As dificuldades da adoção de crianças por casais homoafetivos

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Resumo:


  • O trabalho é dedicado a todas as pessoas que buscam um novo horizonte familiar, baseado em amor, carinho e respeito mútuo.

  • São abordadas questões relacionadas à adoção, especialmente para aqueles que têm seu pedido negado, e a luta por igualdade de direitos na sociedade homoafetiva.

  • O estudo discute a evolução da definição de família, incluindo novos modelos como famílias monoparentais, poliafetivas, informais e homoafetivas, à luz da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

ESTE É UM TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO NA GRADUAÇÃO DE DIREITO... AS DEVIDAS REFERÊNCIAS ENCONTRAM-SE NO TRABALHO ORIGINAL, DANDO OS DEVIDOS CRÉDITOS AOS SEUS AUTORES, BEM COMO NO FINAL DESTE TRABALHO.

Dedico este trabalho a todas as pessoas que buscam um novo horizonte, uma família, não importando qual modelo seja, mas em sua essência principal: com amor, carinho, respeito mútuo, sentimentos essenciais para a evolução do ser humano.

As pessoas que se socorrem do direito para alcançarem seu maior sonho: a adoção, que por vezes tem negado seu pedido.

Aos operadores do direito, em especial aqueles que buscam refúgio na Constituição Federal para que se aplique de maneira igualitária o dispositivo do artigo 5º, “caput”: “todos são iguais perante a lei...”.

 A sociedade homoafetiva, que de maneira corajosa buscam corrigir essa igualdade distorcida, através da Justiça sua equiparação a ente familiar, e por fim, o direito a adoção regulamentar, sem qualquer tipo de barreira criada para impedir tal conquista.

INTRODUÇÃO

Segundo Maria Berenice Dias, ela exemplifica bem o conceito de família como segue:

“é um agrupamento informal, de formação espontânea no meio social, cuja estruturação se dá através do direito.”[1]

Traz-se hoje em dia, o conceito de família monoparental, poliafetiva, informal, pluriparentral, homoafetiva (que se trata o objeto desse estudo), dentre outras.

Todos esses modelos de família acima citados, tem proteção jurídica, baseado no princípio da dignidade da pessoa humana, onde o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais. 

CAPÍTULO 1
1.Aspecto Histórico

Na história da humanidade sempre houve casos de adoção, mas o registro mais antigo da qual se tem notícia, está na Bíblia Sagrada, para ser mais exato no Livro de Êxodos, Capítulo 2, versículo 10:

“E, quando o menino já era grande, ela o trouxe à filha de Faraó, a qual o adotou; e chamou-lhe Moisés, e disse: Porque das águas o tenho tirado.”

Nesta belíssima história narrada no Antigo Testamento, vemos a figura de um menino, que por determinação do faraó executasse todas as crianças do sexo masculino, e sua família em um ato de fé, o acomodou em um cesto, colocando as margens de um rio.

Todavia, a filha de faraó, que se banhava a beira do rio, viu o cesto, e se surpreendeu ao ver a criança dentro, porem, não sabia o que fazer, mas sua irmã, que acompanhava o trajeto, viu e de imediato se propôs a cuidar da criança, o que foi aceito pela filha de faraó.

Conforme cresceu o menino dentro da cultura egípcia, foi apresentado como filho da princesa, tendo o significado de seu nome como “aquele que foi tirado das águas”, sendo assim uma das primeiras adoções relatadas nos tempos antigos.

A Doutoranda Professora Ms. Débora Feres, em sua tese de Mestrado sobre a Adoção do Maior Capaz:

“Na Grécia, a adoção preenchia o desígnio de perpetuar o culto familiar pela linha masculina, ou na ocorrência de falecimento do pater familias que não deixasse como herdeiro pessoa capaz de continuar o culto aos deuses-lares.

No Direito Romano, a adoção mantinha o mesmo objetivo de proporcionar

filhos àqueles que não possuíam prole consanguínea, perpetuando o nome do adotante. Dispunham nas Institutas (Liv. 1o, Tit. 11, § 4o) que o mais jovem não pode adotar o mais velho, imitando a natureza, pois seria monstruoso um pai mais novo do que o filho.

Todavia, o poder paterno era localizado num ordenamento jurídico sistêmico, , recomendando que pudesse um chefe de família sem herdeiros adotar como filho um infante (masculino) de outra família.

Deste modo, o menino adotado deveria receber o nome do adotante e herdar seus bens. O princípio fundamental de que a adoção não poderia se afastar da filiação natural: adoptio naturam, veio aspirado da antiguidade pelo direito civil atual.”[2]

 Percebe-se pela leitura que nos tempos antigos, a adoção era um mecanismo para perpetuar o legado de determinadas pessoas, perpetuando não a genealogia sanguínea, mas o nome de uma família, sempre dando preferência a um varão (menino).    

1.1. Constituição Federal de 1988

O legislador definiu na Constituição Federal, no ano de 1988, em seus arts. 226 a 230 os parâmetros da entidade familiar, porém, com o passar das décadas, houve uma mudança generalizada, sendo aceito pelo nosso ordenamento jurídico pátrio vários modelos de família.

O parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal /88 diz:

“Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

O legislador ao redigir os artigos constitucionais, não considerou a sociedade homoafetiva como família de fato, excluindo assim essa classe social, porém, com o passar dos anos, houve uma verdadeira revolução na sociedade como um todo, haja vista a luta pela igualdade de direitos em uma sociedade conjugal.

Tal discussão aumenta quando se lê o artigo 3º, inciso IV, da CF/88:

“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

É certo que a sociedade homoafetiva sofre preconceitos de todos os tipos, em todas as classes e camadas sociais, e luta por igualdade de direitos.

