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Ocorrência policial: legítima defesa e a doutrina da resposta não convencional

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11/01/2021 às 22:03
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O artigo visa trazer para o mundo jurídico conhecimentos acerca da doutrina e ciência policial, possibilitando uma análise realística e justa da atuação policial. Busca permitir decisões fundadas em evidências científicas aceca da atividade policial

A segurança pública no Brasil, há tempos, é relegada a segundo plano. Em razão das diversas correntes ideológicas que disputam as esferas de poder, não se consegue chegar a um consenso acerca de qual a política de segurança pública deve ser implementada no País.

Os investimentos nas polícias, principalmente estaduais, civil, militar, penal e guardas municipais, ficam muito aquém do ideal, as corporações sofrem com a falta de estrutura adequada, desde os prédios em que estão instaladas até em relação aos equipamentos e armas que utilizam, além da falta de investimentos em tecnologias modernas.

Soma-se a isso, a falta de efetivo. As leis estaduais que regulam as carreiras das instituições, em sua maioria, datam de antes da Constituição da República de 1988, recebendo meras emendas circunstanciais. O cálculo do efetivo das policias, desatualizado, na maioria das vezes, prevê o mesmo número de policiais que foi calculado nas décadas de 1960 e 1980.

Não bastasse isso, quase a totalidade das polícias não tem sequer aquele número de policiais previstos nestas leis, já ultrapassadas, desconsiderando o crescimento da população entre aquele período e o atual.

Consequência disto, é uma sobrecarga de trabalho dos policiais para atender a crescente demanda e a falta de estudos institucionais e trabalhos acadêmicos acerca das estruturas e doutrinas policiais que poderiam ser implementadas, ficando quase a totalidade destes estudos apenas no âmbito interno das corporações.

O grande problema gerado por esta falta de interesse governamental e da comunidade é que a adoção de doutrinas policiais modernas, por ficarem quase que exclusivamente, sob domínio das corporações, não são compreendidos quando de sua aplicação, gerando debates sem fundamento científico.

Órgãos de imprensa passam a analisar os fatos, muitas vezes entrevistando jornalistas, operadores do direito ou mesmo, pseudo-especialistas em segurança pública. São entrevistados/especialistas que emitem opiniões sem qualquer base fática ou científica, muitas vezes, contaminados por ideologias, criam teorias, e algumas vezes, de forma leviana, buscam apenas picos de audiência ou agradar seu público alvo, apresentando “soluções” mágicas, e estratégias infantis, para não dizer ridículas, sem uma análise realística do caso.

Não é incomum, até policiais, que nunca vivenciaram o trabalho de campo, opinar sobre as ações policiais. Acabam confundindo ainda mais o público e criando desinformação. Não é por acaso que dizem que este tipo de integrante da corporação é considerado “policial” (vez que aprovado em concurso na polícia), mas não “polícia”.

Constatado o problema da falta de estudos sérios e fundados em evidências científicas fora do âmbito das corporações policiais, passamos a discorrer sobre o desenvolvimento da chamada doutrina da resposta não convencional, desenvolvida pelo Federal Bureau of Investigation - FBI após análise de ocorrências envolvendo disparos de arma de fogo por policiais contra ameaças, armadas ou não.

O foco deste trabalho é apresentar a doutrina da resposta não convencional e as consequências jurídicas que podem ocorrer se tal doutrina não for compreendida por aplicadores do direito.

Já destacamos em outros artigos1 os problemas das análises de ocorrências policiais feitas com base em critérios exclusivamente jurídicos, feitas por estudiosos puramente juristas, sem qualquer experiência prática ou sem considerar a realidade fática ou mesmo a opinião de estudiosos do assunto – doutrina policial.


CIÊNCIA POLICIAL – DOUTRINA DA RESPOSTA NÃO CONVENCIONAL

A neutralização de uma ameaça, esteja ela na posse de uma arma ou não, em qualquer ocorrência policial com disparos de arma de fogo, exige uma abordagem multidisciplinar.

Aqueles que analisam os fatos, principalmente, Delegados de Polícia, integrantes do Poder Judiciário e membros do Ministério Público, que atuam na aplicação de normas jurídicas, devem conhecer e entender os fatores que influenciam no comportamento dos envolvidos.

