Considerações sobre os partidos políticos no sistema jurídico brasileiro

Partidos Políticos no Brasil

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21/07/2021 às 20:48
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[1] Partido político é, no dizer de José Afonso da Silva, uma forma de agremiação de um grupo social que se propõe organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular com o fim de assumir o poder para realizar seu programa de governo. Pinto Ferreira (op. cit., p. 235) leciona que eles podem ser definidos como grupos sociais, geralmente regulados pelo direito público, vinculando pessoas que, tendo a mesma concepção sobre a forma desejável da sociedade do Estado, se congregam para a conquista do poder político.

[2] Konrad Hesse (29 de janeiro de 1919 em Königsberg, Prússia Oriental, † 15 de março de 2005 em Freiburg im Breisgau) foi um jurista alemão que, de 1975 até 1987, exerceu a função de Juiz do Tribunal Constitucional Federal alemão, localizado em Karlsruhe. A influência do pensamento de Konrad Hesse no Brasil é profunda e tal se deve, por meio indireto, à tradição do Direito Constitucional português, por efeito das obras de seu discípulo José Joaquim Gomes Canotilho. E, de modo direto, às traduções de seus livros no Brasil, especialmente A força normativa da constituição, por Gilmar Ferreira Mendes, e Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha, por Luís Afonso Heck, ambos publicados por Sergio Antonio Fabris Editor. Mais recentemente, Otavio Luiz Rodrigues Junior traduziu Direito constitucional e direito privado, editado pela Forense Universitária. Os escritos de Hesse são até hoje muito citados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.  Uma crise permanente passou a ser a história. Como diz Konrad Hesse, "a Constituição jurídica está condicionada pela realidade histórica. Ela não pode ser separada da realidade concreta de seu tempo. Nada mais real.   (In: Hesse, Konrad.  Força Normativa da Constituição. Tradução: Gilmar Mendes. Sergio Antonio Fabris Editor. Porto Alegre: 1991, p. 24).

[3] Podemos, assim, afirmar que o Poder Executivo tem como função típica a administrativa (ou executiva), por meio da qual se busca, de modo direto e imediato, a realização de determinada utilidade pública, mediante a aplicação das leis a situações em concreto; mas, além desta, detém atribuições de caráter legislativo (quando, por exemplo, edita medidas provisórias) e jurisdicional (quando decide litígios em âmbito administrativo). Da mesma forma, o Legislativo precipuamente legisla (expede atos gerais e abstratos que inovam na ordem jurídica) e fiscaliza, mas também, de forma atípica, julga (o Senado, por exemplo, tem competência para julgar o Presidente da República, nos crimes de responsabilidade) e administra (quando promove um concurso público, para o preenchimento de seus cargos, ou uma licitação, para a celebração de determinado contrato). E o Judiciário, a exemplo dos demais Poderes, além de sua função típica – a jurisdicional, pela qual são solucionados litígios jurídicos de forma definitiva –, também atipicamente exerce atribuições de caráter legislativo (quando os Tribunais elaboram seus respectivos regimentos internos, por exemplo) e administrativo (quando contrata seu pessoal e organiza os serviços de suas secretarias).

[4] Os sistemas partidários definem, basicamente, o número de partidos admitidos: um, dois ou vários, respectivamente, unipartidarismo (mono), bipartidarismo ou polipartidarismo (multi, pluri). Os sistemas eleitorais, em resumo, indicam dois princípios fundamentais de “justiça política distributiva”: o sistema majoritário e o sistema proporcional. Sistema majoritário é aquele em que, no interior de um distrito eleitoral (também chamado de colégio ou circunscrição), quem ganha o maior número de votos recebe todos os postos/representantes a serem eleitos naquela área. Quem ganha leva tudo. Sistema proporcional é aquele em que as cadeiras em jogo são distribuídas segundo os votos recebidos, de modo proporcional, como o nome indica. Assim, por exemplo, se houver uma eleição para escolher 10 deputados e concorrerem o partido A e B, o primeiro com 10% dos votos e o segundo, com 40%, no primeiro sistema, o partido A receberia as 10 cadeiras e, no segundo sistema, o partido A receberia seis cadeiras e o B teria quatro. Além de escolher a fórmula eleitoral, o sistema eleitoral também se preocupa com o procedimento a ser adotado pelo eleitor, com a estrutura do distrito e do boletim de votos.

