Assédio moral organizacional no setor de telemarketing

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A organização do trabalho nas empresas de telemarketing é marcada pela pressão para atingir metas, ritmo acelerado de labor, rigor excessivo na cobrança e controle para o uso de sanitários. É nesse contexto que emerge o assédio moral organizacional.

1. INTRODUÇÃO

Com as inovações tecnológicas e o desenvolvimento da telemática, as empresas de telemarketing, em busca da elevação dos índices de produtividade e lucro, utilizam mecanismos informatizados para fiscalizar os trabalhadores e controlar o tempo e a forma de execução do labor, criando uma política gerencial baseada em metas abusivas, punições e constrangimentos.

As condutas assediadoras estão inseridas na própria organização trabalho, atingindo todos os operadores de telemarketing indistintamente. Desse modo, presente artigo objetiva examinar o assédio moral organizacional no setor de teleatendimento, que, enraizado na estrutura laboral, degrada o meio ambiente de trabalho e adoece os trabalhadores.

2. A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NAS EMPRESAS DE TELEMARKETING OU CALL-CENTERS

O assédio moral organizacional consiste na tortura psicológica perpetrada por um conjunto de condutas abusivas e reiteradas, que estão inseridas na política gerencial da empresa, dirigidas a todos os trabalhadores indistintamente ou a um determinado setor ou perfil de trabalhadores, encontrando-se bastante presente no setor de teleatendimento.

Pressão para atingir metas, sobrecarga e ritmo acelerado e intenso de trabalho, rigor excessivo na cobrança, humilhação dos que não atingem metas, sistema de premiações, pausas mínimas e controladas para uso de sanitário e alto grau de vigilância dos supervisores são algumas formas de organização do trabalho nas empresas de telemarketing, também conhecidas como call-centers ou contact centers.

O trabalho de teleatendimento consiste na atividade de comunicação com interlocutores clientes e usuários, realizada à distância, por intermédio da voz ou mensagens eletrônicas, com a utilização simultânea de terminais de computador, equipamentos de audição ou escuta e fala telefônica, consoante definição constante do item 1.1.2 do Anexo II da NR 17 (trabalho em teleatendimento/telemarketing)[1]

O trabalho em call centers envolve características típicas, quais sejam:

• Atendimento a clientes via uso de interface telefônico-informática (“telemática”).

• Grandes empresas oferecendo o primeiro emprego a centenas de milhares de jovens.

• Grandes centrais de teleatendimento prestadoras de serviços “terceirizados” (subcontratação) principalmente em telecomunicação, mercado financeiro e bancário, comércio eletrônico, atendimento ao consumidor, cobranças, entre outros.

• Centrais de teleatendimento ativas (em que se busca o cliente) e centrais receptivas (que recebem ligações de clientes para atendimento, transações, reclamações etc.).

• Alta eficiência, induzida pela tecnologia, em termos de número de chamadas e tempos médios de atendimento, requerendo dos atendentes a submissão a regime rígido de controle.

• População trabalhadora de perfil jovem (95%) e feminino (80 a 85%)

• Alta rotatividade nos empregos (até 5% ou mais ao mês).

• Trabalho em turnos ininterruptos e noturno, com intervalos exíguos para repouso e refeições.

• Remuneração da grande maioria dos trabalhadores em torno do salário mínimo oficial brasileiro, sujeita a variações por gratificações.

• Uso de roteiros e scripts pré-planejados e controlados.

• Trabalho sob pressão “quando as filas de espera de atendimento aumentam” (CBO, 2016).

• Trabalho estático em células de atendimento de pequenas dimensões.

• Jornadas de 6 horas e 20 minutos diários, com previsão de 2 pausas de 10 minutos cada e mais 20 minutos de intervalo para repouso e alimentação.[2]

A organização do trabalho e a política gerencial das empresas de telemarketing é marcada pela exigência de metas abusivas, controle da forma e do tempo de labor, bem como por sistemas de premiação e punição, que degradam o meio ambiente de trabalho e propiciam a prática de assédio moral organizacional. Assim, convém analisar de forma mais detalhada alguns aspectos da estrutura de trabalho no setor de teleatendimento, como forma de facilitar a compreensão do fenômeno do assédio moral organizacional e do consequente adoecimento dos trabalhadores.

