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Mães no cárcere: a violação do direito à gravidez e à maternidade no sistema prisional

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02/07/2020 às 20:00
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Resumo: O presente estudo se propõe a conhecer a realidade das mães encarceradas, e os desafios por elas vividos no cárcere, abrangendo desde a gestação, o parto e o pósparto, além de tratar das consequências decorrentes da maternidade nos presídios e a violação dos direitos fundamentais e sociais das presas. O trabalho tem em vista abordar o direito à maternidade, o acompanhamento correto por um médico para que o bebê nasça saudável e tenha os mesmos benefícios e direitos daqueles que nascem fora da prisão. Procura-se ainda mostrar o atual cenário do sistema prisional feminino, como essas mulheres recebem assistência na gestação e, como a legislação está sendo aplicada para garantir seus direitos. Por fim, procura-se analisar o que se pode modificar na estrutura do sistema carcerário, implantado no país, para que haja o respeito a dignidade da pessoa humana, o direito à maternidade e, principalmente, o direito de se ter um parto sem traumas para a criança e a mulher.

Palavras-chave: Cárcere. Gestação. Instituições prisionais. Mães presas.


1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema mães no cárcere, a violação do direito à gravidez e à maternidade no sistema prisional. Com o elevado crescimento da população carcerária feminina, surge a preocupação em relação à maternidade exercida dentro dos presídios, diante disso, surge o problema de como as políticas públicas tem prestado assistência para as mulheres que são privadas de sua liberdade na gestação, parto e pós-parto.

Desta forma, a mulher que está privada de sua liberdade merece grande atenção, pois existem peculiaridades da sua condição de mulher que devem ser discutidas, uma delas é a maternidade. Os presídios femininos são precários quando se referem à mulher. A situação piora quando envolve a maternidade, pois não possuem estrutura apropriada para as gestantes e seus filhos, além de não oferecerem assistência médica especializada e estrutura adequada para realizar um parto digno.

Portanto, este artigo tem como objetivo demonstrar como os órgãos judiciais, no que tange aos direitos fundamentais e aos direitos sociais das detentas, realizam atendimento para mulheres que se encontram em estado vulnerável.

Para o desenvolvimento do presente trabalho foi utilizada a pesquisa qualitativa, através de análise a legislações específicas e os tratados internacionais de direitos humanos, o recente julgado de um habeas corpus coletivo pelo Supremo Tribunal federal (STF) onde ficou decidido que a prisão preventiva pode ser substituída em prisão domiciliar, além dos relatórios oficiais do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) que prestam informações penitenciárias das mulheres encarceradas.

O trabalho estrutura-se em quatro capítulos, apresentando-se, no primeiro, a realidade das mães no cárcere, como vivem essas mulheres nesse ambiente hostil que são as prisões. O segundo capítulo vai traçar o perfil dessas mulheres, apontando quem compõem a população prisional feminina, as consequências para os filhos que nascem no sistema prisional e como é a estrutura dos presídios que são oferecidos às mães e aos bebês. Já no terceiro capítulo será abordado o princípio da maternidade, como é realizado o acompanhamento médico na gestação e pós-parto, quando chega o momento do parto como é feito o atendimento médico, o registro de nascimento dessas crianças e o direito à amamentação dada a elas.

No quarto capítulo será indagado sobre o cenário atual e as propostas para a melhoria do sistema prisional.

Ao final, conclui-se, que a lei não protege o bem jurídico que são os bebês e suas mães no cárcere, ou seja, os mais vulneráveis. O Estado pune, mas impede os direitos assegurados aos detentos, sendo que, como Estado maior deveria assegurar a todo e qualquer cidadão, os meios necessários para salvaguardar à vida humana.


2. A REALIDADE DAS MÃES NO CÁRCERE

As primeiras unidades prisionais femininas no Brasil foram: O Instituto Feminino de Readaptação Social, criado no ano de 1937 e localizado no Estado do Rio Grande do Sul. Em 1941 surgiu o Presídio de Mulheres de São Paulo, já no ano de 1942 a Penitenciária Feminina do Distrito Federal em Bangu, que foi construída para a finalidade de abrigar presas mulheres. (ANGOTTI, 2012, p. 23).

Atualmente o Brasil é o quarto país com maior número de mulheres encarceradas, ficando atrás dos Estados Unidos, China e Rússia. Diante desse elevado crescimento, desperta preocupação, tendo em vista que a maioria dos estabelecimentos prisionais foi projetada para abrigar o público masculino (INFOPEN Mulheres. 2014, p.13).

