Prova emprestada no processo administrativo disciplinar: Condições de admissibilidade e validade

29/09/2020 às 14:28

Resumo:


  • O estudo aborda o direito administrativo, princípios e sua relação com a administração pública, destacando o processo administrativo e a aceitação da prova emprestada no processo administrativo disciplinar.

  • Destaca-se a importância dos princípios que regem a administração pública, como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, bem como a aplicação desses princípios no processo administrativo disciplinar.

  • É discutida a utilização da prova emprestada no processo administrativo disciplinar, com base em entendimentos do STF e STJ, ressaltando a necessidade de respeitar o contraditório e a ampla defesa para garantir a validade da prova.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O estudo trata do direito administrativo, seus princípios, e sua relação com a administração pública, enfocando-se o processo administrativo e as questões que envolvem a aceitação e validade da prova emprestada no processo administrativo disciplinar.

RESUMO

O estudo trata do direito administrativo, seus princípios, e sua relação com a administração pública, enfocando-se o processo administrativo, e, em especial, as questões que envolvem a aceitação e validade da prova emprestada no processo administrativo disciplinar. Parte-se da análise do direito administrativo como regente da administração pública, orientador e limitador da atuação do agente estatal, enfatizando-se princípios como da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Em seguida, aborda-se o processo administrativo enquanto instrumento de externalização da atividade administrativa regular e uniforme, para, na sequência, ser tratado o processo administrativo disciplinar, visto como meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da administração. Na esteira, e como ponto fulcral do trabalho, aborda-se a utilização da prova emprestada no processo administrativo disciplinar, apresentando-se o entendimento prevalecente na atualidade, que é pela admissibilidade do compartilhamento de provas, desde que respeitados os princípios basilares e, especialmente, o contraditório e a ampla defesa.

PALAVRAS-CHAVE: Processo Administrativo Disciplinar. Prova Emprestada.

1 INTRODUÇÃO

O direito administrativo é uma das faces do direito público, e mantém estreita relação com a administração pública. Dentro do direito administrativo, está o processo administrativo, que reflete manifestações da administração pública nas suas relações internas e externas. Já no âmbito do processo administrativo, existe o processo administrativo disciplinar, direcionado à apuração de infrações praticadas no exercício da função ou a ela relacionadas.

O presente estudo parte de uma abordagem sucinta da relação entre administração pública e direito administrativo, com especial destaque aos princípios regentes da administração pública consagrados na constituição federal de 1988. Em seguida, aborda-se o processo administrativo, seu desenvolvimento e princípios impositivos, preparando-se o caminho para o estudo do processo administrativo disciplinar.

A abordagem do processo administrativo disciplinar leva em conta sua dupla função, de meio de busca de elementos de autoria e materialidade de uma infração, mas, também, de instrumento de garantia contra decisões apressadas e sanções injustas. Dentro do estudo do processo administrativo disciplinar, põe-se em destaque a questão da prova e, mais especificamente, a análise da prova emprestada.

O estudo é relevante porque, não raras vezes, a prova produzida em outros processos pode servir ao processo administrativo disciplinar, sendo necessário seu empréstimo para apreciação da autoridade competente. Desta forma, é preciso conhecer os entendimentos a respeito do assunto, em especial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, instâncias máximas do Poder Judiciário Brasileiro.

Assim, o trabalho se propõe a analisar a aceitação e a validade das provas emprestadas no processo administrativo disciplinar, em contraste com os princípios constitucionais, administrativos e processuais, sendo esta a resposta a ser buscada ao longo do estudo, cuja metodologia utilizada é a pesquisa bibliográfica.

2 A PROVA EMPRESTADA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

2.1 Direito administrativo e administração pública

O direito rege as relações humanas e sociais. Pode ser natural, isto é, inerente a todos os seres humanos e independente da vontade do Estado e das leis, ou pode ser positivado, que é o direito posto pelo Estado, dependente da vontade do legislador, consubstanciado em leis.

Costuma-se dividir o direito positivo em dois ramos, o público e o privado. Dentro do direito privado encontram-se, verbi gratia, o civil, o trabalhista e o empresarial. Já no direito público estão, por exemplo, o penal, o processual, o constitucional, o administrativo. Interessa para o estudo, essencialmente, o direito administrativo, em razão de sua relação com a administração pública.

