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Segurança social dos trabalhadores fronteiriços na União Européia:

acórdãos Kohll e Decker

24/07/2006 às 00:00
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A garantia efetiva do direito de residência bem como do direito de acesso ao emprego implica para os beneficiários uma proteção social suficiente em caso de deslocação no interior da Comunidade. A coordenação comunitária dos regimes de segurança social foi estabelecida nos Regulamentos (CEE) nº. 1408/71 e nº. 574/72 as quais asseguram aos trabalhadores assalariados e, desde 1982 aos trabalhadores independentes e aos estudantes, mesmo tratamento que os trabalhadores nacionais em matéria de segurança social. Estes regulamentos implicam a manutenção dos direitos adquiridos no conjunto dos estados-membros bem como o direito de cumular os períodos de contribuição social e os períodos de contribuição para a reforma com vista a obter o pagamento de prestações sociais.

Estes regulamentos são freqüentemente alterados em função do ajustamento às modificações efetuadas na legislação nacional. Em 1996, por exemplo, assegurou-se a possibilidade de transferência de trabalhadores para outro estado-membro sem a perda do direito das prestações de desemprego.

Os regulamentos CEE garantem apenas os direitos adquiridos no âmbito dos regimes de proteção social que possuam força de lei. Os regimes complementares e/ou que estão ligados á atividade profissional não estão incluídos, vez que a diversidade e multiplicidade dos direitos os tornam muito complexos. A Comissão adotou uma comunicação sobre este tema a fim de lançar um debate a nível comunitário podendo a falta de coordenação constituir um obstáculo ao desenvolvimento da mobilidade profissional entre os estados-membros.

Desde 1992 , com o objetivo de acelerar e simplificar os procedimentos administrativos para melhorar a aquisição de direitos bem como a concessão e o pagamento das prestações de segurança social, a Comissão vem colocando progressivamente em pratica o programa Telemática para a Segurança Social (TESS). O seu objetivo é a modernização dos intercâmbios de informação entre os organismos de segurança social.

Em matéria de liberalização dos cuidados, o Tribunal de Justiça da UE nos acórdãos Kohll e Decker de 28 de Abril de 1998 aplicou o principio fundamental da livre circulação no domínio da segurança social. Com efeito, no processo Decker o Tribunal afirmou que os artigos 28 e 30 do Tratado CE (antigos artigos 30 e 36 do Tratado) são contrários á regulamentação nacional que recuse a um segurado reembolsar o montante gasto junto a um oculista estabelecido em estado-membro diverso, pelo simples fato de que as compras de produtos médicos no exterior necessitam de autorização prévia.

No processo Kohll, o Tribunal precisou que os artigos 49 e 50 do Tratado (antigos artigos 59 e 60 do Tratado) são contrários á regulamentação nacional que subordine o reembolso de prestações de tratamentos dentários efetuados por ortodontistas estabelecidos em estado-membro diverso à autorização do organismo de segurança social do segurado.

No seguimento deste acórdãos os segurados podem deslocar-se ao exterior para comprar produtos médicos, beneficiar de cuidados de saúde e serem reembolsados de acordo com as tarifas em vigor no país de inscrição. Com efeito, o Tribunal consagrou o direito aos segurados sem levar em consideração a legislação nacional ou o Regulamento 1408/71.

A posição defendida pelo Tribunal de Justiça nos acórdão Kohll e Decker tem como conseqüência a junção de dos sistemas. A questão fundamental é a da conciliação de um espaço sem fronteiras com o principio da territorialidade da segurança social. Alguns estimam que tais acórdãos podem prejudicar o equilíbrio financeiro dos regimes de segurança social ao facilitarem o desenvolvimento de um "shopping medico". Na realidade, o Tribunal de Justiça quis limitar o principio da livre circulação de produtos e serviços médicos, autorizando o estado-membro a tomar medidas restritivas caso o equilíbrio financeiro seja gravemente ameaçado.

O Regulamento 1408/71 continua a ser um das disposições fundamentais em matéria de cuidados de saúde. Todavia este regulamento sofreu profundas alterações ao longo do tempo. No intuito de simplificar e clarear as regras relativas à coordenação dos sistemas de segurança social, a EU apresentou uma proposta de regulamento ao Conselho que adapta o Regulamento 1408/71 em função da evolução das legislações nacionais e da jurisprudência do Tribunal de Justiça. A proposta prevê a extensão das disposições a todas as pessoas cobertas pela legislação da segurança social de um estado-membro deixando de cobrir exclusivamente os trabalhadores.

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Sobre a autora
Daniela Silveira Gonçalves

advogada e consultora, pós-graduada pela Universidade Gama Filho, mestranda pela Universidade de Coimbra (Portugal), bolsista do Programa Alban Bolsas de Estudo de Alto Nível (destinado à América Latina)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Daniela Silveira. Segurança social dos trabalhadores fronteiriços na União Européia:: acórdãos Kohll e Decker. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1118, 24 jul. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8686. Acesso em: 25 abr. 2024.

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