1 INTRODUÇÃO
A atividade comercial está presente desde as primeiras comunidades, nas quais cada indivíduo ou chefe familiar detinha um tipo específico de habilidade de trabalho. Devido à repetição da mesma atividade, foi preciso recorrer a outros trabalhadores para suprir outras necessidades, iniciando assim, as trocas e posteriormente a criação da moeda. Com o passar do tempo, essas relações comerciais rudimentares se tornaram cada vez mais complexas e envolviam uma gama cada vez maior de envolvidos, desempenhando importante papel no mercado econômico em seu aspecto cultural. Com o aprimoramento destas atividades, percebeu-se a aglutinação de esforços de diversos agentes, objetivando o animus lucrandi, passando existir diferentes formas jurídicas no meio empresarial, dentre as quais a sociedades (COELHO, 2011).
Hoje, a busca por mais espaço no mercado tornou-se tremenda que diversas alternativas estão sendo implantadas para efetivar tal anseio, em questão, os fenômenos societários. Cahali (2007) trata a fusão, fenômeno societário, como à união de duas ou mais sociedades que se tornará apenas uma, a qual essa nova será provida de direitos e obrigações. Assim, as universidades, em regra, dispõem de finalidade intelectual, portanto não são empresárias, entretanto, existem universidades que tem finalidade empresária. A globalização crescente tem culminado no aumento da competitividade entre essas universidades empresárias, sendo um dos principais motivos para a fusão de sociedades no mercado de capital. Junto a isso, a concorrência cobra cada vez mais os serviços, visto que buscam sempre os melhores e mais acessíveis. Um dos casos referidos é a fusão da Universidade Estácio de Sá ao Grupo Kroton, sendo estas as duas maiores empresas de educação superior privada do país, com cerca de 588 mil estudantes e 1,01 milhão de alunos, respectivamente (GRUPO KROTON, 2016).
Percebe-se que tal fusão de universidades tem como objetivo multiplicar os resultados acadêmicos e seus impactos sociais visa melhorias nos trabalhos dos professores e qualidade na formação prestada aos estudantes. Contudo, resulta em um grupo amplo de poder de mercado e com maiores chances de uma oferta mais atraente aos estudantes, gerando assim, uma concorrência desleal com relação às outras instituições, além da concentração numa parcela significativa de fundos de incentivo à educação, visto que, diminui as possibilidades de escolha do universitário. Diante dessa perspectiva, será demonstrado de que forma ocorre a concentração econômica em tais universidades empresárias, como se dá essa deslealdade na concorrência, diante do caso exemplificativo do Grupo Kroton (2016), questionando inclusive o porquê da aceitação da superação do limite de concentração econômica estabelecido pelo CADE, que é de 20%, mas a operação em questão ocasiona uma concentração de mais de 30%.
A abordagem da fusão nas universidades empresárias é de suma importância e relevância para o direito empresarial, visto que é um fenômeno societário que mais cresce no cenário atual (BARROS, 2010), assim, tem-se a necessidade de buscar entendê-lo. Logo, através desse trabalho procura-se compreender tal fenômeno, seu contexto, natureza, constituição, responsabilidades e consequencias, além de compreender como se relaciona com o direito, conectando-as com a legislação brasileira (MIRANDA, 2008). Dessa forma também, torna-se relevante descobrir o porquê dessa realidade e apontar momentos históricos e contextos sociais brasileiros, na tentativa de ajudar a conseguir compreender tal situação e assim mostrar a importância do caso. Cabe ressaltar a importância da discussão deste tema, em relação à legislação que carece de regras mais claras sobre o assunto.
O interesse em realizar os estudos a respeito da fusão nas universidades surgiu a partir da necessidade de discutir e aprofundar conhecimentos sobre esse tema, primeiramente, devido ser uma peculiaridade, visto que as universidades têm fins intelectuais e no caso estudado, esse fim agora é econômico, o que já deixa uma dúvida quando essa fusão universitária, criando questionamentos do tipo: será que essa fusão realmente trará benefícios aos universitários ou é meramente uma jogada econômica? Logo, torna-se assim visível a relevância de tal estudo acadêmico, para compreender-se como funciona tal instituto, quais as relações de poder que nele estão inseridas, quais os fundamentos e ideologias são praticados e como isso interfere na concorrência no mercado. Assim o sendo, parte-se para uma análise jurídica e pessoal do fenômeno e de seus paradigmas estabelecendo as relações nele existentes e suas definições, mostrando de que forma essa institucionalização torna-se perspicaz para a concentração de mercado nas universidades.
