A ATIVIDADE SINDICAL
O art. 513. da CLT define as prerrogativas dos sindicatos. Amauri Mascaro Nascimento identifica dentre essas prerrogativas as funções do sindicato classificando-as como função de representação, negocial, assistencial, parafiscal, econômica e política.
A primeira função do Sindicato é de representação, nos planos coletivo e individual, pois lhe cabe atuar como intérprete das pretensões do grupo que representa, cujas reivindicações encaminhará. No plano individual o sindicato desempenha sua função representativa participando de processos judiciais e prática de atos homologatórios de rescisões, por exemplo.
A função negocial é considerada por Montoya Melgar (1986) como principal. A OIT, pela Convenção 98 incentiva a atuação negocial dos sindicatos como sendo um instrumento de paz social e de utilidade técnica jurídica, pois ao normatizar, pela negociação coletiva, a solução de seus conflitos, o sindicato age como fonte de produção de direito positivo. A função assistencial não é unânime entre os juristas, que divergem sobre esta atribuição do sindicato, que não teria obrigação de prestar serviços de natureza médica, educacional, hospitalar, ambulatorial, etc.
A função parafiscal identificada por Amauri Mascaro Nascimento refere-se à cobrança das contribuições sindicais obrigatórias. A função econômica pode ser reconhecida pela possibilidade de participação do sindicato como acionista de empresas e de bancos e desenvolver atividade financeira, o que não foi vedado pela CF, segundo Nascimento. Porém, tanto Arouca como Martins não admitem a revogação do art. 564. da CLT, em que há expressa vedação de atividade econômica do sindicato.
A função política é uma atribuição polêmica e não é aceita em alguns países. Em nosso país, no entanto, esta função deu origem ao Partido dos Trabalhadores, tornando inegável a ação política do movimento sindical.
Segundo Alfredo Ruprecht (1995, p. 57), a atividade sindical desenvolve-se, basicamente, sobre duas orientações bem definidas: uma de caráter sindical e outra de índole política. Para o autor, o sindicato busca dois fins: um imediato, de tipo realista, que se refere diretamente às condições de trabalho e de vida dos trabalhadores, através da modificação da legislação vigente, para que favoreça economicamente a classe trabalhadora; e outro mediato, predominantemente ideológico, com grande conteúdo político, que tende a modificar as estruturas econômicas e jurídicas no âmbito nacional e internacional. No entanto, para fins deste estudo, focaremos nas atividades de caráter puramente sindical.
As atividades sindicais, conforme delineadas por Brito Filho (2000, p. 161), compreendem "o estudo das funções cometidas às entidades sindicais e às pessoas e grupos com atuação no campo das relações coletivas de trabalho, com destaque para a contratação coletiva", e a "atuação das organizações sindicais (...) quando da utilização dos meios de solução dos conflitos coletivos, bem como quando do uso dos instrumentos de ação sindical direta,".
Portanto, verifica-se que as atividades sindicais abrangem variadas atribuições de responsabilidade das organizações sindicais, dentre as quais destacam-se: as funções acometidas às entidades sindicais; e a atuação de referidas organizações.
Funções sindicais
Quanto às funções sindicais, os autores não possuem consenso quanto ao termo mais adequado, sendo que alguns as denominando “funções”, outros “poderes”, e, ainda, há aqueles que as nomeiam “prerrogativas”.
Ruprecht, citando Orlando Gomes e Gottschalk (1995, pp. 173-175), subdivide as funções dos sindicatos, às quais chama de “poderes”, em classes, a saber: poderes de representação dos interesses gerais da profissão; poderes de representação dos interesses individuais dos associados; poderes de representação diante do empregador ou da associação profissional que o representa; e poderes de impor contribuições. Além desses quatro poderes, acrescenta-se ao rol os subsídios a trabalhadores parados, "o direito de oferecer cursos de ensino profissional, de cultura geral, fundar museus, bibliotecas, cooperativas de consumo, quer dizer, tudo quanto possa contribuir, de uma maneira ou de outra, para a melhoria da categoria profissional."
Por sua vez, Amauri Mascaro Nascimento (2000, p. 252. - 256) assevera que, embora haja divergências sobre as funções que ao sindicato devem ser permitidas, são reconhecidas às organizações sindicais as funções de representação e a negocial, sendo controvertidas as demais (funções assistencial, parafiscal e política).
Deixando de lado a questão relacionada à nomenclatura, cabe destacar que a representação consiste na prerrogativa que se caracteriza como autêntico poder sindical, compreendendo as funções de falar e agir em nome da categoria e de defender os interesses dos seus representados, no plano da relação de trabalho, e até mesmo, em plano social mais amplo.
Conforme afirma Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1377. - 1378) a função (prerrogativa ou poder) de representação divide-se em inúmeras dimensões. A privada, pela qual são entabulados os diplomas negocias coletivos de trabalho; a pública, em que o sindicato busca dialogar com a sociedade civil na procura de suporte para suas ações; a administrativa, em face da qual o sindicato procura relacionar-se com o Estado, com o escopo de ver solucionados problemas trabalhistas em sua área de atuação, bem como no intuito do desenvolvimento da solidariedade social; e a judicial, por meio da qual o sindicato atua na defesa dos interesses dos seus filiados e da categoria por ele representada, seja através de dissídios individuais, na condição de substituto processual, seja por meio de dissídios coletivos, instaurados com a finalidade de resolver conflitos jurídicos ou de interesses econômicos.
Como integrante da função de representação temos a função negocial, de caráter privado, em razão da qual ao sindicato são outorgados poderes para se colocar em diálogo ou confronto com os empregadores ou sindicatos empresariais, face aos interesses da categoria, podendo ajustar diplomas negociais coletivos de trabalho, compostos de regras jurídicas que irão reger os contratos de trabalho. Em relação aos trabalhadores, a função negocial coletiva é exclusiva das entidades sindicais, no sistema jurídico brasileiro.