Segundo ROSA (2007, p. 3):

O direito administrativo brasileiro, em síntese, pode ser entendido como o conjunto de princípios jurídicos que regem a atividade administrativa, as entidades, os órgãos e os agentes públicos, objetivando o perfeito atendimento das necessidades da coletividade e dos fins desejados pelo Estado.

Já a administração pública, conforme MEIRELLES (2011, p. 65):

Em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade.

            Entre a administração pública e o direito há uma relação inafastável, dado que aquela deve obediência a este. O direito administrativo, portanto, com suas regras e princípios, impõe o modo de atuação da administração pública. Os princípios são os valores supremos do ordenamento jurídico, os alicerces sobre os quais se constrói o sistema. No caso do direito administrativo, são os princípios que orientam as normas postas ao servidor público. A propósito, elementar o artigo 37[2] da Constituição Federal de 1988, que expressa os princípios essenciais da administração pública, sendo eles: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

            Decorre do princípio da legalidade que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei (CF. 5º, II) [3]. Logo, a administração não pode fazer qualquer imposição que a lei não preveja, salvo em situações excepcionais, como estado de sítio e estado de defesa. Além disso, se para o particular o princípio da legalidade significa fazer tudo o que a lei não proíbe, para a administração pública significa fazer somente o que a lei autoriza. A lei para o particular indica que ele pode fazer de tal forma, enquanto que para a administração impõe que deve fazer daquela forma. Não há liberdade para o agente público além daquela concedida pela lei.

            O princípio da impessoalidade determina que o agente público atue voltado à finalidade pública, não podendo atender a interesses pessoais ou de terceiros. Deve agir sem favoritismos e sem discriminações, sendo obrigatório o tratamento igualitário de todos os administrados. Também impede a promoção pessoal de agente público, pois o ato é manifestação da administração e não do agente.

Pelo princípio da moralidade, a administração deve manter-se no caminho da moral, da ética e da boa-fé. Assim, a atuação administrativa não está presa somente ao direito, mas também à moral, aos bons costumes, à honestidade. O bom agente público deve buscar o bem comum, respeitando as regras da boa e justa administração.

Por sua vez, o princípio da publicidade se relaciona com a transparência da administração pública, impondo a publicidade dos atos para fins de controle interno e externo. O administrado tem o direito de conhecer os atos da administração para que possa avaliá-los e adotar medidas pertinentes em caso de violação às leis e princípios.

Já o princípio da eficiência pode ser visto sob dois vieses. Primeiro no sentido de que a administração pública deve alcançar os melhores resultados com os menores gastos possíveis. Segundo, em relação à atuação dos agentes, dos quais se espera o melhor desempenho de suas atribuições. Atualmente, pode-se dizer que a eficiência na administração pública está muito relacionada com a tecnologia, sendo obrigação administrativa a atualização de acordo com as novas ferramentas tecnológicas, que resultam em maior celeridade e economia.

Embora esses sejam os princípios mais basilares, consagrados na Constituição Federal de 1988, é certo que a administração se prende, ainda, a outros, tais como: supremacia do interesse público sobre o particular; indisponibilidade dos bens, direitos e interesses públicos; autotutela; motivação, etc.

Não obstante a referência constante à administração pública como ente, não se pode esquecer que a atuação administrativa se dá por meio dos agentes públicos, assim considerados todos aqueles vinculados, definitiva ou transitoriamente, a uma função pública. Os agentes públicos integram os órgãos e as entidades e atuam com o encargo de satisfazer o interesse da coletividade. Nesse prisma, os agentes públicos têm o dever de lealdade ao órgão ou entidade, obediência ao superior hierárquico e conduta ética, isto é, devem agir com zelo, honestidade e respeito.

Como decorrência da função pública que exercem, os agentes públicos ficam sujeitos a responsabilizações pelas faltas que cometerem. Tais responsabilizações podem ser de ordem civil, penal e administrativa. A responsabilização penal é decorrência de conduta prevista na legislação criminal como infração penal. Já a responsabilidade civil implica a obrigação de reparar os danos causados. Administrativamente, a responsabilidade do agente público resulta da infração do dever funcional.

