O AUMENTO DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO DOS BANCOS PARA FORÇAR A DIMINUIÇÃO DO PREÇO DO ÓLEO DIESEL E DO GÁS DE COZINHA
Rogério Tadeu Romano
O presidente Jair Bolsonaro publicou o decreto em que isenta o óleo diesel e o gás de cozinha (GLP) de impostos federais, e ao mesmo tempo editou uma medida provisória que eleva a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) aplicada às instituições financeiras. O maior aumento recaiu sobre os bancos.
O decreto, publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) determina que as alíquotas de PIS/Cofins aplicáveis à tonelada de GLP serão zero quando o produto for destinado ao uso doméstico e envasado em recipientes de até 13 quilos. No caso do óleo diesel, as alíquotas que incidem sobre o metro cúbico do combustível – que normalmente são de R$ 62,61 e R$ 288,89 por metro cúbico – ficarão zeradas até 30 de abril.
Podem as contribuições sobre o PIS e a Cofins serem diminuídos por decreto. O que não pode é o Executivo Federal aumentar as alíquotas dessas contribuições além do limite que a lei lhe deu. A esse respeito colho decisão do STF no julgamento da ADI 5.277 e da RE 1.043.313.
O entendimento foi firmado pelo Supremo Tribunal Federal ao declarar constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do parágrafo 2º, artigo 27, da Lei 10.865/04.
Ora, tem-se a conclusão de que haveria uma substancial diminuição na exação mencionada, dentro daquilo que os estudiosos chamam de “manicômio tributário”. Então quem vai pagar a conta? Isso porque se há diminuição de receita, onde haverá diminuição de despesa? Esse um postulado da Lei de Responsabilidade Fiscal.
“Art.14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;
II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.
§ 2º Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.”
Esse artigo impede os incentivos fiscais casuísticos, normalmente, ditados por critérios políticos. Esses incentivos, quase sempre, favorecem determinadas pessoas ou certos setores da economia para sobrecarregar outras pessoas ou outros setores econômicos. Rompem, via de regra, a neutralidade tributária, utilizando-se dos tributos como instrumentos regulatórios da atividade econômica.
Não pode haver despesa não autorizada por lei, pois há aqui reserva de lei.
O artigo 15 da LRF diz tratar-se de despesa não autorizada, irregular e lesiva ao patrimônio público, criando as condições para a tipificação do crime no artigo 359 do Código Penal.
No Artigo 10, alínea 4, da Lei de Responsabilidade Fiscal está dito: São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária: 4 – Infringir , patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária.
Vem o governo federal e resolve, por medida provisória, aumentar a alíquota sobre a CSSL dos bancos.
Em tempos de déficit orçamentário surge a contribuição social sobre o lucro liquido(CSLL) como importante instrumento de obtenção de recursos para o erário.
A contribuição social em tela foi instituída pela Lei 7.689/88.
A contribuição em discussão se constitui num tributo.
Estamos diante de contribuição social, não previdenciária. A esse respeito disse Oscar Valente Cardoso(Contribuição social, natureza jurídica e aspectos controvertidos):
“As contribuições sociais têm fundamento no art. 149 da Constituição, que as divide em três subespécies: contribuições sociais em sentido estrito, contribuições de intervenção no domínio econômico (CIDE), e contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas. As primeiras são aquelas destinadas ao custeio da seguridade social, as segundas são as instituídas com o objetivo de regular determinado mercado, para corrigir distorções (como a CIDE sobre a importação de gasolina, diesel e gás), e as terceiras são destinadas ao financiamento das categorias econômicas ou profissionais (OAB, SESI, SENAI, etc.).”
As contribuições sociais podem ser subdivididas em: a) previdenciárias, se destinadas especificamente ao custeio da Previdência Social, e são formadas pelas contribuições dos segurados e das empresas (arts. 20/23 da Lei nº 8.212/1991); b) e não previdenciárias, quando voltadas para o custeio da Assistência Social e da Saúde Pública. Por exemplo: a COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), o PIS (Programa de Integração Social), incidentes sobre a receita ou o faturamento, e a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), que recai sobre o lucro.
