Efeitos da abusividade
Considerando-se que as normas trabalhistas são de ordem pública, exatamente como aquelas referentes ao sistema de proteção ao consumidor, entendemos que devem incidir em relação a ambas os mesmos efeitos. Portanto, tendo em vista a previsão legal emanada do art. 51, do Código de Defesa do Consumidor, que reputa nulas de pleno direito as cláusulas abusivas, temos que em relação do Direito do Trabalho a hipótese é, também, de nulidade de pleno direito, com efeitos ex tunc, portanto, e não de anulabilidade.
As soluções apresentada pelo Direito para a nulidade dos atos jurídicos abusivos dividem-se entre sanção direita e sanção indireta. Naquela, concretiza-se a reparação in natura, restituindo-se as partes ao status quo ante, sem prejuízo da reparação civil pertinente. Nesta (sanção indireta), ante a impossibilidade de retorno à situação anterior, mantém-se o ato abusivo, assegurando-se o pagamento de indenização reparatória material e moral, quando houver.
Mecanismos de Tutela
Múltiplas são as medidas de proteção contra atos antissindicais. Vão desde as preventivas até as reparatórias, sem excluir sanções administrativas e penais. Assim, a despedida de um dirigente sindical e de um membro de comissão interna pode gerar uma autuação pela autoridade competente33 e sanções de ordem penal, anulação de ato e reintegração no emprego e pagamento de indenização, inclusive por danos morais.
Doutrina significativa sistematiza os meios de tutela contra a conduta antissindical em:
a) medidas de proteção,
b) mecanismos de reparação,
c) outros meios de proteção, tais como publicidade, sanções penais e administrativas, (Giugni, 1991, p. 89) nada impedindo que esses mecanismos, como já noticiado acima, apresentem-se de forma cumulada.
Como medida de prevenção são arrolados apreciação prévia de dispensa por órgão interno ou administrativo e as medidas judiciais preventivas (tutela inibitória, antecipada e até cautelares satisfativas para os países que não possuem essas duas primeiras modalidades de tutela de urgência) (Giugni,1991, p. 89).
No campo dos mecanismos de reparação, temos a demanda dirigida à reintegração do trabalhador, vítima de ato discriminatório e antissindical. Essa ação, que pressupõe a nulidade da despedida, por ser ajuizada pelo obreiro ou pelo sindicato na qualidade de substituto processual. Há inegável interesse coletivo legitimante da atuação do ente sindical (art. 8º, III, da CF), pois a garantia no emprego, a estabilidade, a proibição de despedidas injustificadas e discriminatórias de lideranças sindicais e obreiras transcendem o plano individual para alcançar toda a categoria, o que não será possível se o agente de suas reivindicações for afastado do emprego a qualquer momento (Uriarte, p. 54-57).
A reparação também pode ser alcançada, de forma imperfeita e incompleta, via indenização. Em apenas casos extremos, ela deve ser posta em lugar da reintegração (extinção da empresa e término da estabilidade sindical, por exemplo).
A reintegração e a excepcional indenização substitutiva dessa obrigação de fazer não excluem o direito à indenização por danos morais porventura sofridos pelo trabalhador (art. 5º, X, da CF).
Entre os outros meios de proteção à atividade sindical, encontram-se os meios penais (multas e tipificação do ilícito como crime), publicitários (divulgação da prática antissindical em jornais, periódicos etc.) e a autotutela (greves e movimentos afins).
Para garantir o respeito ao direito de sindicalização, a Convenção n. 98, da OIT, prevê mecanismos de prevenção, de reparação e outros, entre eles, a aplicação de medidas de natureza penal e a autotutela coletiva. O mecanismo de prevenção tende a impedir que o ato antissindical se concretize ou que seus efeitos se materializem, sendo o mais divulgado aquele que condiciona a validade do ato à comunicação ou autorização prévia de determinado órgão, que poderá ser judicial, administrativa, sindical ou conselho de empresa.
Já os meios de reparação consistem: em declarar a nulidade do ato, com a consequente reintegração do empregado ou então em converter os seus efeitos em indenização. A doutrina espanhola considera que o simples efeito anulatório do ato lesivo é insuficiente para restabelecer a integralidade desse direito fundamental, que é a liberdade sindical. Sugere, para neutralizar a conduta antissindical, uma sanção (indenização por dano moral) que seja pelo menos igual ao prejuízo causado, do contrário ficará comprometida a efetividade desse direito fundamental consagrado na Constituição. O dano daí advindo deve ser compensado em função da lesão a um bem extrapatrimonial. Essa tutela reparadora, a par de seu caráter compensador, visa ainda restituir a confiança ou credibilidade da ação sindical e devolver ao sindicato as armas e os instrumentos de tutela de seus direitos, dissuadindo o agente da conduta sindical a reincidir no comportamento lesivo (Goni Sein, 1996, p. 16-21).