2.1 Rigor excessivo na cobrança de metas abusivas

A união da telefonia com a informática reformulou a atividade, tornando-a mais intensa e complexa, com diferentes problemas a serem solucionados, além de impor um ritmo de trabalho definido por aparelhos que distribuem automaticamente as ligações e controlam o trabalho e os trabalhadores.[3]

A maioria das empresas de teleatendimento funcionam prestando serviços terceirizados a setores de telecomunicação, mercado financeiro e bancário, comércio eletrônico, atendimento ao consumidor, cobranças, entre outros. Com objetivo de manter e captar novos clientes e aumentar o lucro, as empresas buscam altos índices de produtividade, exigindo, para tanto, metas abusivas.

As metas podem ser individuais ou coletivas, podendo variar no tempo, em módulos diários, mensais ou semanais[4]. O estabelecimento de metas é uma estratégia legítima. Entretanto, a especificidade dessa estratégia, juntamente com o processo de definição de metas, as pressões para a produtividade e o sistema de punições e recompensas, torna essa exigência abusiva e favorece a prática de assédio moral.[5]

Como forma de aumentar a produtividade, as empresas de telemarketing dividem o salário dos operadores em uma parcela fixa, que corresponde geralmente a um salário mínimo, e outra parcela que é variável, vinculada ao alcance de metas[6]. Como observa Odete Reis, os critérios utilizados para o recebimento da remuneração adicional empregam cálculos complexos, alterados com muita frequência, o que causa confusão e indefinição aos trabalhadores[7]. Além disso, muitas empresas utilizam “deflatores”, ou seja, após a apuração da produção do trabalhador e da parcela variável, são feitos descontos com base em faltas (inclusive justificadas), sanções disciplinares, atrasos na jornada e não cumprimento do script, o que dificulta ainda mais a percepção da parcela[8].

O meio ambiente laboral também é estruturado para o alcance das metas. A disposição dos trabalhadores é feita em cabines ou baias, para que não conversem entre si e permaneçam todo o tempo observados pelo supervisor[9]

Com efeito, as metas abusivas e inatingíveis, atreladas ao pagamento de comissões por produtividade, ocasiona um ritmo acelerado de trabalho. As pressões por produção e o rigor excessivo na cobrança, com o controle do tempo de trabalho e do modo de execução do labor, potencializa o assédio moral organizacional no setor de teleatendimento. Para intensificar ainda mais as condutas assediadoras, o cumprimento das metas é acompanhado de um sistema de punições e recompensas.    

2.2 Sistema de premiação e punição

As metas de alta produtividade encontram-se geralmente atreladas ao sistema de premiação e punição, também conhecido como controle por stick and carrots (porrete e premiação), tendo em vista que aqueles que seguem a programação recebem premiações, na forma de bonificações e prêmios, por outro lado, aqueles que não observam os comandos são cortados ou punidos.[10] As empresas de telemarketing utilizam esse mecanismo abusivo para coagir os trabalhadores a aumentar a produção.

Com efeito, o sistema da premiação, principalmente através da classificação em ranking, enaltece o operador que cumpriu as metas, estimulando uma forte competitividade, além de tornar o ambiente de trabalho hostil e individualista. A publicização do desempenho dos operadores, como bem observa Odete Reis, através da divulgação dos nomes dos “destaques do mês” estampados pelos corredores das empresas ou da colocação de balões nos postos de trabalho daqueles que obtiveram melhores índices de produtividade, são formas comumente utilizadas pelo sistema de premiações.[11]

Por outro lado, o sistema da punição está pautado na ridicularização pública do trabalhador que não alcançou as metas estabelecidas, sendo, na maioria das vezes, desqualificado, por meio de gestos, palavras, gritos, olhares, advertências, suspensões ou utilização de fantasias.