[5] No Brasil. O Brasil teve um período bipartidarista durante 12 anos, entre 1966 e 1979, quando havia apenas a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Em 1966, a ARENA elegeu 19 dos 22 governadores elegíveis (além de quatro nomeados diretamente pelo presidente da República).

[6] Esses são os 33 partidos atualmente registrados no TSE, por ordem de fundação:  Movimento Democrático Brasileiro (MDB); Partido Trabalhista Brasileiro (PTB); Partido Democrático Trabalhista (PDT); Partido dos Trabalhadores (PT); Democratas (DEM); Partido Comunista do Brasil (PC do B); Partido Socialista Brasileiro (PSB); Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB); Partido Trabalhista Cristão (PTC); Partido Social Cristão (PSC); Partido da Mobilização Nacional (PMN); Cidadania; Partido Verde (PV); Avante; Progressistas (PP) Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU); Partido Comunista Brasileiro (PCB); Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB); Democracia Cristã (DC); Partido da Causa Operária ; Podemos (Pode); Partido Social Liberal (PSL); Republicanos; Partido Socialismo e Liberdade (PSOL); Partido Liberal (PL); Partido Social Democrático (PSD); Patriota; Partido Republicano da Ordem Social (PROS); Solidariedade; Partido Novo (Novo); Rede Sustentabilidade (Rede); Partido da Mulher Brasileira (PMB); Unidade Popular (UP).

[7] O sistema partidário brasileiro sofre de uma inversão perversa: para se criar uma legenda há uma série de exigências e dificuldades. Mas, uma vez superadas, o simples fato de existir já dá ao partido uma generosa participação no butim do Fundo Partidário e do tempo de rádio e televisão, tudo custeado pelo contribuinte brasileiro. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/editoriais/liberdade-partidaria 48s8gzrcksb9twcmzai3ultn2/ Acesso em 21.07.2021.

[8] Contudo, cabe aqui uma diferenciação importante: a vontade geral não é sinônimo de vontade da maioria ou de todos. Isso porque a vontade da maioria é uma simples soma numérica de vontades particulares que não reflete o uso da razão. Um exemplo que torna isso mais visível é o que aconteceu no holocausto: mesmo que a maior parte dos alemães estivesse em comum acordo com Hitler, suas atitudes não atendiam à vontade geral, pois não eram esclarecidas pela razão. Segundo o professor e mestre em direito constitucional Edgard Leite: “Resumidamente, no Estado Democrático de Direito, as leis são criadas pelo povo e para o povo, respeitando-se a dignidade da pessoa humana”. Dessa forma, o Estado Democrático de Direito é uma forma de Estado em que a soberania popular é fundamental. Além disso, é marcado pela separação dos poderes estatais, a fim de que o legislativo, executivo e judiciário não se desarmonizem e comprometam a soberania popular. Outro ponto importante que caracteriza essa forma de Estado é o respeito aos Direitos Humanos que são fundamentais e naturais a todos os cidadãos. Assim, é possível perceber a importância do que está escrito no artigo 1º da Constituição Federal, que foi exposto no início do texto. Ou seja, o Estado Democrático de Direito permite que nos organizemos em uma sociedade minimamente justa e estável, com relações de poder que tragam mais benefícios que prejuízos.

[9] O Estado Democrático de Direito é diferente do Estado de Direito pela soberania do que chamamos de “vontade geral”, conceito que é trabalhado pelo teórico Rousseau em seu livro “O contrato social”. Sendo assim, a vontade geral é o atendimento do interesse comum da sociedade, obtido por meio do consenso das partes.

 