Os agentes da conduta antissindical
Geralmente, são os empregadores ou as suas organizações, admitindo-se, entretanto, que o Estado, quer como empregador, quer como legislador, também incorra na prática desses atos.
As próprias organizações de trabalhadores podem praticar atos antissindicais contra os empregados ou seus sindicatos. E assim é que os sindicatos, em determinados momentos, têm visto nas cooperativas ou em outras instituições, uma forma de desestimular a sindicalização.
As entidades sindicais que congregam trabalhadores também poderão praticar atos antissindicais, prejudicando o trabalhador, outro sindicato, o empregador ou suas organizações.
Aspectos Processuais (competência, prova e onus probandi)
Competência
As demandas resultantes de atos antissindicais perpetrados pelo empregador, inclusive se este é o Estado, são de competência da Justiça do Trabalho (arts. 114. e 173, § 1º, da CF), pouco importando a fonte do direito que dá suporte ao pedido (CLT ou direito comum).
Alice Monteiro Pensamos que a competência da Justiça do Trabalho se afirma mesmo se relacionada à conduta antissindical ocorrida quando da admissão, seleção de pessoal e tratativas pré-contratuais (Monteiro de Barros, p. 1456-1457). Aliás, são muito frequentes os atos contrários à liberdade sindical quando da fase pré-contratual e logo no início do pacto empregatício.
Essa questão traz à tona antiga controvérsia, a propósito da competência trabalhista para o dano pré-contratual. Pela competência: MARANHÃO, Délio. Instituições de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: LTr, v. 1, p. 241; MASCARO NASCIMENTO. Iniciação ao direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, p. 130; TOSTES MALTA. Prática do processo do trabalho. 19. ed., p. 253; MONTEIRO DE BARROS, Alice. Ob. cit., p. 1456-1457. Contra: DALAZEM, Orestes. Competência material trabalhista. LTr, p. 105; LAMARCA, Antônio. O livro da competência. São Paulo-Rio de Janeiro, p. 118. Pensamos que a nova redação do art. 114. da CF, com a alteração imposta pela EC 45/04, reforça a primeira corrente, evidenciando o nítido escopo de ampliar a competência material trabalhista.
Prova e onus probandi
Para efetividade dos meios preventivos e de repressão da conduta antissindical, insuficientes, muitas vezes, são as formas materiais, as sanções administrativas e penais e até os provimentos de urgência. Isso porque a prova do ato de ingerência, retaliação e discriminatório, sobretudo este último, quase sempre são de fácil demonstração.
O princípio da inversão do ônus da prova em favor do hipossuficiente, em detrimento daquele que melhor aptidão tem para a prova, acolhido no Código de Defesa do Consumidor e que orienta o processo do trabalho tem plena incidência nas hipóteses de demonstração de atos antissindicais. A Convenção OIT nº 158 (art. 9º), a Recomendação nº 143 da OIT (n. 2, e, do art. 6º) e o comitê de liberdade sindical autorizam essa conclusão, conforme noticiam Uriarte e Bartolomei de La Gruz (apud Uriarte). Na doutrina brasileira, Alice Monteiro de Barros, apoiada em Yolanda Valdeolivas Garcia, esposa o mesmo entendimento.
Conduta antissindical
No Brasil, a liberdade de associação, como vimos, é reconhecida pelo texto constitucional, entretanto, nossa legislação ordinária não contém uma seção intitulada “foro sindical”, “práticas desleais” ou “condutas antissindicais”, mas há seção que trata dos direitos dos sindicalizados. Entretanto, no art. 543, da CLT, assegura-se estabilidade provisória aos empregados que exercem cargo de representação sindical ou administração profissional, inclusive junto a órgão de deliberação coletiva, ainda que suplentes.
Essa garantia implica na impossibilidade de dispensa destes empregados desde o momento do registro da candidatura aos citados cargos e, se eleitos, até um ano após o término do mandato. Excetua-se da proibição a dispensa por falta grave reconhecida em inquérito, a teor da Súmula 197, do STF.
A garantia assegurada ao trabalhador tem em mira evitar que a representação fique comprometida pela represália patronal, ou se veja ele desguarnecido quando termina o mandato; o período de garantia fixado pela lei tende a eliminar qualquer aspereza ou dissensão que, porventura, tenha ocorrido durante a gestão.
