As prerrogativas imiscíveis do advogado e dos militares inativos

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08/11/2021 às 17:37
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Advogado exercendo suas funções essenciais à Justiça, mas são militares inativos, quais prerrogativas devem prevalecer, quais problemas podem advir e por quais crimes respondem e quando???

As prerrogativas imiscíveis do advogado e dos militares inativos.

 

Renato Marçal Dos Santos

Especialista em Direito Penal e Processo Penal Aplicados;

Especialista em Ciências Jurídicas;

Especialista em Direito Constitucional;

Especializasta em Direito Militar;

Extensão em Direito Militar - OAB-Santos;

Docente em Proc. Penal; Direito Penal e Direito Penal Militar;

Membro colaborador da Comissão de Direito Militar OAB  - Guaruja-SP 

Membro consultor comissão de Direito Militar OAB -  Praia Grande - SP

Membro comissão de Direito Militar OAB  -  Santos -SP

 

  1. Considerações iniciais.

É certo que alguns militares, Oficiais ou Praças, Militares das Forças Armadas, ou das Forças Auxiliares, quando se afastam do serviço ativo, ou seja, quando passam para a reserva remunerada ou reformam de acordo com cada denominação específica, acertam em optar, após a passagem para a inatividade, em exercer a nobre arte da advocacia, arte essa essencial ao equilíbrio da Justiça, e nada mais importante que um advogado combativo nos direitos de seus clientes, como também um advogado que conhece as leis e normas vigentes no país, ainda nesse sentido, um advogado que pode ter o diferencial de conhecer a vida na caserna propriamente dita, desse modo, conhece pessoalmente as peculiaridades intramuros, com suas normas internas bem específicas, diante de tal assertiva, falaremos das possibilidades do exercício desta arte, como também das dificuldades enfrentadas por tais profissionais essenciais à administração do que se espera do justo e equilibrado.

 Não pretendemos falar somente do advogado iniciante frente as suas essenciais e inafastáveis prerrogativas, mas também da dificuldade de alguns oficiais em ver na sua frente um superior hierárquico ou mesmo um subalterno hierárquico, que deve todo o respeito, tanto como pessoa quanto como profissional, porém devendo saber em que momento e função aquele militar inativo se encontra, assim, pretendemos expor nosso entendimento e visão, aquela que acreditamos a que se amolda a cada conduta e o seu devido lugar, sem receios, vantagens e demais problemas que possam ser encontrados por todos os atores que farão frente aos interesses, sendo eles, interesses dos seus clientes na combatividade de seus direitos, ou mesmo, nos interesses frente a administração pública militar, exercida por militares, Juízes nos Conselho de Justiça, ou mesmo, os oficiais que são encarregados de Processos Administrativos ou Procedimentos Inquisitoriais, com todas as suas necessidades e peculiaridades.

Diante de tal contexto falaremos das prerrogativas, de uma e outra função, sinalizando, com a devida vênia, a mais adequada para o momento do seu real exercício.

 

  1. Prerrogativas X Privilégios:
    1. Entendendo a palavra “prerrogativa”, substantivo, como sendo um conjunto dos poderes e imunidades que goza certas pessoas, desde que sejam, direitos outorgados e previstos em lei e não ao mero prazer ou contemplação, ou mesmo por capricho e para o contentamento pessoal e satisfação de interesses de cunho personalíssimos. Assim as prerrogativas se revestem de impessoalidade.
    2.  Já o Privilégio, do latim privilegĭum[1], é uma vantagem especial ou a isenção de uma obrigação de que alguém desfruta pela concessão de um superior ou pela sua própria capacidade e circunstância. Existem muitas maneiras de se entender o conceito de privilégio, aqueles instituídos por lei que em sua verdade são prerrogativas legais e impostas a certa categoria de profissionais. Porém, em nosso artigo, utilizaremos a forma pejorativa da palavra, ou seja, sentido desagradável, de desaprovação, algo depreciativo, aquele favorecimento aviltante, indigno, uma vantagem em sentido estrito, um favorecimento pessoal direcionado, em detrimento dos outros que lutam pelos mesmos direitos impostos em lei.
    3. Diante de tais assertivas devemos entender que as prorrogativas, são sim privilégios, mas privilégios de caráter impessoal e que são impostos por lei, normas e regulamentos, por outro lado os privilégios, entenderemos como aquela vantagem “ilegítima” de caráter pessoal, um favor, e não uma obrigação, assim se reveste de caráter pessoal e direcionado a atender pessoa específica e delimitada ao bel prazer de quem os aplica.

