Agricultura legalizada em faixas de domínio rodoviárias

03/09/2020 às 14:56

Resumo:


  • A Resolução nº 9/2020 do DNIT permite o uso das faixas de domínio das rodovias federais para atividades agrícolas e publicidade, visando a desburocratização e a promoção da economia.

  • Os interessados devem obter o "Termo de Permissão Especial de Uso" (TPEU), cumprindo requisitos de segurança, sinalização e manutenção, além de apresentar documentação detalhada, incluindo projetos e licenças ambientais.

  • Ao fim da concessão de uso, as áreas devem ser desocupadas e restauradas, com possíveis sanções para irregularidades, e a iniciativa busca solucionar problemas de ocupações clandestinas e manutenção das faixas de domínio.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O DNIT publicou a Resolução nº 9/2020, que permite o uso das chamadas faixas de domínio rodoviárias para fins agrícolas e publicitários (outdoors)

Em agosto deste ano, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, vinculado ao Ministério da Infraestrutura publicou[1] no Diário Oficial da União de 20/08/2020, a Resolução nº 9/2020, que permite o uso das chamadas faixas de domínio das rodovias, para fins agrícolas e publicitários (outdoors).

Segundo divulgado pelo DNIT[2], o objetivo foi ampliar as possibilidades de utilização, pelos cidadãos, da faixa de domínio das rodovias federais para fins econômicos com agricultura e publicidade.

E também de acordo com o Governo Federal, a nova resolução cumpre os requisitos exigidos da Lei de Liberdade Econômica, Lei nº 13.874/2019 e, ainda, o Decreto nº 10.139/2019, que dispõe sobre a revisão e consolidação dos atos normativos como medida de simplificação e desburocratização.

A chamada faixa de domínio, em outras palavras, é a “cerca” que delimita a área da união por onde passa à rodovia e as áreas vizinhas, muitas vezes ocupadas por propriedades rurais que se utilizam das margens rodoviárias, com dificuldades de cumprir à regulamentação, aproveitando-se de áreas para produção que ali muitas vezes estão ociosas.

Estas áreas adjacentes às rodovias, declaradas de utilidade pública, sem possibilidade de edificação, podem ser usados de forma aérea, subterrânea, aparente, suspensa ou pontual para implantação de serviço específico ou para acesso, podendo ser gratuito ou oneroso, conforme regulamentação específica e mediante autorização do DNIT.

A permissão de uso se dá por um documento chamado “Solicitação de Uso de Faixa de Domínio”, preenchidos alguns requisitos, legalizando o uso das chamadas faixas de domínio para a agricultura.

O ocupante destas áreas para finalidades agrícolas deve buscar o “Termo de Permissão Especial de Uso” (TPEU), válido por até 10 (dez) anos, com possibilidade de renovação, devendo adotar medidas de segurança e sinalização (artigos 112 a 119), como também a limpeza periódica da área com roçadas e capinas, apresentando no requerimento de solicitação, documentos como os projetos, plano e licenças ambientais; e o cronograma da atividade produtiva desenvolvida.

Pela utilização das faixas de domínio, o ocupante se compromete a prestar serviços aos cidadãos, no caso da agricultura, a conservação da faixa de domínio relativa à margem ocupada, por meio de limpeza e roçadas, bem como a sinalização e visibilidade determinados pela normativa.

Para obtenção do chamado TPEU o solicitante deve observar o modelo de requerimento disponível no anexo I da normativa com instruções de preenchimento e o check list de documentação de habilitação e documentação do projeto, constantes no mesmo anexo e o trâmite foi ilustrado por uma das imagens anexas à resolução.

De acordo com os artigos 114 a 119 da Resolução, lavouras devem obedecer a distâncias mínimas descritas e representadas pela Figura 6 do Anexo V da normativa:

O “Termo de Permissão Especial de Uso” (TPEU) exige apresentação de projeto assinado por engenheiro registrado no CREA (art. 122), com os requisitos do artigo 123 e seu parágrafo terceiro:

I - memorial descritivo, com justificativas, especificações, materiais e equipamentos a serem utilizados na execução, descrição dos tipos de culturas a serem implantadas, se limitando ao máximo de 5 (cinco);

II - cronograma operacional do ciclo da agricultura de cada cultura que será utilizada, com abordagem das etapas de preparo do solo, plantio, acompanhamento, colheita, entre outras e com a utilização das contramedidas de segurança para cada tipo de cultura que será utilizada; e

III - análise de segurança viária e estudo de impacto de tráfego no trecho de implantação, a qual deverá considerar o histórico de acidentes registrados pela Polícia Rodoviária Federal ou outro órgão competente, de forma a identificar o impacto da implantação do serviço no número de acidentes no trecho.

