Resumo: Com o avanço da crescente demanda populacional, as questões ambientais passaram a fazer parte das preocupações do homem, principalmente devido ao seu uso de forma desregrada. A escassez de recursos naturais teve como consequência a necessidade da intervenção do Estado na proteção ambiental. A atuação estatal em relação ao uso dos recursos ambientais acaba, muitas vezes, causando danos ao meio ambiente. Diante disso, o Estado prevê formas de recuperação do meio ambiente danificado. Entretanto, quando isso não é suficiente, criam-se instrumentos de responsabilização, seja na esfera cível, penal ou administrativa. Em decorrência dessa atuação estatal, definiu-se, no presente artigo, o seguinte problema de pesquisa: Como o Supremo Tribunal Federal, em suas decisões colegiadas, interpreta a aplicação da responsabilidade administrativa em matéria ambiental? Para responder a essa questão, estabeleceu-se como objetivo geral a análise das decisões colegiadas do Supremo Tribunal Federal em matéria de responsabilidade administrativa ambiental. Além disso, foram definidos os seguintes objetivos específicos: a) analisar a proteção ambiental sob a perspectiva legislativa; b) identificar as hipóteses de ações que configurem danos ambientais; c) examinar a responsabilidade ambiental nas esferas cível, penal e administrativa. Utilizou-se, como procedimento metodológico, o levantamento de decisões coletivas do Supremo Tribunal Federal, caracterizando-se, assim, como uma pesquisa eminentemente documental. Foram encontrados 18 acórdãos após a inserção das palavras-chave "responsabilidade administrativa ambiental" na plataforma de busca de jurisprudência do site oficial do Supremo Tribunal Federal. A análise dessas decisões permitiu concluir que a responsabilidade administrativa em matéria ambiental apresenta lacunas, uma vez que não é objeto frequente de análise pelo Supremo Tribunal Federal.
Palavras–chave: Responsabilidade ambiental. Dano Ambiental. Supremo Tribunal Federal.
1. INTRODUÇÃO
A atividade humana depois de séculos de exploração desenfreada do meio ambiente culminou em uma preocupação mundial. As ações de degradação ambiental fizeram com que o homem criasse medidas de preservação a fim de evitar a escassez dos recursos naturais indispensáveis. Por esse motivo e importância o meio ambiente foi o tema selecionado para ser abordado nesse trabalho.
Para tanto, cabe observar a evolução histórica e legislativa das normas de proteção ambiental, dando enfoque especial aos marcos históricos ocorridos no Brasil e no mundo. Também nesse capítulo será abordado o conceito de meio ambiente e dano ambiental na perspectiva de diversos autores, bem como será feita uma interpretação sobre o que dispõe o fundamento constitucional de proteção ambiental, o artigo 225, da Constituição Federal de 19881.
Diante disso, os atos danosos cometido pela atividade humana ao meio ambiente têm-se a legislação ambiental brasileira que estabelece a primeira forma de reparação: a restauração. Mas isso nem sempre é possível, já que tais danos são de difícil reparação. Por esse motivo, teve a configuração da tríplice responsabilidade como forma de punição pelos danos ambientais causado. Essa tríplice fica dividida em três esferas, a primeira é a de medidas reparatórias, aplicada na esfera civil, e as outras duas são de medidas punitivas nas esferas administrativas e penais, com imposição de multas e outras penas.
Nesse sentir, diante da tríplice responsabilidade, apenas a responsabilidade administrativa será merecedora de atenção especial ao final do artigo. Nesse sentido, o artigo objetiva contextualizar a análise de assunto de acórdãos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal acerca da responsabilidade administrativa em matéria ambiental de modo a auxiliar na compreensão do tema em toda a sua extensão.
2. PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE: Aspecto Internacional
O meio ambiente é um dos elementos fundamentais do bem de uso comum do povo. Assim, com o avançar da evolução humana, as questões ambientais passaram a fazer parte da preocupação do homem, em decorrência principalmente do seu uso de forma desregrada.
Foi apenas na década de 60 que a proteção ao ambiente foi alvo de discussão política, por isso alguns instrumentos normativos no campo internacional são considerados marco do direito ambiental, tais como: Conferência das Nações Unidas em 1972, onde teve o primeiro movimento mundial buscando princípios e protocolos comuns para a preservação e melhoria do meio ambiente (DIAS, 2020, site).
