A ação rescisória no novo Código de Processo Civil

09/11/2021 às 11:04
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Resumo

 O estudo apresenta como objetivo realizar, através de pesquisa bibliográfica, uma análise acerca da instituição da ação rescisória, apreciado sob a ótica do Novo Código de Processo Civil que entrou em vigor no ano de 2016. Os conceitos necessários para o entendimento do presente trabalho são analisados, considerando-se como mais relevantes os conceitos de sentença, trânsito em julgado, recurso e ação rescisória. Conclui-se que é necessário considerar a importância do instituto da ação rescisória para aquele que teve seu direito violado, no qual o processo já se encontra com a sentença transitada em julgado, mas pretende desconstituí-la por meio do referido instituto. 

Palavras-chaves: Ação Rescisória. Rejulgamento. Sentença transitada em julgado. Recurso. Novo Código de Processo Civil.

1. Introdução

 A ação rescisória é um dos institutos jurídicos processuais mais importantes para o ordenamento brasileiro, pois sem ele não teria como reparar equívocos em sentenças proferidas pelos juízos no qual tenha havido algum ato vicioso através de juízes impedidos, juízo absolutamente incompetente, ofensa ao trânsito em julgado, violação da lei, entre outros pressupostos existentes no artigo 966 do Novo Código de Processo Civil que é a carta vigente nos dias de hoje.

O objetivo da pesquisa é analisar e discutir o conceito, finalidade, característica e requisitos da ação rescisória, diferenciando-a do conceito de recurso, mostrando a importância deste instituto para o direito brasileiro.

Para melhor conceituar a ação rescisória, faz-se necessário breve explanação do conceito de sentença, trânsito em julgado e recurso, que veremos a seguir.

De acordo com o art. 203, § 1º, do Código de Processo Civil, "sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução". Assim, a sentença é o pronunciamento final do juiz. É o ato do juiz que, resolvendo ou não o mérito, põe fim a um procedimento (cognição ou execução).

Trânsito em julgado ou transitar em julgado é uma expressão usada para uma decisão judicial (sentença ou acórdão) de que não se pode mais recorrer, seja porque já passou por todos os recursos possíveis, seja porque o prazo para recorrer terminou.

Imperioso destacar que o princípio do duplo grau de jurisdição garante ao recorrente o direito de submeter a matéria decidida a uma nova apreciação jurisdicional, seja total ou parcial, desde que atendidos determinados pressupostos específicos, previstos em lei. Por esse princípio, o jurisdicionado tem o direito de ter novo julgamento para sua demanda. Desta forma, proferida sentença, cabe recurso.

Recurso é o remédio voluntário e idôneo a ensejar dentro do mesmo processo a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração da decisão judicial que se impugna, conforme nos ensina o professor José Carlos B. Moreira.

O código de processo civil de 2015 prevê elenca taxativamente todos os recursos existentes no ordenamento, bem como seus requisitos e prazos.

Decorrido o prazo estipulado em lei sem interposição de recurso ou tendo sido julgado um recurso sem possibilidade de um novo recurso, a sentença/acórdão transita em julgado, ou seja, uma decisão ou acórdão transita em julgado quando não se pode mais recorrer, seja porque já passou por todos os recursos possíveis, seja porque o prazo para recorrer terminou ou por acordo homologado por sentença entre as partes.

O trânsito em julgado é importantíssimo para garantir segurança às relações jurídicas. Se não houvesse trânsito em julgado, as questões poderiam ser discutidas eternamente e seria impossível atingir a paz social. A segurança jurídica é um princípio importantíssimo e é fundamental em qualquer Estado Democrático de Direito, como o Brasil.

No entanto, muitas vezes uma sentença ou acórdão transitam em julgado contendo vícios graves que afrontam às leis e a dignidade das pessoas. Como remédio para tal problema, tem-se a Ação Rescisória.

Ação rescisória é a demanda através do qual se busca desconstituir decisão coberta pela coisa julgada, podendo haver novo julgamento da causa original. Ela está prevista no art. 966 e seguintes do NCPC[2]. A propositura da rescisória é o meio adequado para, nos casos previstos em lei, desconstituir decisão que já tenha sido alcançada pela coisa julgada (formal ou material).

De acordo com Fredie Didier Jr[3]., a ação rescisória é a ação autônoma de impugnação, que tem por objetivos a desconstituição de decisão judicial transitada em julgado e, eventualmente, o rejulgamento da causa.