O tema também é de notória importância histórica e social, visto que é preciso conhecer como se dão os fenômenos societários, em questão a fusão e como esta afeta a sociedade, com foco nos universitários, visto que é de total interesse que saibam que o leque acadêmico diverso está se tornando cada vez menor e mais concentrado devido questões econômicas (BAGNOLI, 2005). A população deve compreender a estruturação desse fenômeno societário, como se relaciona, além de poder observar afora do senso comum, passando a compreender seus aspectos jurídicos oriundos dessa inter-relação.
Este trabalho tem como objetivo geral a análise dos aspectos jurídicos que envolvam a fusão nas universidades brasileiras, destacando assim os aspectos jurídicos, relacionando a legislação brasileira. Dessa forma, no primeiro capítulo serão abordados os procedimentos formais que constituem o fenômeno societário fusão perante a legislação, e também será exposta sua evolução histórica. No segundo capítulo serãoexplicadas as universidades e suas finalidades, visto que, as universidades têm fins intelectuais e o trabalho refere-se às universidades com fins econômicos e depois será explicado como ocorre à concentração econômica e a concorrência desleal na fusão dessas, por fim, no último capítulo, será trazido um exemplo do caso de fusão de universidades empresárias, o caso da Estácio de Sá ao Grupo Kroton e será demonstrado de que forma ocorre sua concentração de mercado.
Ademais, este projeto possui caráter exploratório, desenvolvendo-se através de um procedimento bibliográfico. Pretende-se então utilizar como método uma análise documental, com pesquisa, bibliográfica em livros, artigos científicos, trabalhos e teses, internet, a fim de, explanar questões e fundamentações do objetivo central da pesquisa, o estudo do fenômeno societário (fusão) nas universidades empresárias, fazendo uma seleção de fontes pertinentes ao assunto abordado. Uma vez coletadas as fontes, buscar dissertar com base em fundamentações teóricas de renomados autores e levantar questionamentos críticos com relação ao assunto (GIL, 2010).
2 PROCEDIMENTOS FORMAIS DA FUSÃO PERANTE A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Antes da vinda da família real para o Brasil, a atividade comercial era algo extremamente fechada, todas as áreas eram controladas por Portugal. O direito comercial brasileiro teve início com a Lei de Abertura dos Portosde 1808, a qual permitiu que o país pudesse comercializar com outros países, com destaque ao Reino Unido. Entretanto, o Código comercial brasileiro somente surgiria em 1850. Devido à mudança do Código Civil em 1916, ocorreram diversas alterações também no âmbito comercial, como a atribuição da personalidade jurídica, dentre elas, a sociedade comercial (VERÇOSA, 2008).
Nos últimos tempos tem ocorrido um crescente aumento nas fusões de empresas de diversos setores de países variados. Tais processos causam diversas mudanças, inclusive nos padrões de gestão, produção e emprego (OLAVE; NETO, 2001). Assim, conforme as fusões ganham forças, tem-se a mesma também como uma resposta das organizações ao surgimento de uma maior competitividade dado o processo de globalização. No Brasil, através de uma internacionalização econômica, produtiva e financeira, além do processo de globalização nas décadas de 1980 e 1990, as empresas dão origem a estratégias elaboradas visando vantagens. Nessa conjuntura, tem-se também a evolução das fusões que ao mesmo tempo se tornam objeto de valor diante da busca de entendimento acerca da dinâmica empresarial (BARROS, 2010).
No início, o processo de fusão foi contido no Brasil, por conta da inflação fora de controle ocorrida na década de 90 que impedia transações. Porém, a partir de 1994, com o Plano Real, o mercado de fusões começou a ser mais valorizado e procurado (OLAVE; NETO, 2001).Com base no histórico do fenômeno societário, percebe-se que a principal fundamentação está atrelada à proteção de seus direitos e deveres.