[10] Em atenção aos questionamentos nos remete a transição do Estado Legislativo para o Estado Constitucional, quando ocorreram mudanças na compreensão do Direito, em consequência também na prestação jurisdicional. O Estado, que outrora era alvo de abstenção e de direitos negativos por parte de seus cidadãos, passa a procurar uma reaproximação com a passagem para o Estado Constitucional. Sob uma perspectiva, isso acarreta mudança na postura do juiz, enquanto representante do Estado, e por alterações na própria compreensão do Direito, que deixa de exercer atividade meramente mecânica de aplicação da lei e passa a ser demandado de uma tarefa de reconstrução do sentido normativo para que preste a devida tutela dos direitos. Noutra perspectiva, para que ocorra os estreitamentos dos laços do Estado com o cidadão, é necessário vinculá-lo a decisão judicial, e, portanto, há de ser enaltecido o papel da confiança nesta relação. Sem dúvida, a sentença efetiva há de vincular seus destinatários. Todavia, no Estado Constitucional não basta o uso do poder de império, a seres racionais cabem resoluções racionais e cognoscíveis pelos seus destinatários. In: WESTON, Mônica. O Estado Constitucional, o Estado que se justifica: Disponível em: https://processualistas.jusbrasil.com.br/artigos/574587455/o-estado-constitucional-o-estado-que-se justifica Acesso em 21.7.2021.

[11] Revolução de 1930 foi o movimento armado, liderado pelos estados de Minas Gerais, Paraíba e Rio Grande do Sul, que culminou com o golpe de Estado, o Golpe de 1930, que depôs o presidente da República Washington Luís em 24 de outubro de 1930, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes e pôs fim à República Velha. A Revolução de 1930 é considerada o acontecimento da história do período republicano brasileiro que pôs fim à chamada República Velha e, mais do que isso, foi o acontecimento que também deu fim às articulações políticas entre as oligarquias regionais do Brasil, que sobrepunham os seus interesses particulares aos interesses do Estado e da Nação como um todo. O principal protagonista da Revolução de 1930 foi Getúlio Dorneles Vargas, então presidente (nome que se dava aos governadores da época) do estado do Rio Grande do Sul.

[12] O voto de cabresto é um mecanismo de acesso aos cargos eletivos por meio da compra de votos com a utilização da máquina pública ou o abuso de poder econômico. É um mecanismo muito recorrente no interior do Brasil como característica do coronelismo. A figura do coronel era muito comum durante os anos iniciais da República, principalmente nas regiões do interior do Brasil. O coronel era um grande fazendeiro que utilizava seu poder econômico para garantir a eleição dos candidatos que apoiava. Era usado o voto de cabresto, onde o coronel obrigava e usava até mesmo a violência para que os eleitores de seu "curral eleitoral" votassem nos candidatos apoiados por ele. Como o voto era aberto, os eleitores eram pressionados e fiscalizados por capangas do coronel, para que votassem nos candidatos por ele indicados. O coronel também utilizava outros recursos para conseguir seus objetivos políticos, tais como compra de voto, votos fantasmas, troca de favores, fraudes eleitorais e violência.

[13] A Primeira República iniciou sua fase decadente na década de 1920. A entrada de novos atores na política nacional, como os tenentistas, contribuiu para seu fim. O desgaste do pacto que mantinha as oligarquias minimamente em paz também contribuiu para o fim desse período da história brasileira. Na década de 1920, os tenentistas foram uma força que abalou a estrutura da Primeira República. Isso aconteceu porque os tenentistas reivindicavam o fim das estruturas oligárquicas que estavam estabelecidas no país. Ao longo da década de 1920, os tenentistas realizaram uma série de revoltas por todo o país como a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, a Revolta Paulista de 1924 e a Coluna Prestes. Importante mencionar que a Primeira República foi um período marcado por tensões sociais que resultaram em conflitos por diferentes regiões do Brasil. Aqui podemos citar a Guerra de Canudos, Revolta da Armada, Guerra do Contestado, Revolta da Vacina, Revolta da Chibata etc. Leia este texto para saber mais sobre revoltas da Primeira República.

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[14] Borges de Medeiros é representante da primeira geração republicana. Em 1903, após a morte de Júlio de Castilhos, chamado "O Patriarca”, assumiu a liderança do Partido Republicano Rio-grandense (PRR). Borges de Medeiros também atuou no levante constitucionalista de 1932, quando apoiou os paulistas, no movimento legalista. Em 1924, Borges enviou efetivos da Brigada Militar gaúcha para combater o levante tenentista deflagrado, naquele ano, na capital paulista contra Bernardes. Logo, porém, foi obrigado a enfrentar rebeliões semelhantes em seu próprio estado quando guarnições do Exército localizadas em cidades do interior se sublevaram sob o comando do capitão Luís Carlos Prestes. Em 1945, foi aclamado como presidente de honra da seção gaúcha da União Democrática Nacional (UDN), mas não retomou a atividade política.