Por fim, no ensina Carlos Roberto Gonçalves:

“A Constituição Federal de 1988 “absorveu essa transformação e adotou uma nova ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana, realizando verdadeira revolução no Direito de Família, a partir de três eixos básicos”. Assim, o art. 226 afirma que “a entidade familiar é plural e não mais singular, tendo várias formas na constituição”. O segundo eixo transformador “encontra-se no §6º do art. 227. É a alteração do sistema de filiação, de sorte a proibir designações discriminatórias decorrentes do fato de ter a concepção ocorrido dentro ou fora do casamento”. A terceira grande revolução situa-se “nos artigos 5º, inciso I, e 226, § 5º. Ao consagrar o princípio da igualdade entre homes e mulheres, derrogou mais de uma centena de artigos do Código Civil de 1916”.[3]

1.2. Cadastro Nacional de Adoção

O Cadastro Nacional de Adoção, criado em 2008 pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) visa facilitar a vida dos menores a serem adotados, sendo ferramenta de larga utilização pelos magistrados do país inteiro no que versa sobre procedimentos de adoção.

Sendo de fácil consulta, qualquer pessoa que deseja adotar uma criança é só acessar o site do CNJ, realizar o pré-cadastro de pretendentes, e seguir o passo-a-passo, sendo possível escolher localidade, características da criança a ser adotada, dentre outros.

Ainda segundo uma reportagem da Agência Brasil:

 “O Sistema Nacional de Adoção (CNA) completou hoje (29) 11 anos de criação, tendo já realizado mais de 12 mil adoções. Criado pela Resolução 54/2008, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o cadastro tem atualmente 45.923 pretendentes cadastrados e 9.566 crianças e adolescentes disponíveis.” [4]

Isso nos da uma média de 1.090 adoções/ano, onde não se tem dados empíricos de quantos casais homoafetivos adotaram neste mesmo período, excluindo assim números importantes dessa nova classe social.

Convém dizer que ao acessar o portal do Cadastro Nacional de Adoção, é possível efetuar uma pesquisa estatística acerca do Relatório de Pretendentes, e em seu resultado, não aparece o percentual de casais homoafetivos na fila de adoção.

A lei 12.010/09, em seu art. 6º dispõe sobre o cadastro de adoção, onde as pessoas ficam obrigadas a frequentar durante 01 (um) ano a preparação psicossocial e jurídica para se prepararem para receber uma criança.

Dispõe o referido artigo:

 “As pessoas e casais já inscritos nos cadastros de adoção ficam obrigados a frequentar, no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da entrada em vigor desta Lei, a preparação psicossocial e jurídica a que se referem os §§3.º e 4.º do art. 50 da Lei n. 8.069, de 13 de junho de 1990, acrescidos pelo art. 2.º desta Lei, sob pena de cassação de sua inscrição no cadastro.”

Depreende se da leitura do aludido artigo que ele não se refere aos casais homoafetivos, mesmo depois da promulgação da nossa atual Constituição, chamada de Constituição Cidadã.

CAPÍTULO 2
2.Estatuto da Criança e do Adolescente

Criado em 1990 através da Lei nº 8.069, seu objetivo principal é tutelar os direitos das crianças e adolescentes, dando parâmetros para a sociedade civil e o Poder Judiciário no que diz respeito a diretos e deveres.

Do artigo 39 ao 52-D do referido estatuto dispõe sobre o sistema de adoções, sendo tais dispositivos legais os balizadores para uma correta adoção.

Existia, no entanto, uma maneira não tão burocrática para adoção, ressaltando que tal prática era e ainda é ilegal: a adoção a brasileira.

Era comum as mães que não queriam seus filhos “dar” a criança ainda no hospital, pois o controle era precário no que tange ao registro civil, logo, era fácil sair com o recém-nascido, ir até um cartório de registro civil e registrar como se filho fosse.

Porém, com a criação da Lei nº 12.662/12, as crianças já saem do hospital com o devido registro, justamente para se evitar esse tipo de fraude que era comum em outros tempos.

Ou seja, ao nascer o genitor ou a própria mãe, através do hospital e o convenio firmado com o cartório de registro de pessoas naturais, celebram o ato no próprio nosocômio, dando celeridade ao procedimento, evitando também o registro tardio (depois de anos) dando assim duas idades para a pessoa (a idade real e a idade registrada para fins legais).

2.1. Sociedade Homoafetiva

Com o decorrer dos tempos, o conceito de família foi se ampliando. Todavia, no século passado existiam muitos preconceitos quando se falava da entidade familiar.

A família tradicional era composta por um homem e uma mulher, sendo o homem o provedor do lar, e a mulher executava as tarefas domésticas.

As mulheres pelo mundo, a sua maneira, lutavam por independência financeira e direitos.

Uma das lutas mais conhecidas foi a do direito pelo voto, que a duras penas foi reconhecido pelo longo dos tempos, senão vejamos:

  • Nova Zelândia..........1893
  • Finlândia...................1906
  • Estados Unidos.........1916 (Emenda 19)
  • Equador.....................1929 (1º País latino-americano a instituir o voto feminino)
  • Brasil.........................1932 (Decreto nº 21.076, sendo positivado na Constituição de 1934)

Este é um exemplo de luta pelos direitos, porém a cerne deste trabalho é o direito da sociedade homoafetiva, senão vejamos o primeiro caso de casamento homoafetivo registrado no mundo, na Dinamarca.

“Em 7 de junho de 1989, um documento histórico foi publicado na Dinamarca. Assinado pela rainha Margrethe 2ª, chancelava, "com a mão e o selo reais", uma lei pioneira aprovada pelos parlamentares dinamarqueses: a partir de então, o país escandinavo passaria a ser o primeiro do mundo a reconhecer oficialmente a união estável civil entre casais homoafetivos. 

"Duas pessoas do mesmo sexo podem ter sua união estável registrada", garante o primeiro artigo do ato legislativo. 

Apesar de devidamente aprovada pelos parlamentares e rubricada pela rainha, a lei só entraria em vigor alguns meses depois, em 1º de outubro de 1989 – o tempo se fazia necessário para que os órgãos públicos adaptassem seus procedimentos internos. 

O primeiro casal a ser contemplado com o direito civil histórico já vivia junto há quatro décadas e era bastante conhecido entre aqueles que lutavam pelos direitos da comunidade LGBT: os ativistas Axel Lundahl-Madsen (1915-2011) e Eigil Eskildsen (1922-1995) que, como prova de amor, já haviam adotado o sobrenome Axgil - inventado a partir da junção de seus nomes. 