Existem fatores de ordem psicológica e fisiológica, físicos, biomecânicos, ciência do comportamento humano, programação neuro-linguística (PNL), balística, e outras disciplinas que influenciam diretamente no comportamento humano e precisam ser conhecidos para auxiliar na análise do caso.

Uma das principais fontes de estudo para esse contexto, conforme explica o Delegado de Polícia e expert João da Cunha Neto em sua obra, Balística para Profissionais do Direito, é a balística terminal:A balística terminal, também chamada de balística dos efeitos, analisa o projétil e os danos causados por ele desde o momento do primeiro impacto até sua parada total ,...” grifo nosso (NETO, João da Cunha, p. 23/24)

Não seria exagero esse ramo da balística de “balística do caos”, em face da absoluta imprevisibilidade de como o ser humano se comportará ao ser atingido por um projétil expelido por uma arma de fogo”.

(CUNHA NETO, João da. p. 24)

A incapacitação de um alvo humano por meio do uso de uma arma de fogo depende de diversos fatores, sendo que a maioria deles não pode ser previamente conhecida do policial, vez que estão relacionados a aspectos pessoais de cada indivíduo.

A doutrina policial prega que, em uma ocorrência policial em que o alvo está resistindo aos comandos verbais, não é recomendável, ainda que haja superioridade numérica entre policiais e indivíduo(s), o contato ou confronto físico.

O maior risco nestas ocorrências é o envolvimento físico, um confronto entre alvo e policial, pois se corre o risco de o policial, durante a luta, perder sua arma e vir a ser vitimado por ela. Além disso, disparos efetuados sem o devido cuidado e técnica, fatalmente irá vitimar pessoas que estão próximas, o que a imprensa costuma chamar de “bala perdida”.

Ainda, ao se envolver em um confronto físico, outros policiais ficam impossibilitados de usar seu armamento, pois podem atingir o policial que luta contra seu agressor. Se envolver na luta também não é recomendável, pois a dinâmica do combate físico é imprevisível, e se aproximar pode aumentar ainda mais a chance de o agressor conseguir se apoderar de uma arma e vitimar ambos os policiais.

A literatura e cobertura da mídia de ocorrências policiais estão recheadas de exemplos onde o contato e posterior confronto físico acabou gerando ferimentos e até mesmo a morte de policiais.

Seguem alguns exemplos em que o confronto físico acabou colocando em risco, ou mesmo vitimando o policial.

Perceba que uma ocorrência, aparentemente simples, pode evoluir para uma situação de sobrevivência, uma luta pela vida, em segundos.

Necessário então entender como ocorre a incapacitação de um alvo, quais os fatores determinantes para que uma agressão cesse, e como chegar nesse resultado.

O corpo humano começa a ter suas funções prejudicadas quando ocorre a perda da pressão sanguínea. A partir da queda desta pressão, o indivíduo passa a ter dificuldade em raciocinar, os músculos perdem a capacidade de contração e finalmente, os órgãos vitais param de funcionar.

E como fazer para que um alvo tenha queda da sua pressão sanguínea? Não seremos hipócritas, ou falsos especialistas. Temos que ser realistas, e a resposta é: fazer o alvo sangrar.

A perda de sangue por meio de ferimentos faz com que a pressão sanguínea comece a decair, e quanto maior tamanho e/ou quantidade de ferimentos maior será a velocidade com que o alvo passa a sentir os efeitos da queda de pressão.

A incapacitação de um agressor por meio de disparos de arma de fogo não é tarefa simples, deve ser levada em consideração: o calibre e o tipo de arma usada; o local atingido e a quantidade de disparos; determinação do agressor em atacar (mentalidade de combate).

Um estudo detalhado acerca da neutralização de um agressor foi explanado pelo policial civil e médico Dr. Sérgio F. Maniglia, no capítulo sobre balística terminal aplicada, na obra Balística para Profissionais do Direito.

“Incapacitar um ser humano é tão complexo como o próprio corpo. É necessária uma série de fatores para atingir esse objetivo e os próprios fatores mudam de relevância a cada caso concreto. Fatores fisiológicos e psicológicos do atirador e do agressor, e a escolha do armamento e munição também contribuem para o resultado final”.