Em decorrência disso, a ocasião criou um Programa das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente (PNUMA) com finalidade de promover programas de proteção do meio ambiente e o uso eficiente de recursos naturais no contexto do desenvolvimento sustentável por entidades regionais e internacionais (IGNACIO, 2020, site).
Apesar do sucesso da iniciativa dada pela Conferência das Nações Unidas, a realidade era outra. Devido ao processo de industrialização dos países desenvolvidos estagnou sérios problemas de poluição. Diante disto, houve a convocação para a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio/92), realizada na cidade de Rio de Janeiro – Brasil. Alguns resultados da Rio-92 foram a Agenda 21, onde estabelece diretrizes para a implementação do desenvolvimento sustentável do espaço global ao local; A Convenção do Clima que tratava com regras mais específicas sobre a emissão de gases poluentes na atmosfera; e a Convenção da Biodiversidade que teve como propósito a preservação de espécies animais e vegetais em seu habitat natural. (IGNACIO, 2020, site)
Para avaliação dos protocolos da Conferencia Rio-92, na cidade de Johanesburgo, na África do Sul, no ano de 2002, ocorreu a Rio+10, conhecida como Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável. Em seus debates, foram observadas os objetivos da Agenda 21, e os resultados não foram significativos pois a degradação ambiental era evidente e não se tinha perspectiva para sua recuperação. Logo o objetivo principal da Conferência estava na idéia de que se todos os países buscassem o mesmo padrão de desenvolvimento dos países ricos (e tidos como desenvolvidos) não haveria recursos naturais para todos sem que ocorressem graves e irreversíveis danos ao meio ambiente. (DIAS, 2020, site).
Em 2012, ocorreu a Rio + 20, também na cidade do Rio de Janeiro – Brasil, essa conferência segundo a ONU2 (Organização das Nações Unidas) teve como objetivo “A renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do progresso e das lacunas na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto e do tratamento de temas novos e emergentes”. (DIAS, 2020, site).
Assim como as demais, a Rio + 20 destaca-se a criação da Cúpula dos Povos e do Comitê Nacional de Organização, para garantir que a própria conferência adotasse a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável. (IGNACIO, 2020, site).
Embora tenha sido proposta em conjunto por vários países, a construção de uma sociedade mais justa e sustentável para todos teve resultados desanimadores. Ou seja, vários países se comprometeram a propor soluções de desenvolvimento, mas acabaram por negligenciar diversas questões. No entanto, alguns acordos e ações foram estabelecidos entre os países participantes, para que os temas discutidos tenham um sucesso efetivo e este desafio segue por ser conquistado todos os dias. (IGNACIO, 2020, site).
2.1. Aspectos jurídicos de proteção do meio ambiente no Brasil
Como qualquer processo evolutivo, à medida que o ser humano aumenta sua capacidade de interferir na natureza, a fim de atender às crescentes necessidades e desejos, tensões e conflitos surgiram em relação ao uso do espaço e dos recursos naturais. As primeiras preocupações que surgiram para proteger o meio ambiente no Brasil são identificadas na época do descobrimento até a segunda metade do século XX.
Segundo a doutrina de Sirvinkas (2021, n.p) a proteção ao meio ambiente é dividida em três fases, a) a primeira fase conhecida como individualista; b) a segunda fase é conhecida como fragmentária e, c) a terceira fase conhecida como fase holística.
O referido autor afirma que a primeira fase começa “com o descobrimento do Brasil (1500) e vai até a vinda da Família Real Portuguesa (1808)”. Apenas alguns recursos ambientais eram protegidos por normas naquela época, como por exemplo o Regimento do Pau-Brasil de 1605, que protegia o pau-brasil como propriedade real (SIRVINKAS, 2021, n.p).
O segundo período inicia-se com a vinda da Família Real Portuguesa (1808) e vai até a criação da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (1981). Esse período ficou conhecido como a fase fragmentária. Essa fase se caracteriza pela exploração desregrada do meio ambiente, diante disso, regulou atividade de proteção e conservação do meio ambiente e criou a tutela legislativa, como por exemplo, a Lei nº 601/1850, conhecida por Lei de Terras do Brasil. (SIRVINKAS, 2021, n.p).