[15] O Código Eleitoral de 1932, instituído pelo Decreto nº 21.076 de 24 de fevereiro de 1932, trouxe significativos avanços político-sociais, dentre eles: voto feminino; voto secreto; sistema de representação proporcional, em dois turnos simultâneos. O voto feminino no Brasil foi instituído a partir da aprovação do Código Eleitoral, por meio do Decreto nº 21.076, durante o Governo Provisório de Getúlio Vargas.  O artigo 2º continha a seguinte redação: “é eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código”. Inicialmente, o alistamento eleitoral era facultativo para mulheres, sendo dispensada a autorização do marido para que elas votassem.  Somente dois anos depois, em 1934, quando da inauguração de um novo Estado Democrático de Direito, por meio da segunda Constituição da República, os direitos políticos de votar e ser votada conferidos às mulheres foram assentados em bases constitucionais.

[16] Principais características da Constituição de 1934: - Existência do sistema político de três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário). - Teve caráter democrático (no sentido liberal). - Sistema eleitoral (eleições diretas) com voto secreto. Previu também o voto feminino e obrigatório para maiores de 18 anos. - Estabelecimento da Justiça do Trabalho e leis trabalhistas, além da liberdade de formação e existência de sindicatos de classes trabalhistas. - Outros dois avanços na área do trabalho foi a proibição do trabalho infantil e o estabelecimento da jornada de trabalho de oito horas diárias com repouso semanal obrigatório. Também estabeleceu férias remuneradas e remuneração para trabalhadoras grávidas. - Manutenção do regime republicano com princípios federativos (com redução da autonomia dos estados). - Estabeleceu a nacionalização de recursos minerais presentes no subsolo brasileiro. - Estabelecimento de monopólio estatal em alguns setores da indústria.

[17] A Intentona Comunista foi um levante organizado pelo Partido Comunista em 1935 na tentativa de tirar Getúlio Vargas do poder. Esse levante aconteceu no Rio de Janeiro, então capital federal, em Natal (RN) e em Recife (PE). Luís Carlos Prestes liderou a intentona contando com o apoio de Olga Benário, agente soviética enviada por Moscou. As tropas federais derrotaram os comunistas, que foram presos. Vargas usou a instabilidade política provocada pelos conflitos com os comunistas para decretar a ditadura do Estado Novo em 1937.

[18]  Foi um autor prolífico. Sua obra abrange a Sociologia, a História, a Ciência Política, a Filosofia das Ciências Sociais e a Economia Política, e, enquanto tal, sua influência científica é multidisciplinar, espraiando-se pelo mundo acadêmico contemporâneo em escala mundial. De fato, é muito difícil detectar um ramo das Ciências Sociais modernas, ou um cientista social de renome, que não tenha sofrido influência de Weber, ainda que em pequena escala. Neste diapasão, na visão weberiana, os partidos políticos existentes nas sociedades contemporâneas só podem existir num Estado Laico dotado de uma burocracia estatal racionalmente estruturada conforme critérios jurídicos objetivamente definidos, na medida em que ele - o Estado - precisa não só identificar, através da burocracia estatal, os problemas existentes no seio da Sociedade Civil, como também, e principalmente, dispor de mecanismos políticos eficientes e confiáveis de solução de tais problemas. Dentre esses mecanismos estão, evidentemente, os partidos políticos.

[19] Dessa forma, a vertente ideológica que defendia a drástica redução do número de partidos políticos, em vez de buscar efetivar tal tese por meio de dispositivos legais com o natural risco de ver seus esforços debelados por uma decisão do STF, optou por um caminho diverso e, ao que tudo indica, mais eficiente: o fim das coligações proporcionais. Outro aspecto dessa minirreforma política consiste na recriação da chamada cláusula de barreira (também chamada de cláusula de exclusão ou cláusula de desempenho), instituto que já havia sido previsto no art. 13 da Lei no 9.096/1995 e que foi declarado inconstitucional pelo STF nas ADIs 1351 e 1354. Agora a Constituição passa a restringir o acesso dos partidos a recursos do fundo partidário e ao tempo de rádio e TV. Para tanto emerge uma redação para o § 3o do art. 17, in verbis: § 3o Somente terão direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente: I – obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou II – tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.