(CUNHA NETO, João da. p.162)

Outro estudo importante é a comprovação de que apenas um disparo, na maior parte das vezes, não é suficiente para neutralizar uma ameaça, fazendo cair por terra a ideia que costumamos ver em filmes e programas de TV, em que um alvo recebe um único disparo e é lançado para trás, saindo de combate.

Para entender o estudo acerca da incapacitação de um alvo, há um fator importante que deve ser considerado: Qual seria a quantidade de disparos seria necessária para efetivamente neutralizar a agressão?

Muitas variáveis podem influenciar na velocidade com que um alvo seja neutralizado, como o local do disparo, profundidade alcançada pelo projetil, se houve ou não o comprometimento de grandes vasos, capaz de fazer cessar a atividade cerebral em razão da perda da pressão sanguínea, etc.

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Tim Omar de Lima e Silva, Delegado de Polícia e referência no país em treinamento de tiro policial e combate urbano, em entrevista concedida na sede da Diretoria Estadual de Investigações Criminais de Santa Catarina, tratou do tema Considerações sobre balística terminal e temas conexos:

Para um projétil ser capaz de causar grande ferimento temos em primeiro lugar que atingir áreas críticas do alvo, que são: o cérebro, o coração, a parte superior da coluna e os grandes vasos [...]. Usar munição eficiente para gerar uma grande cavidade permanente, com penetração profunda [...] e, além disso, múltiplos disparos.

Grifo nosso (LEANDRO, Allan Antunes Marinho. p. 45)

Portanto, não basta atingir o agressor, é preciso que o(s) disparo(s) atinja grandes órgãos e vasos gerando e, por consequência, perda de pressão sanguínea, “desligando o cérebro”, o que pode levar até 10 segundos. Ou seja, ainda que o agressor seja atingido em uma região vital (exceto quanto ao cérebro ou tronco encefálico), poderá demorar cerca de 10 segundos até que o cérebro pare de enviar mensagens aos músculos, fazendo cessar a agressão, o que a doutrina policial denominou de: os 10 segundos do homem morto.

O termo "Dez segundos do homem morto" aparece em alguns dos primeiros documentos ocidentais (relatos dos Texas Rangers, não do idealismo de romances baratos), retratando velhos atiradores da era da fronteira recebendo ferimentos fatais, mas ainda assim vencendo seus oponentes. Na maioria desses confrontos com tiroteios, desde o momento do golpe fatal até o momento em que a falta de fluxo sanguíneo transportando oxigênio para o cérebro causou perda de consciência / morte, foi de aproximadamente dez segundos.”2 Tradução minha

(BASULTO, Armando. pag. 12)

Esse evento de “sobrevida” foi denominado há cerca de 200 (duzentos) anos de “Dez segundos do homem morto” (Dead Man’s Ten Seconds), pois, em virtude da oxigenação ainda existente, um ser humano fatalmente ferido pode continuar agredindo outra pessoa severamente durante esse período de dez segundos ou mais.”

(LEANDRO, Allan Antunes Marinho. p.65).

Durante a ocorrência, agressor e policial, têm uma descarga hormonal em seus corpos, desencadeados pelo medo, pelo risco da situação, pela imprevisão do resultado, e outros fatores, principalmente de adrenalina, a qual permite que o ser humano entre em uma reação instintiva de “luta ou fuga” ou, quando esta descarga hormonal é muito intensa, faz com que o individuo literalmente “trave”, congele, e não consiga raciocinar ou mesmo se movimentar com a mesma destreza e reflexo.

Como reação física dessa descarga, o policial tem uma redução da coordenação motora fina (como sensibilidade dos dedos), perda de memória, visão de túnel (redução da visão periférica), alterações da percepção de tempo e espaço, aumento dos batimentos cardíacos, podendo ocorrer, inclusive, perda do controle dos esfíncteres, não sendo incomum, a urina e evacuação3.

Assim, é possível perceber a complexidade que envolve uma ocorrência policial em que haja necessidade do uso da arma de fogo contra uma ameaça. O tempo que o policial tem para assimilar a situação e reagir, defendendo sua vida ou protegendo a de outrem, é inferior a 1 segundo.

A doutrina policial moderna entende que, para incapacitar um alvo que representa uma ameaça, deve ser aplicada a “resposta não convencional”, significa dizer que não há um número de disparos que pode ser convencionado, sendo que o policial deve efetuar tantos disparos quanto necessários para fazer cessar a ameaça a integridade física própria ou de terceiro (saturação de fogo). A cessação da ameaça somente ocorre, e pode ser percebida, quando o agressor vai ao chão, devendo, ainda, ser considerada pelos policiais a condição de 10 segundos do homem morto.