O terceiro período começa com a criação da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (1981), sendo caracterizada como fase holística, que consistia em “proteger de maneira integral o meio ambiente por meio de um sistema ecológico integrado”. (SIRVINKAS, 2021, n.p), sendo esta, fruto da grande influência da Conferência Mundial de Meio Ambiente.
A Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), instituída pela Lei n° 6.938/81 foi considerada um dos principais diplomas para a compreensão da sistemática ambiental, pois através dela foi constituído o meio ambiente como direito próprio, imaterial, indivisível e autônomo. Para entender sua importância, ela conceitua o meio ambiente no artigo 3º como “o conjunto de condições, leis, influência e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (BRASIL, 1981). Assim, com sua criação, estabelece um novo tratamento normativo ao meio ambiente com um excelente arcabouço de princípios, escopos, diretriz e instrumentos (FIORILLO, 2018, n.p).
A Constituição da República de 1988 sofreu influência da Lei n° 6.938/81, prevendo um Capítulo próprio ao meio ambiente, como se verifica a partir da análise do caput do artigo 225 que assim dispõe em sua redação: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. (BRASIL, 1988).
Para fins didáticos, alguns doutrinadores como Wanderley Rebello Filho, Christianne Bernardo, Marcelo Abelha Rodrigues e Celso Antônio Pacheco Fiorillo adotam a classificação do meio ambiente de José Afonso da Silva (2019, n.p) que conceitua o meio ambiente como sendo a "interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas".
Os três aspectos apresentados evidenciam a abrangência do meio ambiente e contribui para a necessidade de proteção ambiental, nas suas mais variadas ramificações, uma vez que configura a sadia qualidade de vida como previsto texto constitucional.
O meio ambiente natural é configurado por aquele que integra a atmosfera, as águas interiores, bem como as subterrâneas e as superficiais, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora. (DIAS e MARQUES, 2011, p.549 – 550).
Se a característica que permite a classificação de um determinado meio ambiente como natural é o fato de ter ele origem pelos procedimentos normais da natureza (sem a interferência substancial do homem), o meio ambiente artificial, em contrapartida, é reconhecido por ser fruto da citada interferência. Desse modo, aquele meio ambiente trabalhado, alterado e modificado pelo homem é um meio ambiente artificial. (DIAS e MARQUES 2011, p. 550)
Em relação ao meio ambiente cultural, ele se distingue em duas faces: a concreta e a abstrata. Dias e Marques (2011, p. 551) diz que:
O ambiente cultural é concreto quando transfigura no objeto que é classificado como artificial, a exemplo de prédios, monumentos, construções, que se encarregam manter a qualidade de artístico, paisagístico ou histórico. Por sua vez, o meio ambiente cultural abstrato é a própria cultura em si mesma, caracterizada pela língua, os costumes, os modos como as pessoas relacionam-se (social, afetiva e profissionalmente), as produções acadêmicas, literárias e científicas, as manifestações derivadas de cada identidade nacional e/ou regional, todos esses aspectos, sem distinção.
Diante destes conceitos, se faz necessário compreender o meio ambiente não como um objeto de cada área isolada de outros fatores. Ele deve ser trazido à tona como uma dimensão que sustenta todas as atividades e impulsiona os aspectos físicos, biológicos, e culturais dos seres humanos.
Evidencia dessa forma, a evolução do meio ambiente no Brasil, as principais leis relativas a sua proteção, bem como a sua classificação como meio ambiente natural, artificial e cultural. No próximo tópico, busca refletir sobre o dano ambiental derivada da ação humana e o dever de repará-lo.
2.2. Dano ambiental
O regimento ambiental brasileiro não traz um conceito próprio sobre o dano ambiental, portanto alguns doutrinadores se encarregaram dessa tarefa e criaram assuntos a respeito dessa lacuna deixada pela legislação.
O exemplo de Mirra (2004, p. 90) que conceitua o dano ambiental como:
O dano ambiental, segundo o que entendemos, consiste na lesão ao meio ambiente abrangente dos elementos naturais, artificiais e culturais, como bem de uso comum do povo, juridicamente protegido. Significa, ainda, a violação do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito humano fundamental, de natureza difusa.