Segundo o jurista Nelson Neri Junior[4] É a ação autônoma de impugnação de natureza constitutiva negativa quanto ao juízo rescindendo, dando ensejo à outra relação processual distinta daquela em que foi proferida a decisão rescindenda; ou seja, é uma ação ou instituto processual a fim de afastar a coisa julgada que tenha se formado com um dos vícios gravíssimos de nulidade previstos em lei (rol taxativo) e, se necessário, rejulgar a lide.

O fato de afastar a coisa julgada pode levantar conjecturas se seria inconstitucional, mas essa controvérsia é totalmente descaracterizada, uma vez que a coisa julgada que a Constituição Federal/88 quer preservar é a aquela idônea, sem vício de nulidade, aferida em um processo regular, previstos no rol do art. 966. Portanto, preserva-se a coisa julgada interpretando o instituto à luz dos princípios da Constituição Federal.

Por outro lado, essa ação é uma medida excepcional, pois deve primar pela preservação da coisa julgada. E por apresentar um rol de nulidades taxativo possui um cabimento vinculado à lei, sendo uma medida restritiva. Assim, ainda que possa encontrar outros vícios gravíssimos que não estejam previstos no rol taxativo da lei (art. 966), não caberá ação rescisória.

2. Hipóteses e Pressupostos para propositura da ação rescisória

Por ser um meio excepcional de impugnação, a ação rescisória só pode ser interposta nos casos estritamente previstos em lei, justamente para não haver a banalização da coisa julgada, ofendendo assim o princípio da segurança jurídica previsto na Constituição Federal/88, em seu art. 5º, inciso XXXVI.

De acordo com o Novo CPC, caberá de ação rescisória quando a decisão de mérito, mesmo transitada em julgado, contiver graves vícios. Dessa maneira, são as hipóteses do artigo 966, do Novo Código de Processo Civil:

I.             se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

II.            for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;

III.          resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;

IV.          ofender a coisa julgada;

V.           violar manifestamente norma jurídica;

VI.          for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;

VII.        obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;

VIII.       for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.

Não sendo caso de nenhuma das hipóteses acima descritas, a propositura da ação rescisória restará prejudicada. Não se vislumbra o cabimento da rescisória somente pelo inconformismo do requerente. É preciso que se preencha todos os pressupostos legais. Nesse sentido, cumpre informar que a Ação Rescisória possui requisitos para que seja validada. São eles:

I. Competência

Embora a ação rescisória não seja ação recursal e inicie novo processo, possui competência originária do segundo grau de jurisdição. Diante disso, o pedido deve ser dirigido:

A - Aos Tribunais de Justiça, quando a decisão rescindida for de primeiro grau ou de acórdão dos próprios Tribunais;

B - Ao Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, quando for objeto da ação acórdão do próprio STJ/STF.

De acordo com o código de processo civil/2015, se a rescisória for endereçada ao Tribunal errado ela será encaminhada ao Tribunal correto. Intimando o Requerente para eventualmente emendar a inicial e, havendo emenda ouve-se o Requerido artigo 968, § 5º e 6º.

II. Legitimidade para propor a ação

Conforme previsto no art. 967 do CPC, serão partes na rescisória, aqueles que figuraram como partes na ação principal, ou seus sucessores. Também poderá ser parte: o Ministério Público, o terceiro juridicamente interessado e aquele que não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a intervenção.

III. Causa de pedir

O autor deve narrar os fatos que revelam a prolação de uma sentença ou interlocutória parcial transitada com o vício que enseja a rescisória. Logo, é preciso indicar a decisão, a data do trânsito, e é necessário comprovar o vício.

Não havendo indicação desses elementos a rescisória será julgada improcedente. Portanto, na exposição do pedido é necessário que o autor exponha e requeira a rescisão da decisão (juízo rescindendo) e, se for o caso, cumular a essa pretensão o pedido rescisório.

Caso seja deduzida pelo autor somente a pretensão rescindenda desconstitutiva e, se o caso exigir também o rejulgamento da lide (pretensão rescisória), o Tribunal determinará a emenda da petição inicial.

IV. Prazo

A ação rescisória tem natureza de direito potestativo. Desse modo, pode ser atingida pela decadência. Segundo o artigo 975 do Novo CPC:

Art. 975.  O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

Apesar de as decisões impugnadas conterem vícios, o Direito opera com base em princípios como o da segurança jurídica. Desse modo, entende-se imprescindível o prazo decadencial limítrofe para discussão da ação.