Dados demonstram que 74% das unidades prisionais são destinadas aos homens, sendo 7% das unidades prisionais ao público feminino e os outros 16% aos presídios mistos. (INFOPEN Mulheres, 2014).

A legislação brasileira regulamenta a individualização da pena em vários dispositivos:

  • A pena será cumprida em estabelecimento distinto, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado (CF, artigo 5º, inciso CLVIII);

  • Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso.

  • A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequados à sua condição (LEP, artigo 82, §1º).

De acordo com o levantamento de Informações Penitenciárias – INFOPEN, de junho/2016, o Brasil nessa época apresentava um percentual de 45% de mulheres presas e que ainda não foram julgadas e condenadas. Os dados evidenciam também que 62% das incidências penais estão relacionadas com o tráfico de drogas. (INFOPEN Mulheres, 2014, p.19-20 e 53).

Além disso, é relevante destacar que as unidades prisionais femininas e mistas, contam com um percentual mínimo para oferecer celas e dormitórios adequados para a mulher gestante que está privada de liberdade. Para que essas mulheres possam permanecer com seus filhos nas unidades prisionais apenas 14% dessas unidades prisionais possuem berçários e/ou centro de referência maternoinfantil com espaços destinados para bebês de até dois anos de idade. Quanto à realidade de unidades femininas ou mistas com espaços que oferecem creches para crianças acima de dois anos, apenas 3% das unidades prisionais contam com esse espaço (INFOPEN Mulheres, 2014, p.32-33).

Falar sobre a gravidez no cárcere é tratar de direitos básicos que devem ser assegurados a todas às mulheres, tal direito é de suma importância que está prevista na Constituição Federal do Brasil, na Lei de Execuções Penais, no Estatuto da Criança e do Adolescente, além das Regras de Bangkok que são as regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. (GALVÃO, 2011).

Estar grávida deveria ser uma experiência mágica para qualquer mulher, a relação afetiva de mãe e filho, surge desde quando o bebê está na barriga, e esta relação se torna mais sólida quando o bebê está nos braços da mãe. Porém, a gravidez no cárcere é tratada de maneira hostil, desumana, viola os direitos básicos que estão regulamentados por Leis. (CUNHA, 2018).

O coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Medidas Socioeducativas do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), o juiz auxiliar da Presidência Luis Geraldo Lanfredi, avalia:

Os estabelecimentos penais, as estruturas internas desses espaços e as normas de convivência no cárcere quase nunca estão adaptadas às necessidades da mulher, já que são sempre desenhadas sob a perspectiva do público masculino. O atendimento médico, por exemplo, não é específico. Se já faltam médicos, o que dirá de ginecologistas, como a saúde da mulher requer. (FERNANDES, 2015).

Fica claro como é cruel a realidade vivida por essas mulheres que estão privadas de sua liberdade. A coordenadora Rosângela Santa Rita do Projeto Mulheres, do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, em entrevista dada à Agência CNJ de notícias disse:

O Brasil possui um Déficit de 220 mil vagas para uma população carcerária hoje em torno de 550 mil. No caso das mulheres, são 36 mil vagas e um déficit de aproximadamente 14 mil vagas. E a histórica discriminação de gênero está desde a estrutura física até os serviços penais. As regras prisionais não foram pensadas pelo viés da mulher. Dou um exemplo: o kit de higiene, que em muitos locais não é distribuído às mulheres. Especialistas sérios já presenciaram a utilização de miolo de pão para conter o sangue das detentas no período menstrual. Estamos em pleno século XXI, em um estado democrático, e essas mulheres sob responsabilidade do Estado. Os secretários estaduais precisam entender e pensar que o encarceramento feminino é especial e precisa ser diferenciado. A lógica se mantém é a do paternalismo. O que sobrar é da mulher.

(https://www.cnj.jus.br/exec-e-judic-discutem-politica-para-mulheresdetentas. Acesso 27.11.2019)

As mulheres que estão privadas de sua liberdade juntamente com seus filhos são responsabilidade do Estado. Assim, o poder público deve propiciar condições adequadas de atendimentos para mães e filhos, que se encontram privados de liberdade.

De acordo com artigo 5º, inciso XLIX da Constituição Federal, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. (BRASIL, 2020).