Praticada uma infração administrativa pelo agente público, surge para a administração o poder-dever de apuração. Todavia, como se verá na sequência, o exercício desse poder-dever não é feito de qualquer forma, muito pelo contrário, deve seguir o processo adequado.

2.2 Processo administrativo disciplinar e sindicância

A definição de processo, assim como sua distinção de procedimento e de sindicância, faz-se relevante no âmbito administrativo e, de igual forma, para a correta compreensão deste estudo.

De acordo com OCTAVIANO e GONZALEZ (2009, p. 123):

Processo é palavra derivada do latim processu, processum, vocábulo que, etimologicamente, enquadra-se na raiz do verbo procedere, que significa adiantar-se, avançar, ir à frente, progredir. Em sentido lato, processo corresponde a avanço, progresso, desenvolvimento.

Na esteira de argumentação, os mesmos autores contribuem para a compreensão da diferença entre processo e procedimento, podendo-se dizer, a partir de suas lições, que processo é o fim, procedimento o meio; processo é o todo, procedimento as partes que compõem esse todo; o processo é o conjunto, o resultado da série de operações, enquanto que o procedimento é cada uma das operações que compõem o resultado. Enfim, o procedimento é a dinâmica do processo.

Já o processo administrativo é uma das categorias pertencentes ao gênero “processo”, apresentando-se como o conjunto de preceitos legais normativos, próprios e necessários ao exercício de direitos e deveres competentes à administração. Destarte, dentre as modalidades de processo, o processo administrativo é aquele que se opera no âmbito da administração e revela o meio pelo qual a atividade administrativa é exteriorizada de forma regular e uniformizada.

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            Dentro do processo administrativo, está o processo administrativo disciplinar, identificado por OCTAVIANO e GONZALEZ (2009, p. 131) como “o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da administração”.

            Mas, antes do aprofundamento do estudo sobre o processo administrativo disciplinar, é salutar diferenciá-lo da sindicância. Conceitualmente, sindicância corresponde ao procedimento pelo qual se reúnem informações tendentes a fornecer elementos esclarecedores de determinados atos ou fatos, cuja apuração se faz no interesse superior e segundo a decisão da autoridade própria. É um meio preventivo e cautelar que evita decisões temerárias ao mesmo tempo em que poupa a administração de expor seus empregados ou servidores a despedidas ou processos injustos (OCTAVIANO e GONZALEZ, 2009, p. 23).

            Além de poder servir como meio preparatório para o processo administrativo disciplinar, a sindicância pode ser utilizada em outras circunstâncias que comprometam a regularidade do serviço público, para corrigir, ordenar e orientar, enfim, para o aperfeiçoamento das rotinas administrativas. Por suas características de medida preliminar, a sindicância deve respeitar os requisitos da brevidade, clareza e exatidão. Averiguações demoradas acabam prejudicando o verdadeiro sentido da sindicância, assim como a falta de clareza leva a erros e interpretações dúbias. Ademais, as informações devem ser exatas, refletindo o mais fielmente possível os fatos sindicados. O objetivo da sindicância é, em regra, recolher elementos que apontem para a necessidade ou não de instauração do processo administrativo. Então, se for apenas preparatória do processo disciplinar, pode ser inquisitiva, mas se tiver caráter punitivo, deverá observar os princípios inerentes.

Retomando a análise do processo administrativo disciplinar, ressalta-se que ele, como forma de expressão da administração pública, está preso aos princípios constitucionais do direito administrativo, elencados no artigo 37 da Carta Magna e já analisados alhures. Mas, também deve observar outros princípios destacados em leis federais e estaduais, como aqueles previstos no artigo 2º da Lei 9.784/1999[4], que regula o processo administrativo no âmbito da administração pública federal.

Pelas características e pela finalidade do processo administrativo disciplinar, merecem ser destacados, além daqueles enumerados no artigo 37 da Constituição Federal de 1988 e no artigo 2º da Lei 9.784/1999, os seguintes princípios constitucionais de obediência obrigatória: devido processo legal; contraditório e da ampla defesa; vedação das provas ilícitas.