 

  1. As Prerrogativas dos Militares, já inativos.

3.1. Para conhecimento e descrição básica, falaremos das prerrogativas dos militares inativos frente às instituições militares, várias são as leis que instituem as prerrogativas dos militares, pois estão previstas em legislações diferentes da cada Estado e a União cada um com suas peculiaridades, contudo, sendo bem igualitárias, com pouquíssimas distinções entre militares estaduais e militares federais, porém em suas essências a base das instituições militares, Hierarquia e Disciplinas são as mesmas, previstas na CF/88, neste enfoque, analisaremos duas leis: a Lei 6.880/80, que Dispõe sobre o Estatuto dos Militares[2], das Forças Armadas, onde tal dispositivo cita por diversas vezes a palavra direitos e prerrogativas, onde nos atentaremos as prerrogativas em razão do posto ou graduação que ocupam, encontraremos na referida lei sobre condição jurídica dos militares é definida pelos dispositivos da Constituição que lhes sejam aplicáveis, por este Estatuto e pela legislação, que lhes outorgam direitos e prerrogativas e lhes impõem deveres e obrigações, constituição das honras, dignidade e distinções de graus hierárquicos, do uso de uniformes, do tratamento e sinais de respeito assegurados em leis e regulamentos, a exemplo o regulamento de continências “R. Cont.”, a precedência hierárquica, e a título comparativo, usaremos a Lei nº 6.218, de 10 de fevereiro de 1983, que dispõe sobre o Estatuto dos Policiais-Militares do Estado de Santa Catarina[3], e dá outras providências que dispõe sobre o ingresso hierarquia, disciplina e função policial militar, onde também são citados direitos e prerrogativas, bem como, são constituídos pela honra, dignidade e distinções devido aos graus hierárquicos e cargos, assim como, tratamento e sinais de respeito que lhes são assegurados em leis e regulamentos, assim notamos que em suas bases são similares, principalmente quanto a hierarquia e disciplina, onde, por fim, as Instituições são regidas pela mesma legislação penal e processual, assim, leis substantivas e adjetivas são as mesma utilizadas no âmbito Federal e Estadual. 

Diante de tais legislações que tratam das prerrogativas dos militares, federais ou estaduais, é certo que o militar inativo, preserva sim, as prerrogativas quando inativo, principalmente quanto ao tratamento, respeito, honra, direitos e sinais de respeito, dentre outras direitos e, inalteráveis quando em situações normais, sendo que, certamente responde frente ao Código Penal Militar, podendo ser no polo ativo ou passivo de legislação castrense, a exemplo, a tipificação prevista no art. 160, Desrespeitar superior diante de outro militar, onde aqui, “in tese” tanto o militar inativo quanto o ativo podem ser sujeitos ativos do crime, desde que conhecida esta condição, por dicção da própria lei Castrense, art. 47º, CPM, porém, se encontrar subsunção na tipificação indireta do art. 9º do CPM.

 

  1. As prerrogativas dos Advogados atuantes.

Com previsão em lei e na própria Constituição de República Federativa do Brasil, por entonação do Art. 133, CF, o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei, dicção inserida pela EC 80\14, sendo descrita de forma clara a necessidade e indispensabilidade do advogado para a administração da Justiça, e sua inviolabilidade no ato de seu ofício, sendo repetidas tais manifestações da necessidade e obrigatoriedade do advogado em todos os litígios, na lei que regulamenta a atividade, deste tão importante, prestador de serviço público, sendo reconhecida a função social do advogado, senão vejamos: a lei 8.906, de 4 de julho de 1994, decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República, dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil [4], assim descreve exatamente o que a Constituição elegeu em seu texto, como essencial a administração da Justiça, sendo que, traz os direitos e prerrogativas deste servidor, deixando claro que, mesmo sendo um ministério privado, presta-se a um serviço público e exerce a função social, diante de tais afirmativas, é certo que no exercício desta nobre atividade, devem ser conhecidos e preservados todos os direitos e prerrogativas para que se possa ser exercida tal atividade com independência, isenção e autonomia.

