"O Brasil precisa estar mais atento à Região Amazônica para impedir movimentos em defesa de sua internacionalização". [01]
Essa questão se expressa pelo risco de uma perda de controle concreto do território para atores sem identidade de Estado (a guerrilha, o narcotráfico, organizações não-governamentais), ou pela perspectiva difusa de uma "internacionalização da Amazônia", a partir de uma má ou insuficiente gestão brasileira.
No início do século XX, no auge do ciclo da borracha, foram demarcadas as fronteiras da Amazônia, que então constituía uma região demograficamente vazia. Passada esta fase, a região voltou a cair no esquecimento, até que durante o regime militar, frente a rumores sobre projetos de internacionalização da área, foram feitas diversas tentativas de indução de desenvolvimento, indo desde a ocupação pela presença militar, passando por projetos agro-industriais de colonização, até o estabelecimento de uma zona franca em Manaus.
Sem dúvida a Amazônia tem uma importância planetária, e por isso a expressão "patrimônio comum da humanidade" deve ser cautelosamente avaliada, já que pressupõe a noção de propriedade coletiva, ignorando as soberanias nacionais dos Estados amazônicos. Tal idéia traz consigo a noção de que é justo que tais territórios estejam abertos a uma renúncia de sua governança por qualquer Estado individual, assinalando a pertinência de uma consertação internacional para o seu bom uso e controle.
É a partir do Tratado de Cooperação Amazônica, assinado em 1978, que se procurou a integração física e o desenvolvimento da Amazônia continental. Com essa iniciativa, se pretendia afastar qualquer tentativa de controle internacional sobre a região, pois regionalizando a solução do problema os países signatários (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela) estariam resguardando sua capacidade de decisão na região. Tal solução garantiria a segurança pela cooperação sem recurso aos meios militares, se o pacto realmente produzisse resultados concretos no marco dessa cooperação. Independentemente do valor que se possa encontrar na Amazônia, é a credibilidade do Brasil como Estado organizado e como ator internacional que estão em jogo. A isso se acrescenta a consideração do valor intrínseco da Amazônia, pelo qual é necessário articular dispositivos políticos e militares capazes de orientar uma economia de forças na defesa desse território. [02]
Com o fim da Guerra Fria, colocou-se a necessidade da reconsideração das formas e da oportunidade de um uso cotidiano da força. A noção de soberania foi grandemente afetada, e o problema de segurança perdeu espaço nas relações internacionais, aliando-se à ênfase econômica, e minimizando a relevância dos estudos estratégicos.
Ainda assim, o caso específico da Amazônia continuou mantendo importância tanto pelas vantagens econômicas da região, como pela necessidade de segurança, vital para qualquer esforço de integração regional. Frente aos novos desafios, em dezembro de 1992 o governo Itamar Franco lançou a Iniciativa Amazônica, visando aprofundar a cooperação econômica com os países da região, membros do Pacto Andino, mais Guiana e Suriname. Através desta iniciativa, o tratado de 1978 ganhava conteúdo e, através de uma ação econômica, reafirmava-se coletiva e multilateralmente a soberania sobre a região.
Atualmente, a manutenção da soberania sobre a Amazônia, vincula-se à nova agenda de segurança (narcotráfico, guerrilha) que pode ser vislumbrada através da ativação do primeiro complexo operacional de segurança da Amazônia (SIPAM-SIVAM) que retoma uma posição assertiva do Estado em defesa da soberania nacional [03], da proteção às minorias indígenas (com a demarcação de reservas), e da atuação de algumas Organizações Não-Governamentais (ONGs), que as autoridades do Estado (especialmente os militares) encaram como ameaça à soberania nacional.
Paralelamente, configurou-se o desafio dos garimpos e exploração irregulares, gerando contrabando de riquezas naturais florestais e minerais e destruição ambiental, cultivo e tráfico de drogas, estabelecimento de forças militares de fora da região frente a nossas fronteiras e a possível infiltração de forças guerrilheiras e fugas de refugiados, que se produziriam com a militarização de conflitos em países vizinhos (especialmente com o Plano Colômbia).