O princípio do devido processo legal é garantia constitucional fulcrada no artigo 5º, LIV[5], da Carta Maior. No âmbito administrativo, o devido processo legal obriga que o processo administrativo disciplinar seja justo, respeite as garantias individuais e processuais. Como decorrência, o processo administrativo disciplinar deve ter duração razoável, adotando-se os meios que garantam a celeridade da sua tramitação. Somente o devido processo administrativo disciplinar permite a aplicação adequada de penalidade pela administração.

Já o contraditório e a ampla defesa são expressões do artigo 5º, LV[6], da Constituição Federal de 1988. É basilar que todos os litigantes, em processos judiciais ou administrativos, e os acusados em geral tenham pleno direito ao contraditório e à ampla defesa. O contraditório permite que o administrado apresente seu ponto de vista, contradite os argumentos que lhe são apresentados, garantindo-se a igualdade de condições com a administração pública. Pela ampla defesa, o administrado deve ter conhecimento de todos os elementos de prova para que possa se defender. Para tanto, pode indicar testemunhas, solicitar perícias, ser representado por advogado, enfim, requerer e produzir todos os elementos que lhe possam favorecer.

Nesse ponto, importante lembrar o entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado na Súmula Vinculante nº 5, no sentido de que a ampla defesa não obriga que a defesa seja elaborada por advogado no processo administrativo disciplinar.

O princípio da vedação das provas ilícitas está insculpido no artigo 5º, LVI[7], da Constituição Federal. Segundo GRINOVER, SCARANCE e GOMES FILHO (1997, p. 131):

Provas ilícitas são aquelas colhidas com infringência às normas ou princípios colocados pela constituição ou pelas leis, frequentemente para a proteção das liberdades públicas e, especialmente, dos direitos de personalidade e, mais especificamente, do direito à intimidade.

A regra é que as provas obtidas ilicitamente não podem ser utilizadas no processo administrativo disciplinar, assim como as provas ilícitas por derivação, ou seja, aquelas que foram angariadas de forma lícita, mas a partir de uma prova anterior ilícita (Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada). Portanto, a licitude da prova é claro limite constitucional imposto aos processos, o que inclui o processo administrativo disciplinar. Nesse ponto, surge o debate acerca da prova emprestada, sua admissibilidade e validade no processo administrativo disciplinar.

2.3 Prova emprestada e processo administrativo disciplinar: condições de admissibilidade e validade

           

Na terminologia processual, o termo prova é empregado, de forma mais abrangente, como o conjunto de atividades realizadas na reconstrução dos fatos que constituem o suporte das pretensões deduzidas e da própria decisão. Também pode aduzir aos instrumentos pelos quais as informações sobre os fatos são introduzidas no processo (FILHO, 1997, p. 41 e ss.).

            Prova, assim, é toda verificação, demonstração, comprovação realizada por meio de documentos, sinais, testemunhos, exames, etc. É o instrumento, em sentido lato, capaz de convencer, de dar certeza e segurança àquele que decide. Assevere-se que, as provas não se destinam apenas a afirmar a responsabilidade penal, civil ou administrativa. Elas podem servir, a contrário censo, para demonstrar que a infração não ocorreu ou que determinada pessoa não foi a autora. Esse o duplo sentido da atividade probatória no Estado Constitucional e Democrático.

Já a prova emprestada é aquela que foi produzida em um processo e a parte interessada pretende que seja apreciada e considerada válida pela autoridade que preside outro processo. É que, em regra, a prova que será utilizada pelas partes e apreciada pela autoridade que decide é produzida no e para o processo ao qual serve, mas, em alguns casos, essa mesma prova pode interessar a outros processos. O fundamento do empréstimo de provas está na necessidade de otimização, racionalidade, eficiência e economia processual, visando a reduzir custos e a evitar que a mesma prova seja produzida mais de uma vez.

Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 591, pacificou o entendimento de que é permitida a prova emprestada no processo administrativo disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente e respeitados o contraditório e a ampla defesa.

Seguindo a orientação do STJ, a Controladoria Geral da União, em seu Enunciado de número 20, observa que o compartilhamento de provas entre procedimentos administrativos é admitido, independentemente de apurarem fatos imputados a pessoa física ou a pessoa jurídica, ressalvadas as hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça.