Outra importante função é a assistencial, que deve ser entendida como a atribuição conferida pela lei ou estatutos para que o sindicato preste serviços aos seus associados (art 477, 500, 513, 514 e 592, da CLT), nos quais expressas as diversas atividade assistenciais prestadas pelo sindicato aos seus representados, tais quais o serviço de homologação administrativa das rescisões contratuais, a colocação no mercado de trabalho, qualificação profissional, educação, saúde, lazer e jurídicos.
Os entes sindicais possuem também as funções econômicas, que podem ser diferenciadas em função econômica em sentido amplo e em sentido estrito. A primeira, designada como fonte de custeio que compreendendo todos os meios de arrecadação, mediante a qual pode o sindicato impor contribuições sindicais, além de cobrar taxas sindicais e mensalidade associativas. Em sentido estrito, diz respeito ao desempenho, pelo sindicato, de atividades nos setores comercial, industrial e de serviços.
Existem, ainda, outras prerrogativas reconhecidas ao sindicato, dentre as quais cabe mencionar a função política que consiste na possibilidade do sindicato vincular-se a partidos políticos ou à ideologia político-partidária. Nesse sentido, importa memorar o dito por Ruprecht (1995, p. 57), para quem o sindicato persegue um fim imediato e outro mediato, sendo que este último "tem um grande conteúdo político e visa fazer com que o Estado se alicerce em conceitos diferentes daqueles que o moldam atualmente".
Por fim, vale mencionar referencias doutrinárias remetendo à função ética (cf. Magano, apud BRITO FILHO, 2000, p. 168), em face da qual deve o sindicato agir eticamente, cabendo ao Estado impor a adoção de padrões éticos, sem que isso, contudo, enseje restrição de atuação.
Atuação das organizações sindicais
As organizações sindicais têm como objetivo a proteção dos interesses coletivos e individuais da categoria. Dentre os interesses individuais dos representados, mencionem-se a prestação de assistência judiciária aos membros da categoria, a assistência nos pedidos de demissão e na homologação das verbas rescisórias.
Por sua vez, os interesses coletivos são metaindividuais, pois vão além do indivíduo, e abarcam, na esteira do art. 81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), os interesses ou direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Nesse sentido, José Carlos Arouca (2012, p.84) afirma que:
A defesa de interesses coletivos não alcança apenas interesses trabalhistas, encerrando-se com o tratado de paz, porque os trabalhadores têm, também, interesses sociais, que são aqueles elencados no art. 6º da Constituição: educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados.
Na defesa dos interesses coletivos dos seus representados, as organizações sindicais atuam na instauração e composição de conflitos e dissídios coletivos, seja através da utilização da ação sindical direta (greve), seja pela via da negociação coletiva, da mediação, da renúncia, da instauração do dissídio coletivo ou da arbitragem.
ABUSO DE DIREITO
A fim de conceituar o termo “abuso de direito”, Fernando Augusto Cunha Sá (1997, p. 103), com base no artigo 334 do Código Civil português, assim dispõe:
é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou econômico desse direito", define o abuso de direito como sendo "um acto ilegítimo, consistindo a sua ilegitimidade precisamente num excesso de exercício de um certo e determinado direito subjectivo: hão-de ultrapassar-se os limites que ao mesmo direito são impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo próprio fim social ou econômico do direito exercido.
Por sua vez, Lúcio Flávio Vasconcelos Naves, citado por Edilton Meireles (2005, p. 21), simplificadamente, define abuso de direito como "o exercício, ou a mera pretensão de exercício injusto de um direito legítimo".
O atual Código Civil brasileiro também define, em seu art. 187, o que seja abuso de direito, in verbis:
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Da definição legal acima colacionada, Edilton Meireles (2005, p. 21) chama a atenção para dois importantes aspectos: o primeiro, que, ao contrário do ato ilícito, o legislador não fez qualquer referência ao dano para a configuração do abuso do direito; segundo, que não há na definição do abuso de direito nenhuma menção à culpa, diversamente do que ocorre no tocante ao ato ilícito. Deste modo, Meireles (2005, p. 22) propõe que o abuso do direito seja definido como "o exercício de um direito que excede manifestamente os limites impostos na lei, pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé e pelos bons costumes, decorrente de ato comissivo ou omissivo".
No mesmo sentido, define Mauro César Martins de Souza (2002, p. 219):
o abuso de direito traduz-se num ato cuja ilegitimidade decorre do excesso no exercício de um direito subjetivo, que tem os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo seu próprio fim social e/ou econômico.
Importa salientar que o ato abusivo não se confunde com o ato emulativo o qual consiste na prática de ato emulativo no exercício do próprio direito, com o intuito, inconfessável ou dissimulado, de causar prejuízo a outrem, e sem tirar qualquer proveito para si. A distinção entre os dois termos reside no fato de que o ato emulativo é mais restrito que o abusivo, pois, naquele o titular do direito não tira qualquer proveito do seu ato abusivo, enquanto neste, pode haver proveito ou não.
Ademais, difere o ato abusivo da fraude a lei, porquanto nesta espécie de conduta são praticados atos que buscam contornar uma proibição legal pela invocação de outra norma (denominada lei de cobertura), e, com isso, atinge-se indiretamente o resultado almejado. Assim, há fraude à lei quando o sujeito age com amparo em uma lei (de cobertura), procurando iludir a aplicação de outra lei, ao passo que, no abuso de direito, o agente não invoca outra norma para atingir seu objetivo.