Observa-se que o doutrinador alega que deve ser compreendido como lesão qualquer das classificações de meio ambiente, seja natural, artificial ou cultural. Na mesma linha de raciocínio, Freitas (2004, p. 50) cita que:
O dano conforme assinalado se constitui no prejuízo sofrido pelo patrimônio econômico de alguém. Em se tratando de meio ambiente, o prejuízo assume dimensão difusa, estendendo-se para o futuro. Diz respeito a coletividade e não ao indivíduo, pouco importando sua duração ou se o meio ambiente terá condições de autodepuração capaz de reduzir os efeitos das alterações ocorridas.
Avalia-se que dano mesmo sendo praticado por um indivíduo, afeta toda a coletividade e pode refletir sobre o patrimônio e os interesses dos indivíduos, individualmente ou em grupos.
Dessa forma, pelo que se depreende desta definição, a ocorrência de um fato que causa lesões a bens ou interesses e necessidades jurídicas alheias, tutelados pela ordem jurídica se torna elemento essencial para que surja a obrigação de reparar as lesões decorrentes de uma atividade danosa. (MILARÉ, 2020, n.p).
Para analisar a interpretação dada ao conceito de dano é preciso compreender que dano ambiental é caracterizado em dois aspectos: o primeiro na vertente da amplitude do bem protegido e o segundo na vertente da extensão e o interesse objetivado (LEITE e AYALA 2011, p. 95).
Para Leite e Ayala (2011, p. 96), na primeira vertente, que é aquela concernente a amplitude do bem, classifica-a em três respectivas:
a) dano ecológico puro, sendo aquele que atinge os bens próprios da natureza, excluindo os patrimônios artificiais e culturais. Nesse sentido, ao lesar o meio ambiente, há dano em componentes essenciais ao ecossistema, necessitando, desta forma, de uma reparação a fim de restaurar o ambiente sustentável. b) dano ambiental amplo refere-se ao interesse da coletividade de preservar o meio ambiente, sendo ele capaz de alcança a todo o meio ambiente, ou seja, o meio ambiente natural, o cultural, o artificial. c) Dano Ambiental Individual ou Reflexo refere-se que não visa aos valores do meio ambiente, e sim da tutela de interesses individuais ou coletivos.
Quanto a segunda vertente, o dano ambiental pode ser classificado em dano patrimonial e dano extrapatrimonial/moral representando a extensão do seu interesse objetivado. Assim, para Leite e Ayala (2011 p.96-97):
Sendo dano patrimonial refere-se aquele que reflete sobre o próprio bem ambiental, isto é, para se ter o meio ambiente ecologicamente equilibrado deve-se restituir a recuperação do bem lesionado. Quanto ao dano extrapatrimonial/moral diz respeito à sensação de dor experimentada ou conceito equivalente em seu mais amplo significado ou todo prejuízo não patrimonial ocasionado à sociedade ou ao indivíduo, em virtude de lesão ao meio ambiente.
Assim, a partir da definição de dano ambiental e suas vertentes de compreensão é possível analisar o dever de reparação por todo aquele que causa lesão ao bem tutelado, motivo na qual será o próximo tópico a ser analisado.
2.3. Dever de Reparar
Compreendida as facetas que podem configurar o dano ambiental, deve-se levar em consideração a importância desse dano e sua forma de reparação.
Observa-se que o conceito dado pela redação do artigo 2º da Lei nº 6.938/81, traz consigo elementos na qual objetiva a preservação e recuperação, in verbis:
A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana. (BRASIL, 1981).
Por conseguinte, a Constituição da República de 1988, incluiu no artigo 225, §1°, inciso I, as hipóteses de competência do poder público, a recuperação de áreas degradadas, priorizando a restauração natural como forma de reparação do dano ao meio ambiente. (BRASIL, 1988).
Ocorre, entretanto que para configurar o dever de reparar deve determinar atividade humana que cause o dano. Assim, para decair a responsabilidade do direito à reparação do dano, é necessário que se comprove o nexo causal entre a conduta do infrator e o resultado danoso. Sirvinskas (2021, n.p) baseia-se em duas teorias nas quais transcreve o nexo causal:
a)Subjetiva que se consubstancia na necessidade de se comprovar a culpa do agente causador do dano; b) A objetiva na qual não exige a demonstração da culpa, ou seja, o agente responderá pelos danos causados independentemente da culpa. Basta a demonstração da existência do fato ou do ato, o dano e o nexo causal.