A par da estabilidade provisória assegurada, o referido dispositivo legal proíbe ainda a transferência desse empregado e qualquer obstáculo que o impeça de exercer as atribuições sindicais.
Até há alguns anos atrás não tínhamos uma sanção eficaz, capaz de garantir a tempestividade da tutela jurisdicional ao dirigente de sindicato, pois a jurisprudência que predominava na mais alta Corte trabalhista desautorizava liminar de reintegração desse dirigente, por considerar a medida satisfativa; por outro lado, a tutela preventiva esbarrava na ausência de prova inequívoca de verossimilhança, exceto quando a dispensa do dirigente se verificasse sumariamente, sem inquérito. Ocorre que a partir de 1996 o legislador inseriu no art. 659, o inciso X, da CLT, atribuindo competência ao juiz presidente de Junta para “Conceder medida liminar, até decisão final do processo, em reclamações trabalhistas que visem reintegrar no emprego dirigente sindical afastado, suspenso ou dispensado pelo empregador.” Essa inovação legislativa contribui, sem dúvida, para tornar o mecanismo de proteção mais real, pois em muitos casos, quando transitavam em julgado decisões dessa natureza, o mandato sindical e a estabilidade provisória assegurada já haviam se exaurido. Logo, a única solução era converter a reintegração em parcelas indenizatórias, reparação insuficiente quando estão em jogo não só os interesses individuais, mas também os interesses coletivos.
No art. 165, da CLT, assegura-se a garantia de emprego aos titulares da representação dos empregados na Comissão Interna de Prevenção contra Acidente do Trabalho (CIPA), garantia essa estendida aos suplentes a partir da Constituição de 1988 (art. 10, II, “a”, do ADCT e En. 339, do TST).
Com a ratificação pelo Brasil da Convenção 135 da OIT, em 1991, a estabilidade provisória deverá ser assegurada também aos representantes de empregados nas empresas com mais de duzentos empregados (art. 11, da Constituição). Verifica-se, nitidamente, no direito positivo brasileiro, a evolução do conceito de atos antissindicais, no sentido de incluir no alcance subjetivo de proteção contra essas práticas também os membros de CIPA e os representantes dos empregados a que alude o art. 11, da Constituição, proibindo-lhes a dispensa injusta.
Como é sabido, não só a legislação brasileira, mas também o TST, através de Precedentes em dissídios coletivos, tem procurado tornar efetivo o exercício da liberdade sindical, consagrando, a par das garantias ao dirigente sindical (art. 543. consolidado e Precedente Normativo 83, do TST, que assegura a frequência livre desses dirigentes às assembleias sindicais devidamente convocadas e comprovadas), o direito de afixar, no interior da empresa, publicações relativas à matéria sindical, dando virtualidade ao comando contido no art. 614, § 2º consolidado.
É o que se infere do Prec. DC 104, do TST, quando assegura o direito de afixação, na empresa, de quadro de avisos do sindicato, para comunicados de interesse dos empregados, vedados os de conteúdo político-partidário ou ofensivo.
A evolução do conceito de ato antissindical manifesta-se, ainda, no § 6º, do art. 543, da CLT, quando sujeita o empregador à sanção administrativa, sem prejuízo da reparação a que tiver direito o empregado, se, por qualquer modo, impedi-lo de se associar a sindicato, de organizar associação profissional ou sindical ou de exercer os direitos inerentes à condição de sindicalizado. O citado dispositivo legal confirma a tendência do conceito moderno de ato antissindical, incluindo no seu campo de incidência não só os dirigentes sindicais, mas outros trabalhadores, tentando facilitar-lhes o exercício da liberdade sindical, neste momento histórico em que os sindicatos mostram-se enfraquecidos e precisam ser fortalecidos, para impedir a desregulamentação no tocante a garantias constitucionais mínimas e atuar eficazmente na flexibilização convencional.
No Brasil, temos exemplo de conduta antissindical praticada pelo Estado no exercício de seu poder regulamentar, antes da Constituição de 1988, quando estabelecia privilégio para os empregados sindicalizados, na admissão nas empresas que explorassem serviços públicos, no ingresso em funções públicas em caso de cessação coletiva do trabalho, nas concorrências para aquisição de casa própria pelo Plano Nacional de Habitação, nos loteamentos urbanos ou rurais promovidos pela União ou pelos seus órgãos, entre outros arrolados no art. 544, da CLT. Esse dispositivo, embora tivesse em mira incentivar a sindicalização, viola a liberdade sindical, que consiste não só em constituir sindicato e nele ingressar, mas também dele se desligar, se conveniente. Portanto, o desligamento do associado não poderia constituir motivo para impedi-lo de desfrutar dos benefícios acima mencionados, sob pena de discriminação.