Por fim, Edilton Meireles (2005, p. 30) sintetiza afirmando que "o abuso do direito surge por ocasião do exercício do direito e a fraude à lei pelo não cumprimento de uma obrigação legal, que se procura evitar invocando a aplicação de outra regra".
Teorias subjetiva, objetiva e mista
Quanto a caracterização do abuso de direito, a doutrina dividiu-se em três correntes: a subjetiva, a objetiva e a mista, as quais veremos a seguir.
Teoria subjetiva, defende que o abuso de direito somente se caracteriza se o agente exercer o seu direito apenas com a intenção de prejudicar terceiros, sendo, portanto, necessária a presença da culpa lato sensu ou do animus nocendi (ato emulativo);
Teoria objetiva, também conhecida como teoria finalista ou funcional, em que seus defensores, dentre os quais se destaca Louis Josserand, entendem que para que haja abuso é irrelevante a intenção do agente; por isso, existindo ou não intenção de prejudicar outrem, o ato será abusivo se o seu objeto ou as circunstâncias o revelarem desta forma. É a teoria adotada no Brasil (art. 187, CC).
Teoria mista, entende que a configuração do abuso depende da análise objetiva da intenção, isto é, devem ser considerados os fatores objetivos e subjetivos das duas teorias citadas anteriormente; a crítica que se faz a esta doutrina é de que a teoria objetiva já envolve a subjetiva, pois quem exercita o direito de forma dolosa ou com intenção emulativa, malfere, decerto, a boa-fé e os fins sociais e econômicos.
A partir da definição do abuso de direito, podem ser traçados os seus pressupostos caracterizadores, consistentes na prática de um ato permitido pelo direito positivo, decorrente de um ato comissivo ou omissivo; que ultrapasse os limites normais do exercício regular de um direito, a independência da ocorrência de dano e a desnecessidade de que o abuso decorra de conduta culposa.
Identificação do abuso do direito
A doutrina aponta diversos critérios para a identificação e caracterização do abuso de direito, os quais podem ser resumidos nos critérios do interesse ou legitimidade apreciável, do exercício normal do direito, da tolerância normal e da moralidade. No entanto, para fins deste estudo, adotaremos a classificação de critérios proposta por Edilton Meireles (2005, p. 48), baseada no art. 187. do atual Código Civil. Para o autor, são cinco os critérios que devem ser aplicados para a verificação do ato abusivo: desproporcionalidade, violação da boa-fé, função social, função econômica e bons costumes.
Veremos a seguir cada um desses critérios de modo pormenorizado.
Desproporcionalidade - vinculado ao princípio da comutatividade ou da justiça contratual, por força do qual se impõe a equivalência das prestações contratadas tanto sob a ótica econômico-financeira, quanto em função da capacidade das partes e em razão das circunstâncias específicas que caracterizam a relação. Conforme assevera Meireles (2005, p. 50): "sempre que ocorrer a ruptura do equilíbrio contratual, em tese, estar-se-á diante de uma cláusula ou prática abusiva".
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Princípio da boa-fé - O princípio da boa-fé deve ser analisado sob os aspectos subjetivo e objetivo. Subjetivamente, a boa-fé está vinculada à ética, impondo às partes o dever de agirem com retidão e probidade. Já a boa-fé objetiva vincula-se ao estado de confiança gerado na contraparte. Na boa-fé subjetiva deve-se considerar a intenção do sujeito, a sua íntima convicção, tendo-se como "parâmetro de aferição o comportamento ético do agente, sempre de foro íntimo". Por sua vez, conforme cita Meireles (2005, p. 57), "a boa-fé objetiva é apurada a partir de um comportamento que se exterioriza, de forma objetiva, tendo em vista a confiança depositada em outrem".
Função social – dispõe que ocorre ato abusivo quando se desvirtua do instituto jurídico que integra. Como todo instituto jurídico é criado, principalmente, para servir à coletividade, o ato ou relação jurídica interessa a todos que os cercam e que são por eles afetados (coletividade), e não apenas às pessoas diretamente envolvidas. Nessa senda, a doutrina cita como violadores da função social os atos que ofendam os direitos fundamentais (físicos, psíquicos e morais).
Função econômica - Impõe-se, por este critério, que o ato cumpra uma finalidade econômica. Portanto, afastam-se da função econômica os atos ou cláusulas que possam conduzir à ruína de uma das partes ou que tendam à espoliação.
Bons costumes - Os bons costumes relacionam-se com a moral social, compreendendo as regras impeditivas de comportamentos, que, embora não expressas, são consideradas em vigor pela sociedade. Nesse trilho, Edilton Meireles (2005, p. 85) assevera que "bons costumes é o conjunto de comportamentos morais aceitos por determinada comunidade. Não são práticas, mas as idéias ou convicções morais".
O ABUSO DO DIREITO SINDICAL
Os atos abusivos podem aparecer sob a forma de cláusulas abusivas, em que há manifestação bilateral de vontade, ou, por práticas abusivas, na qual a manifestação é unilateral. Em ambas, contudo, excedem-se os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelos fins econômicos ou sociais, causando manifesta desproporção na relação mantida entre os envolvidos.
No direito coletivo do trabalho, os atos abusivos aparecem quando ocorrem excessos da atividade sindical, em outras palavras, ainda a atividade pareça legal, os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelos fins sociais ou econômicos são excedidos.
A seguir, com base nos conceitos vistos até o momento, veremos algumas hipóteses em que pode restar configurado o abuso do direito sindical.