Evidenciando a relação da classificação do meio ambiente com os danos ambientais e sua reparação, a seguir será apresentada a tríplice responsabilidade, na esfera civil, penal e administrativo.
3. RESPONSABILIDADE PELOS DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE
O conceito geral sobre responsabilidade em matéria ambiental é o dever de lidar com danos em razão das ações causada por si mesmo ou pelos outros.
Antunes (2021, n.p), observa que “a responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, no sistema jurídico brasileiro, é matéria que goza de status constitucional”, como se verifica no artigo 225, §3º, que prevê a responsabilidade em matéria ambiental, in verbis:
As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 1988).
Os três tipos de responsabilidades citadas no presente artigo, seja civil, administrativa ou penal, referem-se à pessoa responsável, seja física ou jurídica, de direito público ou privado que infringe norma ou preceito de direito objetivo e que, em decorrência da infração, fica sujeita a determinada sanção.
3.1. Responsabilidade civil ambiental
A responsabilidade civil em matéria ambiental, desde a edição da Lei nº 6.938/1981, adota a responsabilidade objetiva na qual se concerne no nexo de causalidade, impondo a obrigatoriedade de reparar ou indenizar pelos danos causados. Esse aparato encontra-se no § 1º do art. 14, da referida lei, in verbis: “(…) é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade” (BRASIL, 1981)
O doutrinador Délton Carvalho (2008, p. 109) adere à responsabilidade objetiva quando indaga que:
[...] todos aqueles que contribuem de qualquer forma para a ocorrência de um dano ambiental devem responder pela integralidade do dano, cabendo a repetição dos prejuízos internamente entre os causadores do dano, por meio do exercício do direito de regresso por aquele que indenizou ou reparou os danos em montante excedente ao seu percentual de participação na lesão ambiental.
Logo se entende que a responsabilidade civil ambiental consiste na probabilidade do dano, o agente independente de ter ou não agido com culpa, mas exerce atividade danosa, deve assumir os riscos e reparar o dano causado. (GONÇALVES, 2019, n.p).
O Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Especial 1612887/PR, da Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 28/04/2020, entendeu por responsabilidade civil objetiva tratar de teoria do risco integral por danos causados o corte indevido de vegetação da Mata Atlântica.
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR. EXONERAÇÃO DA RESPONSABILIDADE. NEXO CAUSAL. ROMPIMENTO. ALEGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. MATA ATLÂNTICA. VEGETAÇÃO PRIMÁRIA, SECUNDÁRIA. GRAUS MÉDIO E AVANÇADO DE REGENERAÇÃO. DEFINIÇÃO. RESOLUÇÃO CONAMA Nº 2 DE MARÇO DE 1994. OFENSA REFLEXA. DESCABIMENTO. INTERESSE SOCIAL E UTILIDADE PÚBLICA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. VALOR DA INDENIZAÇÃO. DEFICIÊNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL. SÚMULA 284/STF. 1. Ação civil pública por meio da qual se requer a indenização de dano ambiental decorrente do corte indevido de vegetação para a instalação de um posto de combustíveis em área de Mata Atlântica e a proibição da concessão de licenças ambientais em condições semelhantes. 2. Recurso especial interposto em: 28/09/2015; conclusos ao gabinete em: 1º/07/2019; aplicação do CPC/73. 3. O propósito recursal é determinar se: a) persistiu a negativa de prestação jurisdicional, por ter o Tribunal de origem se omitido de examinar a tese de interrupção do nexo de causalidade; b) nos danos ambientais, é possível arguir causas de exoneração da responsabilidade; c) as licenças ambientais foram concedidas de acordo com as normas pertinentes; d) havia utilidade pública ou interesse social que autorizassem a supressão de vegetação da Mata Atlântica; e e) se o valor da multa/reparação foi fixado de modo exorbitante. 4. Ausentes os vícios do art. 535. do CPC/73, rejeitam-se os embargos de declaração. 5. A exoneração da responsabilidade pela interrupção do nexo causal é admitida na responsabilidade subjetiva e em algumas teorias do risco, que regem a responsabilidade objetiva, mas não pode ser alegada quando se tratar de dano subordinado à teoria do risco integral. (STJ ,2020, online)
No caso concreto, que fora sobre Ação Civil Pública por meio da qual se requer a indenização de dano ambiental, decorrente do corte indevido de vegetação para a instalação de um posto de combustíveis em área de Mata Atlântica, pode observar que o caso julgado encontra os aparatos da responsabilidade objetiva motivada pelo risco.