[20] Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o partido político somente terá caráter nacional (art. 17, I) se tiver representações e realizar convenções em pelo menos nove Estados-membros ou, ainda, em oito Estados-membros e no Distrito Federal. O art. 17 da Constituição faz menção aos princípios que regem a matéria. A natureza jurídica do partido político é de pessoa jurídica de direito privado (art. 17, § 2o). A infidelidade partidária não pode ser punida com a perda do mandato, pois tal motivo não está previsto no art. 15, mas pode gerar a expulsão do seu autor do partido. O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que as novas regras contidas na Emenda Constitucional no 52/2006, que pôs fim à verticalização nas coligações partidárias, não poderão ser aplicadas às eleições de 2006 (ADI no 3.685), mesmo ano da promulgação da Emenda. Por nove votos a dois, os ministros entenderam que, no caso, deve ser obedecido o princípio da anterioridade eleitoral, contido no art. 16 da Constituição Federal. O dispositivo prevê que alteração do processo eleitoral só terá validade depois de decorrido um ano do início da vigência da norma.

[21] No entanto, o art. 3ºda EC no 97/2017, prevê uma aplicação escalonada e gradativa nas novas regras que instituíram essa cláusula de barreira. Muito embora sua aplicação já encontre eco a partir das eleições de 2018, apenas nas eleições de 2030 será aplicada com toda a sua pujança.  Lembre-se: O titular do poder é o povo; os governantes são apenas servidores públicos momentâneos.

[22] Numa sociedade multifacetária como a nossa, é indispensável que todos os seus membros encontrem um canal adequado às suas convicções, que lhes permita expressar suas opiniões ou, até mesmo, concorrer a cargos eletivos, participando do processo político de nosso país. O pluralismo político é, assim, outro dos fundamentos de nosso Estado, conforme o art. 1º, inciso V, da Constituição, e possui estreita ligação com outro dos fundamentos ora analisados: a cidadania

[23] O Fundo Eleitoral foi criado em 2017 pelas Leis nº 13.487 e 13.488, aprovadas pelo Congresso Nacional. Com a proibição de doações de pessoas jurídicas estabelecida por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2015, o Fundo Eleitoral tornou-se uma das principais fontes de receita para a realização das campanhas eleitorais. O Fundo Partidário (FP), por sua vez, é mais antigo. Instituído em 1995 pela Lei nº 9.096 (Lei dos Partidos Políticos), ele foi durante muito tempo a única fonte de recurso público dividida entre os partidos. Além de poderem ser usados para financiar campanhas eleitorais, os valores do Fundo Partidário são utilizados para custear atividades rotineiras das legendas, como o pagamento de água, luz, aluguel e passagens aéreas, entre outros. O FP é distribuído às siglas anualmente. Ele é composto por dotações orçamentárias da União, multas e penalidades pecuniárias de natureza eleitoral, doações de pessoas físicas depositadas diretamente nas contas dos partidos (aquelas específicas para o Fundo) e outros recursos que eventualmente forem atribuídos por lei.

 

[24] O AI-5 foi a conclusão de um projeto de endurecimento do regime que estava em curso desde que os militares assumiram o poder em 1964. Esse ato institucional foi uma ferramenta utilizada pelos militares para consolidar o autoritarismo e intimidar qualquer tentativa de oposição no país. Esteve em vigor durante dez anos e foi o responsável pela cassação dos direitos políticos e pela prisão de centenas de pessoas. O AI-5 é uma norma legal instituída pelo governo militar que estabelecia prerrogativas para que os militares pudessem perseguir os opositores do regime. Consistia basicamente em uma ferramenta que dava legalidade jurídica para o autoritarismo e a repressão impostos pelos militares desde 1964. Tratava-se de um grande esforço realizado por eles a criação de mecanismos legais que justificassem seu arbítrio. Esse ato dava as seguintes prerrogativas ao presidente da República da época: Fechar o Congresso Nacional, assim como as Assembleias Legislativas (estaduais) e as Câmaras de Vereadores (municipais); decretar a intervenção do Governo Federal nos municípios e estados e nomear interventores para esses de acordo com os interesses presidenciais; Cassar mandatos políticos de deputados, senadores e vereadores; Suspender os direitos políticos de cidadãos; Decretar estado de sítio sem necessitar da aprovação do Legislativo; Apreender recursos de cidadãos. Além disso, por meio do AI-5, decretava-se: Proibição do direito de habeas corpus àqueles que fossem acusados de cometer crimes políticos; Desobrigação do governo de ter que explicar à Justiça qualquer ação realizada com base no AI-5.