Cláusulas de sindicalização forçada
Conforme aponta Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1344) as cláusulas de sindicalização forçada ocorrem quando é verificada a ocorrência de incentivos à sindicalização, “apelidadas de cláusula de segurança sindical ou sindicalização forçada”. O autor destaca ainda a controvérsia existente quanto à compatibilidade de tais cláusulas com o princípio da liberdade sindical.
As cláusulas negociais coletivas, quando não ilícitas, podem ser consideradas abusivas. São exemplos dados por Amauri Mascaro Nascimento, citado por Maurício Godinho Delgado (2013, .1344 – 1345):
a) Closed shop (empresa fechada), pela qual o empregador se obriga perante o sindicato a contratar somente empregado à este filiados.
b) Union shop (empresa sindicalizada), neste caso o empregador se compromete a manter apenas empregados, que, após prazo razoável de sua admissão, se filiem ao respectivo sindicato operário.
c) Preferencial shop (empresa preferencial), condição de favorecimento da contratação de obreiros filiados ao respectivo sindicato.
d) cláusula maintenance of membership (manutenção de filiação), pela qual o empregado inscrito em certo sindicato deve preservar sua filiação durante o prazo de vigência da respectiva convenção coletiva, sob pena de perda do emprego.
Práticas antissindicais
Prática de ato antissindical é aquele que vem desafiar o exercício da liberdade sindical em suas mais variadas formas. Várias são as definições a respeito. Luís Enrique de La Villa Gil, Gabriel Garcia Becedas e Ignácio Garcia-Perrote Escartin afirmam que o ato anti-sindical é um elenco de condutas que tenham por objeto causar alguma espécie de discriminação ou lesão aos direitos da liberdade sindical por motivo de filiação ou da atividade sindical (La Villa Gil, et al, p. 378).
Uma das mais importantes características dos atos antissindicais, é que tais ações ou omissões venham a demonstrar motivação antissindical, ainda que não exclusivamente, ou seja, um dos focos da atitude está voltado a destruir, mitigar, ou tornar sem efeito, a liberdade sindical em uma das expressões anteriormente apontadas.
Os atos antissindicais, assim como a liberdade sindical, também foram objeto de tratamento internacional, por meio dos arts. 1º e 2º da Convenção n. 98. da OIT, ratificada pelo Brasil e que, portanto, apresenta definição de caráter normativo no ordenamento interno:
Art. 1. — 1. Os trabalhadores deverão gozar de proteção adequada contra quaisquer atos atentatórios à liberdade sindical em matéria de emprego.
2. Tal proteção deverá, particularmente, aplicar-se a atos destinados a:
a) subordinar o emprego de um trabalhador à condição de não se filiar a um sindicato ou deixar de fazer parte de um sindicato;
b) dispensar um trabalhador ou prejudicá-lo, por qualquer modo, em virtude de sua filiação a um sindicato ou de sua participação em atividades sindicais, fora das horas de trabalho ou com o consentimento do empregador, durante as mesmas horas.
Art. 2. — 1. As organizações de trabalhadores e de empregadores deverão gozar de proteção adequada contra quaisquer atos de ingerência de umas e outras, quer diretamente quer por meio de seus agentes ou membros, em sua formação, funcionamento e administração.
2. Serão particularmente identificados a atos de ingerência, nos termos do presente artigo, medidas destinadas a provocar a criação de organizações de trabalhadores dominadas por um empregador ou uma organização de empregadores, ou a manter organizações de trabalhadores por outros meios financeiros, com o fim de colocar essas organizações sob o controle de um empregador ou de uma organização de empregadores.
Estão aí previstos as duas principais categorias de atos antissindicais: atos de discriminação e atos de ingerência (SILVA, 2008: 82).
Doutrinariamente, a definição clássica é do jurista uruguaio Oscar Ermida Uriarte, que estabelece que são atos antissindicais aqueles que prejudicam indevidamente um titular de direitos sindicais no exercício da atividade sindical ou por causa desta, ou aqueles atos mediante os quais lhe são negadas, injustificadamente, as facilidades ou prerrogativas necessárias ao normal desempenho da ação coletiva (URIARTE, 1989: 2005).
Mais recentemente, definiu-os Luciano Martinez (2013, p. 411) de forma muito mais abrangente, consentânea com a abordagem que se adota neste ensaio:
A antissindicalidade – como já se disse – é ação ou omissão hostil aos sindicalistas, aos sindicatos, à sua filosofia ou aos seus propósitos, independentemente de tratar-se de uma prática isolada ou de uma verdadeira atividade concertada. Como tal é, em última análise, palavra que consubstancia a conduta de quem obstaculiza os direitos de liberdade sindical – individuais ou coletivos; positivos ou negativos; organizacionais ou acionais – e que, mesmo sem se dar conta disso, turba, por ação reflexiva, a progressividade de outros tantos direitos humanos.
Efetivam-se por métodos contrários à liberdade associativa em sentido amplo, configurando inquestionável vilipêndio aos direitos conquistados pelos trabalhadores, nos termos das Convenções da OIT (especialmente as de nº 87/1948, 111/1958, 135/1971 e 158/1982) e da Constituição de 1988 (art. 1º, 8º, 193, CF/88)1, principalmente quanto ao exercício da liberdade sindical.
Ao abordar o tema dos atos antissindicais, Luciano Martinez (2013, p. 27-28) assevera:
É inevitável concluir que o próprio direito do trabalho e sua peculiar principiologia devem sua existência às ações sindicais. (...). Esse pequeno introito torna evidentes as razões em virtude das quais os direitos de liberdade sindical têm sofrido oposições de toda espécie.