Atualmente, em face do art. 8º, I, da Constituição, esse dispositivo é interpretado por muitos doutrinadores como derrogado, pois implica interferência do Poder Público na organização sindical; entretanto, persistem a contribuição sindical compulsória e a unicidade sindical, institutos que ferem a liberdade sindical e constituem ato antissindical praticado pelo Estado na sua função de ditar normas.
Outra forma de ato antissindical, mas cujo agente é a própria organização gremial dos empregados, consiste em indicar um número excessivo de dirigentes sindicais. Não se discute a liberdade do sindicato de se organizarem, sem interferência do Estado. Todavia, essa autonomia sindical deverá ser exercida dentro dos limites legais. Isto porque o direito de o sindicato eleger sua diretoria vai interferir na relação contratual entre empregado (dirigente sindical) e seu empregador, restringindo-lhe o direito potestativo de resilição contratual. Logo, se se impuser ao empregador um número ilimitado de dirigentes, ficará ele sujeito ao arbítrio do sindicato, competindo ao Judiciário coibir tais abusos, que acabarão por implicar uso anormal de um direito, já que desviado de sua finalidade.
Prescreve o art. 522, da CLT, que a administração do sindicato seria exercida por uma diretoria constituída, no máximo, de 7 e, no mínimo, de 3 membros e de um Conselho Fiscal composto de 3 membros.
Neste sentido, comungamos o seguinte precedente abaixo colacionado:
“DIRIGENTES SINDICAIS - QUANTITATIVO DE LIVRE ESTIPULAÇÃO PELA ENTIDADE - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AUTONOMIA NA ORGANIZAÇÃO - BENEFICIÁRIOS DA GARANTIA PROVISÓRIA DE EMPREGO ASSEGURADA PELO ART. 8º, INCISO VIII, DA CARTA POLÍTICA DE 1988 - A SUJEIÇÃO À PREVISÃO LEGAL ORDINÁRIA - IMPOSSIBILIDADE DE ATRIBUIÇÃO DE ÔNUS AO EMPREGADOR PELA VIA DOS ESTATUTOS DO SINDICATO PROFISSIONAL. Conquanto esteja ao arbítrio das entidades sindicais o estabelecimento da composição e funcionamento de seus órgãos administrativos, no que se inclui a deliberação quanto ao número de membros integrantes de cada qual, não pode a norma estatutária substituir-se à lei para criar, obliquamente, obrigação a cargo do empregador, qual seja a de assegurar estabilidade no emprego irrestrita para quantos candidatos a cargos diretivos viabiliza a estrutura da entidade, a propósito do previsto no art. 8º, VIII, da Carta Política, mormente quando a ordem jurídica em vigor não contempla garantias contra a dispensa imotivada para a generalidade dos trabalhadores, remetendo-as ao plano da lei complementar. Admitir-se a aplicação ilimitada, extensiva da norma estatutária afrontaria, a um só tempo, o disposto no art. 5º, inciso II, da própria Constituição, como também o princípio da isonomia de tratamento, porque estaria criada, nas cúpulas sindicais, uma carta privilegiada. Na inexistência, portanto, de incompatibilidade entre o direito assegurado no art. 8º, VIII, da Constituição de 05 de outubro de 1988, que não é inovatório, e os critérios fixados pelos art. 522, 538 e 543, da CLT, para o fim de limitação objetiva do universo de trabalhadores a ser beneficiado pela garantia excepcional, deve a norma estatutária que dispõe sobre o número de dirigentes do Sindicato profissional e integrantes dos Conselhos respectivos ser interpretada, quanto a seu alcance, à luz das disposições celetárias recepcionadas pela nova ordem jurídica estabelecida a partir de 05.10.1988. Recurso Ordinário conhecido e provido."
DJ 07.08.98.
O rol dos casos concretos é extenso, situando-nos em uma ampla casuística, que tem como elemento comum o fato de que quanto maior forem as margens de discricionariedade e unilateralidade do poder de comando do empregador na fixação das condições de trabalho, mais acentuada é a possibilidade de adoção de medidas aparentemente lícitas, mas que, a rigor, ocultam tratamento discriminatório em relação aos empregados mais empenhados sindicalmente. Esse fato agrava-se em época de crise. Urge, portanto, um controle desse poder econômico organizativo, reclamando um papel mais atuante das convenções coletivas.