Devemos entender primeiramente, conforme descreve o art. 6º do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, Lei nº  8.906/94, que não existe hierarquia, nem subordinação entre Juízes, promotores e advogados, certo que, devem se respeitar como pessoas e profissionais que os são, dentro de cada função, e da mesma forma, pelos funcionários públicos, necessitando haver sempre o tratamento digno e compatível entre todos, assim, é acertado que, por não haver hierarquia ou subordinação, o advogado tem liberdade em todo território nacional para exercer a sua profissão.

Assim, pela contextualização, a própria lei estipula, os direitos e prerrogativas que o advogado tem, a exemplo, pode e deve, se assim entender, fazer contato com seu cliente, preso, detido ou recolhido em qualquer estabelecimento civil ou mesmo militar, sendo que a legislação específica, cita ainda que o advogado pode permanecer, sair, entrar independente de licença em locais públicos e onde deve examinar autos, processos e procedimentos, ainda com fundamentação no art. 7º, inc. VI, da mesma lei, pode reclamar contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento, podendo falar em pé ou sentado, ou seja, como achar mais oportuno e conveniente no momento, tendo ainda, o advogado imunidade profissional, (g.n.) não constituindo injúria ou difamação puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, logicamente podendo ser punido por excessos que cometer.

Dentro do citado, conforme estabelece a lei que está em perfeita vigência em todo o território nacional, não se admitindo, nos dias atuais, que essas prerrogativas não sejam conhecidas e assim, cumpridas e respeitadas por todas as pessoas, principalmente por funcionários públicos e operadores do direito, a fim de não serem, essas pessoas, responsabilizadas por possíveis abusos, pois foi inserido pela lei nº 13.869 de 2019, alínea – b, em seu Art. 7º, que constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado previstos nos incisos II, III, IV e V do caput do art. 7º desta Lei, sendo mais certo ainda que, se ocorrer uma violação desse direito, por algum militar, com subsunção da tipicidade indireta, art. 9º do CPM, logicamente havendo o dolo específico, como prevê a lei de abuso de autoridade, estaremos “in tese”, diante de um crime militar por extensão, como leciona Ronaldo João Roth[5], assim, ocorreria o crime de abuso de autoridade de competência da Polícia Judiciária Militar em apurar e a Justiça Militar, Federal ou Estadual, em processar e julgar, assim, a fim de se ter o conhecimento necessário para o exercício da função, bem como orientação a todos, se faz necessário o conhecimento por parte de todos sobre o Código de Processo Penal Militar[6] (CPPM) e o Código Penal Militar[7] (CPM) a fim de cumprir o prescrito por essa legislação especial.

  1. Situações Fáticas.
    1. Já chegou ao nosso conhecimento que advogados, militares inativos, principalmente o iniciantes na atividade da advocacia, que tiveram, nos quarteis, seus direitos e prerrogativas questionadas por oficiais que foram seus comandantes, ou mesmo, não os trataram como advogados e sim como subordinados hierarquicamente, tentando questionar a sua combatividade junto aos direitos dos clientes os quais representavam, sendo tal conduta inaceitável, pois naquele momento o militar inativo, está na condição pura e simples de defensor dos direitos de seu cliente e, assim, não se pode deixar influenciar, ou mesmo temer por algum tipo de repressão quando atuando em sua nobre atividade, não se sentindo intimidado, seja frente ao oficial presidente ou encarregado de algum feito, ou mesmo frente aos Juízes Militares nos Conselhos Permanente de Justiça ou de Justificação.
    2. É certo também que, já foram alçados casos, em que Oficiais se sentiram desconfortáveis em debater com advogados (militar inativo), ou mesmo, decidir sobre requerimentos apresentados por esses advogados, por saber que se tratava de oficiais superiores hierarquicamente ao encarregado do feito, fatos que não existiriam se fossem advogados “não militares inativos”, assim, tiveram dificuldade em deliberar sobre algum assunto, tudo por se tratar de um oficial superior e até mesmo ex-comandantes, imaginem se o encarregado fale algo para o advogado, sabendo que ele é um militar inativo, e sendo interpretado como uma “falta de consideração”, “de respeito”, “de acatamento[8]” deveria ser entendido como desrespeito a superior frente ao advogado (militar inativo) e vice- versa?, se sim for a resposta com certeza levaria a tomada de decisões inadequadas, assim, estaria sendo parcial por receio de ser responsabilizado, será que sendo o advogado miliar inativo, os encarregados deveriam ser superiores hierárquicos a ele? 