Tom Ahlberg, o prefeito de Copenhague, abriu o evento com um pronunciamento que reconhecia a importância da data. Em seguida, oficiou a cerimônia. Foi ele que perguntou a Axel Axgil se aceitaria Eigil Axgil como companheiro – e vice-versa. E, claro, ouviu duas vezes um "sim". Até o fim daquele ano, 270 homossexuais homens e 70 mulheres registraram suas uniões civis na Dinamarca. 

"Nunca poderíamos nem sequer imaginar que chegaríamos tão longe", disseram eles, logo após a cerimônia. "Mantenham as mentes abertas. Venham e continuem lutando. É a única maneira de mudar as coisas. Se as pessoas saírem do armário, este tipo de legalização vai ocorrer em todos os lugares." 

Como afirma o verbete dedicado a eles na enciclopédia Britânica, a honraria de serem os primeiros a "se casarem" se justificava. "Seus esforços sociais e políticos finalmente valeram a pena quando, em 1989, a Dinamarca se tornou o primeiro país a legalizar as uniões civis do mesmo sexo. Axel e Eigil trocaram votos na prefeitura de Copenhague", aponta a enciclopédia. 

Conforme cronologia preparada pela organização LGBT Danmark, a legalização da união civil homoafetiva foi resultado de "décadas de militância" e serviu para "inspirar e motivar a adoção" de leis similares em outros países pelo mundo. 

"A lei da união estável [para pessoas do mesmo sexo, promulgada em 1989] era praticamente idêntica à já existente lei dinamarquesa para casamentos civis, com a exceção de alguns direitos familiares relacionados à adoções e nacionalidade. As exceções foram sendo removidas ao longo dos anos seguintes", contextualiza a organização.

Inspirado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas em dezembro de 1948, Axel engajou-se para criar uma organização de defesa e reinvindicação de direitos para gays, lésbicas e bissexuais. Nasceu assim a Kredsen af 1948 ("Círculo de 1948"). No ano seguinte, o grupo foi rebatizado como Forbundet af 1948 ("Associação de 1948", ou simplesmente F-48 - em 1951 já congregava 1339 membros, na Dinamarca, na Noruega e na Suécia. 

"Com o fim da Segunda Guerra, o foco passou a ser os valores e direitos democráticos. E os homossexuais começaram a se organizar eles próprios. Ao contrário de outros grupos que foram perseguidos durante a Guerra, homossexuais não foram incluídos na Declaração dos Direitos Humanos de 1948", contextualiza histórico fornecido pela LGBT Danmark, o nome atual da organização desde 1985. 

O ativista Axel conheceu Eigil em um encontro do grupo ativista em 1949. Nunca mais se separaram. 

Juntos criaram um jornal com conteúdo destinado à comunidade homossexual, o 'Vennen' – "Amigo", em português. Também criaram uma agência de modelos e uma empresa de fotografia, ambos especializados na temática gay. 

Acabaram presos em 1955, por conta da publicação de fotos de homens nus. Conforme declararam autoridades dinamarquesas da época, o material, "embora não obsceno, poderia ser considerado especulação comercial com intenções sensuais". 

O casal Axgil refez a vida criando uma pequena pousada no norte da Dinamarca, preocupada principalmente em atender com respeito e dignidade o público LGBT. Nunca deixaram de se envolver no ativismo. 

Não à toa, foram os protagonistas da união civil homossexual número um, em 1 de outubro de 1989, em cerimônia acompanhada por uma multidão de ativistas e simpatizantes que se aglomerou ao redor da prefeitura de Copenhague, onde o ato foi firmado. 

Eigil morreu em setembro de 1995, aos 73 anos. Axel ainda seguiria uma voz influente entre os ativistas LGBT até sua morte, em outubro de 2011, aos 96 anos. Em 2013, foi aclamado postumamente pela organização Equality Forum como um dos 31 ícones mundiais LGBT. 

"Poderíamos dizer que eles estavam muito à frente de seu tempo", avalia, em comentário à BBC News Brasil, o sociólogo Barry Adam, autor do livro The Rise of a Gay and Lesbian Movement (A Ascensão do Movimento Gay e Lésbico, em tradução livre) e professor da Universidade de Windsor, no Canadá. 

Em seu livro, Adam cita a oficialização da união dos Axgil como um ponto fundamental para a consolidação dos direitos dos homossexuais no mundo. Recorda que eles "celebraram com grande festa pelas ruas de Copenhague" e que o ato em si era emblemático dado que a população LGBT, em maior ou menor grau ao redor do mundo, vivia sob perseguições e precisava esconder seu status civil real - vivendo em "casamentos ilegais". 

Professor de Direito da Universidade de Yale, o jurista e escritor William Eskridge conta como foi a aprovação da lei dinamarquesa no livro Gay Marriage: for Better Or for Worse?: What We've Learned from the Evidence. 

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Ele relata que houve um longo debate sem precedentes no Parlamento, com intensa participação de setores da sociedade, sobretudo religiosos "cristãos fundamentalistas", tanto sacerdotes quanto líderes leigos. 

"Uma petição assinada por 122 padres dinamarqueses instigava que os parlamentares engavetassem a lei. 'O Estado não pode fazer leis contra o comando de Deus', dizia o texto. Os religiosos temiam que a lei 'privilegiasse anormalidades'", relata o jurista. 

Mesmo entre os políticos houve discussões semelhantes. Quando o projeto foi posto em discussão, um parlamentar, em tom rude, argumentou que a lei era "uma catástrofe" e que colocaria a Dinamarca "contra todo o resto do mundo". 

"Poucas vezes houve no Parlamento dinamarquês um debate tão fundamental quanto esse, no qual os membros discutiram, e discordaram muitas vezes, sobre o papel da religião na hora de legislar", pontua Eskridge. 

Os que defendiam a lei, por outro lado, argumentavam que havia chegado "o dia em que uma forma de discriminação contra gays e lésbicas seria removido dos livros de Direito". 

No dia 23 de maio de 1989, a lei foi votada. Quando o placar apareceu, uma festa no público que acompanhava a votação: 71 votos a favor, 47 contrários, cinco abstenções. "Axel e Eigil Axgil, os pais do moderno movimento gay dinamarquês, sorriram triunfantes", narra Eskridge. 

