autoridades competentes. Uma vez satisfeitas as exigências, o solicitante é amparado pelo Estatuto dos Refugiados de 1951, impedindo-se sua exclusão injustificada para país em que já sofreu ou possa vir a sofrer perseguição.

Compete ao Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), em deliberação coletiva, analisar o pedido, reconhecendo ou determinando a perda, em primeira instância, da condição de refugiado. Da decisão negativa, cabe recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no prazo de quinze dias.

É certo que se poderá falar em deportação ou extradição. A causa da primeira é o não cumprimento dos requisitos necessários para o ingresso regular ou para a permanência no país, sendo diversa, portanto, da prática de crime. Por outro lado, a prática de delito pode ser razão para expulsão ou extradição de estrangeiros, mas não para sua deportação.

Anoto que a expulsão é medida repressiva por meio da qual um Estado retira de seu território estrangeiro que, de alguma maneira, ofendeu ou violou as regras de conduta ou as leis locais, praticando atos contrários à segurança e à tranquilidade do país. Trata-se de medida político-administrativa.

Se autorizada pelo Supremo Tribunal Federal a extradição, compete ao Presidente da República decidir, em definitivo, sobre a conveniência da entrega, cabendo-lhe a palavra final. É perfeitamente possível que a autorização do STF não seja efetivada pelo Chefe do Executivo, conforme se lê do artigo 84, inciso VII, da Constituição Federal.

Seja como for, a extradição distancia-se da abdução, que consiste no sequestro de indivíduo que se encontra em determinado Estado para ser julgado no território de outro, em violação às regras do Direito Internacional.

O reconhecimento da condição de refugiado impede o prosseguimento de eventual pedido de extradição, a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal, quando fundado nos mesmos fatos que justificaram a concessão do refúgio. Havendo expulsão, esta não resultará na retirada do estrangeiro para país em que sua vida, liberdade ou integridade física possam estar em risco.

Ressalte-se, por fim, que as situações envolvendo refúgio não dizem respeito apenas a casos individuais de pessoas que buscam asilo em determinado país para salvaguardar suas vidas, mas a contextos coletivos em que grupos inteiros deixam seus Estados em razão de crises econômicas, guerras civis ou perseguições fundadas em motivos raciais ou religiosos, buscando proteção em outro território.


Expulsão de Estrangeiros

A Lei de Migração estabelece que o estrangeiro não deve ser deportado ou repatriado se houver risco de morte ou ameaça à sua integridade pessoal em caso de retorno ao país de origem.

Nos termos do artigo 54, a expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional, com impedimento de reingresso, nos casos de condenação judicial transitada em julgado relativa à prática de:
I – crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão; ou
II – crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade.

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Não se procederá à repatriação, à deportação ou à expulsão de nenhum indivíduo quando subsistirem razões para acreditar que a medida poderá colocar em risco sua vida ou integridade pessoal.

O artigo 50, §§ 1º a 4º, fixa prazo de 60 dias (renováveis por igual período) para a deportação, retirando da Polícia Federal o poder de deportação sumária. O artigo 51, caput e § 1º, por sua vez, assegura a atuação da Defensoria Pública da União na defesa dos estrangeiros.

A expulsão fundamenta-se no interesse de preservar a segurança e a ordem pública e social do Estado expulsor, visando à sua conservação. É dirigida àqueles que atentem contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular.

A expulsão não constitui pena criminal. Trata-se de medida político-administrativa, em regra sem intervenção do Poder Judiciário quanto ao mérito da decisão. Contudo, por ser medida discricionária, pode ser impugnada judicialmente caso extrapole os limites legais ou viole direitos fundamentais. Nesses casos, cabe inclusive habeas corpus para combater arbitrariedades.

O estrangeiro expulso não poderá retornar ao solo brasileiro, conforme dispõe o artigo 338 do Código Penal.


Missões Diplomáticas

As missões diplomáticas destinam-se a assegurar a manutenção de boas relações entre o Brasil e os Estados em que se acham sediadas, bem como a proteger os direitos e interesses do Brasil e de seus nacionais, conforme a Lei nº 3.917, de 14 de julho de 1961.

A missão diplomática é integrada pelo Chefe da Missão (embaixador ou ministro), pelo pessoal diplomático, administrativo e técnico, além do pessoal de serviço.

Em 1961, foi assinada a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, que codificou a matéria. A ênfase da Convenção recai sobre a missão diplomática como instituição, relegando a figura do chefe da missão a segundo plano.

Nos termos da terminologia adotada, a expressão “agente diplomático” abrange o chefe da missão ou qualquer membro do corpo diplomático. No passado, sob o Regulamento de Viena de 1815, tal expressão era reservada apenas ao chefe da missão.

Na escolha e nomeação dos agentes diplomáticos, cada Estado fixa as qualidades e requisitos de idoneidade exigidos, bem como o modo de designação. Em muitos países, o corpo diplomático é formado por funcionários de carreira.

Em regra, os agentes diplomáticos são nacionais do país que os nomeia, embora nada impeça que sejam de outra nacionalidade. Contudo, a prática internacional desaconselha a escolha de nacional do Estado junto ao qual exercerá funções, em razão do risco de conflito de interesses.

O Direito Internacional recomenda que, antes da nomeação, o governo interessado solicite a aceitação prévia do Estado receptor, em consulta conhecida como pedido de agrément (ou agréation).

O agente diplomático deve portar, além de outros documentos, um passaporte diplomático (identificação) e uma carta credencial (acreditação).

Seus deveres podem ser resumidos em três: representação, observação e proteção.


Caso dos Diplomatas Venezuelanos

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, confirmou liminar anteriormente deferida que autorizou a permanência de diplomatas venezuelanos no Brasil enquanto durar o estado de calamidade pública e emergência sanitária reconhecido pelo Congresso Nacional (HC 184828).

Em maio de 2020, Barroso havia suspendido, por dez dias, a execução da ordem de expulsão, até que o governo apresentasse informações sobre a urgência da medida. A decisão posterior, confirmatória da liminar, foi tomada após análise de informações apresentadas pelo Ministério das Relações Exteriores, Advocacia-Geral da União e parecer da Procuradoria-Geral da República.

O ministro ressaltou que a decisão do Presidente da República determinando a expulsão era válida, por estar no âmbito de sua discricionariedade política. Contudo, entendeu que os efeitos da ordem deveriam ser suspensos durante a situação de calamidade pública, já que não se tratava de providência urgente que justificasse expor os diplomatas venezuelanos a deslocamento terrestre em meio à pandemia, com risco de contaminação.

Assim, ratificou a liminar “para, sem interferir com a validade da decisão político-administrativa do Presidente da República, suspender temporariamente sua eficácia, assegurando que os diplomatas permaneçam em território nacional enquanto durar o estado de calamidade pública e emergência sanitária reconhecido pelo Congresso Nacional”.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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