Expressando um contraponto às sistemáticas de incentivo à sindicalização, há, por outro lado, sistemáticas voltadas ao desestímulo e desgaste da atuação sindical, fato que entra em claro conflito com a liberdade sindical. Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1345) cita como exemplo de tais práticas antissindicais a yellow dog contract e a company unions:
a) Yellow dog contract (contrato de cães amarelos), na qual o trabalhador firma com seu empregador um compromisso de não filiação ao seu sindicato como critério de admissão e manutenção do emprego.
b) Company unions, em que o empregador estimula a criação e controla a organização e as ações do respectivo sindicato obreiro.
Há também, conforme indicado por Benjamim M. Schieber, citado por José Cláudio Monteiro de Brito Filho (2000), a agency shop¸ caracterizada pela obrigatoriedade das contribuições sindicais, mesmo que o obreiro não seja a ele filiado.
Embora a imposição da contribuição assistencial seja considerada resultado de uma das prerrogativas do sindicato, bem como importante fonte de receita sindical, a jurisprudência pacificada pelo STF e TST segue no sentido de que tais contribuições, quando cobradas de trabalhadores não sindicalizados, são consideradas inválidas. Nesse sentido cabe memorar os dispositivos citados na quinta aula, na qual foram abordadas as modalidades de contribuição sindical, quais sejam: o Precedente Normativo nº 119 do TST, a Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC do TST, a Súmula nº 666 do STF e a Súmula Vinculante 40, do STF. Soma-se aos critérios restritivos do desconto o limite fixado pela jurisprudência do TST, por meio da O.J. n. 18, da SDC do TST, cuja inobservância resulta em abuso.
Quanto à conduta dos empregadores, como destaca Alice Monteiro, os atos antissindicais manifestam-se através de diversos meios e em vários momentos da relação de emprego, inclusive na fase pré-contratual, considerando-a uma das formas mais perigosas e insidiosas de discriminação.
Casos tipificadores de atos antissindicais
Diversas situações podem ser apontadas como de conduta anti-sindical:
a) fomento de sindicatos comprometidos com os interesses de empregador e dominados ou influenciados por este (Uriarte, 1983, p. 39);
b) não-contratação, despedida, suspensão, aplicação injusta de sanções, alterações de tarefas e de horário, rebaixamento, inclusão em listas negras ou no index do patrão, redução do salário (Uriarte, 1983, p. 40) do associado ou do dirigente sindical, membro de comissão ou, simplesmente, porta-voz do grupo;
c) isolamento ou congelamento funcional desses obreiros;
d) no plano da greve, procedimentos que desestimulam ou limitam esse direito despedida, estagnação profissional, medidas disciplinares, transferências de grevistas, concessão de licença, férias maiores, gratificações e aumentos para fura-greves (Giugni, 1991, p. 50-51);
e) ameaças ou concreção de extinção de postos de trabalho ou de estabelecimentos, transferências destes para outro país ou região como represália por atividades sindicais ou de reivindicação coletiva; (Uriarte, p. 41);
f) delitos como ameaça, coação, lesão corporal, cárcere privado, assassinato de lideranças obreiras e sindicais (URIARTE, p. 41)
g) recusa de negociação coletiva (Uriarte, 1983, p. 41);
h) inviabilizar ou dificultar a criação de sindicatos ou comissões internas;
i) impedir ou criar obstáculos ao desempenho da atividade sindical que pressupõe: ingresso e deslocamento nos estabelecimentos empresariais, comunicação de fatos do interesse dos trabalhadores, recebimento das contribuições devidas à entidade classista, informações do empregador necessárias ao desempenho da atividade sindical (Uriarte, 1983, p. 41);
j) apresentação, quando da contratação, de questionário sobre filiação ou passado sindical (Clavel-Fauquenot, 1999, p. 1456);
l) sugestão para abstenção em eleições sindicais ou para comissões internas (Clavel-Fauquenot, 1999, p. 1456);
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m) proibição do empregador de realizar assembléia no seu estabelecimento ou interdição à participação de dirigentes externos nessas assembléias (Giugni, 1991, p. 91).
Cláusulas coletivas abusivas
Há duas hipóteses de abusividade da cláusula inserida em instrumento normativo. Na primeira, o abuso decorre de cláusula firmada pelos sindicatos além do permitido pelos representados (abuso de representação), fato que se resolve com a responsabilidade civil da entidade sindical. Importa destacar que se a parte contrária, firmatária do instrumento negocial, agiu com boa-fé, a cláusula não pode ser tida como abusiva em face das partes contratantes.
O mesmo não ocorre quando o conteúdo da cláusula em si é considerada abusiva. Podemos citar como exemplo quando uma empresa é impelida, por meio de movimento grevista, a firmar acordo coletivo prevendo reajuste salarial superior à sua capacidade econômica, contrariando a função econômica do pacto e levando à ruína a empresa contratante, circunstância de flagrante abuso. Outro exemplo pode ser verificado quando na norma coletiva é pactuada a possibilidade de revistas pessoais dos empregados, circunstância de clara violação de direito fundamental dos trabalhadores.
Abuso do direito de greve
O direito de greve é garantido constitucionalmente, pelo art. 9º, que, segundo Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1466) conferiu a natureza jurídica deste instituto como um direito fundamental de caráter coletivo, resultante da autonomia privada coletiva inerente às sociedades democráticas. Considera, o autor, a greve como direito fundamental porque é consequência das liberdades de trabalho e associativa e também da autonomia dos sindicatos, direitos próprios das democracias e que têm um status de essencialidade nas ordens jurídicas contemporâneas.
Arouca acolhe a natureza jurídica identificada por Magano, de que a greve é um fato social e também universal, com conotações econômicas e políticas. Amauri Mascaro Nascimento identifica várias teorias acerca da natureza jurídica da greve, ressalta este direito como direito de liberdade, direito de igualdade e direito instrumental, contesta a idéia de que a greve é mero fato social porque, na medida em que esse fato é regido pelo direito, passa a ser fato jurídico e, por fim, acolhe a tese da greve como autodefesa (Alcalá-Zamora y Castilho), pelas autorizações do ordenamento jurídico para que alguém empreenda uma reação diante de uma ação constrangedora.