A doutrina da resposta não convencional ensina que:

“[...] diante de um agressor indisposto a cessar o ataque, o ofendido ou um terceiro pode efetuar o número de disparos necessários para fazer cessar a agressão injusta”

(LEANDRO, Allan Antunes Marinho. p.91).

Marcelo Esperandio, Agente de Polícia e instrutor de tiro de combate e táticas policiais, em entrevista concedida na sede da Diretoria Estadual de Investigações Criminais de Santa Catarina, tratou do tema: A “Resposta Não Convencional” e temas conexos – armas de fogo curtas:

“A “Resposta não convencional” consiste na realização de múltiplos disparos contra uma ameaça letal, visando a sua incapacitação imediata ou o mais próximo disso. A quantidade de disparos é definida pela resposta ou reação apresentada pelo alvo , devendo os fogos serem cessados somente após o agressor não constituir mais uma ameaça letal”

grifo nosso (apud ESPERANDIO, Marcelo. LEANDRO, Allan Antunes Marinho. p. 45).

Esta doutrina está amparada nos estudos que demonstraram o “mito do stopping power”, conhecido como “poder de parada”. Estudos demonstraram que não é real a noção hollywoodiana de que um único disparo irá incapacitar um agressor, salvo nos casos em que o disparo atinge seu tronco encefálico, caso que não é o comum em ocorrências policiais. O “tiro de comprometimento” realizado na cabeça, é atividade mais comum nos casos em que é empregado o atirador de elite, ou sniper.

A doutrina, começou a ser desenhada em 1986, após a ocorrência conhecida como “Tiroteio de Miami”, na qual agentes do FBI se envolveram em uma troca de tiros com dois criminosos, Michael Platt e Willian Matix, assaltantes de banco e carro forte.

Neste evento, estudado em detalhes pelo FBI, os criminosos foram mortos, mas não antes de também ferir gravemente 5 e matar 2 agentes policiais. Michael Platt foi baleado 6 vezes enquanto Willian Matix foi atingido 12 vezes pelos policiais, no entanto, diante de sua mentalidade de combate e vontade em permanecer resistindo, mesmo sabendo que não venceria, fez com que permanecesse lutando.

Este evento foi detalhado na obra Sobrevivência Policial: Morrer não faz parte do plano, escrita pelo Agente Especial da Policia Federal e instrutor de armamento e tiro, Humberto Wendling, que ao final conclui:

Sem dúvida, a lição aprendida naquele dia tem salvado as vidas de muitos policiais; lição que transformou o treinamento e as táticas policiais (por exemplo, os policiais são orientados a atirar até que o agressor caia, pois é o único sinal aparente de que houve incapacitação). E não importa quantos tiros sejam necessários para que isso ocorra, porque nenhuma munição é 100% eficaz 100% das vezes. Além disso, a segurança dos policiais e da comunidade está em primeiro lugar.”

(OLIVEIRA, Humberto Wendling Simões de. p.116.)

A partir deste caso, as doutrinas e protocolos de atuação policial foram reformuladas, mudando radicalmente a forma de atuação policial quando diante de uma ameaça à sua integridade física ou sua vida, ou de terceiros.

Nos países em que a doutrina da resposta não convencional já foi entendida e assimilada, é comum observarmos a forma de atuação dos agentes da lei contra ameaças.

Separamos alguns vídeos que demonstram o risco de o policial confrontar, fisicamente um alvo e a aplicação da doutrina não convencional.

