O TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA COMO INSTRUMENTO PARA VERIFICAÇÃO DE CONFORMIDADE JURÍDICA DAS EMPRESAS: PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO E A NECESSIDADE DE EFICIÊNCIA NA APURAÇÃO DE ILÍCITOS.

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RESUMO

Esta pesquisa tem por objeto o estudo do Termo de Ajustamento de Conduta sua aplicação e eficiência no combate de condutas que lesam o erário, e em sua celebração, uma forma de contornar o óbice quanto aos direitos indisponíveis.

O governo brasileiro sempre se depara com um problema central, o qual seja, fechar brechas que oportunizam aos gestores a adoção de condutas que visam apenas seu benefício próprio.

A corrupção data na história brasileira desde o Brasil Imperial, pensando em combater tais condutas que colocam em risco a vida útil da administração direta e indireta o legislador criou normas e tipificou condutas, leis, regulamentos, que dificultam a ocorrência de condutas corruptas enquanto o indivíduo está investido como um longa manus da administração pública.

Influenciada pelo Direito Norte-americano, a doutrina jurídica importou o Compliance, o qual é aplicado nas empresas privadas como um conjunto de regras de conduta, políticas, princípios, e filosofia do bem-estar da empresa e governança corporativa eficiente que tem por objetivo prover à empresa uma vida próspera, repleta de boa fama, e lucro vultuoso.

Surge na doutrina jurídica brasileira o Termo de Ajustamento de Conduta que ao longo de sua aplicação evoluiu de um simples acordo firmado entre indivíduos e pessoas jurídicas com o Ministério Público, que tinha por objetivo dirimir e ressarcir danos que já ocorreram, para um instrumento preventivo, que tem por objetivo principal a PREVENÇÃO da ocorrência de condutas corruptas, assim se amoldando perfeitamente à vontade da lei.

O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) influenciado pelas práticas de Compliance hoje também tem sua aplicação às empresas estatais tendo se mostrado como um instrumento eficiente no combate da corrupção. A problemática que a celebração do TAC enfrenta é quanto à indisponibilidade do interesse público, os direitos indisponíveis os quais a administração pública não pode se dispor.

Palavras-chave: Termo de Ajustamento de Conduta, Compliance, Direitos Indisponíveis, Empresas Estatais.

INTRODUÇÃO

O problema desta pesquisa se concentra nas indagações sobre o que é o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e como ele pode ser aplicado às empresas estatais, e qual o enfrentamento de seu objeto com o ordenamento jurídico pátrio.

O estudo se desenvolveu à luz do entendimento sobre as práticas de Compliance na aplicação do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que tem por natureza jurídica de um acordo celebrado entre particulares, empresas, e o poder público afim de amoldarem suas condutas à vontade da lei.

As empresas estatais hoje são regidas pelo direito público ou mesmo pelo direito privado enquanto servem ao interesse público, e se mostram rentáveis e eficientes, submetidas a um controle rígido da lei, tribunal de contas, etc. Entretanto tal controle se monstra ineficiente pois os gestores acabam por encontrar lacunas que possibilitam seu enriquecimento à custa do dinheiro público.

A celebração do TAC enfrenta um limite em seu objeto, o qual seja a indisponibilidade de determinados direitos, que dada a sua natureza coletiva que tem por querer o bem-estar social não pode a administração deles se dispor.

O tema central ainda carece de desenvolvimento na doutrina jurídica, onde durante a pesquisa se constatou uma escassez de obras científicas objetivas no estudo da aplicação do TAC como um instrumento capaz de amoldar as empresas, fiscalizar sua atividade com fulcro no querer da lei.

A pesquisa se concretizou em bibliografias de doutrinas jurídicas voltadas ao Direito Administrativo, bem como em banco de teses da Universidade de São Paulo USP, Universidade Federal de Uberlândia UFU, Universidade Federal de Minas Gerais UFMG, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP, bem como foi realizada pesquisa jurisprudencial no portal JusBrasil.

Buscou-se com o estudo explorar o tema em seus elementos isoladamente, assim estudando primeiramente sobre o Regime regente da Administração Pública, Termo de Ajustamento de Conduta, Princípio da Indisponibilidade, Direitos Indisponíveis e seu conceito. Por ainda carecer de desenvolvimento não foi possível aprofundar no tema pesquisado, contudo este trabalho traz um entendimento geral e concreto sobre o que vem a ser o Termo de Ajustamento de Conduta e sua aplicação nas Empresas Estatais e eventual barreira imposta pelos direitos indisponíveis.

