Os costumes como fonte do Direito e a Justiça comunitária em regiões da África, especialmente em Moçambique.

O que essa experiência poderá oferecer para solução de conflitos no Brasil

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07/03/2021 às 11:18

Resumo:


  • Abordagem didática das fontes do direito, com foco nos costumes e sua influência na resolução de conflitos.

  • Análise do entendimento africano sobre direito e aplicação do costume, destacando a diversidade e complexidade das sociedades locais.

  • Exploração da justiça comunitária pós-colonial e sua aplicação prática, com destaque para a importância da supervisão do Estado nesse contexto.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CONCLUSÃO

Diante dos argumentos expostos nesse artigo, chegamos à ideia de que como fonte do direito temos o costume, algo ainda muito importante não apenas na África, mas no mundo, como um dos pilares para a realização da Justiça.

Seguindo a linha de pensamento de Pedroso et al. ao referirem-se à justiça informal, comunitária ou alternativa dos países do Norte, às críticas não são suficientes para desacreditar formas de justiça diferenciadas, mas devem manter-nos vigilantes (Pedroso et al., 2002: 38-49).

O Estado tem uma função importante na fiscalização da justiça comunitária, tendo em vista que estamos diante, de uma justiça paralela e complementar a Estatal.

O respeito a diversidade assim como a cultura local, é algo que dever ser mantido também pela justiça positiva e Estatal. Pensando num País como o Brasil, temos diversas culturas, numa única cidade como exemplo, São Paulo. Assim a aplicação da norma de forma igualitária, trará a igualdade? A exegese se faz mister, tendo em vista que estamos diante de uma sociedade desigual.

Óbvio, que não defendemos em nenhum momento, a não aplicação da lei, mas a sua interpretação, com o intuito de fazer Justiça, em cada caso concreto.

Nesse ponto, como um Tribunal Superior (exemplos: STF e STJ) podem aplicar uma regra única, num País de dimensões continentais, regras comuns? Diante disso, a justiça comunitária, sem os apegos a formalização, como nos Juizados Especiais, ou rito sumaríssimo, respeitando a cultura daquela região, com a supervisão do Estado, podendo existir a possibilidade de revisão em caso de fraude, seria uma ótima solução para a Justiça.

Gosto muito do termo pluralismo jurídico, defendido por Boaventura de Sousa Santos, “não há nada de intrinsecamente bom, progressista e emancipatório no pluralismo jurídico” (2002: 89), o pluralismo jurídico é um campo de estudo privilegiado para a sociologia das ausências e das emergências que o autor propõe contra o desperdício da experiência. Esta proposta parte da ideia que “o que não existe é, na verdade, ativamente produzido como não existente, isto é, como uma alternativa não credível ao que existe” e visa conhecer e credibilizar a diversidade das práticas sociais existentes no mundo, frente às práticas hegemónicas concebidas como únicas ou como únicas credíveis (Santos, 2006).

Na sociedade complexa que vivemos, temos que encontrar diversas formas de solução dos conflitos, e trazendo como forma de solução os costumes, assim como a justiça comunitária, iremos desafogar o Judiciário Estatal - o que é bom para todos.

Nesse ponto, encontramos uma maneira de contribuição que usos e costumes impregnados de força normativa podem oferecer aos sistemas jurídicos, mesmo àqueles que se acreditam autossuficientes, diante de uma realidade cada vez mais dinâmica e complexa, para que tais ordenamentos possam atender continuamente às necessidades sociais, sobretudo no que diz respeito às relações contratuais que, por sua própria natureza, sofram constantes modificações no tempo e no espaço.

Infelizmente, com a crescente intervenção do Estado sobre a economia, como um aspecto voraz do capitalismo, como agente normativo, os órgãos da administração pública tomaram para si a tarefa de regular as minúcias das relações econômicas privadas. Fazendo com que regras frias e normas que não são as ideais para aquele momento sejam aplicadas, viraram uma regra. Esse foi um dos motivos que faz com que a Justiça esteja tão distante da sociedade.

Para que possamos dar uma solução aos conflitos, de uma forma mais célere e simples, voltamos aos estudos, desde às origens da sociedade, com a sabedoria criada durante séculos. Do ponto de vista filosófico, aplicando, em parte, o positivismo (pandectismo), adotado nos dias de hoje, com a experiência das escolas racionalistas e utilitaristas, a aplicação da tridimensionalidade do direito, como exegese, com as lições das escolas do jusnaturalismo, juspositivismo e sociologia jurídica, com os acertos e erros, seria o ideal para um bem estar individual e social. Todos essas teorias, foram degraus para que pudéssemos atingir os patamares atuais e, olhando essa “escada evolutiva”, de baixo para cima, temos a certeza que é infinita.