Imaginemos tal situação, sem contar no sentimento de submissão das partes, ou seja, arquitetemos que um presidente de certo feito tenha que se apresentar para o advogado (militar inativo) na frente das testemunhas, ou vice-versa, um advogado tendo que ficar em posição de sentido e se apresentar formalmente para o presidente deste feito, incontestavelmente já entrariam na mente das pessoas que lá estivessem, ou seja, o sentimento de submissão de um para com o outro, assim como as partes entenderiam tal situação e principalmente com confiança haveria da imparcialidade na decisão e nos atos ali tomados?

Um dos casos que ganhou alçada judicial, TJM-SP, em relação a atuação do advogado (militar inativo) foi o processo de Número: 0800001-06.2021.9.26.0010, HABEAS CORPUS CRIMINAL[9], com a concessão de liminar, onde os impetrantes, postularam em nome da OAB – Seção São Paulo, a concessão da liminar da Ordem, para expedição de salvo conduto ao paciente, onde fora sustentado que o IPM foi instaurado em razão de ter o paciente, na condição de advogado de policiais militares investigados, procurado a testemunha pedindo para que “revertesse” seu depoimento..., tendo como julgador o Ex. Sr. Dr. Juiz de Direito, Ronaldo João Roth[10], onde o Magistrado, ab initio, entendeu que a situação fática não encontra amparo no artigo 9º do CPM, já que o paciente, conforme comprovado no IPM, não agiu como militar, mas sim, exclusivamente como advogado dos militares investigados, sendo que, com a devida vênia a pensamentos opostos, decisão muito coerente e da forma mais acertada possível, devido a especificidade do caso em concreto, assim, a condição e qualidade da pessoa no caso específico era de advogado (g.n.).  No entanto, em que pese a brilhante decisão de 1ª instância, o TJM/SP, por parte da 2ª Câmara, no julgado de processo judicial eletrônico nº 0800001-06.2021.9.26.0010 - reexame necessário (nº 000174/2021 - 1ª Auditoria) – Rel. Juiz Paulo Prazak, assim ementado: “Acordam os Juízes da Segunda Câmara do E. Tribunal de Justiça Militar do Estado, à unanimidade de votos, em reformar a decisão recorrida, de conformidade com o relatório e voto do e. relator Paulo Prazak, que ficam fazendo parte do acórdão”, sendo assim, caçada a referida liminar concedida inicialmente. Essa matéria encontra-se, em grau de recurso no STJ, Resp. nº 1952247/SP (2021/0242100-0)[11], autuado em 30/07/021, sob relatoria do e. Ministro João Otávio de Noronha, conclusos para decisão, conforme pesquisa realizada em 22nov21.

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 É certo que a própria legislação processual penal castrense, ou seja, o direito adjetivo prevê em seu art. 75. Os direitos e deveres do advogado, onde cito: No exercício da sua função no processo, o advogado terá os direitos que lhe são assegurados e os deveres que lhe são impostos pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, salvo disposição em contrário, expressamente prevista neste Código[12], desta forma, fica de forma bem sucinta que o advogado está regulamentado por lei própria, lei esta Federal em plena vigência. (g.n.).

 