1 O PROGAMA DE COMPLIANCE NA ADMINISTRAÇÃO BRASILEIRA: BREVES CONSIDERAÇÕES

1.1 O REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO

A Carta Magna carrega um conjunto de regras e princípios que disciplinam a atuação dos agentes públicos na salvaguarda dos interesses da administração pública.

Esse conglomerado forma as prerrogativas enquanto a administração pública agir na busca do interesse público; e forma também as sujeições que disciplinam a atuação da administração pública, submetendo-a ao princípio da legalidade, devendo o administrador somente realizar condutas prevista em lei. (DIAS, 2012)

José dos Santos Carvalho Filho (2011) exorta que o Direito Administrativo como um conjunto sistemático de normas e princípios que lhe são próprios, se originou nos movimentos constitucionais que se deu no final do século XVIII, onde o Estado passou a ter órgãos específicos incumbidos do exercício da administração pública, o que mostrou necessário o desenvolvimento de uma ciência dogmática que disciplinasse as relações da administração em si mesma, e ainda desta com os particulares. E termina afirmando que somente no século XIX o Direito Administrativo se erigiu como uma ciência.

A conotação regime jurídico administrativo é reservada para caracterizar as normas que delineiam o Direito Administrativo, elevando a administração pública a um patamar vertical privilegiado, as quais podem ser resumidas em prerrogativas e sujeições. (DI PIETRO, 2018)

Di Pietro ainda exorta e observa quanto a posição de supremacia da administração em relação aos interesses particulares, que:

Ao mesmo tempo em que as prerrogativas colocam a Administração em posição de supremacia perante o particular, sempre com o objetivo de atingir o benefício da coletividade, as restrições a que está sujeita limitam a sua atividade a determinados fins e princípios que, se não observados, implicam desvio de poder e conseqüente nulidade dos atos da Administração. O conjunto das prerrogativas e restrições a que está sujeita a Administração e que não se encontram nas relações entre particulares constitui o regime jurídico administrativo. Muitas dessas prerrogativas e restrições são expressas sob a forma de princípios que informam o direito público e, em especial, o Direito Administrativo (DI PIETRO,2018, p.131)

Marçal Justen Filho (2005, p.48) sobre regime jurídico administrativo conceitua:

O regime jurídico de direito público consiste no conjunto de normas jurídicas que disciplinam o desempenho de atividades e de organizações de interesse coletivo, vinculadas direta ou indiretamente à realização dos direitos fundamentais, caracterizado pela ausência de disponibilidade e pela vinculação à satisfação de determinados fins.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2005) com maestria ensina que o regime jurídico administrativo se caracteriza por normas de interesse de toda a sociedade e não meramente de interesse particular, consagrando-se nos princípios da supremacia do interesse público sobre o privado, indisponibilidade dos interesses públicos.

O Regime Jurídico Administrativo dada as peculiaridades do interesse público o qual é o preterido pela Administração, busca o bem-estar coletivo, ou seja, o interesse da coletividade, e se resguarda em prerrogativas e também em sujeições as quais não se manifestam nas relações entre os particulares civis, que é regida pelo direito privado.

1.1.1 Entendimento jurisprudencial sobre o Regime Jurídico Administrativo

Quanto ao tema em analise Regime Jurídico Administrativo, não se mostra controvertido, não sendo objeto de acalorado debate entre os tribunais pátrios, os quais mantendo uma posição conservadora se alinham com o entendimento majoritário da doutrina especializada.

O Tribunal de Justiça do Estado do Acre ao julgar Apelação nº 0713783-89.2015.8.01.0001, julgada em 10 de outubro de 2.017, na qual MEDPLUS Comércio e Representação LTDA. Interpôs nos autos da Ação Ordinária proposta em seu desfavor pelo Departamento Estadual de Pavimentação e Saneamento DEPASA, julgou procedente o pedido inicial para condenar a requerida ora apelante, a se abster de incluir o nome da autarquia estadual ora apelada, no rol dos inadimplentes do Serasa Experian ou em qualquer outro congênere.