O britânico Richard Coles, jornalista, músico e padre da Igreja Anglicana, afirma que costuma pensar no casal Axgil quando celebra casamentos. 

"Foi à Dinamarca que abriu o caminho, com as uniões estáveis civis – como eram chamados os protótipos dos casamentos gays - cuja lei entrou em vigor em 1989." 

"O primeiro casal a oficializar a união foi Axel e Eigil Axgil, parceiros e ativistas que haviam participado da campanha para mudar a lei. Eles adotaram o sobrenome Axgil, uma combinação de seus nomes, como uma expressão de seu compromisso mútuo", escreve ele, no seu livro Bringing in the Sheaves: Wheat and Chaff from My Years as a Priest. 

"Essas parcerias foram contraídas apenas em cerimônias civis, mas a Igreja da Dinamarca permitiu que seu clero realizasse bênçãos de casais do mesmo sexo, sob o argumento de que são pessoas, não instituições, que são abençoadas", diz o sacerdote. 

"Em 2010, o parlamento dinamarquês permitiu que casais do mesmo sexo adotassem. E, em 2012, as uniões civis foram substituídas por casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Esses casamentos podem ser realizados em igrejas, mas o clero não é obrigado a oficiá-los se não quiserem", prossegue o sacerdote. 

"Eigil Axbil morreu em 1995 aos 73 anos. Axel Axgil morreu em 2011 aos 96. Muitas vezes penso neles quando estou realizando casamentos de casais que se encaixam nos critérios que a Igreja exige – mas em cujo futuro nem mesmo o jogador mais imprudente apostaria."[5]

2.2.As Famílias Homoafetivas

 “Artigo 227  da Constituição Federal :É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

Desde os primórdios da sociedade fala-se em homossexualidade. Muitas pessoas morreram e ainda hoje morrem por conta de sua orientação sexual.

Com os adventos da era moderna, com a evolução do ser humano e a modernização das leis, alguns direitos vêm sendo garantidos, porém no Brasil somente em 2011 com o julgamento da ADI 4.277 que versa sobre a união homoafetiva.

Cumpre ressaltar que o artigo 226 da Constituição Federal traz a fundamentação do que é a família. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Nada diz o que é família e como é composta a luz do parágrafo 7º do artigo constitucional:

“Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais e privadas.”

Nos ensina Paulo Lôbo:

“Evocando os mesmo princípios constitucionais utilizados pelo STF na ADI 4.277, o STJ decidiu em 2012 (REsp 1.183.378), igualmente, pela legalidade e constitucionalidade do casamento direto de casais homossexuais e não apenas por conversão da união estável. Extrai-se da ementa do acórdão: “Os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta aos princípios constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os pluralismo e livre planejamento familiar”. Nesse mesmo sentido, o CNJ editou a Resolução n. 175, de 2013, determinando que os oficiais de registro de casamento recebam as habilitações para casamento entre pessoas do mesmo sexo, vedando às autoridades competentes a recusa da habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre essas pessoas.”[6]

Ainda de acordo com Paulo Lôbo:

“Todos os direitos e deveres jurídicos decorrentes do casamento ou da união estável são iguais para o casal heterossexual ou homossexual, assim na relação entre os cônjuges ou companheiros, como entre pais e filhos. Nenhuma restrição ou limitação pode haver em razão do sexo igual ou distinto, notadamente quanto a natureza familiar dessas uniões, aos filhos, ao regime de bens, aos alimentos, à sucessão hereditária.”[7]

Com a Resolução do CNJ que determina aos Cartórios realizarem a conversão da união estável em casamento, houve um grande salto para a correção de um erro constitucional, onde até então não tinha o reconhecimento da sociedade homoafetiva como sociedade de fato.

No Brasil, o primeiro casamento entre pessoas homoafetivas se deu no município de Jacarei/São Paulo, como segue:

“O juiz Fernando Henrique Pinto, no estado de São Paulo, é o responsável pela primeira sentença no País que converteu a união estável homoafetiva em casamento. A homologação foi concedida hoje, dia 27 de junho. Na sentença, o juiz cita que a orientação religiosa "que de forma mais marcante se opõe ao casamento entre pessoas do mesmo sexo é a colocação da relação sexual procriadora como principal elemento ou requisito essencial do casamento".

De acordo com a decisão, muitas religiões não poderiam aprovar casamentos entre pessoas de sexo opostos que não podem ter filhos. Para o juiz, "depois da decisão do STF era previsível que essa questão fosse levada para a apreciação do Judiciário. Embora a decisão do Supremo não aborde casamento, porque este não fazia parte do pedido, a sentença foi muito importante para que eu tomasse a minha decisão. O que ficaria difícil seria fundamentar o indeferimento do casamento e não o deferimento. Fico feliz em contribuir para que os direitos humanos e a igualdade prevaleçam. O importante no casamento, seja ele entre pessoas do mesmo sexo ou de sexos diferentes, é o amor."

A certidão de casamento será entregue amanhã, Dia Mundial do Orgulho LGBT, ao casal Luiz André Rezende Sousa Moresi e José Sergio Sousa Moresi. O casal receberá a certidão do Cartório de Registro Civil de Jacareí. Comemorando a decisão, Luiz André definiu que essa é uma vitória do movimento LGBT. "Amanhã o Brasil estará entrando para o seleto grupo de países que autorizam o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. É muito importante porque depois da decisão do Supremo Tribunal Federal, só faltava o casamento civil. O casal está junto há oito anos e solicitou a união estável homoafetiva no dia 6 de maio, um dia após a histórica decisão do STF. Luiz André e José Sérgio puderam finalmente adotar o mesmo sobrenome, Sousa Moresi. 

"Já estamos oficialmente casados. A união estável não dá certidão e não muda o registro civil. Com o casamento, adotamos o sobrenome um do outro", disse. Luiz André e José Sérgio deram entrada no pedido de conversão da união estável em casamento civil no dia 6 de junho." Correram os proclamas durante 15 dias e o promotor de Justiça Luiz Berdinaski concedeu parecer favorável. Após o parecer do Ministério Público, a ação seguiu para o juiz da 2ª Vara da Família da Comarca de Jacareí, Fernando Henrique Pinto, que autorizou o casamento", contou.

