Para concessão da aposentadoria por idade do trabalhador rural deverá o segurado preencher os seguintes requisitos:
60 (sessenta) anos de idade, se homem, e
55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher,
mais
carência de 180 (cento e oitenta) meses (trabalhados na atividade rural).
Logo, para que o trabalhador rural alcance o direito ao recebimento da aposentadoria por idade deve preencher as condições estabelecidas na legislação, sob pena de rejeição do seu pedido em sentença proferida com julgamento de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. O julgamento do mérito conduz à formação plena da coisa julgada material.
Entende-se por coisa julgada a decisão judicial imutável, não passível de alteração ou rediscussão, com previsão constitucional no artigo 5º, inciso XXXVI, da Carta Maior, e infraconstitucional no art. 502 do CPC. Seus efeitos podem ser limitados ao processo em que a decisão foi proferida (coisa julgada formal) ou ao processo em que proferida e a qualquer outro (coisa julgada material).
Por outro lado, há casos em que o trabalhador rural não é capaz de levar ao processo documentação hábil a comprovar o exercício da atividade rural pelo período mínimo exigido para concessão do benefício. Nesses casos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sustenta que o processo não deve ser julgado improcedente, isto é, não pode o magistrado resolver o mérito da ação, mas sim proferir sentença sem resolução de mérito, em razão da carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, com arrimo no art. 485, inciso IV, do CPC, cuja decisão conduz a coisa julgada formal, quer dizer, limitada ao processo em que a decisão foi proferida.
Referido entendimento foi firmado no Tema 629 do STJ, a seguir destacado:
A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Disponível em https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?&l=1&i=629&tt=T. Acesso em 10 mar. 2021.
Portanto, ao afastar o julgamento do mérito da ação lastreada em um conjunto probatório incapaz de comprovar o exercício da atividade rural, pretende do Superior Tribunal de Justiça proteger o trabalhador rurícola da coisa julgada material, o que o impediria de ajuizar uma nova ação pleiteando o mesmo direito.
É importante acentuar que, havendo provas suficientes de que o autor da ação não exercia atividade rural pelo período mínimo exigido pela lei, deve o magistrado julgá-la improcedente, logo, com resolução de mérito (art. 487, inciso I, do CPC).
Em contrapartida, se ausente conteúdo probatório válido a demonstrar o período de carência necessário para concessão da aposentadoria por idade rural, compete ao magistrado a extinção do processo sem análise de mérito (art. 485, IV, do CPC), cuja sentença, por gerar coisa julgada formal, permite que o segurado ajuíze nova ação, caso obtidas provas novas que lhe permitam demonstrar o exercício da atividade rural pelo período necessário.
Hipoteticamente, contudo, caso o magistrado, embora entenda inexistir prova material apta a comprovar o exercício da atividade rural, julgue a demanda improcedente, resolvendo o mérito, e, mais, ainda que tal sentença transite em julgado, o Superior Tribunal de Justiça admite a repropositura da ação objetivando o mesmo pedido: concessão da aposentadoria por idade rural. Há, de acordo com a jurisprudência do STJ, mitigação da coisa julgada na presente hipótese.
A Corte Superior, ao julgar o REsp 1.840.369/RS, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, em 12/11/2019, justificou que: a) Devem ser consideradas as dificuldades enfrentadas pelo segurado para comprovar documentalmente que preenche os requisitos para a concessão do benefício, em razão do considerável transcurso de tempo; b) As normas de Direito Processual Civil devem ser aplicadas ao Processo Judicial Previdenciário, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social; c) Em matéria previdenciária, por seu pronunciado cunho social, há espaço para a excepcional flexibilização de institutos processuais, até mesmo da coisa julgada.
Em resumo do tema, pode-se afirmar que, se o magistrado entender que o segurado especial não reuniu início de prova material da atividade rural (julgamento por falta de provas), levando-se em conta a proteção do trabalhador garantida pela norma, deve julgá-la sem resolução de mérito, como asseverado, por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, permitindo o ajuizamento de uma nova ação, dessa vez com melhor instrução das provas materiais (Tema 629 do STJ).
Caso a demanda anterior tenha sido julgada improcedente, resolvendo-se, por consequência, o mérito, mesmo em decorrência da ausência de prova material do trabalho rural, permite-se ao segurado o ajuizamento de uma nova ação judicial, mitigando o instituto da coisa julgada (STJ, REsp 1.840.369/RS).
Dessa maneira, as normas previdenciárias devem ser interpretadas à luz da Constituição Federal, admitindo-se, como dito, até mesmo o afastamento da coisa julgada na hipótese em comento, visando à proteção social do trabalhador.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Portal de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/.
GARCIA. Gustavo Filipe Barbosa. Manual de direito previdenciário. 4 ed. Salvador: JusPodivm, 2020.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. Vol. Único. 13 ed. Salvador: JusPodivm, 2021.