No tocante à multiplicidade de sujeitos, as obrigações podem ser:
a) Única: quando há unicidade de credor e de devedor;
b) Múltipla: quando há mais de um credor ou/e mais de um devedor. São as obrigações divisíveis, indivisíveis e solidárias. Referidas obrigações são chamadas de obrigações compostas subjetivas (pluralidade de partes); ao passo que as compostas objetivas (pluralidade de prestações) são as obrigações conjuntivas alternativas.
OBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS
Obrigação divisível é aquela em que cada um dos vários devedores é responsável por apenas uma parte da dívida, ou então, cada um dos diversos credores tem direito ao recebimento de apenas uma parte do crédito.
Assim, divisível é a obrigação que admite o cumprimento parcial, isto é, que pode ser executada em partes; indivisível é aquela em que a prestação deve ser cumprida por inteiro, sendo inadmissível o fracionamento do débito.
São dois os pressupostos da divisibilidade:
a) pluralidade de credores ou devedores;
b) prestação divisível, isto é, suscetível de repartição, em porções reais e distintas, formando cada porção um todo perfeito. Exemplos: dinheiro, café, açúcar etc.
Em havendo, porém, um só credor ou um só devedor, ainda que a prestação seja divisível, a obrigação será indivisível. Com efeito, dispõe o art. 314 do CC: "Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou".
Vê-se, portanto, que a pluralidade de credores ou devedores é requisito essencial à obrigação divisível. Aliás, em termos técnicos, o que é divisível e indivisível não é a obrigação e sim a prestação.
Segundo a regra concursu partes fiunt a obrigação se dividi em tantas obrigações independentes quantas forem as partes.
A divisibilidade é uma presunção legal, desde que presentes os seus dois pressupostos, só podendo ser afastada nos casos em que a solidariedade é imposta por lei ou pela vontade das partes.
A rigor, nas obrigações divisíveis há multiplicidade de obrigações, embora a causa, isto é, a fonte de todas elas seja a mesma. De fato, as obrigações são consideradas independentes nas questões atinentes à prescrição, anulação, insolvência etc, como veremos adiante.
A divisibilidade pode ser ativa e passiva.
Em ambas, vigora a máxima concurso partes fiunt. Essa presunção de que a obrigação divisível divide-se em partes iguais entre os credores e devedores é relativa, porque as partes podem convencionar de forma diferente essa divisão.
A divisibilidade ativa ocorre quando há mais de um credor, cada qual com o direito de exigir apenas uma parcela do débito do devedor comum. Exemplo: “A” deve R$ 3.000,00 a “B”, “C” e “D”, oriundo de um contrato de mútuo. Nesse caso, o devedor “A” deverá pagar a cada credor apenas uma parcela do débito, que, no silêncio, presume-se fracionado em partes iguais, qual seja, R$ 1.000,00 para cada um deles. Note-se que o devedor não pode pagar tudo a um dos credores, sob pena de continuar vinculado perante os demais credores.
Assim, o credor que se recusar a receber a sua parte, por pretender receber tudo, poderá ser constituído em mora.
Acrescente-se ainda que a interrupção da prescrição promovida por um dos credores, que, por exemplo, notifica judicialmente o devedor, não beneficia os demais credores, contra os quais a prescrição continuará a fluir normalmente (art. 204 do CC).
Igualmente, a suspensão da prescrição em relação a um dos credores não beneficiará os demais credores, contra os quais a prescrição continuará a fluir normalmente.
Finalmente, se um dos credores perdoar a dívida (remissão), a extinção da obrigação limita-se à quota parte deste credor, subsistindo o restante do débito em relação aos demais credores (art. 262 do CC). Igualmente quando ocorrer entre um dos credores e o devedor comum os institutos da transação, novação, compensação e confusão.
Já a divisibilidade passiva ocorre quando há mais de um devedor, cada qual com a obrigação de pagar apenas uma parcela do débito ao credor comum. Exemplo: “A”,”B “e “C”, tomaram, em conjunto, um empréstimo de R$ 900,00, de “D”. Nesse caso, os devedores respondem apenas por R$ 300,00, cada um.
Se, por acaso, um dos devedores, se tornar insolvente ou falir, não se aumentará o débito dos demais.