É importante ressaltar que a Lei de Execuções penais também dispõe nos seus artigos 10, parágrafo único, 11, 12 e todos da mesma lei:

Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

Art. 11. A assistência será:

I - material;

II - à saúde;

III - jurídica;

IV - educacional;

V- social;

VI- religiosa.

Art.12. A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.

Art. 14. A assistência a saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. §2º quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

§3º Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.

É importante evidenciar, que com o grande aumento da população carcerária feminina e suas estruturas inadequadas, as presas estão sujeitas a diversas doenças. Segundo um relatório da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos sobre a situação das pessoas privadas de liberdade no Brasil, as prisões constituem riscos para a vida e a integridade das pessoas presas, tratamento cruel, desumano e degradante. (Comissão Interamericana de Direitos Humanos, 2018).

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Além disso, consta no relatório as condições alarmantes de superlotação, infraestrutura precária, consta também, que foram recebidas muitas queixas de centros penitenciários onde há negligência na atenção médica, completa falta de higiene, ausência de artigos de necessidades básicas, alimentação inadequada e sem a supervisão de um nutricionista. (Comissão Interamericana de Direitos Humanos, 2018).

Por fim, falar sobre a maternidade no cárcere é um tema muito delicado, o que deveria ser um momento mágico para a mulher, ele se torna o mais triste e angustioso. Assim, a pesquisa é muito importante, pois vai abordar como o Estado está tentando fazer com que essas mulheres tenham mais dignidade, além de tentar fazer com que seja cumprido um dos princípios mais importante para o ser humano “o princípio da dignidade da pessoa humana”.

2.1. Perfil das Mães no Cárcere

O sistema carcerário brasileiro segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) de 2017 mostra que o Brasil é o 4º (quarto) país com maior população carcerária feminina, ficando atrás dos Estados Unidos, China e Rússia. (INFOPEN Mulheres, 2014).

Esse registro vem crescendo gradativamente, tendo em vista que no ano 2000 até 2016 esse aumento foi de 656%, sendo que no ano de 2016 atingiu a marca de 42 mil mulheres presas. Esses dados são relevantes, tendo em vista que a população carcerária masculina nesse mesmo período cresceu um percentual de 293%. (INFOPEN Mulheres, 2014).

No Brasil, o Estado de São Paulo é o local onde se concentra a maior parte da população feminina encarcerada com um total de 31,6%, em seguida está o Estado de Minas Gerais com 10,6% e o Estado do Rio de Janeiro com 7,3% da população prisional feminina. (INFOPEN Mulheres, 2014).

Outro fator importante a ser analisado, refere-se ao fato de que a maior parte dessas mulheres privadas de liberdade não foi sentenciada. As informações penitenciárias do Infopen de junho de 2016 mostraram que 46% dessas mulheres ainda não haviam sido condenadas. Destaca-se que o Estado do Amazonas tem o maior percentual de mulheres presas que não foram sentenciadas com 81%, seguido dos Estados de Sergipe (79%), Ceará (67%), Bahia (71%), Pará (62%) e Piauí (62%). (INFOPEN Mulheres. 2018- 2ª Edição).

Em relação a faixa etária das mulheres presas, em sua maioria são jovens entre 18 a 29 anos, ressalta-se que essas mulheres presas possuem baixa escolaridade, sendo que 45% delas não completaram o ensino fundamental. No que se refere à raça, cor e etnia os dados mostram que 62% são negras. Em relação à condição civil dessas mulheres 62% são solteiras, 23% vivem em união estável e 09% são casadas. (INFOPEN Mulheres. 2018- 2ª Edição- Pág. 37, 40, 42, 43, 44).

Além disso, os dados do Infopen demonstraram que 74% das mulheres encarceradas possuem filhos, chamando a atenção que a mesma pesquisa foi realizada com os homens que estão privados de liberdade, sendo que 53% deles declararam não ter filhos. (INFOPEN Mulheres. 2018. – 2ª Edição).

Ademais, cabe destacar que esse grupo de mulheres privadas de liberdade, em sua maioria, foi abandonadas por seus parceiros, o que fica evidente a necessidade de elas serem chefes de suas famílias. (INFOPEN Mulheres. 2018. – 2ª Edição).

Quanto à nacionalidade das mulheres privadas de liberdade, temos que 89% das unidades prisionais afirmaram possuir estrangeiras em suas unidades, totalizando 529 cidadãs presas, observa-se também que 61% dessas estrangeiras são do continente americano, e que em sua maioria encontram-se presas no Estado de São Paulo (63%). Essas mulheres estrangeiras em sua maioria são detidas pelo fato de serem “mulas” no transporte de drogas. (INFOPEN Mulheres. 2018- 2ª Edição- Pág. 48. e 49).