A fusão de sociedades está disposta no Código Civil (2002), nos artigos 1.119 a 1121, além do art. 228 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6404/76), onde a fusão é a operação a qual ocorre à união entre duas ou várias sociedades formando uma nova que responderá por todas as obrigações e direitos. Após ocorrer a fusão de sociedades extingue as empresas que se fundiram, mas não serão dissolvidas por conta da sucessão de direitos e deveres que agora caberá a nova sociedade. Tal fenômeno ocorre para reorganizar o capital, visando à concentração das participações das empresas no mercado (MIRANDA, 2008). Ou seja, ao contrário de muitas formas comerciais jurídicas, a fusão surge para dar ensejo a uma nova tipificação comercial, e então iniciar o processo de organização de sociedades que carecia de regulamentação jurídica.
Para que se processe a fusão deverão ser cumpridas as formalidades exigidas pelos § 1º e 2º do art. 228 da Lei nº 6.404, de 1976 (Lei das S.A.):
§ 1º A assembléia-geral de cada companhia, se aprovar o protocolo de fusão, deverá nomear os peritos que avaliarão os patrimônios líquidos das demais sociedades.
§ 2º Apresentados os laudos, os administradores convocarão os sócios ou acionistas das sociedades para uma assembléia-geral, que deles tomará conhecimento e resolverá sobre a constituição definitiva da nova sociedade, vedado aos sócios ou acionistas votar o laudo de avaliação do patrimônio líquido da sociedade de que fazem parte (BRASIL, 2016).
Diversos são os fatores determinantes para que haja fusão em empresas. Através de Camargos e Barbosa (2005) foi possível perceber alguns: a) expectativas assimétricas; b) irracionalidade individual nas decisões de dirigentes; c) compensações e incentivos tributários; d) custos de reposição e valores de mercado; e) busca de economias de escala e escopo; f) efeitos anticompetitivos e busca do poder de monopólio; g) redução do risco de insolvência; h) razões gerenciais; i) Capacidades adicionais e sinergias.
A motivação é o principal fator da fusão, a partir dela que surge o interesse e a prospecção de empresas que atendam ao perfil desejado. Vários motivos impulsionam o seu processo: estratégicos, econômicos, conjunturais, estruturais, que provêm das estratégias definidas por cada empresa. Para os acionistas, está ligada ao aumento do valor, enquanto que a motivação do corpo diretivo está relacionada ao mercado, ou seja, aumento do marketshare, resultando em sucesso para a direção da empresa (BARROS, 2010). Dentre os fatores motivações, Camargo e Barbosa (2005) elencam a busca por racionalizar a produção, adotar os progressos tecnológicos, reorganizar as estruturas econômicas empresariais e o mais interessante, a busca em evitar concorrência, sendo este, um fator “disfarçado”, “implícito”.
Dessa forma, a constituição da fusão nas universidades empresárias deve obedecer a diversos requisitos básicos e essenciais dispostos no código civil e na legislação. Visto que, a estrutura da fusão está de acordo com cada empresa fundida e este é um dos motivos que fazem com que seja cada vez mais evidente no mercado econômico atual.
3 DE QUE FORMA OCORRE A CONCENTRAÇÃO ECONÔMICA QUANDO AS UNIVERSIDADES EMPRESÁRIAS SE FUNDEM E OCASIONA EM CONCORRÊNCIA DESLEAL
As universidades, em regra, não são empresárias, porque tem area fim (motivo central de sua existência) atividade intelectual. Classifica-se assim, como sociedade simples, sociedades de pessoas que adquirem personalidade jurídica após registro do contrato social (registro civil da pessoa jurídica), dispõem de atividade exercida por qualquer sócio, não estando sujeita a falência. Destacando-se por sua exploração na atividade de prestação de serviços decorrentes de atividades intelectuais e de cooperativa natureza essencialmente não mercantil, onde para a execução de seu objeto, os sócios exerçam profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, mesmo que para a execução necessitem de auxiliares ou colaboradores (MIRANDA, 2008).
Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.
Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa(BRASIL, 2002).
Assim sendo, uma a sociedade simples não exerce atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens e serviços, salvo quando seu objeto social for de caráter empresarial. O que também é exposto no art. 966 do Código Civil (2002) em sua exceção no parágrafo único:
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.
O artigo expressa que quem exerce atividade intelectual não pode ser considerado empresário, mas abre a possibilidade quando se tratar de Sociedade Anônima, modelo de companhia com fins lucrativos, como é exposto na Lei nº 6404/76 (LSA). Assim, o fenômeno societário da fusão em universidades torna-se possível, já que nesse caso, são sociedades empresárias (SA) que tem como objetivo exercer profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, no intuito de lucro (COELHO, 2011).