Mesmo admitindo a natureza jurídica da greve como direito fundamental ou direito de autodefesa, seu abuso foi previsto na Constituição Federal e regulamentado por Lei própria (Lei n. 7783/1989).
Amauri Mascaro Nascimento (2000, p. 418) considera abusos como as ações ou omissões que venham a contrariar o conceito de greve, deste se distanciando, incluídos os atos de protesto coletivo que não configuram greve, como a ocupação de estabelecimento, a sabotagem, o boicote, a violência contra o patrimônio, a agressão física, o piquete não destinado ao simples convencimento dos trabalhadores para obter a sua adesão à paralisação, a obstrução da livre circulação de pessoas e de mercadorias, etc.
A Lei n. 7.783/99 que Dispõe sobre o exercício do direito de greve, aponta em seus dispositivos as hipóteses consideradas como abusivas do direito de greve. Arnaldo Süssekind (1999, p. 458) elenca os abusos comumente praticados durante greve, pelo sindicato, conforme parâmetros dos artigos 6º, 9º e 11 da Lei n. 7783/1989:
a) Negar-se o sindicato a firmar acordo para a manutenção de serviços, cuja paralisação importe em prejuízo irreparável à empresa, ou cuja prestação seja indispensável ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade e os empregados a prestar os respectivos serviços;
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b) O sindicato ou os grevistas utilizarem meios violentos para aliciar ou persuadir trabalhadores, violar ou constranger direitos e garantias fundamentais de outrem, causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa;
c) O sindicato organizar ou os trabalhadores participarem de piquetes substantivos do livre acesso ao trabalho ou de arrastões que retiram do local de trabalho os empregados que não aderiram à greve;
d) Prosseguir a greve após a decisão da Justiça do Trabalho;
e) A empresa adotar meios para constranger empregados a não participarem da greve ou para frustrar a divulgação do movimento.
O último item não pode ser considerado como de abuso de direito do Sindicato, mas como uma prática antissindical da empresa, que afronta o direito de greve de seus empregados.
Por seu turno, Süssekind classifica os abusos quanto a formalidades, oportunidade e objeto. Sobre as formalidades, lembra que cumpre ao sindicato observar o próprio estatuto a respeito da convocação da assembléia, o quórum para deliberar e o aviso prévio à categoria econômica correspondente. No tocante à oportunidade, a greve somente poderá se iniciar depois de malograda a negociação coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
A manutenção da greve mesmo depois da divulgação de acordo ou intimação de sentença em dissídio coletivo também é considerada abuso quanto à oportunidade. Sobre o objeto, a greve reconhecida pela Constituição tem a finalidade de revisão de condições de trabalho e não é reconhecida a legalidade de greves por objetos políticos ou de solidariedade externa.
Importa, no entanto, diferenciar a abusividade da ilegalidade. A greve será considerada abusiva quando exceder manifestamente a boa-fé, os bons costumes, as funções sociais ou econômicas. Por outro lado, será ilícita quando não for observado os limites estabelecidos pela lei.
A título de exemplo, a greve será considerada ilegal quando apresentadas irregularidades no processo de deflagração, tais como a não concessão de aviso prévio ou ausência de tentativa de negociação quando ocorrida na vigência de norma coletiva. Será abusiva, se o movimento paredista for destituído de fundamentação, violando a função social, for demasiado prolongado conduzindo a empresa à ruína por vilipêndio da função econômica.
Atividades sindicais abusivas durante a greve
A greve é um instrumento constante dos direitos dos trabalhadores como forma de provocar a negociação coletiva. Assim, diversas formas de pressão podem ser utilizadas, sendo que algumas possam ser consideradas como verdadeiros ilícitos, enquanto outras podem ser consideradas abusivas.
Os piquetes informativos e persuasivos mostram-se legítimos, pois visam apenas informar e persuadir os trabalhadores a aderirem à greve. Já os piquetes coativos, podem ser reputados ilícitos, especialmente se utilizada violência.
O Rattening (supressão dos instrumentos de trabalho) e a ocupação do estabelecimento violam o direito de propriedade, portanto, são ilegais.
O incentivo ao boicote de produtos da empresa mostra-se abusivo, pois vulnera o princípio da boa-fé e da função econômica.
A sabotagem é ato ilegal e criminoso, o mesmo sucedendo em relação à extorsão sindical (exigência de uma vantagem pelo sindicato para que não seja deflagrada a greve).
Abuso na organização sindical
Uma das heranças da estrutura sindical corporativista refere-se ao art. 522, da CLT, o qual fixa o número máximo de dirigentes sindicais, estabelecendo que não pode ser superior a sete. Em que pese a jurisprudência dos Tribunais Superiores admita a recepção do citado artigo pela atual Carta Magna, a celeuma persiste. Assim, se reconhecida a recepção do art. 522. consolidado pela Constituição Federal, tem-se como ilícita a fixação, em estatuto da entidade sindical, de número de dirigentes superior a sete, salvo se firmado mediante acordo coletivo.
Por outro lado, entende-se que se acatada a tese da impossibilidade de recepção, pela CF/88, do art. 522. da CLT, em face da expressa vedação de interferência do Poder Público na organização sindical (art. 8º, I, CF/88), então a teoria do abuso do direito terá ampla aplicação, sempre que o sindicato ultrapassar os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelas funções econômicas e sociais.