Para o presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Rodrigo da Cunha Pereira, “como a própria sentença bem disse, se o fundamento é não poder procriar, os casais que não quiserem ter filhos ou que não puderem ter filhos, não podem casar ou não podem constituir família. A sentença é bastante bem fundamentada dentro do estado laico".

Segundo Rodrigo da Cunha, “é uma sentença corajosa porque é a primeira do Brasil que converte a união estável de dois homens ou duas mulheres em casamento. O juiz inseriu a concepção jurídica mais pura, ou seja, sem nenhuma estigmatização. E são essas sentenças, essas decisões destemidas que vão abrindo alas da cidadania, essa coragem que vai instalando um estado democrático de direito, e, principalmente, é uma sentença que não mistura, aliás, separa, o Estado laico do estado religioso. Cada um com sua religião, mas em alguns momentos as religiões, os princípios religiosos colidem com os princípios constitucionais. Ainda mais agora que a Organização das Nações Unidas estabeleceu essa resolução da igualdade. Isso na verdade é um caminho sem volta", disse. 

Para o presidente, essa é a primeira de uma série de outras decisões que virão. "Não se pode mais pensar em cidadania, democracia sem a consideração da igualdade. E até porque esse argumento que não se pode casar é moralista, e como todo moralista ele acaba ficando contraditório", argumentou. 

Segundo ele, essa era uma das principais pendências do Direito de Família, “mas ainda há muitas. O Direito de Família hoje tornou-se uma questão de Direitos Humanos e esse é um avanço importante. Esse é um avanço significativo porque faz exatamente a separação daquilo que o Direito de Família mais almeja que é a separação de moral e ética. Com a moral as pessoas entram em seus valores particularizados e estigmatizantes. E esse juiz conseguiu distinguir ética de moral nessa sentença. É um grande avanço no Direito de Família", garantiu.”[8]

CAPÍTULO 3

3.Dificuldades para Adoção no Brasil

Existem no Brasil inúmeras crianças a espera de um lar, todavia, a fila de espera é igual.

No ano de 2013, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) através da Resolução nº 32 determinou que nos meses de abril e outubro para a realização de audiências concentradas para a diminuição da fila de espera para a adoção.

Contudo, mesmo com a edição desta resolução, muitas pessoas que não atendem aos critérios determinados pela Justiça para a adoção ficam anos a fio, como ensina Maria Berenice Dias:

“Qualquer pessoa pode adotar. Pessoas sozinhas: solteiros, divorciados, viúvos. A lei não faz qualquer restrição quanto a orientação sexual do adotante, nem poderia fazê-lo”.[9]

“Na tentativa de agilizar o procedimento de adoção e reduzir o tempo de permanência de crianças e adolescentes em instituições, a chamada de Lei Nacional de Adoção (Lei 12.010/09) não faz jus ao nome, pois só veio dificultar o processo de adoção. De forma injustificável por onze vezes reitera a preferência à família natural”.[10]

Nesta esteira temos então a Resolução 32/2013 do CNJ:

“PROVIMENTO Nº 32

Dispõe sobre as audiências concentradas nas Varas da Infância e Juventude.

O CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTlÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO o disposto no art. 8°, X do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO a experiência exitosa das "Audiências Concentradas", iniciada em todos os tribunais do país após o 1º Encontro Nacional das Coordenadorias de Infância e Juventude em 2010;

CONSIDERANDO a Instrução Normativa nº 02/2010 desta Corregedoria Nacional;

CONSIDERANDO o art. 19, § 1º do ECA, que dispõe sobre a reavaliação semestral obrigatória dos casos de crianças e adolescentes acolhidos,

CONSIDERANDO as inúmeras sugestões e informações coletadas no processo "CUMPRDEC" que tramita nesta Corregedoria Nacional de Justiça sob nº 0005552-24.2010.2.00.0000,

CONSIDERANDO as sugestões colhidas após o Encontro Nacional dos Coordenadores da Infância do Ministério Público e do Poder Judiciário ocorrido em Brasília, nas dependências do CNMP, aos 16/05/2013;

RESOLVE:

Art. 1º. O Juiz da Infância e Juventude, sem prejuízo do andamento regular, permanente e prioritário dos processos sob sua condução, deverá realizar, em cada semestre, preferencialmente nos meses de abril e outubro, os eventos denominados "Audiências Concentradas", a se realizarem, sempre que possível, nas dependências das entidades de acolhimento, com a presença dos atores do sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente, para reavaliação de cada uma das medidas protetivas de acolhimento, diante de seu caráter excepcional e provisório, com a subsequente confecção de atas individualizadas para juntada em cada um dos processos.

§ 1º Nas varas de grandes comarcas, com excessivo número de acolhidos, reserva-se ao magistrado a possibilidade da seleção dos processos mais viáveis para audiência, desde que mantenha absoluto controle da situação dos demais.

§ 2º Sugere-se o seguinte roteiro para a realização das audiências:

I - conferência pela vara, no Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA), dos dados cadastrais da(s) entidade(s) de acolhimento a ela submetida(s), com a atualização completa dos seus dados;

II - levantamento prévio, a ser feito diretamente perante a(s) entidade(s) de acolhimento ou por ela encaminhado, da lista dos nomes das crianças e adolescentes ali acolhidos;

III - conclusão ao gabinete de todos os processos dos infantes listados no inciso anterior onde foi aplicada a medida protetiva de acolhimento, autuando-se desde já novos processos em favor dos acolhidos que, eventualmente, se encontrarem na instituição de forma irregular, ou seja, sem guia de acolhimento ou qualquer decisão judicial respaldando a institucionalização;

IV - designação das audiências e intimação do Ministério Público, Defensoria Pública, e representantes dos seguintes órgãos, onde houver, para fins de envolvimento único e tomada de medidas efetivas que visem abreviar o período de institucionalização:

a) Equipe interdisciplinar atuante perante a vara da infância e juventude;

b) Conselho Tutelar;

c) Entidade de acolhimento e sua equipe interdisciplinar;

d) Secretaria Municipal de Assistência Social;

e) Secretaria Municipal de Saúde;

f) Secretaria Municipal de Educação;

g) Secretaria Municipal de Trabalho/Emprego;

h) Secretaria Municipal de Habitação

i) Escrivão(ã) da própria Vara.