A causa mais frequente de aprisionamento de mulheres está relacionada com o tráfico de drogas, que representa 62% das incidências penais cometidas por elas, em seguida está o crime de roubo simples, qualificado com 11%, o crime de furto simples com 8% e o crime de homicídio simples e qualificado com 6% das ocorrências, esses dados demonstram que a maior parte das mulheres que cometem crimes está relacionado com tráfico de drogas e os crimes patrimoniais. (INFOPEN Mulheres. 2018- 2ª Edição- Pág. 54. e 55).

Analisando o perfil socioeconômico temos que em sua maioria são chefes de família e possuem empregos informais, e que devido às dificuldades financeiras enfrentadas e a falta de oportunidades, acabam se envolvendo com atividades ilícitas, essa é a forma que elas encontraram para acrescer a renda familiar, tendo em vista que são elas que fazem o sustento de suas famílias.

Diante destas informações, observa-se que o perfil das mulheres que estão privadas de liberdade em sua maioria é jovem, com baixa escolaridade, nascidas em famílias pobres e de baixa renda e não tiveram oportunidades em suas vidas. Observa-se também que de cada 10 mulheres presas, 06 são primárias, não possuem antecedentes criminais. Informação fornecida pelo Departamento Penitenciário Nacional. Levantamento nacional de informações penitenciárias. (INFOPEN Mulheres. 2018. – 2ª Edição).

Desta forma, é importante destacar como a criminalidade cresceu em relação às mulheres, e muitos dos casos estão relacionados com o fato de elas serem chefes de família e da real necessidade de complementarem suas rendas. O Brasil é um país que ainda existem desigualdades entre homens e mulheres e a falta de políticas públicas quando não se investe em saúde, educação e segurança afeta a sociedade fazendo com que aumente a criminalidade no país.

2.2. Consequência para os filhos que nascem no cárcere

Os primeiros anos de vida de uma criança, bem como o período gestacional da mãe, são fundamentais para estabelecer o desenvolvimento do indivíduo na sociedade, por isso vem ganhando espaço importante em quase todos os países e seus programas de governo. (LIPPI, 2011).

A criança tem seus direitos garantidos desde a sua concepção, eles gozam de todos os direitos inerentes à pessoa humana. Dito isso, esses direitos estão regulamentados pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, além de outras regulamentações. É importante dizer que pouco são os estudos realizadas sobre o tema mulheres presas com seus filhos recém-nascidos na prisão.

A presença de crianças no sistema prisional é tema que merece atenção devido à situação das prisões brasileiras, o Estado deve garantir a dignidade a todos. Nesse sentido, o Estado deve garantir direitos para essas crianças que nascem na prisão. (LEAL, 2016).

Em uma pesquisa realizada pela Fiocruz revelou que mais de um terço das mulheres presas disseram que ficaram algemadas na hora do parto. Já em relação às consultas no período do pré-natal, 55% disseram que fizeram menos do que o recomendado pelos médicos. (LEAL, 2016).

Além disso, 32% dessas mulheres não foram diagnosticadas com sífilis durante o período gestacional, assim os dados demonstraram que 4,6% das crianças nasceram com sífilis congênita. É importante destacar, que no período em que essas mulheres estavam hospitalizadas, 15% delas afirmaram ter sofrido algum tipo de violência :verbal, psicológica ou física. (LEAL, 2016).

Em consequência, as condições terríveis que a detenta tem que enfrentar dentro do ambiente prisional, além de todos os conflitos vividos dentro de uma prisão atingem a formação do feto que absorve todas as sensações vividas pela mãe. (VIAFORE, 2005).

Quando uma mulher gera um filho na prisão é garantido a ela permanecer com seus filhos durante o período de amamentação, assim dispõe o artigo 5º, inciso L, da Constituição Federal. (BRASIL, 2011)

Assim, a mãe tem o direito de permanecer com seu filho após o nascimento, ao mesmo tempo em que ela exerce esse direito, ela viola o direito do seu filho de viver em liberdade, de crescer em uma sociedade ou de conviver com seus familiares. (GOELLNER,2018).

As condições em que uma criança vive dentro de uma cela prejudicam o seu desenvolvimento, tendo em vista que os presídios não possuem estruturas para proporcionar vinculo familiares ou meios que ajudem no desenvolvimento da criança. (STELLA, 2009).