De acordo com Crema (2010, p. 13 apud NUSDEO, 2002, p. 21-22), a concentração de empresas define-se como uma ação em que partes envolvidas cessam a centralidade de suas decisões autônomas, atuando então de forma conjunta a partir de um único gestor em suas atividades, permanentemente, ou seja, quando empresas que atuam em setores similares abrem mão de sua autonomia para através de formas de ajuntamentoter apenas um único poder de decisão naquele mercado.
Na legislação brasileira, lei 12.529/2011, a concentração econômica está descrita no art. 90:
Art. 90. (...) realiza-se um ato de concentração quando:
I - 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem;
II - 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas;
III - 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou
IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture.
O artigo acima elenca situações em que há a concentração, tendo a fusão, incorporação, constituição de sociedade ou qualquer outra forma de agrupamento societário, por exemplo. A partir da noção do que é a concentração, percebe-se que quando acontece, a concorrência desleal pode ser uma de suas consequencias.
O dicionário Houaiss (2001) afirma que, concorrência é a oposição de interesses, de dois ou mais indivíduos à procura de um mesmo objetivo, o qual cada um dos lados visa sobrepujar o outro. Assim, a concorrência é a competição entre produtores ou provedores de um mesmo serviço onde o objetivo de cada um deles é obter a “maior fatia da pizza” que é o mercado.
Ao falar em concorrência, imagina-se um grande número de produtores ou provedores de determinado serviço tendo liberdade mercantil no exercício de seu serviço ou na produção de determinado bem, tornando assim o produto com um preço justo, principalmente. É dessa forma que se aumenta a qualidade dos produtos e serviços ofertados, tal como a forma de produzi-los e gerando, consequentemente,uma exigência maior por parte da população, não permitindo que as empresas estagnem e estejam sempre em busca de crescer e desenvolver seu produto.
Agora quando se trata sobre o Direito, o professor Vicente Bagnoli (2005) diz que não é somente isso:
Para o Direito, e evidentemente também para a Economia, essa visão de concorrência é muito restritiva, uma vez que a concorrência não se resume somente a uma disputa ou rivalidade. Concorrência para o Direito e para a Economia envolve interesse, mercados, países, populações, conquistas e os meios para atingir resultados.
Num mundo globalizado, dividido em blocos econômicos onde a velocidade dos negócios é tamanha e ao mesmo tempo tão feroz, que num curto espaço de tempo uma empresa pode não mais resistir no mercado e fechar, centenas de pessoas perderem seus empregos, consumidores se depararem sem oferta de mercadorias e, até mesmo, a economia de uma país ser arruinada, verifica-se a importância da concorrência. Daí a necessidade de se falar em Direito ou Defesa da Concorrência (BAGNOLI, 2005).
No que diz respeito às universidades, esta concorrência é de suma importância, pois, por lidar com um bem tão importante quanto à educação, é necessário que haja uma concorrência saudável e legal, inclusive com a busca das empresas de melhor atender a seus alunos e entregar ensino de qualidade aos mesmos. A fusão de universidades, como já citado, pode criar concentração econômica e causar um grande prejuízo para a concorrência outrora leal de determino local.
A lei 12.529/2011, em seu artigo 36, elenca diversas ações que caracterizam infração contra a ordem econômica:
Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:
I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;
II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;
III - aumentar arbitrariamente os lucros; e
IV - exercer de forma abusiva posição dominante.
(...)
§ 2o Presume-se posição dominante sempre que uma empresa ou grupo de empresas for capaz de alterar unilateral ou coordenadamente as condições de mercado ou quando controlar 20% (vinte por cento) ou mais do mercado relevante, podendo este percentual ser alterado pelo CADE para setores específicos da economia(BRASIL, 2011, grifo nosso).
A supracitada lei é uma infração de ordem econômica quando se mantém uma posição dominante, ao controlar 20% ou mais do mercado relevante. Tudo isso para garantir que a concorrência livre seja respeitada, para que outras empresas possam apresentar seu produto ou serviço de forma competitiva e atraente para os clientes.