[...] § 3º Devem ser apresentados, ainda os seguintes documentos:

I - todas as licenças necessárias à implantação de agricultura na faixa de domínio, expedidas por entidades Federais, Estaduais, Municipais, incluindo as licenças ambientais pertinentes;

II - projeto de sinalização da obra, de acordo com os manuais brasileiros de sinalização de trânsito do CONTRAN e quando for o caso, manual de sinalização de obras e emergência em rodovias do DNIT, devendo abordar o período total do ciclo da agricultura (desde o preparo do solo até o fim da colheita) de cada cultura a ser implantada;

III - projeto de irrigação quando for o caso; e

IV - projeto de escoamento da produção durante a colheita.

Para o plano ambiental, por sua vez, os requisitos a serem atendidos estão descritos no artigo 124:

I - caracterização ambiental resumida da área diretamente afetada;

II - descrição e localização das intervenções da obra e das áreas de apoio, caso necessário;

III - procedimentos ambientais a serem utilizados na execução dos serviços;

IV - concepção e detalhamento das medidas específicas de prevenção, mitigação e correção de impactos ambientais;

V - concepção e detalhamento de sistema de monitoramentos dos indicadores de qualidade ambiental durante a obra; e

VI - plano de gerenciamento de resíduos - PGR, contendo informações sobre a geração, acondicionamento, volume e destinação final dos resíduos gerados durante as atividades.

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Segundo a normativa, ao final da concessão de uso (TPEU), o usuário deve remover a lavoura ou demais atividades e em caso de constatação de situação irregular, a fiscalização está autorizada a emitir multas e demais procedimentos coercitivos (art. 129), podendo o notificado apresentar defesas e recursos em 10 dias (art. 130).

Alguns estudos e discussões já estavam sendo pautados quanto à utilização destas áreas, devido às ocupações clandestinas, o problema de manutenção (limpeza), riscos de incêndios com a biomassa vegetal acumulada em épocas de estiagem e a própria ociosidade de uma área potencialmente produtiva se tomadas as devidas precauções em sua utilização.

Em 2011, na intenção de dar consistência ao setor responsável pela desapropriação destas áreas para diminuir impactos negativos das ocupações, o DNIT passou a buscar subsídios para resolver este problema mediante a aquisição de áreas complementares para realização de benfeitorias nas margens da rodovia, entretanto, seria necessária a atuação de uma equipe multidisciplinar composta por: engenheiro civil e/ou Agrimensor, advogados, assistente social, psicólogo, engenheiro agrônomo, topógrafos, pois são esses os profissionais que irão tratar com o terceiro para esclarecer a necessidade da desocupação da faixa de domínio[3].

Não obstante, a desapropriação, na prática, demanda flexibilidade para seu cumprimento no que diz respeito às remoções de ocupação, mesmo que por meio de ordem judicial, bem como a problemática do pagamento de valores pelas benfeitorias existentes, um conflito que sempre acontece entre o interesse do particular em receber valores de avaliação adequados e o interesse do Estado de pagar conforme suas possibilidades e prerrogativas.

Isto sem contar toda a tramitação burocrática após a avaliação, para compor um processo com toda documentação de domínio, memorial descritivo e demais informações de engenharia até o final do processo com a incorporação da área no patrimônio da União.

A dificuldade técnica para apresentação de projetos para regularização destas áreas sempre foi considerada um entrave nas mais diversas formas de ocupação existentes nestas faixas de domínio, todavia, espera-se maior desburocratização na análise destes processos, bem como o aumento da equipe e capacidade técnica das repartições competentes já que trata-se de um grande número de ocupações longitudinais, transversais e pontuais.

Um fator importante para o bom funcionamento desta nova política pública certamente são as ações educativas junto aos ocupantes destas áreas para conscientização da nova normativa para que sejam capazes de atender as regras estabelecidas, mitigando invasões e aumentando a segurança para todos.


Notas

[1] https://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-n-9-de-12-de-agosto-de-2020-273292434

[2] https://www.gov.br/dnit/pt-br/assuntos/noticias/dnit-aprova-novo-marco-regulatorio-para-o-uso-da-faixa-de-dominio-em-rodovias-federais

[3] TEODORO, Roberto Leal; et. al. Faixa de Domínio: Circunscrição da Área da União – Esfera Estadual e Federal. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 01, Vol. 01, pp. 113-128, Janeiro de 2018. ISSN:2448-0959

Sobre o autor
Pedro Puttini Mendes

Advogado, Consultor Jurídico (OAB/MS 16.518, OAB/SC nº 57.644). Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Sócio da P&M Advocacia Agrária, Ambiental e Imobiliária (OAB/MS nº 741). Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA), Membro Consultivo da Comissão de Direito Ambiental e da Comissão de Direito Agrário e do Agronegócio da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA: "Pantanal Sul-Mato-Grossense, legislação e desenvolvimento local" (Editora Dialética, 2021), "Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor" (Editora Thoth, 2019, 2ª ed / Editora Contemplar, 2018 1ª ed) e "O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988" (Editora Thoth, 2018). Livros em coautoria: "Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988" (editora Thoth, 2018); "Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar" (Editora Thoth, 2018); "Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul - explicada e comentada" (Editora do Senado, 2017).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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