A relatora Des.ª Cezarinete Angelim entendeu que a autarquia estadual celebrou contrato cuja natureza tem caráter do direito privado, entretanto o mesmo direito não se aplica à relação, que tendo um agente governamental em um dos polos, já enseja a aplicação do Direito Administrativo, que é caracterizado por conferir prerrogativas e sujeições ao ente público que elevam seu interesse acima do interesse particular; contrariando o entendimento do apelante. O julgamento da apelação frutificou a seguinte ementa:

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE PROTESTO C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. INSCRIÇÃO DE ENTE PÚBLICO EM ÓRGÃOS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. SERASA. IMPOSSIBILIDADE. DÍVIDA ORIUNDA DE CONTRATO ADMINISTRATIVO DERIVADO DE PROCESSO LICITÁTÓRIO. PRERROGATIVAS DA ADMINISTRAÇÃO. CLÁUSULAS EXORBITANTES. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUNTENÇÃO DA VERBA FIXADA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO DESPROVIDOS.

1. Como é cediço, a Administração Pública pode celebrar contratos de direito privado e contratos de direito administrativo, ambos espécies do gênero contratos da Administração, sendo o traço marcante da distinção entre tais avenças a existência, neste últimos, de prerrogativas especiais e cláusulas exorbitantes, que representa, em absoluto, a minimização dos interesses do contrato no objeto de sua pretensão.

2. No caso concreto, induvidoso que a Autarquia Estadual Fez contrato munida de ius imperi, com prerrogativas e sujeições que lhes são próprias, não se lhe aplicando o regime jurídico de direito privado, apto a dar suporte ao protesto ou à inscrição em órgão de proteção ao crédito. Não se pode olvidar que os efeitos negativos do protesto podem gerar eventuais obstáculos a até mesmo impedir que o ente público celebra convênios ou contrate empréstimos para atende os interesses públicos da coletividade.

3. A verba honorária fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa observou estritamente os ditames do art. 85, §§ 2º e 3º e inciso III do CPC/2015.

4. Apelação e Recurso adesivo desprovidos (grifo nosso).

À luz do entendimento do direito privado há uma desproporção quanto as vultuosas prerrogativas que goza a administração pública, entretanto o direito público tem por objeto o bem-estar coletivo, o que justificaria tais prerrogativas, assim é a conclusão do Egrégio Tribunal de Justiça do Pernambuco A administração é a guardiã do interesse público, papel que a legitima à imposição de sacrifícios a direitos individuais em prol do bem-estar social. (TJ-PE APL: 3988834 PE, Relator: Democrito Ramos Reinaldo Filho, Data de Julgamento: 14/03/2019, 1º Câmara Regional de Caruaru 2ª Turma, Data de Publicação: 19/03/2019).

O Tribunal Regional Federal da Segunda Região, nos autos do Agravo e Instrumento nº 201002010163452, Relator Des. Júlio Emílio Abranches Mansur, julgado em 29 de março de 2.011 e publicado em 05 de abril de 2.011. Entendeu que

No âmbito do Direito Administrativo, consoante ensinamento já consolidado doutrina e na jurisprudência, vigora a norma principiológica da supremacia do interesse público sobre o interesse privado. Ainda em sua motivação exortou o magistrado que a posição de supremacia do interesse público diante dos interesses privados confere á Administração um conjunto de prerrogativas estranhas ao direito comum, e por isso mesmo, denominadas exorbitantes [...].

1.2 NOÇÕES QUANTO A APLICAÇÃO DO COMPLIANCE NA ADMINISTRAÇÃO BRASILEIRA

O tema Compliance é vasto e objeto de acaloradas discussões acerca de seu conceito, objeto e aplicação, entretanto este trabalho não objetiva adentrar nesta discussão, cumpre aqui trazer uma noção do instituto e a previsão de sua aplicação na administração pública.

O termo Compliance, advém da língua inglesa, precisamente do verbo To Comply que pelo dicionário Oxford Living Dictionaries (2018) é traduzido como: Act in accordance with a wish or command, sendo agir de acordo com um comando. (TUKAHARA, 2018)

O Compliance se revela como um conjunto de regras e diretrizes a serem seguidas, as quais tem como objetivos tanto prevenir a ocorrência de infrações legais como a prevenção de eventuais riscos de sua ocorrência, que caso ocorram acabariam por colocar em risco a reputação da empresa, além de outras penalidades jurídicas que serão aplicadas caso concretizadas estas infrações (VERÍSSIMO, 2017).

O termo Compliance, tem-se como seu significado um conjunto de sistemas de controle interno que são instituídos por uma empresa, que permitem àquele que utiliza de ativos econômicos-financeiros possa efetivamente gerenciar riscos e prevenir a ocorrência de eventuais operações ilegais, que coloquem em risco não somente a empresa, mas seus clientes, investidores e fornecedores (BENEDETTI, 2014).