Assim, a fusão entre as universidades empresárias, que não dispõem mais da atividade intelectual como finalidade principal, diminui a necessidade de inovação e de penetração dos mercados, visto que, torna as universidades um meio cada vez mais fechado. Perde-se a “competição” saudável como foi dito, já que as demais universidades que não estão inclusas nesse processo ficam em desvantagem. Cria-se um grupo com amplo poder de mercado que concentra uma parcela significativa de fundos de incentivo à educação. Como será demonstrado a seguir, com base no caso de fusão entre a universidade Estácio de Sá ao Grupo Kroton, sociedades empresárias.
4 A CONCENTRAÇÃO DE MERCADO NAS UNIVERSIDADES EMPRESÁRIAS: FUSÃO DA ESTÁCIO DE SÁ AO GRUPO KROTON EDUCACIONAL
A Kroton Educacional (2016) se tornou a maior organização de educação privada no Brasil, tendo mais de 40 anos prestando serviços em Ensino Básico e mais de 10 anos atuando no Ensino Superior. No decorrer dos anos, a Kroton adquiriu grandes grupos educacionais, tais como o Grupo IUNI Educacional, a Universidade Norte do Paraná (Unopar) e em 2014 fundiu-se com a Anhanguera Educacional, até então o seu maior rival. Atualmente, fala-se muito sobre a fusão da Estácio, segunda maior do setor, com o Grupo Kroton, o que causaria uma grande concentração de mercado em um único grupo, causando prejuízos às demais empresas de educação superior privada no país.
É notório que a tendência da empresa na modernidade é que ela cresça e tenha uma produção diversificada, sendo apresentadas várias alternativas para alcançar o crescimento e sua diversificação, porém não se observa crescimento econômico quando acontece integração de empresas, tendo em vista que há uma diminuição na concorrência. Disto, tem-se a Lei Antitruste no Brasil, que verifica atos de concentração de poder econômico, obtidos por qualquer tipo de ato ou negócio jurídico, tais como fusão, cisão, incorporação ou qualquer outra forma de concentração de poder econômico, sendo necessária a apreciação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) que pode ocasionar inclusive no impedimento de tal prática.
Até o momento da publicação do presente paper, não há decisão por parte do CADE com relação ao negócio. Para que a união das duas maiores empresas de ensino superior privado do país se consolide, é preciso que o CADE, num prazo de 240 dias, com possível prorrogação por mais 90, avalie a operação. Como relatam Natalia Viri (2016) para o Brazil Journal, analistas do Morgan Stanley, empresa global de serviços financeiros com sede em Nova Iorque, afirmam que há poucos cenários possíveis no CADE para tal negócio, onde em todos eles a nova empresa terá que se desfazer de algumas unidades do seu ensino presencial nas cidades em que há justaposição e consequentemente uma concentração no mercado estudantil, tanto presencial quanto a distância. Há também outro problema, através de entrevista dada a Juliana Schincariol (2016) para o site Reuters Brasil, o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) acredita que a citada fusão causaria uma concentração de 30 por cento de participação no mercado estudantil, além de mais de 50 por cento do fundo de incentivo à educação, o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).
Tais considerações expressas mostram que o grupo Kroton se tornaria um concorrente desleal no âmbito educacional, visto que, já possui monopólio disparado antes mesmo de realizar tal fusão. E, o mais preocupante seria essa concentração de incentivos educacionais para si, por possuir maior demanda, impossibilita o crescimento das demais universidades que recebem investimentos bem menores, o que gera uma concorrência desleal. Para a concorrência ser leal é preciso que todos tenham a mesma chance de crescer e avançar, o que claramente não ocorre no caso (BAGNOLI, 2005).
Diversas concorrentes do grupo Kroton e da Estácio de Sá expuseram seus temores com relação à possível fusão. Como destaca o Jornal do Comércio (2016), tais concorrentes apresentaram as mesmas razões acima expostas, preocupadas com a fusão dos rivais, ainda mencionaram um risco de abuso de poder de mercado por parte da gigante. Para o grupo Laureate Brasil, integrante da rede global líder em ensino superior Laureate International Universities, formada por 12 Instituições de Ensino Superior, com mais de 50 campi em oito estados brasileiros, a união das rivais tem evidente potencial anticompetitivo. Já a Ser Educacional apresentou dados e levantamentos para contestar a operação, através de seus advogados afirmaram que a operação gera uma redução da rivalidade em diversos mercados do setor educacional, uma vez que suprime o principal rival da Kroton, que era a Estácio de Sá, concentrando o mercado das universidades de maneira excessiva.
