Mundo Digital

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27/10/2020 às 12:15
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 4 A Internet.

A Internet foi concebida no contexto da Guerra Fria (1948-1990), época em que a criação de inovadoras estratégias de combate na área militar, se faziam extremamente necessárias. Conforme leciona Fabrízzio Rosa[19], “em 1957, quatro meses após a União Soviética pôr em órbita, o primeiro satélite espacial, (o Sputnik), os Estados Unidos da América, anunciavam a criação de uma Agência Federal norte-americana, cujo objetivo, era pesquisar e desenvolver alta tecnologia para as Forças Armadas norte-americanas”.

Essa Agência era conhecida como ARPA - Advance Research Projects Agency (Agência de Projetos de Pesquisa Avançada), que durante os anos 1960, foi aperfeiçoada no intuito de sobreviver a um possível bombardeio soviético em solo americano, de modo a permanecer ativa, e a possibilitar o tráfego de informações aos seus destinatários. Era a ARPANET, rede de agência de projetos avançados de pesquisa.

Nos ensinamentos de Rosa, é que nos anos 1970, “a Internet passou a ser utilizada para fins acadêmicos e científicos". O correio eletrônico (e-mail), até hoje é a aplicação mais utilizada da rede, que foi criada em 1972, por Ray Tomlinson. Em 1973, a Inglaterra e a Noruega, foram ligadas à rede, tornando-se, com isso, um fenômeno mundial. Em meados da década de 1980, o Governo norte-americano abriu a rede às empresas e continuou financiando a ARPANET, até o ano de 1989, quando também foi lançado o primeiro browser, tendo sido apresentado em Genebra, Suíça, a World Wide Web (www).

No Brasil, as primeiras normas que visavam regular o serviço de Internet, foram traçadas em 1995, em nota conjunta do Ministério das Comunicações e do Ministério da Ciência e Tecnologia. Estabeleceu-se, por exemplo, que os serviços comerciais da rede, seriam fornecidos por empresas privadas.  

Registre-se que a Lei nº 7.232, de 29/10/1984[20], estabeleceu os princípios, objetivos e diretrizes da Política Nacional de Informática (PNI), seus fins e mecanismos de formulação, cria o Conselho Nacional de Informática e Automação - CONIN, dispõe sobre a Secretaria Especial de Informática - SEI, cria os Distritos de Exportação de Informática, autoriza a criação da Fundação Centro Tecnológico para Informática - CTI, institui o Plano Nacional de Informática e Automação e o Fundo Especial de Informática e Automação.

Diga-se que, a Política Nacional de Informática (PNI), foi aprovada pela Lei nº 7.232, de 29/10/1984, pelo Congresso Nacional, com prazo de vigência previamente estabelecido em 8 (oito) anos, visando a estimular o desenvolvimento da indústria de informática no Brasil, por intermédio de reserva de mercado, para as empresas nacionais.

A ideia de instituir uma reserva de mercado para fabricantes nacionais de produtos de informática, começou a tomar forma na primeira metade da década de 1970, durante a vigência do Governo Militar, dentro do espírito, então vigente, de "Brasil Grande Potência". A justificativa é que, protegidas da concorrência com as multinacionais da época, do Setor de Tecnologia da Informação, como a IBM, Burrougs, HP, Olivetti, entre outras, os fabricantes brasileiros poderiam desenvolver uma tecnologia genuinamente nacional, e estariam plenamente aptos, para competir no mesmo nível de igualdade, com suas concorrentes estrangeiras, quando a reserva de mercado terminasse.

Todavia, a reserva de mercado foi vítima de inúmeras críticas, dentro e fora do país. Os críticos brasileiros apontavam o surgimento de mais um cartel, na economia nacional e a penalização dos consumidores, obrigados a adquirir equipamentos muitas vezes, obsoletos, de qualidade tecnológica inferior e por preços exorbitantes. No plano internacional, denunciavam-se as contínuas quebras de patentes, e violações de propriedade intelectual, cometidas por empresas brasileiras, sob a proteção da lei, bem como, a impossibilidade de uma concorrência justa, pois, as empresas estrangeiras, com raríssimas exceções, sequer, podiam vender seus produtos no país.