VI - Intimação prévia dos pais ou parentes do acolhido que com eles mantenham vínculos de afinidade e afetividade, ou sua condução no dia do ato.

VII - Confecção de ata de audiência individualizada para cada acolhido ou grupo de irmãos, com assinatura dos presentes e as medidas tomadas, com a sua juntada aos respectivos autos.

VIII - Anotação final das medidas tomadas nas audiências, para fins estatísticos, a ser incluída no Sistema CNCA, em campo criado exclusivamente para este fim, separado por entidade de acolhimento, com os seguintes dados fundamentais:

a) semestre a que se referem (1º ou 2º) / ano;

b) local onde as audiências se realizaram;

c) total geral de acolhidos na entidade;

d) total de acolhidos com genitores falecidos ou desconhecidos;

e) total de acolhidos com consentimento ou a pedido dos genitores para colocação em família substituta;

f) total de audiências realizadas;

g) total de reintegrados à família de natural (pai e/ou mãe);

h) total de reintegrados à família extensa;

i) total de reintegrados à família substituta;

j) total de mantidos acolhidos;

k) total de acolhidos há mais de 2 (dois) anos ininterruptamente;

l) total de acolhidos há mais de 6 (seis) meses sem ação de destituição do poder familiar ajuizada;

m) total de acolhidos há mais de 6 (seis) meses com ação de destituição do poder familiar em andamento;

n) total de acolhidos há mais de 6 (seis) meses com ação de destituição do poder familiar com sentença transitada em julgado;

Art. 2º. Na audiência, sem prejuízo do uso deste roteiro na condução rotineira do processo antes e depois da audiência, sugere-se seja observado e regularizado minimamente o seguinte:

a) Há nos autos alguma tarja específica identificando que se trata de processo com infante acolhido?

b) Há nos autos foto(s) da criança ou do adolescente, de preferência na primeira página após a capa?

c) O acolhimento foi realizado por decisão judicial ou ao menos por ela ratificado?

d) Foi expedida a competente Guia de Acolhimento no Sistema CNCA com juntada de cópia nos autos?

e) O infante possui certidão de nascimento com cópia juntada aos autos?

f) O infante está matriculado na rede oficial de ensino?

g) O infante, se o caso, recebeu atendimento médico necessário aos eventuais problemas de saúde que possua?

h) O infante recebe visita dos familiares? Com qual frequência?

i) Já foi elaborado o PIA de que trata do art. 101, § 4º do ECA?

j) A criança, respeitado seu estágio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, ou o adolescente, bem como seus pais, já foram ouvidos em juízo e informados dos seus direitos e dos motivos que determinaram a intervenção nos termos do que dispõe os incisos XI e XII do parágrafo único do art. 100 do ECA?

k) O acolhido e/ou seus pais ou responsáveis foram encaminhados a programas oficiais ou comunitários de orientação, apoio e promoção social com vistas a futura reintegração familiar?

l) É possível no momento a reintegração do infante à família de origem?

m) Em caso negativo, foram esgotadas as buscas de membros da família extensa que possam ter o infante sob sua guarda?

n) Se o caso, já foi ajuizada a ação de destituição do poder familiar? Em que data?

o) Em caso positivo, está ela tendo o andamento adequado?

p) Se já transitou em julgado a ação de destituição, o nome do infante já foi inserido adequadamente no Cadastro Nacional de Adoção?

q) Foi tentada, pelo Cadastro Nacional de Adoção, a busca de eventuais pretendentes? Qual a última vez que foi tentada a busca?

Art. 3º. Concluídas as audiências, será de responsabilidade do magistrado o preenchimento eletrônico das estatísticas de que trata o art. 1º, parágrafo segundo, inciso VIII deste Provimento no Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA) em campos próprios lá criados para este fim.

Art. 4º. O processo de "medida de proteção" ou similar referente ao infante em situação de risco, acolhido ou não, deve preferencialmente ser autônomo em relação a eventual ação de destituição do poder familiar de seus genitores, bem como à ação de adoção ou quaisquer outros procedimentos onde se deva observar o contraditório, podendo ser arquivado ou desarquivado por decisão judicial sempre que a situação de risco subsistir, para preservar, num só feito, o histórico do infante e, ao mesmo tempo, manter o processo sempre acessível, enquanto as outras ações, com rito próprio, possam se encontrar em carga com quaisquer das partes ou vir a ser objeto de recurso para os tribunais.

Art. 5º. Nos casos de crianças ou adolescentes acolhidos há mais de 6 (seis) meses, constatado pelo magistrado que diante das peculiaridades haja possível excesso de prazo no acolhimento sem o ajuizamento de ação de destituição do poder familiar dos pais biológicos, recomenda-se seja concedida vista imediata dos autos ao Ministério Público para manifestação expressa sobre tal situação.

Parágrafo único. Caso o entendimento do Ministério Público seja pela não propositura da ação de destituição do poder familiar dos pais biológicos e a manutenção do acolhimento, ante o risco da perpetuação da indefinição da situação, recomenda-se ao magistrado, diante da excepcionalidade e provisoriedade da medida protetiva de acolhimento, que, encaminhe cópia dos autos ao Procurador Geral de Justiça para eventual reexame, podendo, para tanto, se utilizar da analogia com o disposto no art. 28 do CPP.

Art. 6º. Este Provimento entrará em vigor após 40 (quarenta) dias da data da sua publicação.[11]

3.1.Caso de Adoção por Casal Homoafetivo no Brasil

Um dos primeiros casos no Brasil, o qual se tornou notório chegando a ser noticiado pela imprensa, foi o de uma menina no interior do Estado de São Paulo, na cidade de Catanduva.

Segundo reportagem do portal Globo.com, Dorival Pereira de Carvalho e Vasco Pedro da Gama Junior, lutaram na justiça pela guarda da menor Theodora pelo período de cinco anos até conseguirem no final de 2005 a guarda da menor.[12]

A reportagem, foi dito por eles que tiveram o primeiro pedido negado, porém, recorreram e, após longos cinco anos, conquistaram o direito de adotar a menina, que leva o sobrenome dos dois “pais” na certidão de nascimento.