Ressalte-se que o item 5.13 do Anexo II da NR 17 veda a utilização de métodos que causem assédio moral, medo ou constrangimento, nos seguintes termos:

É vedada a utilização de métodos que causem assédio moral, medo ou constrangimento, tais como: a) estímulo abusivo à competição entre trabalhadores ou grupos/equipes de trabalho; b) exigência de que os trabalhadores usem, de forma permanente ou temporária, adereços, acessórios, fantasias e vestimentas com o objetivo de punição, promoção e propaganda; c) exposição pública das avaliações de desempenho dos operadores.[12]

Além das punições pelo não cumprimento das metas, os operadores de telemarketing são constantemente advertidos ou suspensos pela inobservância do script[13]. As empresas de teleatendimento possuem um setor específico de monitoria dos operadores, cuja função é escutar as ligações[14], zelar pelo cumprimento do script e observar a cordialidade, segurança, entonação da voz[15] e capacidade de resolução de problemas durante o atendimento.[16]

As “pausas indevidas” também são computadas na “escala pedagógica”, que consiste na escala de punições relativas a determinadas condutas do operador. Desse modo, as empresas acabam punindo os trabalhadores por atitudes variadas, como estourar as pausas permitidas; tirar pausas indevidas; utilizar livros, celulares ou lanchar na PA (Posição de Atendimento); atrasar-se injustificadamente; descumpri o script, entre outras condutas que instauram uma sensação de medo entre os trabalhadores pela iminente possibilidade do recebimento de penalizações.[17]

Por fim, convém destacar que além das punições pelo descumprimento de metas e pela inobservância do script e das pausas, o operador de call-center também é alvo de agressão dos consumidores. O Decreto nº. 6.523/2008, regulamenta a Lei nº. 8.078/90, fixando normas gerais sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor – SAC.

O SAC consiste no serviço de atendimento telefônico das prestadoras de serviços regulados que tenham como finalidade resolver as demandas dos consumidores sobre informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento de contratos e de serviços, nos termos do art. 2º do Decreto nº. 6.523/2008. Contudo, não obstante as empresas de teleatendimento devam respeitar os ditames do regulamento, na prática, verifica-se um reiterado descumprimento das suas disposições. A título de exemplo, cumpre mencionar o art. 10, §2º, que estabelece que “nos casos de reclamação e cancelamento de serviço, não será admitida a transferência da ligação, devendo todos os atendentes possuir atribuições para executar essas funções”.[18]

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             Esse descumprimento, em muitas situações, é proposital. O trabalho no setor de teleatendimento é organizado de modo a cansar o consumidor para que ele desista, por exemplo, de cancelar serviços. Assim, o atendente acaba sendo vítima de assédio moral organizacional, como também das agressões de consumidores que descarregam nos operadores suas insatisfações com a prestadora de serviço.[19]

2.3 Controle do tempo de trabalho e restrição ao uso de banheiro

As empresas de teleatendimento apresentam uma estrutura hierárquica destinada ao controle dos trabalhadores e da produção. Para cada grupo de aproximadamente vinte trabalhadores, há um supervisor que, além do controle visual, monitora em tempo real o número de ligações, o tempo médio de atendimento, bem como o cumprimento do horário de trabalho e das pausas para descanso, alimentação e banheiro.[20]

Ademais, as inovações tecnológicas e telemáticas possibilitam o controle preciso da atuação do empregado, em especial através do cômputo do tempo de atendimento, das pausas, da gravação de conversas e das estatísticas de atendimento.

Faz-se mister evidenciar que, além do registro das pausas no computador, com a respectiva exposição do motivo, o trabalhador deve solicitar autorização do supervisor, inclusive para satisfação de necessidades fisiológicas, devendo explicar os motivos de idas mais frequentes, como período menstrual ou problemas intestinais.[21] A disposição física dos postos de trabalho facilita ainda mais esse controle por parte do supervisor.

