Direito de voto dos credores e atuação jurisdicional no processamento de recuperação judicial

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A sociedade empresária El Chavo Del Ocho S/A, companhia brasileira responsável, desde 1972, pela produção e circulação de obras televisivas voltadas ao público infantil se vê estagnada diante das grandes evoluções tecnológicas vivenciadas no século XXI, com o uso constante da internet e implementação de novos serviços de entretenimento, como os de streaming, tendo como consequência uma grande crise econômico-financeira, e resultando na necessidade do requerimento de recuperação judicial da empresa, tendo em mente que o plano de recuperação, previsto no art. 50 da Lei 11.101 de 2005, salvaria a mesma. A empresa tinha como fito a adaptação da empresa às novas tecnologias presentes atualmente e remodelá-la a tal realidade, assim como pagar seus credores. Na Assembleia Geral de Credores, com a finalidade de que se fosse aprovado o plano de recuperação apresentado pela empresa, o mesmo não foi aprovado por conta de um voto contrário, proferido pelo único credor com garantia real, o Banco Zenón Barriga Y Pesado. Mesmo sendo aprovado pelos credores trabalhistas e quirografários, o plano fora recusado pois não estava cumprindo o quórum demandado pelo art. 45 da Lei 11.101. Questiona-se a possibilidade ou não do pedido de recuperação ser deferido.

Deve-se levar em consideração, para o deferimento do pedido de recuperação judicial, o princípio da função social da empresa e da preservação da mesma. O princípio da preservação da empresa prevê que a contiguidade das atividades de produção de riquezas é algo a se proteger, sempre reconhecendo, em contrapartida, os efeitos nocivos advindos do encerramento das atividades empresariais, uma vez que prejudica não só a sociedade empresária ou só o empresário, mas também todos os demais, como trabalhadores, consumidores, fornecedores e até o Estado. (MAMEDE, 2005)

Daí surge a importância do Estado na preservação da Empresa, que, de acordo com Zanoti e Zanoti (2007):

o Estado  deve  envidar  todos  os  esforços  para  preservar a saúde financeira  delas.  Inegavelmente, elas contribuem  fundamentalmente  para  que  os  cidadãos realizem suas melhores expectativas de vida, seja pela produção de um medicamento, seja pela  colocação  no  mercado  de  bens  e  serviços  que  facilitam  a  vida  das pessoas,  seja  pela geração  de  empregos  que  resultam  em  pagamentos  de  salários  que  dão acesso  a esses confortos.

Pode-se argumentar também através da teoria dos jogos. Tal teoria especifica maneiras capazes de lidar com cooperação e conflito e a mesma faz estudos de decisões tomadas em situações onde há interação entre os jogadores. De acordo com Tomazette (2017):

A grande ideia da recuperação é convencer os grupos de interesse de que os ganhos serão maiores no futuro com a manutenção da atividade. O empresário deverá convencer seus credores (fornecedores, empregados...) de que é melhor abrir mão de algo nesse momento, para posteriormente haver ganhos maiores. (...). Cabe à legislação incentivar os jogadores para que eles tenham colaboração mútua e apoiem a melhor estratégia para todos.

Mesmo com o previsto na Lei 11.101/2005, em seu art. 45 "Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta." (BRASIL, 2005), é possível que o juiz intervenha em tal decisão, principalmente se não há aprovação, sendo possível ao mesmo que imponha a aprovação do plano aos credores. De acordo com Souza (2012), craw down significa "em tradução própria, empurrar goela abaixo, referindo-se ao fato de alguns credores, embora relutantes, terem que se submeter ao plano aprovado pelo juiz." Diante dos expostos é que se opta pelo deferimento do pedido de recuperação judicial.


BRASIL. Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Regula A Recuperação Judicial, A Extrajudicial e A Falência do Empresário e da Sociedade Empresária. Brasília, DF, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 05 set. 2017.

MAMEDE, Gladston. Manual de Direito Empresarial. São Paulo: Atlas, 2005.

SATIRO, Francisco. Autonomia dos credores na aprovação do plano de Recuperação Judicial. Direito Empresarial e Outros estudos em Homenagem ao Professor José Alexandre Tavares Guerreiro. Ricardo Lupion Garcia (Org.), v. 181, 2013.

SOUZA, Juliano Copello de. O cram down na Lei n° 11.101/2005. 2012. 99 f. Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Direito) - Faculdade de Direito Milton Campos. Nova Lima. Disponível em: <http://www.mcampos.br/u/201503/julianocopelodesouzaocramdownalei11101.pdf>. Acesso em 05 set. 2017.

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. Capítulo 3. v. 3. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 43-58.

ZANOTI, Luiz Antonio Ramalho; ZANOTI, André Luiz Depes. A preservação da empresa sob o enfoque da nova lei de falência e de recuperação de empresas. 2007. Disponível em: <http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/28598-28616-1-PB.pdf>. Acesso em: 09 set. 2017.

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