V. Propositura da ação

Uma vez que a ação rescisória constitui novo processo, sua propositura deve atender aos requisitos da petição inicial do artigo 319 do Novo CPC. Além disso, o autor também deve se atentar às disposições do artigo 968 do Novo CPC. Assim, é seu dever:

- Fazer o pedido de forma, obrigatoriamente, escrita;

- Qualificar as partes

- Fazer o pedido de rejulgamento, se for o caso, junto ao pedido de rescisão da decisão;

- Indicar os fatos do pedido, sendo obrigatória a indicação dos dispositivos legais apenas quando se tratar de ação rescisória em face de decisão que viola norma jurídica;

- Provar o trânsito em julgado da decisão, com juntada de documento;

- Apresentar as provas supervenientes e/ou que ensejem a ação;

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- Indicar o tribunal competente;

- Indicar o valor da causa;

- Realizar depósito de 5% sobre o valor da causa, não superior a 1.000 salários-mínimos.

Caso a ação seja julgada inadmissível ou improcedente por unanimidade dos votos, o valor depositado se converterá em multa em favor do réu. É, portanto, um meio de evitar a demanda sem que haja causa de fato. No entanto, isenta-se do depósito aquele que for beneficiado com a Justiça Gratuita.

3. Efeitos da ação

A ação rescisória não possui efeito suspensivo. Deste modo, os efeitos da decisão impugnada não são interrompidos no decurso do processo, exceto quanto concedida tutela provisória.

Ao receber a inicial, não sendo causa de julgamento antecipado, o juiz determinará a citação do réu. Este, então, terá de 15 a 30 dias, conforme prazo estabelecido em juízo, para oferecer resposta. O processo, em seguida, observará os ritos do procedimento comum. Conforme o artigo 972 do Novo CPC se os fatos alegados pelas partes dependerem de prova, o relator poderá delegar a competência ao órgão que proferiu a decisão rescindenda, fixando prazo de 1 (um) a 3 (três) meses para a devolução dos autos.

Por fim, concluída a instrução, será aberta vista ao autor e ao réu para alegações finais, sucessivamente, pelo prazo de 10 dias.

Caso o pedido seja julgado procedente, o tribunal competente desconstituirá a decisão rescindenda. Ainda, se houver pedido de rejulgamento, proferirá nova decisão. De todo modo, o valor depositado será restituído ao autor.

Da decisão que encerra a ação rescisória caberá recurso especial ou embargos de declaração, embora também haja discussões sobre a oposição de apelação.

Considerações Finais

Diante do exposto, conclui-se que o processo civil brasileiro passa ao longo do tempo por diversas transformações, sempre buscando o aperfeiçoamento por meio dos legisladores e doutrinadores. A Ação rescisória é um instituto de suma importância que tenta reparar decisões que prejudicou uma das partes, por atos viciosos, assim podendo retratar uma injustiça.

No que concerne à ação rescisória, pode-se notar ao longo do estudo a importância do instituto da ação rescisória, consequentemente melhorando o direito, a parte processual e o sistema jurídico, e pela perspectiva do jurisdicionado, assegurando ainda mais a justiça que tanto se busca.

O trabalho abordou os aspectos mais importantes da ação rescisória, bem como seu cabimento. Com isso, conclui-se que em caso de uma injusta decisão judicial é possível ainda buscar a justiça, desde que presentes os requisitos necessários para propositura da rescisória.

Evidencia-se assim que a ação rescisória é uma conquista ao longo de muito tempo de debate e discussões. Pode-se falar que ela é um dos institutos mais apreciáveis da ciência jurídica.

 

REFERÊNCIAS

BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015.

BRASIL. Novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.105/2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm Acesso em: 15 de setembro 2020.

DIAS, Luciano Souto. LIMA, Marcellus Polastri. Apontamentos sobre a ação rescisória no Novo Código de Processo Civil. Belo Horizonte. 2017. Disponível em: < https://www.rkladvocacia.com/apontamentos-sobre-acao-rescisoria-no-novo-codigo-de-processo-civil/> Acesso em: 17 de setembro 2020.

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JUSPODIVM, 2016.

LENZA, Pedro. Direito Processual Civil Esquematizado.  São Paulo: Editora Saraiva, 2017.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002.


[2] Novo Código de Processo Civil Brasileiro (2015).

[3] DIDIER Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. Salvador: Jus Podivm, 2016, 13. ed., p. 421

[4] NERY, Rosa Maria de Andrade; JÚNIOR, Nelson Nery. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2020.

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