Em 13 de novembro de 1987, o então Presidente dos EUA, Ronald Reagan, declarou uma série de sanções comerciais ao Brasil, como resposta à pratica protecionista da Política Nacional de Informática (PNI). Na ocasião, Reagan, anunciou o aumento das taxas de importação de produtos vindos do Brasil, bem como, a total proibição da importação de determinados produtos do setor de informática. O objetivo com a medida, segundo o Presidente norte-americano, seria o de obter uma compensação pelo prejuízo causado às empresas norte-americanas, em decorrência da política brasileira, estimado, na época, em 105 milhões de dólares, o que equivaleria a aproximadamente em 233 milhões de dólares norte-americanos, em valores corrigidos em 2018.

Assim, em 1995, é lançado o Windows 95, um Sistema operacional completo para computadores pessoais que elimina a necessidade do MS-DOS (MS-DOS, acrônimo de Microsoft Disk Operating System, é um sistema operacional comprado pela Microsoft, para ser usado na linha de computadores IBM PC). No mesmo período, é lançado o Internet Explorer, parte do pacote do Windows 95 Plus, vendido separadamente. No ano seguinte lança o Windows NT 4.0, com o visual do Windows 95 e a segurança do Windows NT. 

No Brasil, o primeiro computador foi produzido apenas em 1972, pela Universidade de São Paulo - USP, seguido pelo Projeto G-10, também da USP, em parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio, que buscava a criação de hardwares e softwares, para a Marinha do Brasil. Depois da “abertura das fronteiras” para importação, na época de Governo do Presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992), o Brasil começou a acompanhar as mudanças tecnológicas do setor, embora com atraso. Mesmo porque, o art. 170, IV, da Constituição Federal do Brasil, de 1988, estabelece a livre concorrência na atividade econômica.

Nos dias de hoje, o país já alcança uma posição muito semelhante aos dos países denominados de Primeiro mundo (EUA, países da Europa, Japão), nas questões de inovação e uso de tecnologias de informática, pelos Órgãos e Entidades Governamentais e pelos Grupos Empresariais Privados, e também, pela população em geral.

Registre-se também, a existência do Marco Civil da Internet, aprovado pela  Lei n° 12.965, de 23/04/2014[21], que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil, ou seja, é a Lei que regula o uso da Internet no Brasil, por meio da previsão de princípios, garantias, direitos e deveres para quem usa a rede, bem como, a determinação de diretrizes para a atuação do Estado.

A Internet, como é conhecida hoje, foi concebida a partir de 1983, quando, após quebras de barreiras militares, a rede acabou repercutindo na área civil. Depois desse período, a Internet se espalhou por todo o mundo, e, destarte, causou uma revolução, na maneira de se comunicar e realizar negócios. A partir desse fato, a Internet passou a complementar, em vários aspectos, as relações entre os Estados, Organizações, Empresas e pessoas físicas e jurídicas, se tornando relevante para o desenvolvimento do mercado, em meio a uma sociedade tecnológica global.

Dessa forma, dentro da Era Digital, surge o Direito Digital ou ainda o Direito na Internet (Rede Mundial de Computadores) estabelecendo a necessidade de repensar importantes aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, privacidade, liberdade etc. Ora, o Direito, como se conhecia até o surgimento da Era Digital, se baseia nas Leis e, as leis, tem jurisdição sobre um espaço físico para sua aplicação. O Espaço físico corresponde ao Princípio da Territorialidade e ao Princípio da Extraterritorialidade. Não obstante, tem-se agora o espaço virtual ou o ciberespaço.