O sistema penitenciário feminino é um ambiente precário e insalubre em que as mulheres enfrentam quando estão privadas de sua liberdade. Além disso, elas enfrentam a gravidez e suportam os primeiros meses de vida de seus filhos dentro desse ambiente, que na maioria dos presídios não possuem berçários ou dormitórios apropriados para recebê-los. As penitenciárias no Brasil foram construídas para o sexo masculino e por esse motivo muitos ainda não são adequados para oferecer um ambiente digno para as gestantes (INFOPEN Mulheres. Junho 2017).

A Lei de Execuções penais em seu artigo 83, §2ª, dispõe que os estabelecimentos penais destinados a mulher serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar e amamentar seus filhos, no mínimo até os seis meses de idade da criança. (BRASIL, 2011).

Já o artigo 89 da mesma Lei assegura que a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de seis meses e menores de sete anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada quando a mãe estiver presa. (Id. Palácio do Planalto. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal).

Assim, tem-se que o ordenamento jurídico brasileiro assegura as presidiárias mulheres e mães os seus direitos regulados em leis. (Id. Palácio do Planalto. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal).

Apesar das dificuldades em que a mãe tem de exercer a maternidade no cárcere, a dificuldade maior que ela vive é a separação de seu filho, pois essa separação deveria ser gradual para evitar que seja traumática para ambos. Além disso, tem-se a incerteza do destino de seu filho, pois nem sempre fica com um membro de sua família.

2.3. A Análise da estrutura dos presídios oferecidos às mães e aos bebês

A estrutura oferecida para as gestantes e seus bebês nos presídios é de muita relevância para esse estudo, tendo em vista que as mulheres encarceradas estão mais vulneráveis. Os problemas físicos desses estabelecimentos violam vários dos seus direitos previstos na legislação do Brasil, como o princípio da dignidade da pessoa humana, direito à saúde, à integridade física e moral, dentre outros. (BRASIL, 2011).

Essas garantias estão previstas no artigo 5º, inciso XLIX e L da Constituição Federal quando prevê que é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral, e que às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação. (BRASIL, 2011).

Além de leis específicas, os artigos 10 e 11 da Lei de Execuções Penais, dispõe que a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado e a assistência será material à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. (Id. Palácio do Planalto. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal).

Deve-se destacar que a maioria dos presídios brasileiros não possui estrutura adequada às mulheres, apesar do grande índice de aumento carcerário feminino. Atualmente no Brasil 74,85% dos estabelecimentos prisionais foram construídos para detenção masculina, sendo 18,18% são mistos e, apenas 6,97% foram construídos exclusivamente para as mulheres. (INFOPEN Mulheres. Junho 2017- Pág. 15).

Através desses dados é possível afirmar que tanto os estabelecimentos masculinos, quanto os femininos, também estão destinados para aqueles presos que estão em cumprimento de pena no regime fechado, sendo 75,20% das unidades masculinas e 71,22% das unidades femininas. Já nos estabelecimentos mistos são diversos os tipos de destinação, sendo que estão destinados para o cumprimento de pena em regime fechado e os outros 18,1% estão destinados para a prisão provisória. (INFOPEN Mulheres. Junho 2017- Pág. 16).

Dito isso, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) de 2017 também analisou as infraestruturas dos presídios e apresentou os seguintes resultados: em relação ao número de mulheres gestantes e lactantes apenas 16% das unidades prisionais têm celas e dormitórios para receber essas mulheres. Por outro lado, as unidades femininas ou mistas que possuem berçário e/ou centro de referência materno infantil, os dados demonstram que apenas 14% dessas unidades estão adaptadas. (INFOPEN Mulheres, Junho 2017).

Em relação as unidades femininas ou mistas que têm espaços com creches e que recebem crianças acima de 02 anos, apenas 3% das unidades prisionais declararam possuir esse espaço. (Infopen Mulheres- 2ª edição. Brasília - DF/2018).

De acordo com a análise, observa-se que as estruturas dos estabelecimentos prisionais não são adequadas para as mães que estão gerando um filho, bem como para os recém-nascidos que passam os primeiros meses de vida nesse ambiente. É visível o descaso em que presas são tratadas, mesmo que existam Leis para regular os seus direitos, é notório o seu descumprimento.

Sobre a autora
Jacqueline Sampaio Gonçalves

Graduanda em Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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