3.2. Responsabilidade penal pelos danos causados ao meio ambiente
A mola propulsora para tipificar a responsabilidade penal decorre do artigo 225 § 3º da Constituição Brasileira de 1988, na qual destaca que as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente serão responsabilizadas administrativa e penalmente.
No âmbito da legislação infraconstitucional, a Lei nº 9.605/98 que trata da Lei dos Crimes Ambientais prevê a responsabilização penal, no artigo 2º, in verbis:
Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la” (BRASIL, 1998).
Importa mencionar que o referido artigo diz a respeito da responsabilidade penal na qual se justifica na necessidade de impedir a gravidade dos danos ambientais e impõe a obrigação de suportar implicações jurídicas de o agente ressarcir o dano ou sofrer determinada pena.
As sanções penais nos delitos ambientais, tanto para pessoas físicas quanto a jurídica, seguem os moldes do direito penal, isto é, são aplicadas a pena privativa de liberdade, a restritiva de direitos e multa (BRASIL, 1998). Mas para que tais sanções sejam aplicadas o elemento determinante da responsabilidade penal ambiental é subjetiva, pois configura a culpa do agente pelo dano.
Seguindo a linha de raciocínio, quando ocorre o crime ambiental deve observar a finalidade do sujeito ao realizar a conduta na qual advém a gerar um resultado danoso, para tal, como já mencionado, o bem jurídico ambiental tutelado é o meio ambiental em sua dimensão global, e por se tratar de um bem essencial à vida e à saúde do homem da atual e das futuras gerações se admite a responsabilidade penal subjetiva.
Assim, após a análise da responsabilidade civil e da responsabilidade penal, é de se fazer comentários acerca de responsabilidade administrativa, já que é diretamente ligada ao tema proposto no artigo.
3.3. Responsabilidade administrativa ambiental
Os fundamentos da responsabilidade administrativa têm previsão na Lei nº 9.605/1998, no artigo 70, em que “considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”. (BRASIL, 1998).
Pode-se, ainda, encontrar um conceito de infração administrativa no artigo 2º do Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre a especificação das sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, segundo o qual:
Toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente é considerada infração administrativa ambiental e será punida com as sanções do presente diploma legal, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades previstas na legislação. (BRASIL, 2008)
Para Trennepohl (2020, n.p) a finalidade da responsabilidade administrativa “resulta de infrações a normas administrativas, sujeitando-se o infrator a uma sanção de natureza também administrativa: a advertência, multa simples, interdição de atividade, suspensão de benefícios e etc.”.
Conforme entendimento de Milaré (2020, n.p), verifica-se que este dispositivo, “apesar de não definir especificadamente as infrações, entende-se que toda atividade lesiva feita em âmbito administrativo basta à comprovação do nexo de causalidade da conduta ilícita do agente”. Observa-se que a responsabilidade administrativa ambiental, se trata de responsabilidade subjetiva, aquela em que é necessária a comprovação de dolo ou culpa do poluidor para sua caracterização.
O Supremo Tribunal de Justiça entende que a responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva como disposto no Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 62584 / RJ, do Rel. Ministro Sérgio Kukina, julgado em 18/06/2015:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.VIOLAÇÃO AO ART. 535. DO CPC. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL, ACIDENTE NO TRANSPORTE DE ÓLEO DIESEL. IMPOSIÇÃO DE MULTA AO PROPRIETÁRIO DA CARGA. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. I - A corte de origem apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando a tese vertida pela parte ora Agravante. Inexistência de omissão. II - A responsabilidade civil ambiental é objetiva; porém, tratando-se de responsabilidade administrativa ambiental, o terceiro, proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo transportador. III - Agravo regimental provido. (STJ, 2015, online)
Perceba que no caso concreto, que fora sobre Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial por meio da qual trata sobre a responsabilidade subjetiva o proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo transportador.