O direito do dever de votar ou o dever do direito ao voto

21/08/2020 às 13:51
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Infelizmente, percebe-se que ainda existe uma visão equivocada de que a obrigatoriedade do voto seja uma imposição antidemocrática, quando na verdade é o exercício de um direito.

O direito de participar da vida política do seu país é reconhecido internacionalmente, amparado por diversos tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, a Declaração sobre Progresso e Desenvolvimento Social e a própria Convenção Americana de Direitos Humanos, ao versar sobre os direitos políticos.

Em adição, outros tantos direitos constitucionais no Brasil podem ser elencados, como o direito à autodeterminação dos povos, à liberdade de opinião e o direito de votar e ser votado, dentre outros, em respeito às liberdades fundamentais, garantidas pela Constituição Federal de 1988.

Todavia, não se pode esquecer que o fundamento básico do direito e da própria sociedade reside no fato de que, para todo direito, corresponde um dever. Assim, se o cidadão tem o direito de votar e de ser votado, também tem o dever de participar com lisura de um pleito eleitoral, independentemente do polo em que se encontre. Ainda que o direito à participação política não seja reconhecido universalmente, o Brasil pode ser considerado um país privilegiado, em que, virada a página dos anos negros da ditadura, a partir da Constituição de 1988 passou a singrar pelos mares da democracia.

Mas para que ocorra essa efetiva participação cidadã na vida política do País, e para que os candidatos a determinados cargos políticos exerçam de forma plena – e não apenas adequada – o seu papel de verdadeiramente representar a população, é preciso que se considere alguns direitos e deveres que, na maior parte do tempo, partilham o mesmo prato.

Se de um lado há o direito de o cidadão poder opinar sobre o futuro do País, de outro existe a obrigação de escolher com sabedoria seus representantes. Se de um lado existe o direito do candidato para fazer propaganda de suas intenções, de outro existe a responsabilidade de executar as futuras ações, caso seja eleito. Se de um lado existe o direito de o eleitor escolher seu representante, de outro existe o dever de acompanhar o cumprimento das promessas feitas pelo seu candidato. Se de um lado existe no Brasil a construção histórica do direito ao sufrágio, de outro existe o dever constitucional de comparecer às urnas a cada dois anos.

Ainda, se de um lado existe o voto facultativo para determinados segmentos, previsto no art. 14, § 1º, II da Carta Magna, como os analfabetos, maiores de dezesseis e de setenta anos e menores de dezoito anos, o inciso I desse artigo determina a obrigatoriedade do voto para os brasileiros maiores de dezoito anos, cuja omissão pode resultar em sanções nas mais diversas esferas.

Nessa senda, é necessária cada vez mais a conscientização política do eleitor, para que se dê conta de que é um direito seu participar politicamente em uma democracia ainda recente. Para Dallari[1], “tanto a participação direta quanto a eleição de representantes têm fundamental importância, pois a participação do povo no exercício do poder político é absolutamente necessária para a efetividade da sociedade democrática”.

Assim, cabe ao candidato atrair e convencer esse eleitor para cumprir com esse direito/dever, com propostas sóbrias e exequíveis, a fim de que a incidência dos votos válidos nas urnas seja cada vez maior, e que o eleitor possa se convencer de que está exercendo a soberania popular por meio do seu ato cívico.

Infelizmente, percebe-se que ainda existe uma visão equivocada de que a obrigatoriedade do voto seja uma imposição antidemocrática, quando na verdade é o exercício de um direito. Já dizia Platão (428 a.C. a 347 a. C.) que “o preço a pagar pela tua não participação na política é seres governado por quem é inferior”, cuja ideia foi mais tarde incrementada pelo economista Arnold Toynbee, segundo o qual “o maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam”.

Direitos cívicos são direitos políticos, que por sua vez são direitos humanos. Logo, cabe ao cidadão fazer uso do seu direito/dever e valorizar o seu voto, fazendo jus à construção histórica da luta pelo direito ao sufrágio e, por meio da sua participação política, promover o exercício da cidadania


Notas

[1] DALLARI, Dalmo de Abreu. Votar é um direito político e um dever social. Jornal do Brasil, 2014. Disponível em: <https://vermelho.org.br/2014/08/29/dallari-votar-e-um-direito-politico-e-um-deversocial/>. Acesso em: 07/03/2020

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Sobre a autora
Andrea Haetinger

Advogada atuante em Direito Cível, Penal, Administrativo, Eleitoral, de família e consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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