Convém destacar que o item 5.7 da NR 17 dispõe que “o trabalhador deve ter permissão para sair de seu posto de trabalho a qualquer tempo, sem qualquer tipo de prejuízo, para satisfação de suas necessidades fisiológicas”.[22] As empresas de call-center, todavia, em total desrespeito à dignidade e aos direitos personalíssimos do trabalhador, restringem a utilização dos banheiros, penalizando-os pela extrapolação das pausas pré-definidas.

Nesse sentido, cabe transcrever a ementa do acórdão proferido pela 7ª Turma do TST, in verbis:

RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE - PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014, DO CPC/2015 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST - ATENDENTE DE TELEMARKETING - CALL CENTER - CONTROLE DO USO DO BANHEIRO - ANEXO II DA NR-17 DO MTE - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

1. As disposições do Anexo II da NR-17 do MTE permitem perceber que o Executivo exerceu seu poder regulamentar em matéria de saúde e segurança do trabalho voltando-se não apenas para a proteção da integridade física, mas também para a tutela da integridade mental do trabalhador e, em última análise, de sua própria dignidade, num resgate valioso dos parâmetros constitucionais de proteção. E, havendo uma normatização disciplinadora das condições de trabalho que permite contemplar a dignidade dos trabalhadores do setor, resulta mitigada a margem de ponderação de valores da qual o Poder Judiciário vinha lançando mão com fundamento na lacuna normativa.

2. No caso, o item 5.7 da NR-17, Anexo II, do MTE é taxativo no sentido de que o acesso do trabalhador ao banheiro em qualquer momento da jornada deve ser assegurado, quantas vezes forem necessárias.

3. Desse modo, a tão só vinculação da possibilidade de ir ao banheiro nas pausas estabelecidas na norma já constitui restrição à liberdade de disposição do próprio corpo ali assegurada. É dizer que o simples fato de ter que pedir autorização para ir ao banheiro, ainda que essa autorização seja sempre deferida pelo empregador, no tempo em que lhe convier, representa extrapolação inadmissível do poder diretivo do empregador para colonizar aspectos inerentes à autonomia corporal do sujeito que trabalha, traduzindo-se em constrangimento e desrespeitando o disposto na referida norma regulamentar.

4. O controle, por meio da submissão de cada uma das idas do trabalhador ao sanitário à prévia autorização do empregador, e o estabelecimento antecipado de momentos preferenciais em que os empregados possam ir ao banheiro torna constrangedora, excepcional e desprovida da preservação da intimidade eventual a ida ao banheiro que ocorra fora desses parâmetros.

5. Ademais, transfere para o empregador o controle sobre uma dimensão íntima e inerente ao exercício da mais primeva autonomia do ser humano adulto. É importante observar que as medidas previstas na referida NR se apresentam como resposta necessária ao panorama atual de adoecimento dos trabalhadores em call center.

6. A realidade encontrada por muitas pesquisas realizadas no setor retrata, além de um cenário de precarização propício à manifestação de diversas enfermidades, com destaque para o adoecimento psíquico dos trabalhadores, em razão do alto nível de cobrança, estresse, intensidade e controle do tempo e dos procedimentos laborais, um novo indicador de adoecimento específico e diferenciado em relação às demais categorias: problemas do trato urinário e distúrbios miccionais, imediatamente relacionados ao controle e repressão tácita ao uso do sanitário durante a jornada de trabalho.

7. Por isso a relevância de se trazer o trato específico e responsivo das normas regulamentares em matéria de medicina e segurança do trabalho para o âmbito da efetivação dos valores constitucionais da saúde e também da dignidade de quem trabalha. Devida, portanto, a reparação por danos morais em razão do controle do uso do banheiro. Recurso de revista conhecido e provido.[23]

Conclui-se, assim, que a organização do trabalho no setor de teleatendimento é marcada por um total controle do tempo de labor, das pausas e do modo de execução das atividades (escuta das ligações e monitoramento do script), o que retira a liberdade do trabalhador, mantendo-o em intensa e constante vigilância. A pressão por produtividade, a exigência de metas abusivas e o temor das penalizações potencializa o assédio moral organizacional nas empresas de telemarketing, violando gravemente os direitos fundamentais dos trabalhadores.

