Julgamentos Online no Supremo Tribunal Federal: A Substituição do Voto Ao Vivo pelo Voto a Voto

07/12/2020 às 18:37
Leia nesta página:

O artigo examina as mudanças ocorridas em 2020 sobre a prestação de serviços do Judiciário, especialmente sobre a realização online de sessões de julgamento.

No ano de 2020, por um fator externo (a pandemia causada pela COVID-19), houve a aceleração de três fatores que devem modificar a prestação de serviços no futuro e que também afetaram diretamente o Judiciário no Brasil:

(a) a ampliação do teletrabalho e do trabalho remoto (e outras formas de prestação do trabalho fora da sede da organização), que, apesar de ter ocorrido por dever legal neste ano, deve ser mantida e ampliada voluntariamente nos próximos anos;

(b) a digitalização dos meios de trabalho, o que, para o Judiciário, levou à aceleração da informatização dos sistemas processuais e da digitalização dos processos (administrativos e judiciais);

(c) e (como consequência direta do fator anterior) a virtualização dos serviços, o que significa que não apenas o trabalho interno é prestado à distância e de forma virtual, com o uso de meios digitais, mas que os serviços prestados aos destinatários também ocorrem em meio digital.

Este artigo analisa o último aspecto de modo específico no Judiciário, que levou à virtualização da prestação jurisdicional, o que significa que não apenas os processos e os sistemas judiciais (consulta ao andamento processual, emissão de certidão de antecedentes, apresentação de petições e documentos, entre outros atos) são praticados exclusivamente no meio digital, mas que os serviços prestados pelo Judiciário ocorrem virtualmente (inclusive a realização de audiências e sessões de julgamento virtuais e telepresenciais, a prestação de informações e de atendimentos por e-mail, telefone ou videoconferência), o que dispensa deslocamentos e a presença física de partes, advogados, servidores, magistrados e outras pessoas na sede do Tribunal, no Fórum ou em outro local de atendimento.

Entre essas inovações está a ampliação do uso das sessões de julgamento virtuais (ou online) e a regulamentação das sessões de julgamento telepresenciais, analisadas em um artigo anterior (que pode ser lido aqui).

Recorda-se, em resumo, que a sessão de julgamento virtual ocorre totalmente de forma remota em um ambiente digital, com um prazo de duração em dias para que todos os integrantes do órgão julgador possam analisar todos os processos e apresentar seus votos, de forma assíncrona. Já a sessão de julgamento telepresencial é uma sessão de julgamento presencial realizada por meio de videoconferência, com um prazo de duração em horas (no dia de sua realização) para que todos os integrantes do órgão julgador possam analisar todos os processos e apresentar seus votos, de forma síncrona.

A ampliação das sessões de julgamentos online (virtual) pelo Supremo Tribunal Federal levou à substituição do voto ao vivo pelo acompanhamento voto a voto.

Nas sessões presenciais e telepresenciais, transmitidas pela TV Justiça (e reproduzida em diversas plataformas), é possível acompanhar a leitura ou apresentação do voto de cada Ministro, mas, em regra, o início e o fim da sessão ocorrem no mesmo dia, com a duração em horas do julgamento. Por isso, normalmente há uma análise posterior do julgamento e dos votos (no meio jurídico, na imprensa, nos grupos sociais afetados e, em alguns casos, em toda a sociedade).

Por exemplo, no julgamento do HC 152.752, sobre a possibilidade de prisão em segunda instância, o STF realizou uma sessão de julgamento que durou quase 11 horas (a mais longa sessão única na história da Corte), iniciada no dia 4 de abril e encerrada já nas primeiras horas do dia 5 de abril de 2018. De outro lado, excepcionalmente ocorrem julgamentos que perduram por mais de uma sessão, em virtude de pedido de vista, ou pela necessidade de um período maior (pela quantidade de sustentações orais e a extensão do relatório e dos votos), ou por outras razões. O julgamento que perdurou pelo maior intervalo de tempo no STF foi o da Ação Penal 470, iniciado em 2 de agosto de 2012 e concluído em 13 de março de 2014 (com o julgamento de recursos), durante 69 sessões do Plenário. Mas essas são situações excepcionais, porque, em regra, os processos são decididos em apenas uma ou em algumas sessões, que podem ser acompanhadas ao vivo por qualquer interessado, de forma síncrona com a apresentação dos votos e o julgamento final.

Nas sessões virtuais, o acompanhamento é realizado online no site do Supremo Tribunal Federal, na página de acompanhamento processual, na aba Sessão Virtual. Essa publicidade permite que, durante a realização da sessão de julgamento online no STF (que inicia na sexta-feira e tem um prazo de duração de 5 dias úteis, de acordo com o art. 2º da Resolução nº 642/2019 do STF), seja possível acompanhar todos os votos apresentados pelos Ministros, em uma duração maior do que em regra ocorre na sessão presencial ou telepresencial.

Isso aconteceu recentemente, no julgamento da ADI 6524, sobre a possiblidade – ou não – de reeleição ou recondução da Mesa Diretora do Senado Federal e da Câmara dos Deputados na eleição imediatamente subsequente (na mesma legislatura ou em legislaturas diferentes). A partir do início da sessão virtual, em 04 de dezembro de 2020, houve um acompanhamento de todos os votos na imprensa e no meio jurídico, com comentários e previsões sobre os votos remanescentes e os prováveis resultados. Apesar de a sessão se encerrar apenas no dia 14 de dezembro de 2020, os últimos votos foram proferidos no domingo, dia 06 de dezembro, com ampla cobertura da imprensa no próprio dia e no dia seguinte.

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Assim, nas sessões online ocorre a substituição do voto ao vivo pelo acompanhamento voto a voto, durante os dias de duração da sessão, com a leitura de cada um dos votos inseridos no Plenário Virtual, de forma assíncrona. Os comentários realizados somente após o julgamento foram substituídos pela possibilidade de comentar, divulgar e criticar cada um dos votos e prognosticar os votos remanescentes até o fim do prazo da sessão virtual.

Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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