Igualmente, a interrupção da prescrição contra um dos devedores não prejudica os demais devedores, contra os quais o lapso prescricional continuará a fluir normalmente (art. 204 do CC).
Da mesma forma, a anulabilidade da obrigação em relação a um dos devedores não se comunica aos demais devedores (art. 177 do CC). Anote-se, porém, que, se não obstante a anulabilidade, o solvens (devedor) efetuar o pagamento parcial, ciente do vício, haverá ratificação tácita, com renúncia a todas as ações e exceções de que dispunha contra o negócio jurídico (arts. 174 e 175).
OBRIGAÇÃO INDIVISÍVEL
Obrigação indivisível é a que deve ser cumprida por inteiro. É a que não admite o fracionamento do débito.
Vimos que, se houver um só credor e um só devedor, a obrigação é sempre indivisível, ainda que a prestação seja divisível, porque o credor não é obrigado a receber parceladamente o que se convencionou a receber por inteiro.
Em contrapartida, em havendo pluralidade de credores ou de devedores, a obrigação só será indivisível se a prestação também o for, porquanto se for divisível aplica-se a regra concurso partes fiunt, inerente às obrigações divisíveis.
A indivisibilidade da prestação pode ser:
a) física ou natural: quando a própria estrutura orgânica da coisa faz com que a divisão destrua a sua essência. Exemplo: um cavalo; um carro.
b) convencional: quando a prestação é materialmente divisível, mas a vontade das partes proíbe seu fracionamento. Tal ocorre, por exemplo, quando se estipula a indivisibilidade do crédito em dinheiro, com o escopo de o credor poder cobrar a totalidade da prestação de cada um dos codevedores, afastando-se, destarte, a regra concurso partes fiunt.
c) Legal ou jurídica: quando a lei proíbe a divisão de uma prestação materialmente divisível. Exemplos: o terreno não pode ser dividido em partes inferiores ao módulo urbano ou módulo rural – Leis nºs 6.015/1973 e 4.504/1964; os direitos reais de garantia; as ações de sociedade anônimas (art. 28 da Lei da S/A).
d) econômica: quando o fracionamento de uma coisa materialmente divisível faz com que cada porção perca sensivelmente o valor, deixando de manter a mesma proporção com o todo. Exemplo: um grande diamante, raro pelo seu tamanho, se for partilhado, os fragmentos não terão o valor proporcional ao todo.
e) causal: quando a indivisibilidade resulta da razão determinante do negócio jurídico.
f) Judicial: quando a indivisibilidade da prestação é composta por sentença judicial.
As obrigações indivisíveis podem ser ativas e passivas, conforme haja a pluralidade de credores ou de devedores.
Em ambas as hipóteses, urge que a prestação seja indivisível.
A indivisibilidade ativa ocorre quando há vários credores com o direito de exigir, judicialmente ou extrajudicialmente, o cumprimento integral da obrigação do devedor comum. Exemplo: “A” deve entregar um cavalo aos credores “B”, “C” e “D”.
O devedor ou devedores se desobrigaram, pagando (art. 260 do CC):
I. a todos conjuntamente;
II. a um, dando este caução de ratificação dos outros credores.
Anote-se que, na indivisibilidade ativa, qualquer credor pode reclamar a dívida inteira, movendo a ação judicial em face do devedor. Este, porém, não deve efetuar todo o pagamento a apenas um dos credores, mas reuni-los conjuntamente e exigir que todos assinem o termo de quitação.
Em duas hipóteses, porém, o devedor poderá efetuar o pagamento a apenas um dos credores, a saber:
a) se o credor estiver autorizado pelos demais credores a receber a prestação por inteiro. Aqui não há necessidade da caução.
b) se o credor prestar caução (garantia) de que os demais credores ratificarão o pagamento.
O credor que recebeu a prestação por inteiro deve pagar em dinheiro a parte dos demais credores (art. 261).
Por outro lado, se um dos credores remitir (perdoar) a dívida, a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só poderão exigir, descontada a quota do credor remitente (art. 262). Na verdade, se a prestação é indivisível não é possível o desconto e sim o reembolso em dinheiro, devendo a expressão desconto ser interpretada nesse sentido. Assim, no exemplo acima, referente à obrigação de entregar o cavalo para três pessoas, se uma delas perdoasse a dívida, as outras duas, para exigirem a entrega do animal, teriam que pagar ao devedor a importância correspondente ao crédito remitido.