A aplicação de programas de Compliance às empresas públicas é de grande valia, uma vez que o governo presta e contrata diversos serviços, sendo tal conduta pautada pela imperiosa legalidade que confere segurança jurídica quanto à pratica de condutas maliciosas, entretanto havendo uma brecha, entenda por corrupção, acarretara um grave prejuízo ao erário público sendo que quem arcará com tal prejuízo é a população, por mais que posteriormente venha a ser responsabilizado o agente público que deu causa ao dano (TUKAHARA, 2018).

Victor Heideki Tukahara (2018) com maestria reflete que os escândalos de corrupção que de tempos em tempos explodem na administração pública brasileira demonstram todo o retardo da mesma quanto ao tema ética e governança corporativa, mesmo após ser signatário de diversos tratados internacionais sobre o tema, ainda caminha em passos lentos, estando em desenvolvimento a ciência do Compliance sua aplicação afim de dirimir a corrupção.

Sobre a problemática o entendimento de Marcio Bonini Notari (2017, p.17), se destaca:

É mister que, a luz de tais constatações, no contexto social e atual, a corrupção não poderá ser vista como algo intrínseco a realidade brasileira. Esse fenômeno que vem perpassando as fronteiras estatais prejudica a legitimidade das instituições públicas, as autoridades estrangeiras e nacionais, degradando a ordem moral/política, atentando contra a diversidade dos povos, ao desenvolvimento sustentável, as políticas públicas. O desenvolvimento integral dos Estados, por meio da mútua cooperação, passa, então, a ser um imperativo da liga das nações, o que exige a união de esforços da comunidade internacional, indo além das políticas locais/ nacionais no enfrentamento a essa patologia.

A ISO International Organization For Standardization elabora a norma regulamentar ISSO 37001 a qual é o Sistema de Gestão Antissuborno, segundo tal norma suborno é:

Oferta, promessa, doação, aceitação ou solicitação de uma vantagem indevida de qualquer valor (que pode ser financeiro ou não financeiro), direta ou indiretamente, e independente de localização (ões), em violação às leis aplicáveis, como um incentivo ou recompensa para uma pessoa que está agindo ou deixando de agir em relação ao desempenho das suas obrigações (ISO, 2017, p.2).

No que se refere ao tema Compliance de acordo com a NBR ISO 37001:2017 as práticas de Compliance buscam a dirimir custos, riscos e danos envolvidos na corrupção, a promover a confiança no negócio e a aumentar sua reputação. Vejamos as disposições sobre o tema em análise:

É esperado que uma organização bem gerenciada tenha uma política de Compliance apoiada por sistemas de gestão apropriados, para auxiliá-la no cumprimento das suas obrigações legais e no comprometimento com a integridade. Uma política antissuborno é um componente de uma política global de Compliance. A política antissuborno e o sistema de gestão de apoio ajudam uma organização a evitar ou mitigar os custos, riscos e danos de envolvimento com suborno, promover a confiança nos negócios e melhorar a sua reputação (BRASIL, 2017).

Para a instituição dos programas de Compliance primordialmente a primeira medida a ser tomada é a elaboração de lei, o ordenamento jurídico brasileiro é tímido quanto ao tema, tendo poucas leis, e diretrizes legais dispondo sobre conjunto de condutas com escopo nas práticas de Compliance.

Tendo uma lei imperativa abrangente a todos os setores da administração pública, estará o programa de Compliance revestido do Princípio da Legalidade, o qual exorta que o agente administrativo deve reger toda a sua conduta por uma lei, jamais dela se desvincular. (DIAS, 2017)

Uma vez instituído o programa de Compliance pautado nos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, surge o dever para os entes da administração direta e indireta ao vincular e submeter suas condutas, voltando todo o ânimo a prevenir ou reprimir atos atentatórios ao erário público, assim tendo uma boa administração, justa e transparente.

2 TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E SUA APLICAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE VERIFICAÇÃO DA CONFORMIDADE JURÍDICA DAS EMPRESAS

2.1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DO TAC NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O Termo de Ajustamento de Conduta é um instrumento genuinamente brasileiro, não sendo então fruto da doutrina jurídica estrangeira (PINHO, 2009). Durante a década de 90 o TAC surge ligado à atuação do Parquet enquanto na ação em defesa do interesse público, desejando homologar acordos extrajudiciais a fim de salvaguardar os seus interesses. (MAZZILLI, 2007)

O legislador viu com bons olhos a intenção do Ministério Público de homologar acordos celebrado entre as partes, e foi editada a Lei nº 7.244/1.984 que tratava dos Juizados Especiais de Pequenas Causas. O acordo celebrado perante o Parquet passou então a ter força de título executivo extrajudicial, nesse sentido é o entendimento da jurisprudência.

