O que é uma cláusula abusiva num contrato de consumo?

15/06/2020 às 20:59
Leia nesta página:

Estudo elaborado com base em doutrinas de direito do consumidor, sobre cláusulas abusivas em contratos de consumo

Os contratos de consumo costumam ser de adesão, não dando oportunidade ao consumidor de discutir e negociar as condições do contrato, contudo, muitas vezes pela necessidade da contratação ignoramos cláusulas totalmente desproporcionais que violam de maneira flagrante nossos direitos como Consumidores.

Mas será que, o fato de tais cláusulas apenas constarem dos contratos de adesão, faz delas válidas?

A característica principal das relações de consumo é a existência de contratos de adesão, feitos de maneira impessoal, isto é, direcionadas à um número indeterminado de pessoas sem levar em conta as peculiaridades de cada caso, procurando englobar o máximo de situações possíveis. 

Assim, a interpretação das cláusulas contratuais se dá com base na boa-fé objetiva.

E qualquer atitude ou interpretação que viole essa pretensa boa-fé objetiva pode ensejar a nulidade da cláusula.

Conforme definições de Cristiano Heineck Schmitt:

“… a presença de cláusula abusiva em contratos dessa espécie não ocasionará a nulidade do negócio por falta ou defeito de algum requisito formal do contrato ligado ao consentimento, mas sim por afronta ao princípio da boa-fé objetiva essencialmente e ao equilíbrio negocial.

(…)

Sobre a boa-fé objetiva, o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor traz dois enunciados: art. 4º, III : “harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170 da CF), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidor e fornecedores”; art. 51, IV: “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem  o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis coma boa-fé ou equidade”.

(SCHMITT, Cristiano Heineck. Cláusulas Abusivas nas Relações de Consumo- 3 ed. – São Paulo: RT, 2010, p.p. 58 e 109)

Em todos os contratos há princípios basilares que devem ser respeitados como: a confiança, a boa-fé e o equilíbrio contratual.

 O Código de Defesa do Consumidor consagra em seus artigos 4º, III e 51, a boa-fé objetiva como cláusula geral de todos os contratos que regulam relações de consumo.

Conforme leciona Rizatto Nunes:

“Já a boa fé objetiva, que é a que está presente no CDC, pode ser definida, a grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo

(…)

A boa-fé objetiva funciona, então, como um modelo, um standard, que não depende de forma alguma da verificação da má-fé subjetiva do fornecedor ou mesmo do consumidor.

Deste modo, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra. É um princípio que visa garantir a ação sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão à ninguém, cooperando sempre para atingir o fim colimado no contrato, realizando os interesses das partes.

A boa-fé objetiva é uma espécie de pré-condição, abstrata de uma relação ideal. Toda vez que no caso concreto, por exemplo, o magistrado tiver de avaliar o caso para identificar algum tipo de abuso, deve levar em consideração essa condição ideal a priori, na qual as partes respeitam-se mutuamente, de forma adequada e justa.”

(NUNES, Luis Antonio Rizzatto, Curso de direito do consumidor – 6 ed. – São Paulo: Saraiva, 2011, p. 177)

O Código de Defesa do Consumidor trata das cláusulas abusivas em seus artigos 51 a 53, tratando-se o artigo 51 de uma perspectiva geral, com rol não taxativo e os artigos 52 e 53 tratam de casos específicos.

Importante ressaltar que a nulidade da cláusula é absoluta.

Sendo esta inválida desde o início da relação, podendo a qualquer tempo o consumidor socorrer-se do judiciário para discutir tal nulidade.

“… não há que falar em cláusula abusiva que se possa validar: ela sempre nasce nula, ou melhor dizendo, foi escrita e posta no contrato, mas é nula desde sempre.

Em função, então, desse caráter, não está obrigado o consumidor a cumprir qualquer obrigação que se lhe imponham mediante cláusula abusiva. Se a questão tiver de ser levada a juízo, isso poderá ser feito pelo consumidor, mediante ação diretamente proposta contra o fornecedor, ou poderá ser alegada em defesa: contestação ou embargos à execução. E, claro, pode ser arguida em reconvenção.

(…)

Não há, na Lei 8.078, nenhum prazo para o exercício do direito de pleitear em juízo a declaração da nulidade da cláusula abusiva.

O princípio é o de que a nulidade é absoluta da cláusula abusiva, de acordo com as disposições do CDC, cuja matéria é de ordem pública e interesse social (art. 1º). E, quer se considere a decisão judicial que reconheça a nulidade como “meramente declaratória”, que como “desconstitutiva”, a ação é imprescritível.”

(NUNES, Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor – 6ª ed. – São Paulo: Saraiva, p.p. 657 e 661)

Assim, existem princípios legais basilares me qualquer contrato que devem ser respeitados e sempre que uma cláusula contratual afronta algum principio gera-se a nulidade da referida cláusula que será tida como inválida.

Conclusões

Ademais, os contratos também têm uma função social, devendo suas cláusulas especificarem a maneira como o serviço será prestado mantendo-se o objeto da prestação de serviços útil ao consumidor.

Assim, qualquer cláusula do contrato de adesão que viole a boa-fé objetiva, e afete o equilíbrio contratual ou até mesmo a utilidade do contrato deve ser tida como nula de pleno direito, podendo o consumidor socorrer-se do Poder Judiciário, a qualquer tempo para invalidá-la.

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Texto escrito pelo Dr. Diego dos Santos Zuza, advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados.

Sobre o autor
Diego dos Santos Zuza

#Fique em casa! Faça sua consulta por Whatsapp (11) 97188-1220 Advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados. Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista de Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Advogado atuante nas áreas de Direito Penal, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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