Neste caso, percebe-se que devido a opção sexual dos adotantes houve uma certa dificuldade para efetuar a adoção, pois conforme declarações na mesma entrevista, foi dito a seguinte frase: “O juiz não autorizou na primeira vez. Depois entramos com o pedido novamente e embasado na área psicossocial o juiz foi favorável.”

Depreende-se da leitura do artigo jornalístico que houve uma certa demora por parte do Poder Judiciário da época em conceder a guarda definitiva da menina em questão. Talvez por se tratar de um casal homoafetivo, e por ser o primeiro caso no Brasil até então.

É cediço que a sociedade não via com bons olhos aquela adoção, uma vez que um casal homoafetivo eram a parte interessada.

Todavia perseveraram, pois conheceram a pequena Theodora no orfanato local, e desde o primeiro contato, a primeira audiência, em todos os tramites processuais, eles acreditavam na justiça como um todo, sendo este considerado um dos primeiros casos de adoção por casal homoafetivo reconhecido em nosso Estado Brasileiro após a Constituição de 1.988.

3.2. Direitos e Garantias Fundamentais da Sociedade Homoafetiva

Com o fim da Segunda Grande Guerra, houve a necessidade da criação de um instrumento que protegesse as pessoas, bem como sua dignidade física, psicológica.

Segundo Fabiano Melo, “a Declaração Universal deu início e proporcionou a expansão do processo de generalização da promoção e proteção aos direitos humanos no século XX. Constitui o documento fundamental da concepção contemporânea dos direitos humanos.”[13]

“A Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas protetivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição”.[14]

Depreende-se ainda da leitura do preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos a proteção da dignidade da pessoa humana, não importando qual sua raça, religião, etnia, opção sexual, sendo certo que todos os Estados-Membros signatários de tal tratado se submetem a cumpri-lo, versando sua melhor aplicabilidade.

Fabiano Melo cita em sua obra o ilustre Antônio Augusto Cançado Trindade, “O princípio da não discriminação é um dos pilares do Direito Internacional dos Direitos Humanos e a não observância constitui uma violação dos propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas”.[15]

Na leitura do artigo 5º da Constituição Federal fica explícito o desejo de igualdade conforme segue:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:”

Como pode se observar, a nossa Constituição Federal garante a todos o mesmo tratamento todas as pessoas, sem distinção, e por mais que não fale sobre família homoafetiva, está de maneira implícita no artigo 3º e 5º de nossa Carta Magna.

Destaque-se os dizeres de Alexandre de Moraes, Ministro do S.T.F:

“O Supremo Tribunal Federal entendeu que o texto constitucional proíbe expressamente o preconceito em razão do sexo ou da natural diferença entre homens e mulheres, afirmando a existência de isonomia entre os sexos, que se caracteriza pela garantia de “não sofrer discriminação pelo fato em si da contraposta conformação anatomofisiológica e de fazer ou deixar de fazer uso da respectiva sexualidade; além de, nas situações de uso emparceirado da sexualidade fazê-lo com pessoas adultas do mesmo sexo ou não”.[16]

É certo que nossa sociedade evoluiu, todavia, as leis que deveriam garantir a todas as pessoas, sem distinção alguma de escolhas quanto a sua opção sexual, tornando-as assim as menos favorecidas, por mais explicito que a Constituição Federal em seus artigos garanta a dignidade da pessoa humana.

Nas palavras o Eminente Ministro Luís Roberto Barroso, em voto do HC 152.752, onde ele dissertou sobre a mutação constitucional:

“Na ocasião sustentei ter ocorrido o fenômeno da mutação constitucional, que significa a alteração do sentido e alcance de uma norma, tal como interpretada pela Suprema Corte, por uma das três razões: (i) mudança da realidade social, (ii) mudança na compreensão do direito ou (iii) pelos impactos negativos produzidos pelo entendimento anterior.”

De maneira simples foi explicado o que ocorre em nossa sociedade atualmente, ou seja, que a sociedade evoluiu, mas a Constituição não, deixando de fora a sociedade homoafetiva como entidade familiar, tal como explanado acima, onde se lê mudança da realidade social.

No artigo 226, § 3º da Carta Magna, deixa de maneira expressa o que é entidade familiar:

“Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” G.n

O legislador no ato de redigir tal artigo, que se trata de uma cláusula pétrea, ou seja, não pode ser modificada a não ser por convocação de uma nova Assembléia Constituinte, não imaginou que a sociedade evoluiria, logo, deixou de fora a sociedade homoafetiva do dispositivo constitucional.

Logo, seguindo o ensinamento acima citado, é nítido que houve uma mudança na realidade social do nosso país, onde hoje vemos que a sociedade homoafetiva busca a equiparação matrimonial de um casal hétero, bem como a igualdade no direito de adoção, sem maiores complicações, seja por preconceito de gênero, seja por preconceito judicial, por parte de uma minoria que não aceita tal condição.

E os impactos negativos pelo entendimento anterior, diante de tal assertiva fica nítido que o artigo 226, em especial no parágrafo 3º, não abrange a sociedade homoafetiva, criando assim uma lacuna constitucional irreparável, pois por se tratar de uma clausula pétrea, exclui esse grupo de pessoas, dificultando de sobremaneira os direitos à adoção solicitada, por não se encaixar nos moldes de uma família tradicional conforme preconiza a Constituição Federal.

 Os direitos e garantais fundamentais inerentes as pessoas ora capituladas na Constituição Federal, segundo ensina Vicente Paulo e Marcelo Alexandre:

“Em suma, os direitos fundamentais surgiram como norma que visavam a restringir a atuação do Estado, exigindo deste um comportamento omissivo (abstenção) em favor da liberdade do indivíduo, ampliando o domínio da autonomia individual frente a ação estatal.