Nesse contexto, nota-se que a ameaça à nossa soberania é latente. Pois, segundo reportagem da "Folha de S.Paulo" publicada no dia 2 de janeiro de 2005 mostrou que relatórios do CIE (Centro de Inteligência do Exército) brasileiro indicaram que militares americanos construíram pistas de pouso em cidades próximas do Brasil, no Paraguai e na Bolívia, instalaram radares e bases aéreas em nove localidades do Peru, montaram destacamentos e inscreveram soldados em cursos preparatórios para combate em selva e contra o narcotráfico em diversos países sul-americanos. [04]
A Amazônia Legal, que corresponde a 55% do território brasileiro, é e deve ser prioridade dos militares brasileiros e da sociedade civil por causa da cobiça internacional. As frases a seguir foram tiradas do arquivo do comando militar da Amazônia: [05]
"Se os países subdesenvolvidos não conseguem pagar suas dívidas externos, que vendam suas riquezas, seus territórios e suas fábricas". Margareth Thatcher (Primeira Ministra Britânica), 1983
"Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós. Oferecemos o perdão da dívida externa em troca da floresta". Al Gore (Vice-Presidente dos Estados Unidos), 1989
"O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia". François Mitterrand (Presidente Francês), 1989
"O Brasil deve delegar parte dos seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes". Gorbachev (Presidente da Ex-URSS), 1992
"Caso o Brasil resolva fazer uso da Amazônia, pondo em risco o meio ambiente nos Estados Unidos, temos que estar prontos para interromper este processo imediatamente". General Patrick Hugles (Chefe do órgão central de informações do Exército Americano). [06]
Assim, num momento em que a fronteira econômica e demográfica se expande e se aproxima da fronteira política, estabelecendo conexões com os países vizinhos (como a integração da infra-estrutura proposta pelas duas Cúpulas Sul-Americanas), é necessário encontrar um ponto de equilíbrio entre preservação ambiental, desenvolvimento econômico e controle político. E para o governo brasileiro, é fundamental responder rapidamente ao vácuo criado pela redução da presença do Estado na região, especialmente no que diz respeito às forças armadas e aos serviços sociais. Isto para que as noções de soberania e de responsabilidade possam substituir as de ausência e descaso, que podem gerar a perda e/ou a degradação deste inestimável patrimônio que representa mais da metade de nosso território.
Notas
O alerta foi feito pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Edson Vidigal, diante de algumas propostas externas apresentadas nos últimos dias sobre a Amazônia se transformar num patrimônio internacional. A soberania nacional foi usada para entremear o foco central da conferência sobre a Constituição Federal. A palestra foi proferida no III Simpósio Regional – As novas tendências do Direito, realizada em dia 31.04.05, em Manaus (PA).
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O presidente da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Biopirataria, deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), fez coro com Sarney Filho. Segundo Thame, "o crescente desmatamento da Amazônia passa para o mundo a idéia de que o governo brasileiro é impotente, suscitando a questão da autoridade internacional". O presidente da CPI destacou ainda o valor comercial de remédios fabricados a partir de princípios ativos encontrados na floresta, o que aumenta a cobiça internacional sobre a biodiversidade brasileira. O deputado defendeu maior controle sobre as reservas ecológicas. Ambiente Brasil. Disponível em: <www.ambientebrasil.com.br>. Acesso em 05.05.05
Segundo o ex-Ministro da Defesa, Geraldo Quintão, essa ação de defesa visa "proteger a Amazônia brasileira, com apoio de toda a sociedade e com a valorização da presença militar, e de aprimorar o sistema de vigilância, controle e defesa das fronteiras, das águas jurisdicionais, da plataforma continental e do espaço aéreo brasileiro, bem como dos tráfegos marítimo e aéreo".
Por coincidência ou não, "a presença militar norte-americana nas fronteiras dos países Amazônicos" e a "Resistência e Luta dos Povos da Pan-Amazônia contra as Estratégias de Ocupação Militar", foram temas de debates durante o 4º Fórum Social Pan-Amazônico, versão regional do Fórum Social Mundial que ocorreu nos dias 19 e 20 de janeiro de 2005, em Manaus (AM). Diário do Pará: Belém (PA), 18.01.05. Disponível em: <www.diariodopara.com.br>. Acesso em 19.01.05
Disponível em: <http://militar.com.br/soberaniaamazonia.htm>. Acesso em 10.02.05
"Cada um de nossos guerreiros de selva vale dez de qualquer um estrangeiro. Eles podem até invadir, mas não sairão vivos da floresta", opinou o coronel Wilson (Exército Brasileiro). Disponível em: <http://redeglobo.globo.com/cgi-bin/fantastico/mont_materia.pl?controle=564>. Acesso em 10.02.05