3. O ADOECIMENTO DO TRABALHADOR EM TELEATENDIMENTO

O assédio moral organizacional adoece os trabalhadores em teleatendimento das mais diversas formas. Alarmantes estatísticas de afastamentos e altos índices de rotatividade demonstram a perversidade da organização laboral no setor de telemarketing. Doenças osteomusculares, doenças psíquicas, distúrbios de fonação, distúrbios auditivos e doenças geniturinárias são algumas das doenças geradas nos operadores de call-center.

O trabalho em teleatendimento, por envolver uma contínua interação entre computador e telefone (headset), ocasiona graves riscos de adoecimento osteomuscular. Isso porque são necessárias posturas estáticas, em ambientes exíguos (cabines ou baias), com movimentos repetitivos de digitação e sem pausas adequadas para recuperação e repouso, tendo em vista o número de chamadas e metas a cumprir.[24] Além disso, em muitas empresas, o mobiliário não atende as especificações previstas no item 2 do Anexo II da NR 17, gerando a manutenção de posturas inadequadas e desconfortáveis.

Com efeito, entre os transtornos osteomusculares e do tecido conjuntivo (LER/DORT) que mais acometem os operadores de telemarketing, pode-se destacar: síndrome cervicobraquial (M53.1); dorsalgia (M54.-); sinovites e tenossinovites (M65.-); bursite da mão (M70.1); bursite do ombro (M75.5); síndrome do manguito rotatório (M75.1), entre outros.[25]

O labor intensivo em interface telemática, com o controle preciso do tempo de trabalho, das pausas e do modo de execução das funções, juntamente com o cumprimento de metas abusivas, acompanhadas de punições, compromete seriamente a saúde mental do operador de telemarketing.

Conforme lição de Christophe Dejours, o ritmo e a velocidade da produção gera ansiedade no trabalhador, acarretando um progressivo esgotamento e desgaste.[26] Assim, nesse estado de ansiedade e estresse, surgem doenças psíquicas, tais como transtorno de estresse pós-traumático (F43.1); síndrome do burn-out (Z73.0); e depressão (F32.-).

O assédio moral organizacional, como bem preleciona Ileana Mousinho, ao impor “ritmos penosos de trabalho por meio de metas de produtividade excessiva é fator de risco que faz eclodir vários transtornos mentais, inclusive a Neurose Profissional (CID F.48.8)”.[27]

Os trabalhadores em teleatendimento também são acometidos por distúrbios de fonação, em virtude do uso intenso e contínuo da voz como ferramenta de trabalho, agravado por fatores de riscos ambientais (expressivo ruído de fundo, equipamentos deficientes, mudanças bruscas e frequentes de temperatura, dificuldade de acesso a hidratação e sanitários) e organizacionais (estresse relacionado ao trabalho, obrigação de repetição de longos scripts pré-formatados, falta de intervalos adequados, falta de treinamento para uso adequado da voz, entre outros).[28]

Assim como a voz, o headset (conjunto de microfone e fone de ouvido) também é uma ferramenta de trabalho, sendo utilizado durante toda a jornada. Os ruídos de alta frequência e intensidade, forçam o trabalhador a aumentar o volume do headset, lesionando o seu canal auditivo. Outrossim, os fatores de riscos ambientais e organizacionais acima apontados agravam as lesões, acarretando sensações de parestesia ao redor da orelha, perda de audição, zumbido no ouvido afetado, alterações do equilíbrio, além de potencializar o quadro de ansiedade e depressão que geralmente acompanha esses trabalhadores.[29] Por fim, as restrições ao uso do banheiro ocasionam doenças geniturinárias, como infecções urinárias.

Conclui-se, assim, que a organização do labor nas empresas de telemarketing compromete seriamente a saúde dos empregados, violando diversas convenções internacionais e disposições constitucionais que tutelam o meio ambiente do trabalho e os direitos fundamentais dos trabalhadores.

Sobre a autora
Claiz Maria Pereira Gunça dos Santos

Mestra em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Federal da Bahia. Graduada em Direito, com Láurea Acadêmica, pela Universidade Federal da Bahia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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