A FUNÇÃO SOCIAL E ECONÔMICA DO CARF

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A cada decisão do CARF há um movimento social e econômico pelo mercado privado e publico, que busca se amoldar a forma com que as questões tributárias são interpretadas e aplicadas. No artigo a seguir se propõe analise sobre a função social e econômica.

Em tempos de eficiência e efetividade, a solução alternativa de conflitos ou a descentralização ou não-judicialização são medidas importantes, além é logico da celeridade. Em matéria tributária o CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) tem atendido esta demanda, mesmo que em parte.

            Em particular, “O CARF é um órgão colegiado, formado por representantes do Estado e da sociedade,  com atribuição de julgar em segunda instância administrativa, os litígios em matéria tributária e aduaneira.  Compete também ao CARF a uniformização da jurisprudência do órgão, mediante recurso especial das partes, quando ocorrer divergência de entendimento entre os colegiados de julgamento.” 

            O CARF surgiu em 2009 com a lei nº 11.941[1] e desde então diversas questões tributárias tem sido debatidas e regulamentadas no órgão. Após a decisão do CARF é comum que algumas  empresas envolvidas busquem o Poder judiciário para a análise da legalidade ou da constitucionalidade das questões ali decididas, sendo que, muitas das vezes o Judiciário mantem a decisão adotada pelo órgão Administrativo.

            São objetivos do CARF atuar com imparcialidade e excelência nas decisões tributárias, tendo entre seus membros pessoas com notável conhecimento tributário.

            Contudo há que se observar que o órgão ao prolatar decisões contra ou a favor os contribuintes está na verdade fazendo um controle social utilizando o sistema tributário para equalizar (ou não) a distribuição de recursos na sociedade. É certo que o ponto central de efeito social do CARF é que suas decisões balizam outras ações de fiscalização, criam precedentes administrativos e impedem novas condutas das empresas ou do Estado.

Em curto espaço de tempo duas decisões paradigmáticas envolvendo o CARF se tornaram paradigmas e demonstram a importância do processo administrativo e da relevância das empresas prepararem seus órgãos internos e de controle, para evitar as situações que se passa a expor. Sem adentrar no mérito dos julgamentos, pois este não é objetivo deste texto, o que se propõe é analisar a função social, empresarial e administrativa do CARF por meio de seus julgamentos, logo vamos a dois recentes exemplos que servem para demonstrar a relevância do órgão para as diretrizes que o mercado econômico poderá adotar e agir.

            A primeira decisão foi tomada pelo TRF (tribunal Regional Federal) da 3ª região, que em um processo envolvendo a empresa Kimberly-Clark, numa atuação de R$ 471 milhões devido a uma amortização indevida de ágio, nessa decisão o Tribunal entendeu que há a necessidade de se esgotar as vias administrativas para só depois a questão ser apresentada ao Judiciário (processo nº  5028418.41.2018.4.03.6100)[2]. Em particular, nessa decisão do TRF entendeu que o Poder Judiciário não pode interferir em decisões do CARF, sendo necessário esgotar as vias administrativas para só então o Judiciário analisar a legalidade e a constitucionalidade da decisão.

            Outro processo foi envolvendo o Banco Itau BBA S/A (com processo administrativo nº 16327.720779/2014­44)  no qual se entendeu que há a incidência de contribuição previdenciária nos valores pagos a titulo de participação dos empregados nos resultados da empresa quando pagos em desacordo com a Lei nº 10.101 de 2000. Os valores envolvidos ultrapassam os R$ 500 milhões à época do lançamento.

             Nos casos utilizados como exemplos, temos que  sobre o tema outras empresas não irão condutas similares as que geraram as atuações, ou seja, dificilmente outras empresas  irão amortizar os seus ágios como a empresa atuada fez e por menos haverá distribuição de lucros e resultados fora do que a lei 10. 101/2000 prevê.