5  O Ciberespaço.

O Ciberespaço é um espaço existente no mundo de comunicação em que não é necessária a presença física do homem para constituir a comunicação como fonte de relacionamento, dando ênfase ao ato da imaginação, necessária para a criação de uma imagem anônima, que terá conexão com os demais ambientes. Ciberespaço é o espaço virtual para a comunicação, que surge da interconexão das redes e de dispositivos digitais interligados no planeta, incluindo seus documentos, programas e dados, imagens, portanto, não se refere apenas à infraestrutura material da comunicação digital, mas, também, ao universo de informações que ela abriga.

O termo ciberespaço foi criado em 1984, por Willian Gibson[22], um escritor norte-americano, que usou esta palavra em seu livro de ficção científica, intitulado Neoromancer. Esta obra trata de uma realidade, que se constitui, através da produção de um conjunto de tecnologias enraizadas na sociedade, e conclui, por modificar as estruturas e os princípios desta, e dos indivíduos, que nela estão inseridos. O ciberespaço é definido como o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores. A rigor, trata-se de um novo meio de comunicação estruturado.

O conceito de ciberespaço, ao mesmo tempo, inclui ainda, os sujeitos e instituições que participam da interconectividade e o espaço que interliga pessoas, documentos e máquinas. O ciberespaço representa a capacidade dos indivíduos de se relacionar, criando redes que estão cada vez mais conectadas, à um número maior de pontos, tornando-se as fontes de informação mais acessíveis. Porém, o ciberespaço compreende não só como um ambiente de divulgação de informação, mas, também de entretenimento e cultura, no qual os indivíduos podem expressar suas singularidades e, ao mesmo tempo, se relacionar criando novas e diversas pluralidades. Isto é possível, porque o ciberespaço é considerado um espaço de acesso livre e descentralizado, onde todos os tipos de texto, voz, imagens, vídeos, etc., são traduzidos a uma única linguagem: a informática. Diga-se, é um espaço democrático.

Na concepção do ciberespaço, como um modo virtual de relacionamento social na modernidade, entre conectividades, Silva[23], destaca acerca das “tecnologias do imaginário, definindo-as como dispositivos de intervenção, formatação, inferência e da construção das bacias semânticas, que determinarão a complexidade dos trajetos antropológicos de indivíduos ou grupos”.

No Século XXI, a partir do ciberespaço, vivencia-se a ausência do Mundo Real, surgindo a perspectiva de uma complexidade de dados, imagens e informações, na qual, não há objetos tangíveis, mas, apenas, uma simbologia de uma linguagem nova para a conectividade entres as pessoas e máquinas, de um Mundo Virtual.

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Nesse Mundo Digital, e na perspectiva virtual, as informações podem ser arquivadas em pastas específicas, criadas pelo usuário do computador, laptops, tabletes e smartphones, ou ainda, podem ser transferidas e armazenadas na nuvem, e, a posteriori, serem visualizados, compartilhadas e transportadas para outras pessoas ou dispositivos, conforme o destino desejado pelo usuário.

É inegável que a Revolução Cibernética afeta os mais variados aspectos da vida, com a inserção de contextos virtuais e de conectividade, como círculos eletrônicos de amizade, por intermédio de comunidades virtuais, e da possibilidade de navegar pelo mundo, como faz milhões ou bilhões de internautas, tornando o presente, cada vez mais próximo da ideia de aldeia global. Porém, foi na última metade do Século XX, com o surgimento da rede digital e do ciberespaço, é que se tornou efetiva, a vivência de uma realidade virtual, a qual, passou a exercer um modo inquestionável nas práticas e nas relações sociais de uma sociedade global.

Diga-se, que os limites entre o Mundo Real e o Mundo Digital, um imaginário entre o próximo e o distante, tornam-se cada vez menos perceptíveis. Um ambiente para a verificação dos possíveis reflexos e desdobramentos do desenvolvimento dos sistemas de realidade virtual, e dos ambientes das redes digitais de comunicação, sobre os limites do espaço e do tempo, pode ser denominado de ciberespaço.