Questão que gerou polêmica, no tocante ao empréstimo de provas, diz respeito à interceptação das conversações telefônicas, por se tratar de exceção à regra do sigilo das comunicações, somente admitida em investigações criminais e no processo penal. Todavia, mesmo com relação a essa prova, o Supremo Tribunal Federal encerrou a controvérsia, assentando que é possível a utilização, como prova emprestada, de interceptações telefônicas derivadas de processo penal, com autorização judicial, no processo administrativo disciplinar, desde que seja assegurada a garantia do contraditório.

Vê-se, pois, que a Suprema Corte condiciona a utilização da interceptação telefônica como prova emprestada no processo administrativo disciplinar à autorização judicial e ao contraditório e à ampla defesa. Descumpridas essas exigências, a prova não será válida.

Portanto, não há nenhuma dúvida de que a prova emprestada é admissível no processo administrativo disciplinar, estando tal entendimento solidificado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça. Porém, sempre deve haver respeito pleno ao contraditório e à ampla defesa, de modo que, uma vez juntada aos autos a prova emprestada, deve-se oportunizar que o administrado possa contraditá-la, inclusive com a produção de outras provas, se assim entender adequado.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo foi desenvolvido em três tópicos. O primeiro cuidou da administração pública e sua relação com o direito administrativo, com destaque para os princípios constitucionais. O segundo tópico tratou do processo administrativo disciplinar e da sindicância, fazendo as distinções necessárias entre ambos e também distinguindo processo e procedimento. A terceira parte foi destinada ao estudo da prova emprestada e sua utilização no processo administrativo disciplinar.

O epílogo inevitável é que a atividade administrativa deve respeito aos princípios constitucionais consagrados no artigo 37 da Constituição Federal de 1988. Mas, não só a eles. Outros princípios são de observação obrigatória pela administração pública, e decorrem do próprio sistema jurídico, bem como da previsão em legislações próprias.

O processo administrativo disciplinar, como instrumento da administração pública, também se prende à principiologia geral, mas ainda deve atender a outros alicerces inafastáveis, como a ampla defesa, o contraditório, o devido processo legal e a inadmissibilidade das provas ilícitas.

A propósito, a prova emprestada não pode ser considerada uma prova ilícita. Muito pelo contrário. A prova emprestada é perfeitamente válida para o processo administrativo disciplinar, e tal entendimento se encontra consolidado no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, bem como em órgãos e entidades da administração pública, como, por exemplo, a Corregedoria Geral da União.

Desta forma, o estudo permite concluir que as provas emprestadas têm plena validade no processo administrativo disciplinar, desde que respeitados os princípios regentes, em especial o contraditório e a ampla defesa.

4 REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 12 de maio de 2020.

BRASIL. Lei nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm. Acesso em 13 de maio de 2020.

BRASIL. Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União/Corregedoria-Geral da União. Enunciado nº 20. Disponível em: http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/4710421/do1-2018-02-28-enunciado-n-20-de-26-de-fevereiro-de-2018-4710417. Acesso em 14 de maio de 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante nº 5. A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=88437. Acesso em 13 de maio de 2020.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 591. É permitida a “prova emprestada” no processo administrativo disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente e respeitados o contraditório e a ampla defesa. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/noticias/499151008/stj-edita-seis-novas-sumulas. Acesso em 14 de maio de 2020.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. MS 17.815/DF, j. 21/11/2018. Relatora: Ministra Regina Helena Costa. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/671916427/mandado-de-seguranca-ms-17815-df-2011-0276341-8/relatorio-e-voto-671916495. Acesso em 14 de maio de 2020.  

FILHO, Antônio Magalhães Gomes. Direito à prova no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades do processo penal. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2011.

OCTAVIANO, Ernomar; GONZALEZ, Átila J. Sindicância e Processo Administrativo: doutrina, prática, jurisprudência. 11 ed. ver. e ampl. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de Direito, 2009.

ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito Administrativo. 9. Ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.


[2] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...

[3] Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
[4] Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
[5] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
[6] LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

[7] LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.

Sobre o autor
Adilson José Bressan

Delegado de Polícia. Especialista em Segurança Pública. Especialista em Ciências Penais. Especialista em Direito de Polícia Judiciária. Especialista em Compliance Público-Privado, Integridade Corporativa e Repressão à Corrupção. Especialista em Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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