4. A orientação consolidada deste Tribunal Superior reconhece que o compromisso de ajustamento de conduta previsto no art. 5º, § 6º, da Lei 7.347/85 constitui título executivo extrajudicial. 5. Nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp 327.023/DF, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 23.5.2006; REsp 443.407/SP, 2ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 25.4.2006; REsp 440.205/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 13.6.2005. 6. Assim, é manifesta a conclusão no sentido de que o compromisso de ajustamento de conduta como espécie de título executivo extrajudicial exige, para o reconhecimento de sua validade, a presença de requisitos, entre os quais a expressa manifestação de vontade do órgão público que formalizou o compromisso que fica exteriorizado pela assinatura do compromitente. Portanto, a ausência de assinatura do representante do Ministério Público que formalizou o termo de ajustamento de conduta constitui requisito formal indispensável que afasta a natureza executiva do referido instrumento. STJ - REsp nº 840.507/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/12/2008, DJe 11/02/2009.

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A Lei nº 9.099/1.995 revogou a Lei nº 7.244/1.984, todavia no parágrafo único de seu artigo 57, reproduziu a redação do artigo 55 da lei pretérita, veja o Valerá como título extrajudicial o acordo celebrado pelas partes, por instrumento escrito, referendado pelo órgão competente do Ministério Público.

O TAC foi abraçado pelo ordenamento jurídico brasileiro, aparecendo com grande destaque no Estatuto da Criança e do Adolescente a Lei nº 8.069/90, que em seu artigo 211 estabelece que os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, o qual terá eficácia de título executivo extrajudicial.

Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. §6º do artigo 5º da Lei de Ação Civil Pública nº 7.347/85 a qual concede o TAC sua efetividade instrumental.

O Código de Processo de Civil de 1.979, em 1.994 por meio da lei 8.953/1.994, alterou o artigo 585, II; seguindo o entendimento, passou a reconhecer o status de título executivo extrajudicial aos acordos celebrados perante o Ministério Público. O referido instrumento também foi previsto na Lei nº 8.884/1.994 chamada Lei Antitruste e também na Lei nº 9.605/1.998 chamada Lei dos Crimes Ambientais.

2.2 NATUREZA JURÍDICA E PLANO DE EFICÁCIA E VALIDADE DO TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA

A natureza jurídica do TAC ainda se resta controvertida na doutrina jurídica brasileira, entretanto sem adentrar nessa problemática, percebe-se que o instituto foi criado com uma inspiração nas chamadas class actions do Direito Norte-americano, sobre isso Scarpinella Bueno (1996, p. 2) pontua:

O procedimento em que uma pessoa, considerada individualmente, ou um pequeno grupo de pessoas, enquanto tal, passa a representar um grupo maior ou classe de pessoas, desde que compartilhem, entre si, um interesse comum. Seu cabimento restringe-se àquelas hipóteses em que a união de todos que poderiam ser partes em um mesmo processo (que se afirmam titulares da lide levada ao Estado juiz, portanto) não é plausível (até porque seu número poderia chegar a milhões) ou porque sua reunião, em um só processo, daria ensejo a dificuldades insuperáveis quanto à jurisdição e à competência.

A doutrina expõe que quanto a natureza jurídica do Termo de Ajustamento de Conduta, há o entendimento de três tipos: acordo, reconhecimento jurídico do pedido e negócio jurídico.

Hugro Nigro Mazzilli (2001) entende ser um acordo, onde se posiciona por uma mitigação do princípio da indisponibilidade da ação pública; de outro lado Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (1992) entende se tratar de um reconhecimento jurídico do pedido, uma vez que se trata de uma obrigação legal a ser cumprida, Geisa de Assis Rodrigues (1995, p. 297) se posiciona ao entendimento de um negócio jurídico bilateral, que tem apenas o efeito de acertar a conduta do obrigado às determinações legais

José dos Santos Carvalho Filho (2009), entende que o TAC é um o ato jurídico pelo qual a pessoa, reconhecendo implicitamente que sua conduta ofende interesse difuso ou coletivo, assume o compromisso de eliminar a ofensa através da adequação de seu comportamento às exigências legais.