A velocidade com que o ciberespaço se desenvolve, unida ao meio supostamente acessível e democrático que este representa, torna possível, uma verdadeira revolução social, com desdobramentos múltiplos, que tendem a exercer uma interferência cada vez maior na vida dos indivíduos.

Registre-se também que, com o advento da Era digital, criou-se a necessidade de repensar importantes aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, privacidade, liberdade etc. Sim, existe um novo espaço, o espaço cibernético ou cyberespaço, que é distinto do espaço físico. Discute-se se surgirá uma disciplina autônoma, já que toda vez que surgiu uma nova tecnologia, surgiu também, a necessidade de reunir seus problemas e soluções, em torno dessa matéria. Atualmente difunde-se muito a ideia de Direito do Espaço Virtual, ou o Direito Cibernético.

Como esta atividade digital é recente, não há uma classificação definida entre os Ramos do Direito, já que a mesma, transcende as fronteiras físico-geográfica-temporais, e por essa razão, o Direito Cibernético, a ser considerado, a nosso ver, poderia ser classificado como um Direito Internacional Privado, por envolver direitos de pessoas físicas e jurídicas, notadamente, em face da conectividade das Redes Sociais (Facebook, Instagram, Twitter, WhatsApp) e nos chamados e-commerce (comércio eletrônico), na perspectiva de uma sociedade global, que se utiliza em dia e noite, e noite e dia, de plataformas on line, para a realização dos anseios e desejos, sejam eles, pessoais ou profissionais, seja para as pessoais físicas ou jurídicas, para alcançar a socialização da atividade humana.

Todavia, existem alguns países, que, por razões políticas e de soberania, controlam a Internet, nacionalmente, como ocorre na República Popular da China, na República Islâmica do Irã, que, regulamentaram o acesso à Internet, por intermédio de servidores nacionais centrais, que só permitem um tipo de informação. Esse controle é mais acentuado em países como a República de Cuba, a República Democrática Popular do Laos, a República Socialista do Vietnã, e notadamente, na República Democrática Popular da Coreia do Norte,

Em síntese, o Mundo Digital se consubstancia numa transcendência das fronteiras físico-geográfica-temporais, utilizando-se do ciberespaço, existente Mundo Virtual, de modo a intensificar as mudanças e transformações políticas, sociais e econômicas, nos mais variados campos da atividade humana, de uma sociedade globalizada.

Sobre o autor
René Dellagnezze

Doutorando em Direito Constitucional pela UNIVERSIDADE DE BUENOS AIRES - UBA, Argentina (www.uba.ar). Possui Graduação em Direito pela UNIVERSIDADE DE MOGI DAS CRUZES - UMC (1980) (www.umc.br) e Mestrado em Direito pelo CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO - UNISAL (2006)(www.unisal.com.br). Professor de Graduação e Pós Graduação em Direito Público e Direito Internacional Publico, no Curso de Direito, da UNIVERSIDADE ESTACIO DE SÁ, Campus da ESTACIO, Brasília, Distrito Federal (www.estacio.br/brasilia). Ex-Professor de Direito Internacional da UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO - UMESP (www.metodista.br).Colaborador da Revista Âmbito Jurídico (www.ambito-juridico.com.br) e e da Revista Jus Navigandi (jus.com. br); Pesquisador   do   CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO - UNISAL;Pesquisador do CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO - UNISAL. É o Advogado Geral da ADVOCACIA GERAL DA IMBEL - AGI, da INDÚSTRIA DE MATERIAL BÉLICO DO BRASIL (www.imbel.gov.br), Empresa Pública Federal, vinculada ao Ministério da Defesa. Tem experiência como Advogado Empresarial há 45 anos, e, como Professor, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes ramos do Direito: Direito Constitucional, Internacional, Administrativo e Empresarial, Trabalhista, Tributário, Comercial. Publicou diversos Artigos e Livros, entre outros, 200 Anos da Indústria de Defesa no Brasil e "Soberania - O Quarto Poder do Estado", ambos pela Cabral Editora (www.editoracabral.com.br).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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