O bem jurídico mais importante em nosso ordenamento jurídico é a vida. Logo, o Estado tem o dever de proporcionar todos os meios possíveis para a manutenção da vida, nos termos do artigo 5, caput, da CF/88.
Ademais, a Constituição é clara ao afirmar que a saúde é direito de todos e dever do Estado, consoante artigos 6 c/c art.196, sendo assim, todos os entes possuem responsabilidade e competência jurídica para garantir a vida e saúde da população.
Assim, no atual cenário em que vivemos, onde é notório que o Covid-19 se tornou uma pandemia mundial, vemos que a maioria dos países entrou em uma “corrida” contra o tempo para desenvolver a vacina contra o Covid-19 e enquanto isso foram aplicados as medidas necessárias para tentar controlar a propagação do vírus.
Ocorre que no Brasil o Governo Federal que deveria ter tomado as medidas cabíveis para tentar prevenir e minimizar os efeitos dessa patologia, desde o início, seja através da ampliação de leitos, investimento em pesquisas, medidas de prevenção ou aquisição de vacinas, quedou-se inerte e a atuação solitária e limitada contra o vírus foi dos Governos Estaduais e Municipais.
Após várias pesquisas para encontrar a vacina mais adequada, a indústria farmacêutica conseguiu liberar as vacinas, assim, já em dezembro de 2020 iniciou-se em diversos países estrangeiros a aplicação da vacina contra o COVID-19, atualmente são mais de 50 países que já estão aplicando a vacina contra o COVID 19, a exemplo dos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Rússia.
O que chama a atenção é o fato de países com o Produto Interno Bruto - PIB menor que o do Brasil já terem iniciado a vacinação, como a Argentina, México, Chile, o que demonstra que a morosidade da vacinação no Brasil, não é uma questão financeira, mas sim, uma burocratização estatal, que vem se sobrepondo ao direito à vida.
Salienta-se que cada dia que passa sem a aplicação da vacina o número de pessoas mortas só tende a se ampliar, além do fato que diversos municípios já estão com todos os leitos em sua ocupação máxima, tendo em vista que já estamos vivendo uma segunda onda do COVID-19, ou seja, a morosidade da vacinação ocasiona o aumento no número de mortos e das despesas com a saúde.
Deste modo, acreditasse que o poder público deve relativizar a sua burocracia interna e contribuir para a aplicação imediata da vacina no Brasil, pois as vacinas estão dentro dos padrões internacionais o que é exigido pela Anvisa, sendo assim, a solicitação de um processo interno desde o princípio caracterizaria o bis in idem e apenas causaria morosidade sem necessidade já que as vacinas já estão dentro dos padrões exigidos.
A morosidade do Estado em fornecer a vacinação poderia gerar uma responsabilização cível por omissão, pois o Superior Tribunal Federal afirma que se o Estado encontra-se na condição de garante e, por omissão, cria situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tenha o dever de agir para impedi-lo, no caso em tela, seria o dever de fornecer a vacinação contra o Covid-19 que já matou milhões de pessoas, pressupõe um dever específico do Estado, que o obrigue a agir para impedir o resultado danoso.
Sendo assim, seria possível pleitear em face do Estado a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa, pois tinha o dever de agir e não o fez, assim, a omissão da administração gera uma responsabilidade objetiva do Estado.
E mais, seria possível que uma família que teve seu familiar vítima do Covid-19, devido à omissão do Estado, pudesse pleitear na justiça uma indenização utilizando como fundamento a teoria da perda de uma chance, desde que fique demostrado que a pessoa tinha uma chance real e concreta de não vim a falecer caso fosse vacinada.
Cumpre mencionar que atualmente não existe uma legislação nacional específica sobre a perda de uma chance, ocorrendo com isso uma interpretação extensiva dos artigos 186, 187 e 927 e 948 e 949 do Código Civil, além da interpretação constitucional do artigo 5º, V, Constituição Federal de 1988.
Pode-se conceituar a perda de uma chance como a frustração de uma possibilidade concreta de evitar um prejuízo que deixou de se concretizar em virtude de um fato danoso, ou seja, trazendo para o tema em tela, havendo uma chance real de evitar a morte de uma pessoa caso esta fosse vacinada, sendo que essa chance foi furtada em razão da burocratização do estado para a aplicação da vacina.
Portanto, concluísse que se o Estado não agilizar a compra das vacinas e seus insumos provavelmente irá haver uma grande demanda de ações contra a administração federal, pois além da indenização a população irá atrás de obrigar o Estado a fornecer a vacina já que no Brasil já se passou dos duzentos mil mortos e o dever de garantir o direito à vida é do Estado, conforme prevê a Constituição Federal do Brasil.