  • Dallas, Texas - Em 5 de novembro de 2020, por volta das 18:30, os policiais investigavam um veículo suspeito. Durante a investigação, Reginald Alexander Jr. (25), foi identificado e estava com um mandado de prisão pendente. Quando foram fazer a revista, Alexander tinha uma arma. Houve uma troca de tiros. Alexander foi atingido e morreu no hospital. Um policial também foi atingido.

    https://www.youtube.com/watch?v=Y72w8s-kXq4&bpctr=1605840811

  • San Jose, Califórnia – No dia 4 de maio de 2019, Efren Esquivel (24), roubou um veículo. Depois de encontrado, mesmo cercado, recusou a se render e tentou abrir caminho para sair do bloqueio, atropelando um dos policiais. O promotor em um relatório de 30 páginas escreveu: "Quando ele dirigiu contra o sargento (James) Mason em alta velocidade, os oficiais não tiveram outro recurso para salvar o sargento Mason senão disparar suas armas de fogo."

    https://www.youtube.com/watch?v=A-NkkEv47Ro&list=PL7csYbrPKf-wX976QRuXlZIa6ZAVjlFxz&index=12

  • Tucson, Arizona – Em 22 de agosto de 2020, policiais atendiam uma ocorrência de furto. Horas antes, um policial havia sido baleado e o veículo do atirador identificado. Os policiais avistaram o mesmo e o motorista se evadiu quando tentatram aborda-lo. Fernando Valenzuela (34) era suspeito de ser o atirador. Durante a perseguição cruzou com um dos policiais e estava armado com uma pistola AR cal .22 e uma pistola .40.

    https://www.youtube.com/watch?v=zoEnWaD_D6Q&list=PL7csYbrPKf-wX976QRuXlZIa6ZAVjlFxz&index=15&bpctr=1605842840

  • Flórida – Phillip Thomas Marsh (30) havia roubado um veículo e feito uma mulher refém. Durante a perseguição, teve os pneus de seu veículo furados e então decidiu rouar outro veículo, mas foi impedido por um policial em uma viatura descaracerizada. Phillip estava armado e atirou contra os policiais, sendo que um dos disparos acertou de raspão a cabeça de um deles. Os policiais responderam e Phillip acabou sendo morto.

    https://www.youtube.com/watch?v=8fX-31BHUFw&list=PL7csYbrPKf-wYQaiWxgRJuZpKPYYbbv0V&index=11

  • Washington, DC – No dia 2 de setembro de 2020, policiais inestigavam uma denúncia acerca de um homem armado no local. Indivíduos em um veículo estacionado foram abordados e, Deon Kay (18) se evadiu. Durante a perseguição, um dos policiais cruzou com Deon, que estava segurando uma arma. O policial o atingiu no peito.

    https://www.youtube.com/watch?v=UQjGBrURQJE&list=PL7csYbrPKf-wX976QRuXlZIa6ZAVjlFxz&index=13&bpctr=1605847869

O canal do YouTube, POLICE ACTIVITY4, possui diversos vídeos com ocorrências policiais em que é possível observar a aplicação da doutrina da resposta não convencional. Nota-se, nas ocorrências envolvendo disparos de arma de fogo, que os policiais somente cessam os disparos após a certeza de que a ameaça foi neutralizada, independente desta portar uma arma de fogo, uma faca, um taco de beisebol ou mesmo desarmada.

Também se observa que a quantidade de disparos varia, pois em cada ocorrência a neutralização das ameaças ocorre em momentos diferentes, sendo impossível traçar um padrão de conduta de disparos. Algumas foram incapacitadas com apenas 1 disparo, outras, após diversos disparos por diversos policiais.

Outro ponto a ser considerado é que nesse tipo de ocorrência, o disparo efetuado pelo policial, será o disparo instintivo (sem visada) ou disparo policial, significa que o policial não fará uso do aparelho de pontaria, como no disparo de precisão.

Com efeito, caem por terra aquelas análises que a imprensa apresenta, com supostos “especialistas” que criticam a ação policial falando sobre “tiro na perna”, “um disparo seria suficiente”, “houve excesso de disparos”, entre outros argumentos ridículos e sem base científica ou experiência prática, às vezes, sequer baseadas em qualquer estudo, não passando da opinião de um oportunista.

Humberto Wendling, na obra, Policiais – Coletânea, composta de diversos artigos que analisam a atividade policial, discorre acerca da possiblidade de “É possível atirar apenas para ferir?”, e ensina:

Algumas pessoas imaginam que o policial pode atirar no criminoso “só um pouquinho”. Mas “só um pouquinho” não existe em termos de força letal . Toda vez que alguém pressiona o gatilho, existe boa chance de ocorrer um sério ferimento ou a morte. A lei sequer sugere que a legítima defesa (com emprego de força letal) deva ser empregada apenas para ferir e sem qualquer chance de morte

(grifo nosso) (OLIVEIRA, Humberto Wendling Simões de. pag.117.)