Abuso do direito de desmembramento das categorias
A regra do art. 570, da CLT, considerado em vigor pelo Supremo Tribunal Federal, determina que os sindicatos devem ser constituídos por categorias específicas. A exceção é prevista no parágrafo único do mesmo art. e no art. 571, pelos quais as categorias similares ou conexas, que façam parte de um mesmo sindicato, podem dissociar-se para formação de um sindicato específico.
Tais artigos são considerados revogados por Valentin Carrion (2003) , que invoca o art. 8º da Constituição Federal e a livre associação, principalmente quanto ao art. 571, pois não há mais a Comissão do Enquadramento Sindical para avaliar a legitimidade deste desmembramento.
Süssekind (1999, p. 344) confirma a vigência do art. 570, da CLT, citando a decisão do STF, mas admite, evidentemente, a extinção da comissão prevista no art. 571. e assevera que, não obstante a extinção desta comissão,
[...] o princípio que se deduz da norma legal pode e deve justificar a deliberação dos grupos interessados em prol desse desmembramento, desde que caracterizado o surgimento de uma nova categoria em decorrência do desenvolvimento socioeconômico, especialmente de nova tecnologia, formando uma unidade sociológica com ressonância nos hábitos da população e no mercado consumidor.
O mesmo autor considera relevante que as características específicas da atividade vinculem as empresas que a empreendem para demonstração da comunhão de interesses e ressalta que a concentração ou desmembramento de categorias depende de decisão da assembléia dos sindicatos interessados.
Lembra ainda, Sússekind, que o desmembramento deve se dar considerando a natureza da atividade e não o porte das empresas e faz referência a uma decisão da então competente 6ª Vara Cível de São Paulo, em que não foi reconhecida judicialmente a configuração da categoria do Sindicato das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte do Comércio.
Amauri Mascaro Nascimento (2000, p. 208) cita decisão do TST (SDC – RODC 239.943/96) em que há autorização para desmembramento de sindicatos, desde que respeitados os requisitos legais de sua constituição (convocação da categoria e deliberação, registro civil no AESB-MTB (Arquivo das Entidades Sindicais Brasileiras), inexistência de disputa judicial pela representatividade da categoria).
Sérgio Pinto Martins (2007, p. 616) considera que os artigos consolidados que tratavam de enquadramento e da comissão de enquadramento sindical foram revogados, lembrando que o Ministério do Trabalho não pode exigir autorização para o funcionamento do sindicato, nem pode intervir ou interferir na atividade sindical. Para o autor, em relação ao disposto no art. 571, da CLT, os próprios interessados podem criar novos sindicatos, desmembrando-os em relação aos anteriores, pois eles irão definir a criação do sindicato e a base territorial, que apenas não poderá ser inferior à área de um município.
Não há, portanto, o reconhecimento de um enquadramento formal em vigor. A liberdade de associação deve ser respeitada, mas o abuso em relação a este tópico se refere à criatividade das especificidades criadas, para que haja um enquadramento cada vez mais inexpressivo e não representativo.
Considera-se, portanto, um tipo de abuso da atividade sindical as manobras políticas de desmembramento da categoria, com o objetivo de auferir os ganhos da contribuição sindical. Não se trata de generalizar toda a ação de desmembramento, mas deve ser verificada a efetiva representatividade da categoria.
Abuso do direito do representante sindical
Como Chiarelli cita as comissões internas como criações de concorrência localista de um sistema globalizado para diminuição do poder dos sindicatos, consideramos ser este o próximo tipo de abuso a ser abordado.
Para o autor de “O Trabalho e o Sindicato: Evolução e Desafios” a representatividade local das comissões passou a ser uma concorrência ao sindicato, que então, acaba, na maioria das situações do cotidiano, por ter uma verdadeira aversão a este tipo de representação dos trabalhadores. Chiarelli considerou que a ação das comissões internas causou a compressão da ação sindical, dificultando uma mobilização dos trabalhadores perante o sindicato, o qual deveria alargar sua atuação à amplitude categorial e não se restringir ao limitado grupo de pessoal da empresa.
Todavia, não se trata de atividade sindical delegada, na forma como prevista no art. 11, da CF, a representação dos trabalhadores. O abuso que poderia surgir por parte do sindicato seria restrito a eventual boicote de informações e criação de dificuldades caso haja necessidade de uma ação conjunta.
O que se tem verificado é uma interferência do sindicato nas representações internas dos trabalhadores, o que pode até mesmo ser considerado como uma somatória de forças, na medida em que há uma cobrança de parcelas ou benefícios específicos para uma empresa, como, por exemplo, melhoria do café da manhã oferecido pelo empregador, papel que caberia à representação interna.
Nesta visão de Chiarelli, estaria ocorrendo um abuso do direito sindical, o qual perdeu sua visão de representante da categoria, para limitar sua atuação à geografia doméstica.
Abuso do direito de liberdade de associação
A liberdade de associação foi garantida pelo art. 8º, da Constituição Federal e atividades sindicais que induzem o trabalhador ou o empregador (o que é mais difícil ocorrer) a se associar são, evidentemente, consideradas abusivas. O inciso V, do art. 8º prevê a liberdade de filiação.
A discussão acerca da formação de entidade sindical e da ampla liberdade do direito sindical foi analisada, considerando o tema do abuso sindical, no tópico referente ao desmembramento de sindicatos.
Os grupos de trabalhadores ou empregadores que são vinculados pelo exercício de atividades profissionais e econômicas idênticas ou similares, ou conexas, podem constituir o respectivo sindicato, desde que respeitada a unicidade sindical. Esta regra última fere a liberdade sindical sugerida pela Convenção 87, da OIT, mas a liberdade de associação é garantida relativamente aos integrantes das categorias respectivas.