[25] Principais características do regime militar no Brasil: - Cassação de direitos políticos de opositores ao regime; Repressão aos movimentos sociais e manifestações políticas de oposição; - Censura aos meios de comunicação; - Censura aos artistas (músicos, atores, artistas plásticos, etc.); - Aproximação dos Estados Unidos; - Controle dos sindicatos; - Implantação do bipartidarismo: ARENA (governo) e MDB (oposição); - Enfrentamento militar aos movimentos de guerrilha (urbana e rural) contrários ao regime militar. Vale ressaltar que, muitos desses guerrilheiros pretendiam derrubar o governo militar, através da luta armada (inclusive com atos criminosos como assaltos a bancos e sequestro de embaixador), para implantar o socialismo no Brasil, aos moldes das ditaduras de Cuba, China ou União Soviética. Vale dizer também que esses países socialistas utilizavam sistemas de repressão extremamente violentos, inclusive com assassinatos em massa de opositores, além da eliminação total da democracia e métodos rígidos de controle social. - “Milagre econômico”: forte crescimento da economia (entre 1969 a 1973) com altos investimentos em infraestrutura. Aumento da dívida externa.

[26] Anotar que a Lei 12.875/2013, alterando o art. 47, § 2.º, da Lei 9.504/1997, estabelece que o horário de propaganda eleitoral deve ser concedido a todos os partidos e coligações que tenham candidato (e não apenas aos partidos com representação na Câmara dos Deputados).

[27] A perda do mandato em razão de mudança de partido não se aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário (seja por maioria simples ou absoluta), sob pena de violação da soberania popular e das escolhas feitas pelo eleitor. No sistema majoritário, o candidato escolhido é aquele que obteve mais votos, não importando o quociente eleitoral nem o quociente partidário. Nos pleitos dessa natureza, os eleitores votam no candidato e não no seu partido político. Desse modo, no sistema majoritário, a imposição da perda do mandato por infidelidade partidária é antagônica (contrária) à soberania popular. b) O mandato parlamentar conquistado no sistema eleitoral proporcional pertence ao partido político. Assim, se o parlamentar eleito decidir mudar de partido político, ele sofrerá um processo na Justiça Eleitoral que poderá resultar na perda do seu mandato. Nesse processo, com contraditório e ampla defesa, será analisado se havia justa causa para essa mudança. O assunto está disciplinado na Resolução 22.610/2007 do TSE, que elenca, inclusive, as hipóteses consideradas como “justa causa”.

[28] A EC 97/2017 trouxe uma nova possibilidade de troca de partido sem a perda do mandato. Como sabemos, essa emenda constitucional definiu a cláusula de barreira para que os partidos tenham acesso aos recursos do fundo partidário, acesso gratuito ao rádio e à televisão (art. 17, § 3.º, da CF). Caso um parlamentar tenha sido eleito por um partido que não tenha alcançado o mínimo exigido pela cláusula de barreira, o art. 17, § 5.º, garante a possibilidade da troca de legenda sem perda do mandato, nos seguintes termos: “§ 5.º Ao eleito por partido que não preencher os requisitos previstos no § 3.º deste artigo é assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que os tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de distribuição dos recursos do fundo partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e de televisão”.

[29] Em 2007, o TSE e o STF passaram a entender que a infidelidade partidária era causa de perda do mandato eletivo. Assim, se o titular do mandato, sem justa causa, sair do partido político pelo qual foi eleito, perderá o cargo que ocupa. Essa regra apenas é aplicada a cargos eletivos do sistema proporcional, ou seja, deputados e vereadores. Portanto, não se aplica a cargos regidos pelo sistema majoritário como o de Presidente da República e Senador (ADI 5081/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27/5/2015). E eis que a história se repete... Na abusiva tentativa de burlar decisão do TSE (confirmada pelo STF) que moralizou o processo eleitoral acabando com as chamadas “legendas de aluguel”, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 91/2016 criando uma segunda “janela” oportunista. para o troca-troca de partidos.