Inteligente é o posicionamento de Rodolfo de Camargo Mancuso (1994) o qual entende no curso da ação civil pública é possível a celebração do acordo judicial, não encontrando então óbice sob o argumento de indisponibilidade do objeto, visto que o artigo 841 do Código Civil dispõe que somente direitos patrimoniais estão sujeitos à transação.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se manifestou nesse sentido no RE nº 253-885-0/MG16, Rel. Min. Ellen Gracie, publicado no DJ 21.06.02, vejamos:

Em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis, porque pertencem à coletividade. É, por isso, o administrador, mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotada pela Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste interesse (GRACIE, 2002).

Contribuindo com o entendimento, assim exorta Milaré (2007, p. 976 977):

A marca da indisponibilidade dos interesses e direitos transidividuais impede, em princípio, a transação, tendo em vista que o objeto dessa alcança apenas direitos patrimoniais de caráter privado, [...].

Diante, porém, de situações concretas de dano iminente ou consumado, em que o responsável acede em adequar-se à Lei ou em reparar a lesão, seria fechar os olhos à realidade e as exigências da vida recusar pura e simplesmente tal procedimento, numa incompreensível reverência aos conceitos.

Despertando para esta realidade [...] o § 6º [...] consagra hipótese de transação, pois destina-se a prevenir o litígio (propositura de ação civil pública) ou pôr-lhe fim (ação em andamento), e ainda dotar os legitimados ativos de Título executivo extrajudicial ou judicial, respectivamente, tornando líquida e certa a obrigação [...].

Primordialmente o Termo de Ajustamento de Conduta, se vale na reparação ou até mesmo prevenção de danos aos Direitos Transindividuais, podendo corresponder em uma obrigação de fazer ou não fazer, dentre outros conforme a situação concreta, entretanto não afasta as responsabilidades penais ou administrativas.

Quanto ao plano de eficácia e validade, o Código Civil Brasileiro em seu artigo 104 dispõe: A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Quanto aos legitimados a propor o TAC MAZZILLI (2007, p.231-243) ensina que não são todos os legitimados à ação civil pública ou coletiva que podem tomar compromisso de ajustamento, mas só aqueles que somam à sua condição de legitimados ativos ao processo coletivo a condição de órgãos públicos.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça exorta que apenas os legitimados ao ajuizamento da ação civil pública que detenham condição de órgão público podem tomar das partes termos de ajustamento de conduta (REsp 1020009/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/03/2012, DJe 09/03/2012).

Pode-se concluir que o Ministério Público, bem como os entes da administração direta e indireta estão aptos a celebrar Termo de Ajustamento de Conduta; observando a pertinência temática aos entes que a lei assim dispõe.

Quanto ao Termo de Ajustamento de Conduta se destaca as lições de Antônio Junqueira de Azevedo (2002, p. 41-42):

A validade é, pois, a qualidade que o negócio deve ter ao entrar no mundo jurídico, consistente em estar de acordo com as regras jurídicas (ser regular). Validade é, como sufixo da palavra indica, qualidade de um negócio existente. Válido é adjetivo com que se qualifica o negócio jurídico, formado de acordo com as regras jurídicas. [...]

O terceiro e último plano em que a mente humana deve projetar o negócio jurídico para examiná-lo é o plano de eficácia. Nesse plano, não se trata, naturalmente, de toda e qualquer possível eficácia prática do negócio, mas sim, tão-só, da sua eficácia jurídica e, especialmente, da sua eficácia própria ou típica, isto é, da eficácia referente aos efeitos manifestados como queridos.

Assim ao ser celebrado, no TAC deve se vislumbrar uma declaração de vontade espontânea sem qualquer vício de consentimento; objeto lícito correspondente a uma obrigação de fazer/não fazer, e que segundo Mazzili (2007, p.385) nunca poderá versar a disponibilidade material do próprio direito controvertido; forma escrita; agente capaz.

Uma vez que o Termo de Ajustamento de Conduta é celebrado e homologado perante o órgão judicial adquire a natureza jurídica de título executivo judicial com a individualidade que lhe são inerentes, e também conserva sua natureza de ajustamento de conduta. (RODRIGUES, 1995)

Devido ao vultuoso número de processos ativos perante o poder judiciário brasileiro, gerou acalorados debates entre juristas fomentando a solução consensual de conflitos, e assim o poder legislativo atentou seus olhos para a criação e reforço de meios capazes buscar uma justiça célere e eficaz; trata-se dos institutos da conciliação, mediação e arbitragem.