Este exemplo é citado por Kauffman (2005) ao descrever as práticas antissindicais originárias do próprio sindicato, como a celebração de convênios coletivos com cláusulas de “segurança sindical”, pelas quais se firma um acordo com o empregador para induzir o trabalhador à filiação ou à desfiliação.
Abuso do direito de fixação do número de diretores
A entidade sindical tem a liberdade para dispor sobre sua constituição, estruturação, número de seus diretores, segundo seu exclusivo interesse e de seus associados.
Situações consideradas como de abuso desse direito, com o objetivo de fazer frente ao poder potestativo do empregador de extinguir os respectivos contratos de trabalho em face da estabilidade dos diretores, são a fixação de diretores em número muito superior ao disposto no art. 522, da CLT.
Para Sérgio Pinto Martins a limitação do número de diretores pelo art. 522, da CLT, não importa em intervenção do Estado, mas em mera disciplina por parte da lei e não haveria ofensa à autonomia interna do sindicato e, portanto, este artigo não estaria revogado. Esta é a conclusão estampada na decisão do STF, abaixo transcrita:
CONSTITUCIONAL TRABALHO. SINDICATO: DIRIGENTES: CLT, art. 522: RECEPÇÃO PELA CF/88, art. 8º, I. I. - O art. 522, CLT, que estabelece número de dirigentes sindicais, foi recebido pela CF/88, artigo 8º, I. II. - R.E. conhecido e provido.
(RE 193.345.3 - SC, Rel. Min. Carlos Velloso, Ac. 2ª T, 13.4.99 in LTr 63-09/1207).
Embora a Constituição não preveja, há quem defenda que um limite no número de dirigentes e representantes sindicais é impositivo, pelo menos para o efeito de aquisição da estabilidade provisória no emprego e que podem ser criados tantos cargos de direção quanto necessários, mas a garantia de emprego somente beneficia dirigentes em número não superior aos cargos previstos no art. 522, da CLT.
Para Edilton Meireles (2004, p. 263), em sua tese de doutorado sobre Abuso do direito na relação de emprego, o art. 522, da CLT estaria revogado pela vedação constitucional de interferência do Poder Público na organização sindical (art. 8º, inciso I), mas, para ele, se o sindicato, no exercício do seu direito de se auto-organizar, ultrapassar os limites impostos pela boa-fé, bons costumes e pelas funções econômica e social, estaria configurado o abuso do direito.
Abuso do direito de cobrança de contribuições
Outro abuso identificado dentre as atividades sindicais são as cobranças e os valores fixados a título de contribuições assistenciais e confederativas e a possibilidade do uso do direito de oposição.
Martins defende, ao comentar o art. 54, da CLT, que este dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o art. 462, da CLT, e que o sindicato deveria notificar tanto o empregado como o empregador dos valores das contribuições que serão descontadas em folha.
O direito de oposição deve ser garantido ao empregado, sob pena de se considerar o abuso do direito da entidade sindical. A única contribuição que independe da vontade da pessoa em contribuir é a sindical e esta pode ser descontada do empregado, sem seu consentimento. As demais contribuições devem ser autorizadas (assistencial, confederativa e a mensalidade sindical).
O impedimento da oposição importaria numa filiação obrigatória, o que contraria o inciso V, art. 8º, da Constituição Federal. Já os associados não podem se opor à cobrança, pois deveriam estar presentes à Assembléia que fixou os valores.
A seguinte decisão do TST ilustra o direito de oposição:
A estipulação em convenção coletiva de contribuição para o sindicato dos empregados e que será descontada pelo empregador do salário deles, exige, para sua validade, que se assegure a eles o direito de oposição como previsto no art. 545. da CLT e no Precedente Normativo n. 74. do TST. Ação julgada procedente para declarar a nulidade da cláusula que ignorou o direito de oposição do empregado.
(TST 112670/94.3, Ac. SDC 214/85, j. 04/04/95, Rel. Min. Manoel Mendes de Freitas, in LTr 59/05/648).
Abuso do direito de homologação das rescisões contratuais
Trata-se de função representativa individual a atribuição da entidade sindical que presta assistência ao trabalhador quando da rescisão contratual. Em que pese a dificuldade em se localizar material teórico acerca do tema, essa situação já foi vivenciada pela maioria dos advogados que militam na área trabalhista: a recusa do sindicato em homologar a rescisão contratual.
Essa prática comum das entidades sindicais acaba por dificultar ao empregado o exercício de seu direito em ter seus depósitos em conta vinculada liberados perante a CEF.
O fato de o sindicato discordar de valores, títulos ou até mesmo do motivo da rescisão não poderia ser justificativa para deixar de homologar o TRCT, eis que há a possibilidade de se ressalvar os direitos faltantes no verso do documento.
Trata-se de uma postura inflexível do sindicato que contribui para que o empregado desinformado somente tenha prejuízos posteriores, eis que dependerá de ajuizamento de reclamação trabalhista para conseguir a liberação dos valores de FGTS.
Abuso do direito de previsão de cláusulas normativas
A função negocial das entidades sindicais tem limites que devem ser observados. São amplas as possibilidades de validade e eficácia jurídica das normas coletivas, mas os limites são os atos estritos de renúncia sobre direitos de terceiros ou de parcelas indisponíveis, como anotação em CTPS, pagamento de salário mínimo e normas de medicina e segurança do trabalho.
Cláusulas que importam em ofensa à dignidade da pessoa humana ou contenham conotação discriminatória também não devem constar dos instrumentos normativos.
Outra praxe identificada em convenções coletivas e considerada abusiva é a fixação de verbas denominadas PLR sem qualquer vinculação efetiva ao lucro, como um valor específico.