12) POSSIBILIDADE DA SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO POR ESCRITURA, MESMO EXISTINDO FILHOS MENORES OU MAIORES INCAPAZES
A lei é clara ao condicionar as escrituras de separação e divórcio à ausência de filhos menores ou maiores incapazes do casal.
No entanto, princípio comezinho de direito pátrio que "a lei deve ser aplicada segundo os fins sociais a que se destina", de modo a afastar a vedação em alguns casos especiais.
Com efeito, a finalidade da lei nova foi simplificar as separações e divórcios consensuais, mediante procedimento administrativo rápido, quando desnecessária a intervenção judicial.
Afastou-se a possibilidade de realização dos atos notariais quando da presença de filhos incapazes dos separandos e divorciandos, posto ser indispensável a tutela dos interesses destes pelo Poder Judiciário, sob a fiscalização do Ministério Público.
Mas e se os direitos indisponíveis dos filhos incapazes já estiverem judicialmente tutelados e as escrituras de separação e divórcio ratificarem as decisões judiciais, sem quaisquer alterações pelo casal? Qual o prejuízo para os filhos incapazes?
Nenhum.
Assim, se for caso de mera conversão consensual de separação judicial em divórcio, no qual ficarão mantidas as cláusulas da separação relativas à guarda, direito de visita e pensão alimentícia dos filhos menores e maiores incapazes, obviamente que nenhum prejuízo poderá ocorrer para os filhos. Nessa hipótese se foram prejudicados, tal se deu no processo judicial da separação e sob as barbas do Juiz de Direito e do Promotor de Justiça.
Ora, também possível em processo contencioso ou consensual serem resolvidas as questões de alimentos, guarda e direito de visita dos filhos incapazes, podendo os cônjuges em escritura de separação ou divórcio consensual direto ratificar o acordo homologado ou a decisão imposta pelo Judiciário.
Tal ocorrendo, não há margem para prejuízo para os filhos.
Em resumo: entendo que a intenção do legislador, ou melhor, que o fim social buscado foi unicamente impedir que os cônjuges ou ex-cônjuges, em escrituras de separação ou divórcio, portanto sem a presença do Juiz de Direito e do Promotor de Justiça, estabeleçam ou alterem direitos envolvendo filhos menores ou maiores incapazes, especialmente sobre pensão alimentícia, guarda e direito de visita, de modo a permitir ao Judiciário afastar tal óbice para a lavratura da escritura pública, quando já tutelados judicialmente os direitos desses filhos, limitando-se o casal a ratificar as condições dessa tutela judicial.
Acredito que, com o decorrer do tempo, será essa a posição adotada pela maioria dos Juízes. No entanto, como aos tabeliães não é dado decidir, devem se abster de lavrar escrituras quando existentes filhos incapazes, seguindo à risca a letra fria da lei, podendo quando muito levantar dúvida ao Magistrado, ou instruir os contratantes a postular autorização judicial.
Na prática, entre aguardar uma decisão em processo de dúvida ou de autorização judicial para a lavratura da escritura, é preferível requerer a separação ou o divórcio em juízo.
13) ESCRITURA DE INVENTÁRIO E ADJUDICAÇÃO
A lei autoriza seja lavrada a escritura de inventário e partilha, quando os interessados forem maiores e capazes.
Mas se houver herdeiro único, sendo caso de adjudicação?
Não vejo qualquer óbice em se lavrar uma escritura de inventário e adjudicação, figurando o único herdeiro como outorgante declarante.
Comprovada a qualidade de herdeiro único, observadas as demais exigências legais e recolhido o imposto de transmissão causa mortis, deve o tabelião lavrar mencionada escritura, por se tratar de situação singela, menos complexa do que se houvesse outro ou outros herdeiros e, conseqüentemente, uma partilha.
14) CONCLUSÃO
Tomados esses cuidados, observando-se pela certidão do registro civil o óbito da pessoa inventariada ou o tempo mínimo de casamento para a separação consensual (CC, art. 1.574) ou para a conversão da separação legal em divórcio (art. 1.580), não há qualquer empecilho em se lavrar escritura de inventário, separação ou divórcio, por se tratar de ato notarial como outro qualquer.
A lei veio em boa hora, com possibilidade de desafogar o Judiciário, dele retirando casos nos quais sua intervenção não se justifica. Apenas uma crítica: deveria o legislador ao invés de criar mais uma forma de separação legal, ter aproveitado a oportunidade para acabar com a separação judicial, e principalmente com a discussão de culpa pela separação, fonte interminável de litígios no Judiciário, cuja finalidade única é manter abertas as feridas das separações traumáticas.
Como costumeiramente diz o Desembargador Judimar Martins Biber Sampaio: vamos sem medo.