  1. Falemos do tempo do crime.
    1. É acertado que o tempo do crime, com a devida previsão legal no CPM ou no CP, é exatamente o momento da ação ou da omissão, teoria da atividade, seja nos crimes comissivos, omissivos, ou mesmo, nos comissivos por omissão, não importando quando se deu seu resultado, diante da análise literal ou mesmo do resultado declarativo de tais artigos, entendemos que o importante, são as características do sujeito ativo no momento delitivo, assim é certo que o ex militar, responde por crime militar, mesmo se excluído ou exonerado das fileiras da corporação, senão vejamos, no site do Tribunal de Justiça Militar do Estado de Minas Gerais[13] (TJMMG), descreve a competência daquela Justiça Militar da seguinte forma: A Justiça Militar estadual é competente..., Julga também o militar excluído (ex-militar) que tenha cometido crime militar, ainda naquela condição à época do fato.(g.n), a situação em relação a competência também já foi alvo de análise junto ao STJ no recurso ordinário em Habeas Corpus: RHC 20.348 - SC (2006/0231461-1), sob relatoria da e. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, onde em síntese descreve em sua ementa, crime cometido por policial militar do estado, descrito de forma clara que a competência deve ser fixada sempre em relação à qualidade que o recorrente apresentava no momento do cometimento do fato[14]..., sendo por unanimidade acompanhado no acórdão que no caso em concreto negou provimento ao Recurso ordinário em HC. (g.n).
    2. Diante de tais assertivas e logicamente com as devidas proporções e peculiaridades, fica claro que no tempo do cometimento do delito, devemos analisar duas vertentes iniciais, primeiramente a condição e a qualidade do acusado, do averiguado, do investigado, ou seja, da pessoa que cometeu o delito, assim, se o advogado cometeu um delito na condição e qualidade de advogado, devem ser considerados esses predicados, isso é importante devido a algumas restrições tanto matérias, quanto formais ou processuais, ou seja, o crime praticado e a forma de se realizar a prisão do advogado caso seja necessária essa medida extrema.

Já na segunda vertente a ser analisada quanto ao advogado, seja militar reformado ou civil, devemos nos remeter ao CPM em seu art. 9º, incisos e alíneas, em apreciação ordenada com a Lei Maior, CF/88, onde em seus artigos 124º e 125º, em especial o seu § 4º, assim em síntese, devemos saber quais são os crimes militares cometidos e, qual justiça é competente para julgar aquele crime militar, mais especificamente, quem são os jurisdicionados das Justiças Militares e em quais situações.

 

 

  1. Os advogados cometem crime Militar?
    1. Apesar de não ser o tema principal deste artigo, não podemos nos furtar de uma breve incursão ao assunto, desta forma, a resposta é um imponente SIM, pois os advogados como todos os civis, militares da reserva e os reformados, podem cometer crime militar, porém por força Constitucional, com fulcro em seu artigo 124º, a justiça competente para julgar um civil que comete um crime militar na esfera federal, será a Justiça Militar da União, sendo ela competente para julgar crimes militares, independente do sujeito ativo do delito, logicamente se estiverem as circunstâncias do inc. III, do art. 9º do CPM, ou seja, por descrição do legislador, delito contra as Instituições Militares, já a Justiça Militar Estadual, também por delimitação Constitucional, artigo 125º, § 4º, só é competente para Julgar os Militares dos Estados, inclusive os inativos, e sendo mais específico, os seus militares estaduais, vide súmula 78, STJ[15], e caso haja um delito conexo entre um civil e um militar estadual, mesmo que esse delito afronte as instituições militares estaduais, os processos serão desmembrados. “Exceções à regra da junção dos processos em caso de conexão e continência”, conforme lição de Guilherme de Souza Nucci[16]. Exemplificando, um caso em concreto, vide Processo n. 44811/06, citado na obra de Robson Coimbra Neves[17], frente a 1ª Auditoria da Justiça Militar do estado de São Paulo, onde em resumo, foi recebida a denúncia, pelo Magistrado Ronaldo Roth[18], citado que “o fato do denunciado ter procurado o quartel da PM em um domingo e vir a desacatar um militar de serviço...”, onde o denunciado impetrou HC perante o TJM/SP sendo que a 1ª Câmara desse Tribunal denegou a ordem de HC, porém em recurso ao STJ, no HC n. 21.701/SP, entendeu-se que a competência era da Justiça comum. Neste caso, com o máximo de respeito aos ilustres Ministros, entendo que no caso específico o militar reformado, mesmo atuando, in tese, como advogado, ao desacatar o militar de serviço pretendeu e atingiu a Instituição Militar, assim com a perfeita subsunção da tipicidade indireta, art. 9º, inc. III, desta forma, a competência, que era o que estava em voga, seria sim da Justiça Militar Estadual.

 

  1. Conclusão.
    1. Uma posição firme, contudo, respeitosa entre todas as partes.

Pelo contextualizado, fica certo que existem duas funções importantíssimas para as Instituições, sendo a dos encarregados dos feitos de interesse público junto a administração e a Justiça Militar, e a do advogado, atuando frente ao interesse dos seus representados com prerrogativas que se tornam imiscíveis, as prerrogativas do militar inativo e do advogado atuando com base em seus direitos e interesses, onde não podem ser mescladas.