Essa mesma solução, que é baseada na proibição do enriquecimento indevido, é aplicável quando houver transação, novação, compensação ou confusão (parágrafo único do art. 262).
Finalmente, suspensa a prescrição em favor de um dos credores, aproveita-se aos outros (art. 201).
A indivisibilidade passiva ocorre quando há vários devedores responsáveis pelo cumprimento integral da prestação devida ao credor comum. Nenhum devedor poderá solver o débito pro parte (art. 259 do CC). Exemplo: “A”, “B” e “C” assumem a obrigação de entregar um cavalo árabe a “D”. Nesse caso, o credor pode mover ação judicial em face de qualquer um dos devedores para exigir o cumprimento total da prestação. De fato, cada um dos devedores é responsável pela dívida toda (art. 259). Todavia, o devedor, que paga a dívida, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros coobrigados, podendo deles reaver, em dinheiro, as respectivas quotas (parágrafo único do art. 259). Trata-se de sub-rogação legal, assumindo o devedor a posição do credor, persistindo, em seu favor, as eventuais garantias (reais ou fidejussórias) atinentes à obrigação originária. Nesse direito de regresso, porém, a obrigação perante os codevedores torna-se divisível, pois cada um deles só é responsável pela sua quota no débito (arts.283 e 285 do CC), abatida a parte do devedor adimplente.
Na obrigação indivisível, o credor, sob pena de ser constituído em mora, não pode se recusar a receber a prestação por inteiro de um dos devedores.
Cremos que o devedor acionado judicialmente possa realizar o chamamento ao processo dos demais devedores, por analogia ao disposto no art. 77, III, do CPC, com o escopo de aproveitar a mesma sentença, que vier a condená-lo, para fazer valer, em sede de execução, o seu direito de regresso contra os demais.
A rigor, na obrigação indivisível cada um dos devedores só deve parte da dívida. Prova disso é o direito de regresso que a lei assegura ao devedor que adimplir por inteiro a obrigação. Outra prova consiste no fato de os devedores responderem em partes iguais pelas perdas e danos, quando o perecimento da prestação emanar da culpa de todos eles (art. 263, § 1º). Se for de um só a culpa, ficarão exonerados os outros, respondendo só esse pelas perdas e danos (§2º do art. 263). Se ninguém tiver tido culpa, todos se exoneram da obrigação de indenizar as perdas e danos. Assim, perecendo a prestação por culpa de todos os devedores, ou de um deles, a obrigação converte-se em divisível, de natureza pecuniária, respondendo cada devedor apenas pela sua quota-parte no débito; quanto às perdas e danos, só o culpado responde, e se a culpa for de todos, responderão todos por partes iguais (art.263, §§1º e 2º, do CC). Se o perecimento decorreu de caso fortuito ou força maior, a obrigação é extinta sem qualquer direito do credor à indenização, salvo nos casos dos arts. 393 e 399 do CC. Se, no entanto, as perdas e danos da obrigação indivisível estiver previamente fixada em cláusula penal, todos os devedores, ainda que um só seja culpado, responde pelo valor fixado, na proporção de sua quota, à exceção do devedor culpado, que responde integralmente por esse valor. Aos não culpados fica reservado a ação regressiva contra aquele que deu causa à aplicação da pena, isto é, da cláusula penal (art. 414 e seu parágrafo único do CC).
Finalmente, a anulabilidade quanto a um dos interessados aproveita aos outros (art. 177). Quanto à prescrição, a interrupção contra um dos devedores, prejudica todos os outros (art.204, §2º do CC).
Referências bibliográficas
BRASIL. Código Civil. Lei n° 10406, de 10 de janeiro de 2002.
GOMES, Orlando. Obrigações, Forense. 17 ed. Rio de Janeiro, 2007.
NADER, Paulo. Curso de Direito Civil, Obrigações. Forense. 5 ed. Rio de Janeiro, 2010.
DINIZ, Maria Helena. Curso Brasileiro de Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações, 1998.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - Teoria Geral das Obrigações, 15ª edição. São Paulo: Saraiva, 2018, v. 2.
VENOSA, Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, 10ª edição, ATLAS, São Paulo, 2010.