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O direito ao sossego X vizinhos barulhentos

27/08/2021 às 09:35
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Não existe regra que determine que o sossego da vizinhança deva ser respeitado somente entre 22h e 6h. O respeito ao direito de vizinhança deve ser observado de forma contínua, a todo tempo.

O lar é um local sagrado! É nosso refúgio, nosso cantinho, onde repomos as energias gastas na correria do dia a dia. É ainda o lugar onde podemos aproveitar o convívio familiar e desfrutar das coisas que gostamos e conquistamos com esforço.

Ocorre que para muitas pessoas o chegar e ficar em casa tem se tornado um verdadeiro tormento, motivo de perturbação, irritação, aflição e angústia. É que muitos moradores têm seu sossego e suas horas de prazer prejudicados por vizinhos que demonstram pouca empatia e capacidade de conviver em vizinhança.

A utilização de aparelhos de som, televisores e outros equipamentos no último volume, a realização de festas que mais se assemelham a orgias, e que transcorrem dia, noite e madrugada adentro, sem qualquer respeito aos demais moradores, são exemplos de maus comportamentos que tiram o sossego e a paz de toda a vizinhança.

O resultado é que muitas pessoas não conseguem descansar, relaxar, nem mesmo estudar ou trabalhar em casa. Muitos ainda acabam tendo sua saúde física e mental afetadas. Sem contar o péssimo clima que passam a viver todos aqueles que convivem com este incômodo. Esta situação faz, inclusive, com que muitos cheguem a pensar em se mudar do imóvel que tanto sonharam e custaram a conquistar.

Alguns desses vizinhos, problemáticos, ao serem confrontados pela perturbação que causam, chegam a se defender alegando que o barulho (insuportável) que fazem não é realizado entre o período das 22h às 6h. Estas pessoas pensam, e muitos outros acreditam, que o silêncio e as regras de vizinhança devem ser observados somente neste período noturno.

Acontece que não é verdade e não existe regra que determine que o sossego da vizinhança deva ser respeitado somente entre 22h e 6h. O respeito ao direito de vizinhança deve ser observado de forma contínua, a todo tempo/horário.

Qualquer morador tem o direito de fazer cessar, pelas vias legais, a perturbação gerada pelo comportamento inadequado de um vizinho. O artigo 1.277 do Código Civil declara que "O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha". Veja que o referido direito não está atrelado a nenhum período específico do dia.

Ainda quanto ao direito de fazer cessar o barulho e outros comportamentos antissociais, de se ressaltar que as leis orgânicas municipais também coíbem o barulho e demais atos que perturbem a vizinhança. Na cidade de Belo Horizonte/MG, por exemplo, a Lei Orgânica nº.: 9.505/98, que dispõe sobre o controle de ruídos, sons e vibrações, em seu artigo 2º proíbe a emissão de ruídos que ponham em perigo e/ou prejudiquem a saúde individual ou coletiva, que cause incômodo de qualquer natureza ou, ainda, que cause perturbação ao sossego ao bem estar públicos, sob pena de aplicação de multa: "Lei 9.505/98. Art. 2º. É proibida a emissão de ruídos ,sons e vibrações, produzidos de forma que: I - ponha em perigo ou prejudique a saúde individual ou coletiva; II - cause danos de qualquer natureza às propriedades públicas ou privadas; III - cause incômodo de qualquer natureza; IV - cause perturbação ao sossego ou ao bem-estar públicos; V - ultrapasse os níveis fixados nesta Lei".

De se mencionar também que a perturbação constitui contravenção penal, conforme artigo 42, incisos I e III, da Lei de Contravencoes Penais: "LCP. CAPÍTULO IV DAS CONTRAVENÇÕES REFERENTES À PAZ PÚBLICA Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheios: I - com gritaria ou algazarra; III - abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos".

Em se tratando de condomínios edilícios, o artigo 1.336 do Código Civil, em seu inciso IV, determina que é dever do condômino não utilizar de seu espaço "de maneira prejudicial ao SOSSEGO , salubridade e segurança dos possuidores, ou aos BONS COSTUMES.

Ainda no universo dos condomínios, o barulho e a perturbação causado por moradores poderão ser coibidos pela aplicação de multa, conforme previsão do parágrafo único do artigo 1.337 do Código Civil: "Código Civil Art. 1.337. Parágrafo Único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia" .

O que precisa restar claro é que as regras e o sossego da vizinhança devem ser respeitados a qualquer hora do dia. A Lei garante o direito ao sossego de todos!

Aquele que tiver seu sossego e de sua família prejudicados pelo barulho e mau comportamento de um vizinho, ao invés de perder sua saúde, se angustiar ou pensar em se mudar, tem todo o direito e deve fazer cessar o incomodo. Deve comunicar o fato à administração do condomínio, para que tome providências, entre elas, aplicação de multa àqueles que tiverem comportamento antissocial.

Caso a perturbação continue, aquele que tiver seu sossego prejudicado pode e deve recorrer ao Poder Judiciário, tanto na esfera cível quanto na criminal, para compelir seu vizinho barulhento e problemático a respeitar o direito de vizinhança e as regras de convívio social.

O sossego e a paz devem ser protegidos na vizinhança. Apenas se angustiar e não tomar providências não irá resolver a situação. Já diz o ditado que o Direito não socorre aos que dormem. O problema é que, nestes casos, nem dormir é possível.

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Sobre o autor
Leandro Conceição Ribeiro

Profissional da área investigativa desde o ano 2000, graduado em Direito, pós graduação em Direito Penal e Processual Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Leandro Conceição. O direito ao sossego X vizinhos barulhentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6631, 27 ago. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/92555. Acesso em: 28 mar. 2024.

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