Diante dos princípios implícitos e explícitos, sejam princípios Administrativos, Processuais ou Constitucionais, da isonomia, da impessoalidade, da imparcialidade, da legalidade, da proporcionalidade, da eficiência, da segurança, da boa-fé, da dignidade da pessoa humana, dentre todos os outros que regem a vida pública e privada, todos os advogados devem ser tratados de forma idêntica quando no exercício da profissão, afim de se garantir o livre exercício da profissão, senão imaginemos um advogado ex militar que chega a uma seção e tem que se apresentar em posição de sentido a um superior hierárquico ou, vice versa, um militar da ativa tendo que se apresentar ao advogado atuando, já deixaria qualquer um, em situação no mínimo incomoda e desconfortável para a imparcial atuação em qualquer esfera que seja, sem contar a sensação de submissão ou serventia de um para com o outro frete as outras partes no evento.

Desta forma, com a devida vênia aos pensamentos contrários, o militar juiz, o oficial do conselho de justiça, o oficial, encarregado ou presidente de feitos, ou no exercício  de Polícia Judiciária Militar, seja autoridade originária ou delegada, devem enxergar o advogado, não como pessoas (conhecido, amigo ou inimigo), muito mesmo como um militar inativo, superior ou subordinado hierárquico, mas sim, como um profissional exercendo uma atividade legítima, sem subordinação a órgãos ou pessoas, assim, isento do ônus ou do bônus de ser um militar inativo, mas sim, e somente uma pessoas exercendo seu mister, que está sob a proteção Constitucional do exercício livre da profissão e que naquele momento se encontra regido, regulamentado e tutelado por lei própria, lei que deve ser conhecida e respeitada, o estatuto da OAB - Lei Federal nº 8.906/94, e também é certo que, esse advogado não deve se apresentar como militar inativo, apresentando-se, somente como Advogado. ‘Fulano de tal’, representante de ‘tal parte’, e se for conhecido, informar que naquele momento está exclusivamente na condição e qualidade de advogado, sob pena de ter as prerrogativas misturadas e perder o direito de ter assegurado o estatuto da OAB em sua totalidade, tendo, de tal modo, o risco de ter as prerrogativas embaralhadas e, assim, não exercer a defesa plena dos interesses de seu cliente, e da mesma forma, se esse advogado pretender usar, mesmo que inconscientemente, as prerrogativas que naquele momento estão “adormecidas”, as de militar inativo, não terá prerrogativa, mas sim, um privilégio e, desta forma, estará usando de má-fé, inadmissível com o nobre mister da advocacia e também intolerável com a honra e dignidade de um militar, mesmo que inativo.

Portanto, dentro de caso e ainda bem delimitado, deve-se ter um apropriado entendimento, impessoal e não ideológico, para se garantir ao defensor que se faça a defesa justa e merecida da demanda ao qual está representando em nome de seu cliente, e, reafirmando que indiscutivelmente, os advogados civis ou militares inativos não estão livres de cometerem um crime militar quando sua intenção, com indícios convincentes, seja de atacar a Instituição Militar, porém essa deve ser a exceção, frise-se, não devemos esquecer que a nossa “Constituição Cidadã” exerce força centrípeta sobre todo o ordenamento jurídico vigente no País, assim, deve se analisar de forma razoável e proporcional, dentro da adequabilidade mais conveniente para o caso em concreto, analisando de maneira bem circunstanciada os elementos volitivos e cognitivos do indivíduo, desta forma, o dolo do agente, ou seja, o que ele tentou atingir com sua conduta criminosa e só então se verificar qual seria o crime cometido e qual seria a justiça competente para o julgamento do caso.

 

Sobre o autor
Renato Marçal dos Santos

Advogado; Especialista em Direito Penal e Processo Penal Aplicados; Especialista em Ciências Jurídicas; Especialista em Direito Constitucional; Especialista em Direito Militar; Extensão em Direito Militar - OAB-Santos Docente em Proc. Penal; Direito Penal e Direito Penal Militar. Membro das comissões de Direito Militar OAB - Santos ; Praia Grande ; Guarujá; Jabaquara SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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