Em linhas gerais, a arbitragem é regida pela Lei nº 13.140/2015, e o referido instituto corresponde à solução do conflito por um terceiro, o Arbitro que encontrará a decisão final; a mediação corresponde a um procedimento no qual terá a participação de uma terceira pessoa, o Mediador, com a função de possibilitar a intermediação entre as partes polos do conflito; a conciliação por sua vez é uma forma de resolução de conflitos na qual o Conciliador, terá uma participação mais incisiva, buscando compreender os motivos de ambas as partes, e assim fazendo-as chegar a um denominador comum.

O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) entra no cenário jurídico com normas que incisivamente busca a solução consensual de conflitos. Em seu artigo 3°, §3° que: A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. Também em sua parte especial, livro I, título I, prevê um capítulo destinado à mediação e a conciliação no âmbito das ações judiciais.

Humberto Theodoro Junior (2015), exorta que o novo código de processo civil apresenta uma adoção de meios alternativos tradicionais de solução de conflitos, cujo principal objetivo seria a solução de litígios, o que garante a norma constitucional do livre acesso à justiça consagrado no inciso XXXV do art. 5° da CR/1988.

Com a Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.348/85) surgiu o Inquérito Civil, que conforme o entendimento de Mazzilli (apud MELO, 2014, p. 59): A criação do Inquérito Civil inspirou-se no inquérito policial, como mecanismos investigatórios para colheita de informações preparatórias de relevo para iniciativa de atuação do Ministério Público.

Sobre as características do Inquérito Civil segundo as loções de Proença (2001, p. 32-33):

Trata-se de procedimento meramente administrativo, de caráter pré-processual, que se realiza extrajudicialmente. O inquérito civil, de instauração facultativa, desempenha relevante função instrumental. Constitui meio destinado a coligir provas e quaisquer outros elementos de convicção, que possam fundamentar a atuação processual do Ministério Público. O inquérito civil, em suma, configura um procedimento preparatório, destinado a viabilizar o exercício responsável da ação civil pública.

Finalizando sobre o inquérito civil, Mazzilli (2005, p. 95) dispõe: O objeto do inquérito civil consiste na investigação de danos a interesses transindividuais (como meio ambiente, consumidor, etc.), ao patrimônio público e social, ao interesse público e a quaisquer outros interesses que o Ministério Público incuba defender.

Com a celebração do TAC restará suprimida a ação de conhecimento, entretanto sendo a avença descumprida restara a ação de execução de título executivo a medida eficaz de dirimir o dano.

O poder discricionário da administração pública oportuniza a celebração do TAC, sendo observado a conveniência e a oportunidade com o sobrepeso do interesse público envolvido, sendo que a celebração poderá ensejar o arquivamento de processos administrativos sancionatórios (SCHOLZE, 2015)

A composição de litígios envolvendo interesses do âmbito do Direito Público reflete a nova roupagem do Direito Administração, onde de forma plenamente constitucional expressa a vontade do Estado Democrático de Direito; se livrando das amarras arcaicas de um Direito Público autoritário e arbitrário. (SCHOLZE, 2015)

Cumpre observar que a jurisprudência penal tem entendido que a celebração do Termo de Ajustamento de Conduta obsta o oferecimento da denúncia; logo se o TAC afasta a sanção penal do Estado, o mesmo o fará com o poder de polícia estatal. Veja os dizeres jurisprudenciais:

HABEAS CORPUS - TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL - CRIME AMBIENTAL - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA - MATERIA PENAL DESCONSTITUÍDA - POSSIBILIDADE. - A assinatura do termo de compromisso de ajustamento da conduta ambiental (TAC) junto aos órgãos competentes antes do oferecimento da denúncia pelo "Parquet" obsta a propositura da mesma, ante a ausência de justa causa para a instauração da respectiva ação penal, devendo esta ser trancada. - Ordem concedida. 3ª Câmara. HC 351992/2. Juiz Relator Ciro Campos. DJSP 15/02/2000.

Raimundo Simão de Melo (2014, p. 129) leciona que:

O órgão que tomou o compromisso tem a obrigação de acompanhar o seu cumprimento, pena de ser responsabilizado o seu representante legal, condutor do procedimento. Assim, não cumpridas as obrigações, deve ser ajuizada a competente medida judicial pedindo-se a sua satisfação, mais o pagamento dos valores das multas e de eventual indenização pecuniária ajustada no termo. O ajuizamento da ação de execução cabe, em primeiro lugar, ao condutor da investigação que tomou o compromisso, mas a sua omissão, os outros legitimados coletivos para o ajuizamento da Ação Civil Pública correspondente poderão agir para efetivar os direitos protegidos no acordo, sem prejuízo da responsabilização, no caso de omissão injustificada, de quem deveria agir, inclusive por improbidade administrativa na forma da Lei n. 8.429/92 (art. 11, inc. II).