O Centro de Pesquisa da Ciência da Força (The Force Science Research Center - FSRC) elaborou estudo para avaliar as dificuldades que envolvem um disparo de arma de fogo e a avaliação de um alvo. O resultado demonstrou que, se aplicadas todas as técnicas de tiro e avaliação do alvo, o atirador pode levar entre 1 a 1,5 segundo para cessar os disparos.

Sabendo que um atirador mediano pode efetuar cerca de 4 disparos por segundo, significa concluir que o alvo pode receber entre 4 a 6 disparos mesmo após a sua total neutralização.

Note que o estudo é realizado em ambiente controlado e não se trata de uma ameaça real ao atirador. Nesse sentido, podemos concluir que, o atirador que busca defender a própria vida ou de terceiro, poderá, em razão das circunstâncias fáticas, psicológicas e fisiológicas que envolvem a ocorrência, efetuar até mais disparos, vez que sua percepção dos fatos está influenciada pelo instinto de sobrevivência.

Não se trata aqui de defender o uso da arma de fogo de forma indiscriminada. Antes que o objetivo do texto seja deturpado por meio de interpretações tendenciosas e arraigadas de ideologias fantasiosas, o que se pretende é demonstrar que a doutrina da reposta não convencional é aplicada nos casos em que o alvo resiste aos comandos verbais dos policiais e se torna uma ameaça aos envolvidos.

O policial ao realizar uma abordagem tem amparo legal, tendo o poder de escolha do momento do início da ação de abordagem. Por outro lado o abordado se vê escudado em todos os seus direitos constitucionais de individualidade. Apesar disso no momento da abordagem o policial tem a expectativa de que o abordado aja da maneira esperada e obedeça a seus comandos.”5

(SOUZA, Marcos Vinicius Souza de.)

Humberto Wendling, na obra Policiais – Coletânea, no artigo “Policiais mortos não protegem ninguém” explica:

Uma pessoa ponderada colabora com a polícia quando parada e entrevistada, mesmo que a ordem não faça sentido imediatamente.

[...]

Qualquer atitude diferente da cooperação aumentará a suspeita e o medo no policial, causando a escalada da força .

Grifo nosso (OLIVEIRA, Humberto Wendling Simões de. Policiais - Coletânea. p.323)

Quando um indivíduo suspeito é abordado e passa a confrontar a autoridade do policial, desobedecendo aos comandos, deve o policial se preparar para o pior cenário. A resistência, geralmente está mascarando a intenção do alvo em buscar uma “janela de oportunidade”, ou seja, uma brecha na atuação policial para que possa fugir ou atacar o policial.

Os vídeos abaixo demonstram o alvo abordado pelos policiais buscando encontrar uma “brecha”, uma “janela de oportunidade” para atacar os policiais e fugir.

  • Durante a abordagem, o alvo resiste aos comandos de mostrar as mãos e sair do veículo, dissimulando sua intenção de utilizar sua arma. O policial foi baleado e o agressor fugiu.

    https://www.youtube.com/watch?v=kK2WqCHZOuA

  • Durante a abordagem, o alvo resiste aos comandos de mostrar as mãos e sair do veículo, dissimulando sua intenção de utilizar sua arma. Um policial e o agressor foram baleados.

    https://www.youtube.com/watch?v=G5pgZ0yq1-E

Ainda, sobre usar uma arma de fogo contra um indivíduo desarmado, lembre-se que o policial não tem condições de saber se ele está sob efeito de drogas, álcool, se tem problemas mentais, qual a sua disposição para lutar (mentalidade de combate) ou mesmo se é um atleta marcial, todos, fatores que poderiam subjugá-lo em um confronto físico. O que está em jogo é a sua vida, e não há lei que o impeça de defender a sua vida.

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Sobre o autor
Tiago Gonçalves Escudero

Sobre o autor: Ex-Militar da Força Aérea, onde atuou no Batalhão de Infantaria. Atuou, ainda, como advogado em São Paulo, e posteriormente como Analista (Assistente Jurídico) no Ministério Público do Estado de São Paulo, principalmente, no Grupo de Combate à Lavagem de Dinheiro e Delitos Econômicos - GEDEC. Atualmente, é Delegado de Polícia Civil no Estado de Santa Catarina.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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