            Estas propostas de limitações de ações ou providencias pelas empresas precisam de uma maior visibilidade, quer nos departamentos contábeis, jurídicos e nos controles internos das empresas, pois exceto novas hipóteses jurídicas, condutas já enquadradas como “adequadas ou inadequadas” pelo CARF e que geram ou não as incidências tributárias, ou seja, os precedentes dos julgamentos tendem a ser reproduzidas sistematicamente, e ainda, como as decisões são bem fundamentadas, muitas das vezes o Poder Judiciário acaba encampando as teses do CARF.

            Por fim, salienta-se que o Poder do CARF se consolida com o passar do tempo, como uma instância  administrativa (quase que obrigatória) para as questões tributárias (federais), contudo há que ter cautela extrema nas tendências de sua composição, pois por mais paritária que seja, é certo que influencias mercadológicas podem interferir na qualidade do julgamento, podendo assim corromper as premissas básicas e estruturais do órgão, que é agir com destemor, independência, na estrita legalidade e em respeitos aos princípios básicos e fundamentais do direito.

            O órgão e seus membros possuem cada vez mais funções sociais significativas que podem ser positivas ou negativas, ou seja, que podem ampliar ou reduzir a atividade econômica e novas e boas praticas empresariais, e em uma econômica capitalista há repercussão na ampla liberdade econômica e na circulação de valores e riquezas que par ao mercado são premissas sempre presentes.  

            Para ratificar o quanto exposto há em discussão no STF duas ADIs (com os nºs 6399 e 6403 ) que discutem o dispositivo da lei nº 13.988/2020 que estabelece o fim do voto de qualidade do empate nos julgamentos administrativos fiscais do CARF  ao dar nova redação ao artigo 19-E da Lei 10.522/2002[3].  A relatoria é do Ministro Marco Aurélio Mello que permitiu a participação de diversas entidades como Amicus Curiae. O dispositivo questionado previa que na hipótese de empate, o resultado deveria ser favorável ao contribuinte. Para entender a questão, na ADI 63999 a Procuradoria da Republica questiona um vicio no processo legislativo oriundo da MP 899/2019 e na ADI 6403 o PSB sustenta que a nova previsão legal  implica na mudança de natureza do CARF, de forma a que a mudança implica em alteração na composição paritária do órgão. Ora esta questão é central para a manutenção e independência do órgão, bem como no seu fortalecimento ao longo dos próximos anos.

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            Assim, ante estas questões é que o CARF se sedimenta no meio jurídico como um órgão de controle indireto de atividades e procedimentos empresariais e com repercussão econômica direta e suas decisões passam a repercutir nas condutas e nas praticas empresariais. Quanto mais o órgão agir e julgar mais repercussão de suas decisões serão observadas pela sociedade. Resta torcer pela total independência, transparência e lisura (ética) nas decisões do CARF.

 


[1] Página sobre perguntas frequentes — Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (fazenda.gov.br), acesso em 27.11.20, às 17h

[2] Judiciário não pode interferir em decisão do Carf | Legislação | Valor Econômico (globo.com), acesso em 27.11.20, às 17h10, https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2020/11/26/judiciario-nao-pode-interferir-em-decisao-do-carf.ghtml

[3] Tema que foi objeto da portaria nº 260 do Ministério da Economia, publicada em 03/07/2020 e que está sendo questionada juridicamente: nota-oab-carf.pdf (conjur.com.br)  https://www.conjur.com.br/dl/nota-oab-carf.pdf e ConJur - Ministério da Economia regulamenta voto de qualidade no Carf https://www.conjur.com.br/2020-jul-06/ministerio-economia-regulamenta-voto-qualidade-carf?imprimir=1  acesso em 27.11.2020, às 18h

Sobre o autor
Aarão Ghidoni do Prado Miranda

Advogado sócio do escritório Miranda advogados, professor de cursos de graduação e pós-graduação, especialista e mestre em direito. Autor de diversos artigos e livros jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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