[30] O STF, analisando o MS 26.602/DF, seguindo orientação firmada na consulta ao TSE 1.398/DF, de 27.03.2007, referendou o texto supracitado afirmando que “o abandono de legenda enseja a extinção do mandato do parlamentar, ressalvadas situações específicas, tais como mudanças na ideologia do partido ou perseguições políticas, a serem definidas e apreciadas caso a caso pelo Tribunal Superior Eleitoral”. Há duas regras de ouro para o preenchimento das vagas pelos candidatos (...): (a) O preenchimento dos lugares com que cada partido for contemplado far-se-á segundo a ordem de votação recebida por seus candidatos. (§ 1.º do art. 109 do Código Eleitoral), e (b) Poderão concorrer à distribuição dos lugares todos os partidos que participaram do pleito. (§ 2.º do art. 109 do Código Eleitoral)”.26 Nesses termos, os suplentes são aqueles não eleitos mais votados sob a mesma legenda partidária, que compõem as listas registradas.

[31] Os recursos do FEFC serão liberados às legendas, de acordo com a Resolução TSE nº 23.605/2019, somente após a definição, pela Comissão Executiva Nacional, dos critérios para a sua distribuição, que devem ser aprovados pela maioria absoluta dos membros do órgão de direção executiva nacional do partido. Ainda de acordo com a norma, os partidos são obrigados a reservar, no mínimo, 30% do total recebido do FEFC para financiamento das campanhas femininas, ou em percentual maior correspondente ao número de candidatas do partido. Também em decisão recente, o Plenário do TSE estabeleceu que a distribuição do Fundo Eleitoral deve ser proporcional ao total de candidatos negros que o partido apresentar para a disputa eleitoral. A implementação dos incentivos já deve acontecer nas Eleições de 2020, em conformidade com a decisão proferida pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF).

[32] Na abusiva tentativa de burlar decisão do TSE (confirmada pelo STF) que moralizou o processo eleitoral acabando com as chamadas “legendas de aluguel”, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 91/2016 criando uma segunda “janela” oportunista. para o troca-troca de partidos. Oportuno perceber que o prazo trazido pela Emenda 91/2016 é para desfiliação e não para uma nova filiação. Em outras palavras, o parlamentar poderá permanecer sem partido até que resolva fazer uma nova filiação. Em segundo lugar, é um factoide legislativo, com o objetivo claro de satisfazer interesses político-partidários imediatistas e fisiológicos.

[33] Entretanto, a EC 52/2006 pôs fim à verticalização e a EC 97/2017 reforçou, incluindo no art. 17, § 1.º, da CRFB a previsão: “É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, vedada a sua celebração nas eleições proporcionais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.” Cumpre frisar que a EC 97/2017 pôs fim à possibilidade de os partidos políticos celebrarem coligações para as eleições de cargos do sistema proporcional (deputados federais, estaduais, distritais e vereadores), o que sempre foi muito comum até então, permitindo apenas a coligação para as eleições de cargos majoritários (chefes do Poder Executivo e senadores).

[34] § 5º Ao eleito por partido que não preencher os requisitos previstos no § 3º deste artigo é assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que os tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de distribuição dos recursos do fundo partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e de televisão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 97, de 2017).

[35] Outro aspecto dessa minirreforma política consiste na recriação da chamada cláusula de barreira (também chamada de cláusula de exclusão ou cláusula de desempenho), instituto que já havia sido previsto no art. 13 da Lei no 9.096/1995 e que foi declarado inconstitucional pelo STF nas ADIs 1351 e 1354. Agora a Constituição passa a restringir o acesso dos partidos a recursos do fundo partidário e ao tempo de rádio e TV. Para tanto emerge uma redação para o § 3º do art. 17 CF.

[36] A democracia não se limita aos partidos. Perfaz um exercício de tolerância social; de respeito aos dissensos; de constituição das maiorias temporárias; do respeito aos direitos fundamentais; e uma visão participativa de uma construção social mais justa, igual e solidária. O conceito de democracia é dinâmico, em constante evolução, como assinala Bobbio, e os partidos exercem condição essencial, da qual não se pode prescindir, desde que acompanhem o dinamismo democrático e iniciem na valoração de seus filiados e nas suas bases sociais o processo de revitalização necessário.

Sobre a autora
Gisele Leite

Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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