Somente no século XX, com o reconhecimento dos direitos fundamentais de segunda dimensão – direitos sociais, culturais e econômicos – os direitos fundamentais passaram a ter feição positiva, isto é, passaram a exigir, também, a atuação comissiva do Estado, prestações estatais em favor do bem-estar do indivíduo.”[17]

Depreende-se da leitura do texto acima que o Estado somente veio a se preocupar com o bem-estar do indivíduo somente no século XX, e em nosso ordenamento pátrio após a promulgação da Constituição de 1998. Contudo, por mais que o nosso ordenamento jurídico tenha abarcado os tratados internacionais como normas supraconstitucionais, e que tais tratados venham a garantir a igualdade de tratamento entre todos os seres humanos, ainda sim existe uma lacuna onde as minorias não possuem, por assim dizer, os mesmos direitos e garantias fundamentais.

Cumpre consignar que existe um movimento para que todas as pessoas tenham as mesmas garantias constitucionais sem distinção de orientação sexual, pois todas as outras já estão descritas na forma da lei. Nos ensina Drª. Maria Berenice Dias:

“A própria finalidade do Estado é assegurar a todos o direito à felicidade, não só como um sonho individual, mas como meta social. Não consegue ser feliz quem não tem garantidos mínimos direitos...”[18] 

O artigo 6º da Constituição Federal deixa tal direito implícito, pois não traz a palavra felicidade transcrita, todavia o Senador Cristóvão Buarque, em 2010 propôs a PEC da Felicidade sob nº 10/2010:

“São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados.”[19] g.n

Nota-se que o legislador em 1988 ao promulgar a Constituição não se refere de maneira direta a felicidade do indivíduo como direito social garantido, mas com o decorrer dos anos está cada vez mais implícito, e de maneira tácita aceita por boa parte dos legisladores e tribunais.

Considerações Finais

Com os adventos da Constituição Federal de 1988, em seu preâmbulo, onde se destaca “...a igualdade...”, bem como o Caput do artigo 5º em que se repete a mesma palavra, “igualdade”.

No Brasil, existem mecanismos legais para a adoção quem vem desde a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, com as alterações do Código Civil em 2002, a criação do Provimento nº 32/2013 do CNJ que facilita a adoção, com audiências concentradas.

As adoções deveriam ser viabilizadas devido ao grande número de crianças a espera de um lar.

Porém, com as dificuldades impostas às pessoas que anseiam por uma família completa, com filhos, seja eles naturais ou adotados.

Os filhos adotados com a reestruturação do Código Civil passaram a ter os mesmos direitos que dos filhos naturais, ou seja, inclusive o direito a herança.

Nesta esteira, as famílias homoafetivas, querendo garantir seus direitos a família, com base no critério da igualdade, do acesso ao Poder Judiciário, começou a requerer, via justiça, o direito de constituir um lar completo: com filhos legalmente constituídos, não fruto de um relacionamento anterior, mas sim fruto de uma busca, de um consenso, do princípio da autonomia da vontade.

Luiz Roberto Barroso, durante sua sustentação oral na qual reconheceu como entidade familiar à sociedade homoafetiva, declinou:

“Qualquer maneira de amor vale a pana e ninguém, nessa vida, deve ser diminuído em razão dos seis afetos. A vida é boa é feita dos nossos afetos, dos prazeres e da busca pela felicidade.”  

No trabalho em questão, verifica-se não só as dificuldades de adoção por casal homoafetivo, mas também elenca a dificuldade no contexto geral, de outro giro, com certeza existe maior dificuldade para adoção de crianças por esta classe social é mais difícil. Seja pelo preconceito pela opção sexual, seja pela própria sociedade que não entende que na vida existem muitas maneiras de amar.

O que se precisa hoje é a desburocratização do sistema de adoção no Brasil, eis que existem pessoas de bom coração querendo dar um lar para uma criança ou adolescente, neste diapasão, o sistema judicial tem que fazer as verificações normais quanto aos adotantes, de maneira eficiente, e se for o caso, com o apoio de outras instituições (Polícia Militar, Polícia Civil) e demais órgãos de inteligência para celeridade processual.

A sociedade homoafetiva é a que mais sente as barreiras impostas a elas, pois o primeiro caso de adoção no Brasil somente se concretizou em 2005, em uma luta judicial que demorou quase seis anos, com uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

Logo, mesmo depois da promulgação da Constituição Federal, onde está explicito que somos todos iguais, demorou quase 20 anos para que essa igualdade fosse realmente aplicada, dando a um casal homoafetivo e uma criança o direito constitucional de formarem uma família nos moldes do artigo 226 da nossa Carta Magna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERENICE DIAS, Maria, Manual de Direito das Famílias

QUEIROZ OLIVEIRA FERES RIBEIRO, Débora, Adoção da Pessoa Maior e Capaz: Direito à Autonomia da Vontade, Liberdade e a Dignidade Humana na Família Socioafetiva. 2011

ROBERTO GONÇALVES, Carlos, Direito Civil Brasileiro 6, Direito de Família, 2019, Editora Saraiva, 16 edição

www.agenciabrasil.ebc.com.br em 06/09/19 as 00:47

www.G1.com; pesquisado em 01/06/2020 as 01:15

LÔBO, Paulo, Direito Civil Famílias, volume 5, 9º edição, Editora Saraiva Jur, 2019

LÔBO, Paulo, Direito Civil Famílias, volume 5, 9º edição, Editora Saraiva Jur, 2019

https://ibdfam.jusbrasil.com.br/noticias/2751724/brasil-tem-primeiro-casamento-gay; em 03/06/2020 as 00:30

DIAS, Maria Berenice, Manual de Direito das Famílias, 10º edição, Editora Revista dos Tribunais, 2015

http://www.mppr.mp.br em 15JUN2020 as 20:30

Reportagem do site globo. com em 12JAN2020 as 13:45

MELO, Fabiano, Direitos Humanos. São Paulo: editora Método, 2016

de MORAES, Alexandre, Direito Constitucional, 34ª edição, editora Gen/Atlas, 2018

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo, Direito Constitucional Descomplicado, 18ª edição, Editora Método, 2019,

BERENICE DIAS, Maria, Homoafetividade e Direitos LGBTI, 7ª edição, Revista dos Tribunais, 2016,

PEC nº 19/2

Sobre o autor
Oseas Gonçalves dos Santos Filho

Bacharel em direito, Pós graduado em Direito Penal e Processo Penal e Pós graduando em Direito Constitucional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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