O art. 36, parágrafo 2º da Lei nº 12.529 (lei Antitruste) de 30 de novembro de 2011, mostra que dominar mercado relevante de bens ou serviços configura infração de ordem econômica. Assim sendo, a fusão do Grupo Kroton a Estácio de Sá controlaria mais de 30% do mercado estudantil configurando assim infração para a lei brasileira. E não seria algo bom para os universitários, pois assim, terão menos opções para escolher onde querem estudar e qual metodologia se sentem mais confortáveis, já que está ocorrendo uma “atrofia acadêmica” por questões econômicas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como principal destaque o estudo sobre o fenômeno societário da fusão nas universidades empresárias, em face de sua contínua aplicação no âmbito comercial. Torna-se viável, pois, embora resulte em uma nova sociedade, os deveres e direitos das duas empresas anteriores não são extintos. Em um contexto histórico, foi destacado de forma cronológica a atividade empresarial no Brasil e como isso está relacionado ao uso cada vez mais frequente da fusão de empresas, foram demonstrados quais os procedimentos formais para constituição da fusão perante a legislação brasileira, destacando seus requisitos. Depois, buscou-se compreender de que forma ocorre a concentração econômica quando as universidades se fundem e geram concorrência desleal, além de ser exposta a diferença entre as universidades empresárias das universidades intelectuais. E por fim, ilustrou-se a partir do caso da fusão da Estácio de Sá ao Grupo Kroton, a concentração de mercado nas universidades empresárias. Dessa forma, foi possível compreender a análise geral do estudo, que diz respeito à concentração no mercado de capital e sua concorrência desleal ocasionadas pela fusão nas universidades com fins empresários, sob a legislação brasileira.
A fusão, como já foi exposta, acontece porque os gestores e sócios das empresas envolvidas pensam ser um bom investimento, contando que terão retorno positivo sobre as operações feitas sob a nova pessoa jurídica surgida a partir do fenômeno. Mas, ao ocorrer em universidades, que deveriam prezar pela questão intelectual não empresária, torna-se preocupante. Entre as empresas existem concorrência e busca em oferecer os melhores serviços, justamente por ter como intuito o lucro, a parte que cobre o seu trabalho. Sendo assim, quando as universidades empresárias buscam fundir-se, buscam concentrar mercados, não se preocupam com a característica principal das universidades que é o intelecto e acaba por criar um mercado mais fechado, com menos diversidade em metodologias e preços, gerando uma concorrência desleal.
Dessa forma, foi utilizado o caso do Grupo Kroton, que é uma universidade com fim econômico que está se fundido à Universidade Estácio de Sá SA, que controlaria mais de 30% do mercado estudantil, o que é considerado uma infração à legislação, já que o máximo desse controle está por volta dos 20%. Portanto, percebe-se que os sócios envolvidos não estão preocupados com a vida acadêmica ou em oferecer os melhores ensinos, mas, em obter uma parcela maior de “consumidores” da sua atividade intelectual e acabam gerando um monopólio no campo.
Conclui-se, então, que a fusão do grupo Kroton à Universidade Estácio de Sá ainda gerará bastante discussão, tanto no âmbito econômico quanto no ramo educacional, uma vez que aprovada pelo CADE sem nenhuma condição imposta pelo mesmo, acabaria resultando numa gigante da educação com mais de 1,6 milhões de alunos e abarcando uma fatia considerada ilegal de acordo com a legislação brasileira. Como supracitado, é provável que o CADE rejeite a fusão ou apresente uma contraproposta, a qual o grupo Kroton teria que se desfazer de alguma de suas unidades de ensino presenciais para que não exceda o limite estipulado pela lei vigente no Brasil.
O presente estudo foi de suma importância, pois tal fusão influenciará na educação de muitos brasileiros, principalmente os de classes menos favorecidas que se vale de financiamento estudantil, como exemplo: Fies. Tal influencia se dará tanto em termos econômicos quanto em termos qualitativos de ensino, pois há a possibilidade de que, controlando a maior parcela de mercado, o grupo perca o foco na qualidade de ensino presencial e foque em um ensino mediano através da modalidade à distância.
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