Os contratos de consumo costumam ser de adesão, não dando oportunidade ao consumidor de discutir e negociar as condições do contrato, contudo, muitas vezes pela necessidade da contratação ignoramos cláusulas totalmente desproporcionais que violam de maneira flagrante nossos direitos como Consumidores.
Mas será que, o fato de tais cláusulas apenas constarem dos contratos de adesão, faz delas válidas?
A característica principal das relações de consumo é a existência de contratos de adesão, feitos de maneira impessoal, isto é, direcionadas à um número indeterminado de pessoas sem levar em conta as peculiaridades de cada caso, procurando englobar o máximo de situações possíveis.
Assim, a interpretação das cláusulas contratuais se dá com base na boa-fé objetiva.
E qualquer atitude ou interpretação que viole essa pretensa boa-fé objetiva pode ensejar a nulidade da cláusula.
Conforme definições de Cristiano Heineck Schmitt:
“… a presença de cláusula abusiva em contratos dessa espécie não ocasionará a nulidade do negócio por falta ou defeito de algum requisito formal do contrato ligado ao consentimento, mas sim por afronta ao princípio da boa-fé objetiva essencialmente e ao equilíbrio negocial.
(…)
Sobre a boa-fé objetiva, o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor traz dois enunciados: art. 4º, III : “harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170 da CF), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidor e fornecedores”; art. 51, IV: “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis coma boa-fé ou equidade”.
(SCHMITT, Cristiano Heineck. Cláusulas Abusivas nas Relações de Consumo- 3 ed. – São Paulo: RT, 2010, p.p. 58 e 109)
Em todos os contratos há princípios basilares que devem ser respeitados como: a confiança, a boa-fé e o equilíbrio contratual.
O Código de Defesa do Consumidor consagra em seus artigos 4º, III e 51, a boa-fé objetiva como cláusula geral de todos os contratos que regulam relações de consumo.
Conforme leciona Rizatto Nunes:
“Já a boa fé objetiva, que é a que está presente no CDC, pode ser definida, a grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo
(…)
A boa-fé objetiva funciona, então, como um modelo, um standard, que não depende de forma alguma da verificação da má-fé subjetiva do fornecedor ou mesmo do consumidor.
Deste modo, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra. É um princípio que visa garantir a ação sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão à ninguém, cooperando sempre para atingir o fim colimado no contrato, realizando os interesses das partes.
A boa-fé objetiva é uma espécie de pré-condição, abstrata de uma relação ideal. Toda vez que no caso concreto, por exemplo, o magistrado tiver de avaliar o caso para identificar algum tipo de abuso, deve levar em consideração essa condição ideal a priori, na qual as partes respeitam-se mutuamente, de forma adequada e justa.”
(NUNES, Luis Antonio Rizzatto, Curso de direito do consumidor – 6 ed. – São Paulo: Saraiva, 2011, p. 177)
O Código de Defesa do Consumidor trata das cláusulas abusivas em seus artigos 51 a 53, tratando-se o artigo 51 de uma perspectiva geral, com rol não taxativo e os artigos 52 e 53 tratam de casos específicos.
Importante ressaltar que a nulidade da cláusula é absoluta.
Sendo esta inválida desde o início da relação, podendo a qualquer tempo o consumidor socorrer-se do judiciário para discutir tal nulidade.
“… não há que falar em cláusula abusiva que se possa validar: ela sempre nasce nula, ou melhor dizendo, foi escrita e posta no contrato, mas é nula desde sempre.
Em função, então, desse caráter, não está obrigado o consumidor a cumprir qualquer obrigação que se lhe imponham mediante cláusula abusiva. Se a questão tiver de ser levada a juízo, isso poderá ser feito pelo consumidor, mediante ação diretamente proposta contra o fornecedor, ou poderá ser alegada em defesa: contestação ou embargos à execução. E, claro, pode ser arguida em reconvenção.
(…)
Não há, na Lei 8.078, nenhum prazo para o exercício do direito de pleitear em juízo a declaração da nulidade da cláusula abusiva.
O princípio é o de que a nulidade é absoluta da cláusula abusiva, de acordo com as disposições do CDC, cuja matéria é de ordem pública e interesse social (art. 1º). E, quer se considere a decisão judicial que reconheça a nulidade como “meramente declaratória”, que como “desconstitutiva”, a ação é imprescritível.”
(NUNES, Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor – 6ª ed. – São Paulo: Saraiva, p.p. 657 e 661)
Assim, existem princípios legais basilares me qualquer contrato que devem ser respeitados e sempre que uma cláusula contratual afronta algum principio gera-se a nulidade da referida cláusula que será tida como inválida.
Conclusões
Ademais, os contratos também têm uma função social, devendo suas cláusulas especificarem a maneira como o serviço será prestado mantendo-se o objeto da prestação de serviços útil ao consumidor.
Assim, qualquer cláusula do contrato de adesão que viole a boa-fé objetiva, e afete o equilíbrio contratual ou até mesmo a utilidade do contrato deve ser tida como nula de pleno direito, podendo o consumidor socorrer-se do Poder Judiciário, a qualquer tempo para invalidá-la.
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Texto escrito pelo Dr. Diego dos Santos Zuza, advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados.