A responsabilidade civil do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em decorrência da sua atuação previdenciária

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29/11/2020 às 22:38
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Demonstrar a possibilidade de a autarquia previdenciária (INSS) ser responsabilizada civilmente por ação ou omissão, relativamente aos danos materiais e morais causados aos segurados.

INTRODUÇÃO

Um dos instrumentos jurídicos para instrumentalização da segurança jurídica é o instituto da responsabilização civil, que encontra previsão tanto constitucional quanto infraconstitucional, e visa recompor o equilíbrio fático da esfera individual ou coletiva lesada.

As constantes mudanças do Direito Previdenciário e a sua relevância para a sociedade fazem com que constantemente os olhos se voltem para o tema, do qual depende a construção social de valores protetivos concretos.

No exercício dos direitos previdenciários não raramente a esfera de dignidade humana é atingida, fazendo vir à tona a questão acerca da possibilidade de se responsabilizar ou não o ente autárquico por seus atos seja em decorrência de sua ação ou omissão.

Sem pretensão de esgotar o tema, o presente estudo traz de modo sucinto uma compreensão do instituto da responsabilização civil como meio reparador dos danos havidos nas relações previdenciárias.


1. CONCEITOS SOBRE SEGURIDADE E PREVIDÊNCIA SOCIAL

Para a adequada compreensão do conceito de Previdência Social faz-se necessário, primeiramente, compreendermos o conceito de Sistema Nacional de Seguridade Social.

A seguridade social é definida pela Constituição Federal, como um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (artigo 194).

O Sistema de Seguridade Social se revela, assim, como um “necessário mecanismo de fixação constitucional para a concretização dos propósitos da República, dentre eles da Justiça Social e do Bem-Estar de toda a coletividade”. (AGOSTINHO; SALVADOR, 2017, p. 17).

Se constitui, portanto, em um sistema de proteção social que abrange os três programas sociais de maior relevância: a previdência social, a assistência social e a saúde.

O presente estudo tem foco na previdência social, que é a forma de proteção social “destinada a afastar necessidades sociais decorrentes de contingências sociais que reduzem ou eliminam a capacidade de auto-sustento dos trabalhadores e/ou de seus dependentes”. (TORRES, 2012a).

Sendo assim, tal segmento autônomo da seguridade social vai se preocupar exclusivamente com os trabalhadores e com os seus dependentes econômicos.

AGOSTINHO e SALVADOR afirmam que

Em suma, interpretando seus principais comandos, em especial os arts. 40, 201 e 202 da CF/1988, fácil destacar que a Previdência Social é uma constitucional técnica protetiva, de contornos axiológicos, que visa assegurar a seus participantes o acesso a benefícios e serviços quando sujeitos a determinado risco social. (2017, p. 18).

A proteção da Previdência Social evoluiu ao longo dos anos e foi sendo ampliada, passo a passo, de acordo com a promulgação das oito constituições brasileiras, tendo atingido o seu ápice na Constituição Cidadã de 1988. (RANGEL et al, p. 42-45).

Os direitos relativos à Previdência Social são direitos fundamentais sociais, que podem ser chamados, ainda, de direitos “de segunda dimensão, ou ainda os direitos do cidadão de viver em sociedade, e, devido a tal classificação, percebe-se uma grande preocupação em aumentar a sua força normativa”. (AGOSTINHO; SALVADOR, 2017, p. 15-16).

As relações previdenciárias são norteadas por seus regimes previdenciários, que são divididos em três espécies, segundo o disposto nos artigos 201, 40 e 202 da CF: a) O Regime Geral da Previdência Social, aplicável aos empregados, empresários, profissionais liberais, empregados domésticos e trabalhadores avulsos; b) O Regime Próprio de Previdência Social, de administração do Estado e aplicável aos funcionários públicos estatutários de todos os entes federativos; c) O Regime de Previdência Complementar ou Privado, que é facultativo e administrado pela iniciativa privada.

Desta forma, depreende-se que o regime jurídico é “um relacionamento organizado, mas específico, disciplinador de um pacto previdenciário com direitos e deveres”. (AGOSTINHO; SALVADOR, 2017, p. 25).

É no campo das relações existentes nas relações previdenciárias do RGPS que o presente estudo se dirige, no qual, situa-se a maior contingência de contenciosidade.

O Regime Geral de Previdência Social é

uma relação obrigacional, de natureza sinalagmática, ou seja, deve existir uma reciprocidade entre as partes, o Estado e o segurado. O Estado, como sujeito ativo, paga ao beneficiário o seu benefício, e o beneficiário, o sujeito passivo da relação, tem o necessário dever de contribuir com a Previdência, para então fazer jus ao pacote de proteção e exigir o amparo constitucional. Todos deveriam ter o direito à Previdência Social, mas existe esta interdependência entre o direito de receber e o dever de pagar, ou seja, se o indivíduo não paga sua prestação, não existirá a obrigação do Estado em disponibilizar-lhe uma retribuição do tipo previdenciária. Existe sempre um condicionamento de um com o outro. (AGOSTINHO; SALVADOR, 2017, p. 25).

Beneficiários da Previdência Social são as pessoas físicas que recebem a proteção previdenciária por parte do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, que por sua vez é o órgão gestor do regime geral de previdência social. (TORRES, 2012b).

Segundo disposição expressa do artigo 10, da Lei 8.213/91, os beneficiários da Previdência social são os segurados (beneficiários diretos) e seus dependentes (beneficiários indiretos).

Seja pelo exercício de atividade laborativa remunerada para os segurados obrigatórios, ou pelo recolhimento das contribuições para os segurados facultativos, ambos necessitam contribuir para a Previdência Social, e, por isso são os beneficiários diretos, diferentemente de seus dependentes que não são obrigados a contribuir e a proteção não decorre de ato próprio, mas da qualidade de dependente, e se constituem, assim, apenas beneficiários indiretos.

Segundo Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de Macêdo “Os segurados são, ao mesmo tempo, beneficiários da proteção previdenciária e contribuintes da previdência social, conforme o disposto nos arts. 12. e 14 da Lei 8.213/91 e nos arts. 11. e 13 da lei 8.213/91.” (apud TORRES, 2012b).


2. A REPARAÇÃO CIVIL NO DIREITO PÁTRIO

Atualmente, a responsabilidade civil está consagrada na Constituição Federal, no artigo 5º, V e X, e diz respeito ao restabelecimento do equilíbrio jurídico e patrimonial afetado por uma conduta que transgrediu uma norma, seja decorrente de lei ou contrato, causando um dano, no intuito de recuperar o statu quo ante (MENDONÇA, 2018).

A Constituição Federal prevê, assim, expressamente o direito de indenização por dano material, moral e à imagem, consagrando ao ofendido a total reparabilidade em virtude dos prejuízos sofridos. A norma, portanto, pretende a reparabilidade da ordem jurídica lesada, seja por meio de reparação econômica, seja através de outros meios, como por exemplo, o direito de resposta.

O violador sujeita-se, portanto, às consequências do seu ato, seja recompondo as coisas ao statu quo ante, ou pagando uma compensação pecuniária à vítima, caso não seja possível recompor. (GAGLIANO; PAMPLONA, 2006, p. 9).

A responsabilidade civil, se trata, assim, do dever jurídico de restaurar o equilíbrio patrimonial e moral violado, objetivando sempre ressarcir a vítima à situação anterior à lesão pelo dano (MENDONÇA, 2018).

Pode ser de ordem contratual, prevista nos artigos 389 e seguintes, e artigo 395 e seguintes, todos do Código Civil, ou, extracontratual. Esta última, por sua vez, surge quando o agente viola um dever legal, sem que exista um vínculo preexistente com a vítima, nos termos dos artigos 186 a 188, e 927 a 954, do Código Civil.

Quanto ao dano em si, diz respeito ao prejuízo pela afetação do patrimônio do ser humano. (MARTINEZ, 2005, p. 28).

O dano é “toda desvantagem que experimentamos em nossos bens jurídicos (patrimônio, corpo, vida, saúde, honra, crédito, bem-estar, capacidade de aquisição)” (ENNEERUS apud STOCO, 2007, p. 128).

Segundo ensina Carlos Alberto Bittar,

São reparáveis todos os danos que afetam a pessoa (física ou jurídica), em sua integridade estrutural, em seu patrimônio e respectivas projeções. Tratando-se de pessoa física, são indenizáveis as lesões a componentes de sua expressão física (corpórea), ou psíquica, ou moral, restringindo-se, na pessoa jurídica, a aspectos morais e patrimoniais. (1989, p. 16).

A reparação por dano material visa recompor o patrimônio econômico do ofendido, - seja pelo dano imediato ou emergente, quanto pelos lucros cessantes/aquilo que deixou de auferir -, enquanto a reparação por dano moral, se propõe indenizar a ofensa da vítima enquanto ser humano, pela violação de seus direitos da personalidade (MENDONÇA, 2018), ou da dignidade humana (CAVALIERI, 2009, p. 81).

Carlos Alberto Bittar, diz que a extensão da reparação dos danos, abrange além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar, decorrentes, direta e imediatamente, da ação violadora (1989, p. 20).

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, sustentam, ainda, o dano reflexo, consistente no prejuízo que atinge reflexamente pessoa próxima, ligada à vítima direta; bem como os danos coletivos, difusos e a interesses individuais homogêneos (2006, p. 45. e 47).

O nexo causal visa garantir que o causador somente seja responsabilizado, se realmente deu causa à lesão da vítima. Tal conceito não é jurídico; mas “decorre das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado” (CAVALIERI FILHO, apud CAVEDON, 2016).

Os autores Gagliano e Pamplona, trazem, ainda, três requisitos para que o dano seja indenizável: a) violação de um interesse jurídico patrimonial ou extrapatrimonial de uma pessoa física ou jurídica; b) certeza do dano; c) subsistência do dano (2006, p. 40).

Depreende-se, portanto, três funções da reparação civil: compensatória do dano à vítima; punitiva do ofensor e socioeducativa, ou seja, desmotivação social da conduta lesiva (GAGLIANO; PAMPLONA, 2006, p. 21).

Segundo Cavalieri Filho, o arbitramento deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais, devendo ser utilizado o princípio da lógica do razoável como a bússola norteadora do julgador (2009, p. 69).

O artigo 944 do Código Civil, disciplina o princípio da reparação integral, por prever que “A indenização mede-se pela extensão do dano”, tendo como objetivo proporcionar uma compensação àquele que os sofreu em virtude de certos fatos (FARIAS et al, 2015, p. 22-23).

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A responsabilização civil pode se dar de duas formas. A primeira a ser citada é a forma subjetiva, caso em que é necessário se comprovar a intenção ou não de se provocar o dano (dolo ou culpa). A culpa tem natureza civil e está caracterizada quando o agente, embora não teve a intenção de causar o dano, atue com negligência, imprudência ou imperícia, nos termos do artigo 186, do Código Civil (VITORINO).

A segunda é a objetiva, que se encontra prevista na Constituição Federal de 1988, quando se refere ao seguro em acidentes de trabalho (art. 7º, inc. XXVIII), aos danos nucleares (art. 21, inc. XXIII, alínea c), às pessoas jurídicas de direito público e privado prestadoras de serviço público (art. 37, § 6°), aos danos ambientais (art. 225, § 3°) (WEDY, 2015).

A partir desta linha constitucional foi sancionada posteriormente a Lei 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor -, que também prevê em seu artigo 12, a responsabilidade objetiva do fabricante, do produtor, do construtor, nacional ou estrangeiro, e do importador pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

O Código Civil de 1916 previa a regra geral da responsabilidade subjetiva (artigo 159), mas previa também a responsabilidade objetiva, na hipótese de queda ou lançamento de objetos de edifícios. (WEDY, 2015).

Já o Código Civil de 2002 trouxe também a regra geral da responsabilidade subjetiva no artigo 186, e, por outro lado, trouxe também a responsabilidade objetiva por atividades de risco no art. 927, parágrafo único, ao estabelecer a obrigação de indenizar, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar riscos para outrem (WEDY, 2015).

Ana Paula Martini Tremarin Wedy, cita, ainda, que o Código Civil prevê outras hipóteses de responsabilidade objetiva, a seguir descritas:

art. 928. (responsabilidade equitativa e subsidiária dos incapazes), artigos 932 e 933: (responsabilidade dos pais em relação aos filhos; do tutor e do curador em relação aos pupilos e aos curatelados; do empregador ou comitente quanto aos empregados e aos prepostos; dos donos de hotéis pelos hóspedes; e dos que gratuitamente houverem participado nos produtos de crime), art. 936. (pelo fato dos animais dono ou detentor do animal ressarcirá o dano por ele causado, se não provar culpa da vítima ou força maior), artigos 937 e 938 (responsabilidade civil pelo fato das coisas), artigos 441 a 446 (responsabilidade por vício redibitório), artigos 447 a 457 (responsabilidade objetiva por evicção), artigos 734 e 735 (responsabilidade do transportador de pessoas é objetiva), artigos 884 a 886 (hipóteses de enriquecimento sem causa) e artigos 939 e 940 (concernentes ao credor que demanda o devedor antes de vencida a dívida, bem como ao que o faz por dívida já paga). (WEDY, 2015).

Na responsabilidade objetiva, não é necessário a caracterização da culpa, já que esta é presumida, segundo ensina Bittar:

Passou-se da exigência de ato de vontade, contrário à ordem jurídica – com base no princípio do neminem laedere – à admissão do risco, introduzido na sociedade pelo exercício de atividades perigosas, como esteio para a responsabilização do agente. De uma conduta antijurídica chegou-se a ação legítima, mas perigosa, na teoria em análise, coma aplicação do princípio do ubi emolumentum, ibi ius (ou ibi ônus), de conformidade com o qual a pessoa que retira proveito dos riscos criados, deve arcar com as respectivas consequências. Com isso, libera-se a vítima, em concreto, da prova da subjetividade, facilitando-se a percepção da indenização devida(...) (1989, p. 31).

E segue este autor, explicando que,

Assim, a responsabilidade recai sobre empresas exploradoras de atividades consideradas perigosas, fundada no risco correspondente e caraterizada pelo vínculo entre sua ação e o resultado danoso (ou seja, pelo simples implemento do nexo causal, sem qualquer cogitação de subjetividade). (1989, p. 31).


3. A RELAÇÃO PREVIDENCIÁRIA COMO DIREITO FUNDAMENTAL

Direitos fundamentais são

Todas aquelas posições jurídicas concernentes às pessoas que, do ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, por seu conteúdo e importância (fundamentalidade em sentido material), integradas ao texto da Constituição e, portanto, retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos (fundamentalidade formal), bem como as que, por seu conteúdo e significado, possam lhes ser equiparados, agregando-se à Constituição material, tendo ou não assento na constituição formal (ROCHA, 2004, p. 84)

A fundamentalidade formal se encontra presente na Constituição Federal, quando prevê o direito à previdência social em seu artigo 6º; e a fundamentalidade material, abrange “uma obrigação prestatória quando o indivíduo não pode, de outra maneira, prover uma existência humanamente digna”. (ROCHA, 2004, p. 111).

Afinal,

É justamente nos momentos nos quais os cidadãos, inseridos na sociedade por força de sua capacidade de trabalho (substancial maioria da população), têm sua força laboral afetada, ou mesmo negado o acesso ao trabalho, como é cada vez mais comum por força do modelo econômico excludente, que a previdência social evidencia seu papel nuclear para a manutenção do ser humano dentro de um nível existencial minimamente adequado. (ROCHA, 2004, p. 111).

Daniel Machado da Rocha, sustenta que “o direito à previdência social constitui o núcleo gravitacional do Direito Previdenciário” (ROCHA, 2004, p. 113).

É em razão da previdência social estabelecer um vínculo entre a capacidade contributiva e as prestações ofertadas, convertendo uma parte do resultado da atividade produtiva e a solidariedade social em proteção social individual e previsível, que se materializa uma expectativa jurídica legítima, nos beneficiários, de serem amparados nos momentos de necessidade social. (ROCHA, 2004, p. 114-115).

A doutrina reconhece o vínculo entre o direito à previdência social e a dignidade humana, a qual é princípio basilar de todos os direitos sociais, conforme já salientado alhures (ROCHA, 2004, p. 111).

O conceito de dignidade da pessoa humana na responsabilidade civil pode ser entendido como uma

Qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano, que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando neste sentido um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (FARIAS; ROSENVALD; BRAGA NETTO, 2015, p. 13-14).

Desta forma, tratando-se de um direito fundamental, a relação previdenciária possui um cunho protetivo que deve ser calçado na prestação de serviço público de forma eficiente à tais garantias.


4. A RESPONSABILIZAÇÃO DO INSS

Segundo preleciona Carlos Alberto Bittar, as ações lesivas podem ser praticadas tanto por pessoas físicas, quanto por pessoas jurídicas, dentre as quais

incluem-se também as de direito público, considerando-se como tal os entes políticos, ou de governo propriamente ditos (União, Estados e Municípios: C. Civil, art. 14. e 15 e Constituição vigente: art. 107), os componentes da administração descentralizada (autarquias e empresas) e os serviços institucionalizados, de cooperação com o Poder Público (como as de assistência social, de educação, etc.). (1989, p. 11)

Embora alguns autores refiram que a responsabilidade da Administração Pública é melhor denominada como responsabilidade do Estado, porquanto somente este é titular de direitos e obrigações na ordem civil, na realidade, quem sempre responde é a pessoa jurídica pública ou privada que integra a Administração Pública (CAVALIERI, 2009, p. 227).

A responsabilidade civil do Estado, enquanto pessoa jurídica de direito público, surgiu com o Código Civil de 1916 (art. 15), e Constituição Federal de 1934 (art. 171), e é objetiva desde a Constituição de 1946 (artigo 194) (STOCO, 2007, p. 1003).

Se encontra atualmente disciplinada no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, que assim dispõe:

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Houve no direito Pátrio, portanto, o acolhimento da teoria do risco administrativo (e não do risco integral que cobre as excludentes de ilicitude), ou seja, a responsabilidade objetiva está condicionada ao dano decorrente de sua atividade administrativa, somente quando houver relação de causa e efeito (CAVALIERI, 2009, p. 237).

O Estado responderá

Objetivamente pelos danos materiais ou morais, comprovadamente oriundos de atos de qualquer dos três Poderes, obrigando-se a reparar os prejuízos causados, a serem quantificados em execução. Não há para o Poder Público privilégios ou prerrogativas que possam eximi-lo do dever, que a todos impõe, de preservação da integridade de bens ou direitos protegidos pela segurança da ordem jurídica (TÁCITO apud STOCO, 2007, p. 1198).

Segundo lição de Yussef Said Cahali, a Administração Pública só pode realizar as atividades que lhe são próprias através de seus agentes, já que

A atividade funcional do Estado, como ser abstrato, realidade acidental, formada de relações de seres substanciais, os seres humanos, se efetiva mediante a ação destes, pessoas físicas, seus agentes, mas no seu nome e por sua conta, como centro de atribuições e operações. (MELLO apud CAHALI, 2012, p. 13).

Este autor sustenta que a responsabilidade direta da pessoa jurídica de direito público apoia-se na teoria orgânica, e decorre da própria natureza da pessoa jurídica, já que o funcionário causador do dano faz parte da organização desta. (CAHALI, 2012, p. 63).

Segundo Inácio de Carvalho Neto, a expressão “agentes” prevista no artigo 37, § 6º, diz respeito não apenas aos agentes públicos, mas também às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. (CARVALHO NETO, 2000, p. 131).

Por outro lado, a condição de pessoa jurídica de direito público das autarquias decorre da própria lei (Decreto-lei 6.016/43 e Decreto-lei 200/67, artigo 5º, inciso I), atribuindo-se “atividades típicas” da Administração às autarquias.

Por tais razões, a doutrina tem sustentado a responsabilidade civil das autarquias, quando estas atuarem na prestação de serviços públicos. (CAHALI, 2012, p. 99).

O conceito de serviço público compreende a ideia de um Estado serviente à coletividade, sendo, portanto, “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral”, no qual, o Estado “presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público” (ZANCANER, 2006, p. 342).

Considerando o dever jurídico da Administração Pública prestar o serviço público, sendo este um de seus princípios nucleares, lhe incumbe prestar o serviço adequado, ou seja, que satisfaça “as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas” (ROCHA apud ZANCANER, 2006, p. 344).

Embora os vínculos que geram danos no tocante à previdência social possam suceder entre beneficiário/contribuinte e a União, o MPS, o MF, e o INSS, e até a DATAPREV, (MARTINEZ, 2005, p. 57), o presente trabalho se presta a enfatizar apenas a relação com a autarquia previdenciária (INSS).

Theodoro Vicente Agostinho, ensina que a Previdência social

se viu inserida na Lei Fundamental como parte integrante de um arcabouço sistêmico, intitulado Sistema de Seguridade Social, consolidado em seu art. 194, caput do Código Excelso, que visou a dar a estruturação técnica necessária para a eficácia plena dos regulados direitos fundamentais (2017, p. 39).

Os benefícios previdenciários são uma garantia constitucional (artigo 7º, inciso XXIV e artigos 201 e 202), cuja gestão é realizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (BASSIL, 2010, p. 131), autarquia de direito público criado em 27 de junho de 1990, por meio do Decreto n° 99.350.

Segundo João Batista Lazzari, “uma vez ocorrida a hipótese de que trata a norma, é obrigação do ente previdenciário conceder a prestação prevista em lei, nos estritos termos do que ali determinado” (apud BASSIL, 2010, p. 132).

No processo administrativo previdenciário existem os princípios gerais que norteiam todos os atos administrativos, contidos no artigo 37 da Constituição Federal, e, existem, ainda os seguintes princípios específicos: a obrigatoriedade da concessão do benefício mais vantajoso; a primazia da verdade real; a oficialidade na atuação dos órgãos para a realização de requerimentos administrativos e produção de provas; e a presunção de veracidade dos dados constantes nos sistemas corporativos da previdência social (BASSIL, 2010, p. 132-133).

Conforme ensina José dos Santos Carvalho Filho:

Todos os atos administrativos podem submeter-se à apreciação judicial de sua legalidade, e esse é o natural corolário do princípio da legalidade. Em relação aos atos vinculados, não há dúvida de que o controle da legalidade a cargo do Judiciário terá muito mais efetividade. Com efeito, se todos os elementos do ato têm previsão na lei, bastará, para o controle da legalidade, o confronto entre o ato e a lei. Havendo adequação entre ambos, o ato será válido, se não houver, haverá vício de legalidade. (2003, p. 35).

Do exposto, conclui-se que, se o INSS realiza a gestão dos benefícios previdenciários, os quais, por sua vez, se constituem em garantia constitucional, necessita conceder a prestação nos termos da lei, sob pena de ser responsabilizado civilmente por seus atos.

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