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VENOSA, Sílvio. Introdução ao Estudo do Direito – Primeiras Linhas, 2ª ed., São Paulo, Atlas, 2006.


CUSTOMS, AS A SOURCE OF LAW AND COMMUNITY JUSTICE, IN REGIONS OF AFRICA, ESPECIALLY IN MOZAMBIQUE AND WHAT THIS EXPERIENCE MAY OFFER TO SOLVE CONFLICTS IN BRAZIL.

Abstract: We will approach in a didactic way, the sources of the law, especially the customs so that we can understand the influence of this way for solution of conflicts. In this line of thought, we will look at African issues and their millennial way of resolving the conflicts presented, as well as community justice applied in the countries of this huge continent and, finally, what can be applied in Brazil.

Keywords: Africa. African rights. Sources of law. Mores. Community justice.

Sobre o autor
Gleibe Pretti

Pós Doutorado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina- nota 6 na CAPES -2023) Link de acesso: https://ppgd.ufsc.br/colegiado-delegado/atas-delegado-2022/ Doutor no Programa de pós-graduação em Direito da Universidade de Marília (UNIMAR- CAPES-nota 5), área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social, com a tese: APLICAÇÃO DA ARBITRAGEM NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS, COMO UMA FORMA DE EFETIVIDADE DA JUSTIÇA (Concluído em 09/06/2022, aprovado com nota máxima). Segue o link de acesso a tese: https://portal.unimar.br/site/public/pdf/dissertacoes/53082B5076D221F668102851209A6BBA.pdf ; Mestre em Análise Geoambiental na Univeritas (UnG). (2017) Pós-graduado em Direito Constitucional e Direito e Processo do Trabalho na UNIFIA-UNISEPE (2015). Bacharel em Direito na Universidade São Francisco (2002), Licenciatura em Sociologia na Faculdade Paulista São José (2014), Licenciatura em história (2021) e Licenciatura em Pedagogia (2023) pela FAUSP. Perícia Judicial pelo CONPEJ em 2011 e ABCAD (360h) formação complementar em perícia grafotécnica. Coordenador do programa de mestrado em direito da MUST University. Coordenador da pós graduação lato sensu em Direito do CEJU (SP). Atualmente é Professor Universitário na Graduação nas seguintes faculdades: Faculdades Campos Salles (FICS) e UniDrummond. UNITAU (Universidade de Taubaté), como professor da pós graduação em direito do trabalho, assim como arbitragem, Professor da Jus Expert, em perícia grafotécnica, documentoscopia, perícia, avaliador de bens móveis e investigador de usucapião. Professor do SEBRAE- para empreendedores. Membro e pesquisador do Grupo de pesquisa em Epistemologia da prática arbitral nacional e internacional, da Universidade de Marília (UNIMAR) com o endereço: dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/2781165061648836 em que o líder é o Prof. Dr. Elias Marques de Medeiros Neto. Avaliador de artigos da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Editor Chefe Revista educação B1 (Ung) de 2017 até 2019. Colaborador científico da RFT. Atua como Advogado, Árbitro na Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada de São Paulo S.S. Ltda. Cames/SP e na Secretaria Nacional dos Direitos Autorais e Propriedade Intelectual (SNDAPI), da Secretaria Especial de Cultura (Secult), desde 2015. Mediador, conciliador e árbitro formado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Especialista nas áreas de Direito e Processo do Trabalho, assim como em Arbitragem e sistema multiportas. Focado em novidades da área como: LGPD nas empresas, Empreendedorismo em face do desemprego, Direito do Trabalho Pós Pandemia, Marketing Jurídico, Direito do Trabalho e métodos de solução de conflito (Arbitragem), Meio ambiente do Trabalho e Sustentabilidade, Mindset 4.0 nas relações trabalhistas, Compliance Trabalhista, Direito do Trabalho numa sociedade líquida, dentre outros). Autor de mais de 100 livros na área trabalhista e perícia, dentre outros com mais de 430 artigos jurídicos (período de 2021 a 2024), em revistas e sites jurídicos, realizados individualmente ou em conjunto. Perito Judicial Grafotécnico. Autor com mais produções no Centro Universitário Estácio, anos 2021 e 2022. Tel: 11 982073053 Email: [email protected] Redes sociais: @professorgleibepretti Publicações no ResearchGate- pesquisadores (https://www.researchgate.net/search?q=gleibe20pretti) 21 publicações/ 472 leituras / 239 citações (atualizado julho de 2024)

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