Sobre o aumento de alíquotas por Medida Provisória trago à colação trecho da ementa do RE 600.649/SP, relatora ministra Cármen Lúcia onde foi dito:
“Pode medida provisória instituir tributos, salvo apenas as exceções previstas na própria Constituição Federal, artigo 62, e os casos que dependam de lei complementar para a sua edição, o que não é o caso da contribuição social sobre o lucro. CSLL, nos termos do artigo 195 da Carta Federal, que pode ser disposta por lei ordinária. II O tema da majoração de alíquotas da CSLL, por medida provisória, foi objeto de diversos julgamentos pela Suprema Corte, que sempre decidiu pela constitucionalidade do ato normativo, fixando-se na data da respectiva edição o termo inicial do prazo nonagesimal."
A majoração de alíquota de CSLL não atrai a aplicação do art. 246 da Constituição Federal. Nesse sentido, vejam-se os seguintes precedentes: AI 594156 AgR,Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, DJe 26.6.2009; AI489734 AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJe30.4.2009.
No que se refere ao princípio da anterioridade, o STF já assentou que a majoração de alíquota da CSLL por medida provisória e suas reedições não viola a Constituição Federal.
Sobre o tema, cito alguns precedentes:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. CSLL. MAJORAÇÃO DEALÍQUOTA. MP 1.807/1999 E REEDIÇÕES. POSSIBILIDADE.CONTAGEM DO PRAZO NONAGESIMAL A PARTIR DA PRIMEIRA EDIÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que me parece juridicamente correta, é firme no sentido de que é constitucional a majoração da alíquota da CSLL pela MP 1.807/1999 e suas reedições e que a contagem do prazo nonagesimal se dá com a primeira edição da medida provisória. 2. Agravo regimental desprovido.” (RE 636.319-AgR, Relator o Ministro Ayres Britto, Segunda Turma, DJ25.10.2011)
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO – CSLL. 1.POSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA PELA MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.807/99 E SUAS REEDIÇÕES. 2.PRAZO DO ART. 195, § 4°, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA: CONTAGEM A PARTIR DA PRIMEIRA EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” (RE588.943-AgR, de minha relatoria, Primeira Turma, DJ 18.3.2011). “Tributo. Contribuição Social sobre o Lucro Líquido -CSLL. Adicional instituído por meio de medida provisória. Admissibilidade. Violação ao art. 246 da CF. Não ocorrência. Tributo instituído e regulamentado pela Lei nº 7.689/88. Mero aumento da alíquota pela MP nº 1.807/99. Recurso extraordinário não provido. A Medida Provisória nº 1.807/99não instituiu, nem regulamentou a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido - CSLL, mas apenas lhe aumentou a alíquota”(RE 403.512, Relator o Ministro Cezar Peluso, Segunda Turma, DJe 6.3.2009 – grifos nossos).“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. 1. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ALÍQUOTA DIFERENCIADA DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO -CSLL. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA. PRECEDENTES. 2. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL OBSERVADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM: AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. 3. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.” (RE 528160 AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe 12.6.2013).
Aplicam-se à CSLL as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação em vigor (Lei 8.981, de 1995, artigo 57).
Desta forma, além do IRPJ, a pessoa jurídica optante pelo Lucro Real, Presumido ou Arbitrado deverá recolher a Contribuição Social sobre o Lucro Presumido (CSLL), também pela forma escolhida.
A receita bruta poderá ser considerada pelo regime de caixa, desde que o critério seja adotado também para o IRPJ, PIS e Cofins.
As adições à Base de Cálculo deverão, ainda, ser somadas à base de cálculo da CSSL no Lucro Presumido:
1. os ganhos de capital, as demais receitas e os resultados positivos decorrentes de receitas não compreendidas na atividade, inclusive:
a) os rendimentos auferidos nas operações de mútuo realizadas entre pessoas jurídicas controladoras, controladas, coligadas ou interligadas, exceto se a mutuária for instituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil;
b) os ganhos de capital auferidos na alienação de participações societárias permanentes em sociedades coligadas e controladas, e de participações societárias que permaneceram no ativo da pessoa jurídica até o término do ano-calendário seguinte ao de suas aquisições;
c) os ganhos auferidos em operações de cobertura ("hedge") realizadas em bolsas de valores, de mercadorias e de futuros ou no mercado de balcão;
d) a receita de locação de imóvel, quando não for este o objeto social da pessoa jurídica, deduzida dos encargos necessários à percepção da mesma;
e) os juros relativos a impostos e contribuições a serem restituídos ou compensados;
f) as variações monetárias ativas;
A base de cálculo para as pessoas jurídicas optantes pelo lucro real é o lucro contábil, ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação.
Podem ocorrer antecipações mensais quando a empresas que recolhem a CSLL por estimativa mensal, a partir de 01.09.2003, devem considerar a nova base de cálculo da CSLL de 32% para as seguintes atividades:
a) prestação de serviços em geral, exceto a de serviços hospitalares e de transporte;
b) intermediação de negócios;
c) administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza;
d) prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a pagar e a receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).
São as seguintes as alíquotas da contribuição social:
8% (oito por cento) até 30.04.1999.
A partir de 01.05.1999, a alíquota foi majorada para 12% (doze por cento) e a partir de 01.02.2000 a alíquota é de 9% (nove por cento).
Para as entidades financeiras e equiparadas a alíquota era de 15%.
Em passado recente, MP elevou de 15% para 20% a alíquota da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) de instituições financeiras até 1º de janeiro de 2019, quando retorna a taxação anterior. As cooperativas de crédito são a exceção da MP, e terão os tributos elevados de 15% para 17%.
Outro ponto a discutir diz respeito a base de cálculo da receita bruta, com a alternativa do regime de competência ou regime de caixa vinculado à opção da tributação do IRPJ.
Se a empresa apurar o IRPJ no Lucro Presumido segundo o regime de caixa sobre a receita bruta, deverá proceder ao cálculo da tributação pela CSLL também pelo regime de caixa.
No caso de ter optado pela tributação do IRPJ pelo regime de competência, fará a apuração da CSLL segundo este regime.
Ou seja, a escolha entre regime de caixa e regime de competência, no IRPJ, vincula a forma de apuração da CSLL.
Quanto ao fato gerador do IRPJ e da CSLL, o Superior Tribunal de Justiça possui precedentes no sentido de que a escrituração dos créditos de ICMS caracteriza a "aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de acréscimos patrimoniais", devendo ser tributada regularmente, sendo indiferente às restrições do uso dos créditos adquiridos ,Na forma da jurisprudência, "a Primeira Seção do STJ possui orientação consolidada no sentido de que os créditos escriturais apurados pelos contribuintes no regime não cumulativo do PIS e da Cofins integram a base de cálculo do IRPJ e da CSLL (AgRg no REsp1.307.519/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe19.8.2013; REsp 1.267.705/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 8.9.2011; AgRg no REsp 1.206.195/PR, Rel.Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25.8.2011; AgRg noREsp 1.213.374/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 25.10.2013)" (STJ, AgRg no AREsp 618120/CE, Rel. Ministro HERMANBENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 31/03/2015).
O Supremo Tribunal Federal concluiu pela constitucionalidade dos artigos 42 e 58 da Lei nº 8.981/95, no que limitaram em 30%, para cada ano-base, o direito do contribuinte de compensar os prejuízos fiscais do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro – CSSL. Assentou a ausência de afronta à irretroatividade e à anterioridade bem como de direito adquirido ao regime de compensação(RE 540051 AgR/SP, DJe de 17 de outubro de 2013.
Ainda entendeu o Supremo Tribunal Federal que que a identidade entre as bases de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL) e do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) não implica, necessariamente, em unicidade de tratamento fiscal, como bem demonstrado na decisão agravada (RE 138.284/CE, Pleno, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 28/8/92)
Em síntese: houve por bem o governo, diante da Lei de Responsabilidade Fiscal, de forma discricionária, elevar a alíquota da CSSL para os bancos, diante do momento por que passa a Nação, exação essa que se aplica de imediato, a partir da edição da noticiada MP.