O TAC se mostra uma boa opção para o compromissário, tendo em vista ser um instrumento participativo que permite amplo diálogo entre os contratantes, Daniel Fink (2002, p. 132) de mesmo entendimento afirma: cada parte terá certeza de que cada obrigação é resultado daquilo que cada um pode dar e na forma que pode dar. É a realização do possível.

A baila do tema em debate, o entendimento de Geisa de Assis Rodrigues (2002, p.121) é de que o TAC será eficaz na promoção da justiça: se for um meio econômico, breve e justo de solução de direito transindividual, pois caso contrário, a promessa nele inserida, de aumentar o acesso à justiça, será frustrada. A citada autora ainda acrescenta que o TAC não pode [...] criar um excessivo formalismo para a celebração do ajuste que o tornaria mais dispendioso e demorado, nem criar óbices que limitem a sua operosidade imediata [...] (RODRIGUES, 2002, p.121).

O TAC se mostra como um instrumento muito eficaz na prevenção de danos, entretanto para que tal eficácia seja de modo pleno, deve haver uma fiscalização por parte do poder público, quanto ao cumprimento das cláusulas avençadas. O TAC é um tipo peculiar de transação, que tem como finalidade a prevenção do litígio ou o seu próprio fim, devendo abarcar a totalidade das medidas necessárias à reparação do bem lesado, sendo a principal problemática a ausência de uma estrutura eficiente de acompanhamento do cumprimento da avença, que não seja o próprio denuncismo das entidades civis e dos indivíduos isolados, pois são os que sofrem com o descumprimento do acordo pactuado, seja de forma direita ou mesmo indireta (NOGUEIRA, 2007).

3. O TAC E SUA APLICAÇÃO: ÓBICES QUANTO AOS DIREITOS INDISPONÍVEIS

Com o avanço da globalização e evolução dos direitos humanos, veio surgimento de determinadas situações em que fez com que a sociedade se agrupasse por meio de laços em comum a todos os indivíduos que a compõe; assim ligados e unidos surgiu a necessidade de uma tutela e reconhecimento do caráter desse Direito que era liame entre o grupo, buscando uma efetividade na tutela jurídica da situação, foi possível o reconhecimento desse direito que passou a ser entendido como Direitos Transindividuais.

Conforme já amplamente exposto , com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor nos anos 1.990, pouco se sabia e consequentemente era debatido sobre o tema de Direitos Transindividuais, então com a promulgação, distinguiu os Direitos Transindividuais entre Direitos Difusos, Direitos Coletivos e Direitos Individuais Homogêneos, estabelecendo liames entre indivíduos afetados pelo dano aos direitos a eles inerentes.

O ordenamento jurídico brasileiro se preocupou primordialmente com a tutela dos direitos individuais, o que segundo o entendimento de Souza (2007, p.3) enquanto a proteção aos interesses individuais era das mais abrangentes, os denominados interesses sociais se encontravam, no mais das vezes, à margem da tutela jurídica.

Entende-se por Direitos Transindividuais, aqueles que transcendem a individualidade do interesse, e que pela sua natureza atinge uma coletividade que pode ser determinada ou indeterminada, que resta-se ligada por um vínculo de natureza jurídica ou fático (GONÇALVES, 2012).

O traço distintivo dos Direitos Transindividuais com o ordenamento jurídico tradicionalmente divido em direito público e privado conforme exposto é o vínculo que une uma coletividade, devendo tal direito ser pleiteado por meio de uma tutela coletiva. A problemática do Direito Processual reside na legitimidade para pleitear os interesses transindividuais já que o Direito Processual Civil tradicional reconhecia a legitimidade ordinária e a extraordinária. Foi então necessário inovar quanto ao entendimento da coisa julgada, já que esta sempre atingiu as partes participantes do processo; e nas ações coletivas passou a ter efeitos erga omnes, atingindo não apenas aqueles que participaram da ação, mas todos os que se encontram na situação jurídica ou fática (GONÇALVES, 2012).

A Lei nº 8.078/90 em seu inciso I do artigo 81 conceitua os direitos ou interesses difusos como sendo transindividuais de natureza indivisível, cujos os titulares de tal direito são indeterminados, porém ligadas por uma situação fatídica. Observe bem que o vínculo que liga tais indivíduos é de natureza fática e não jurídica; é o caso por exemplo de uma fábrica que emite poluentes colocando em risco a saúde dos habitantes de uma determinada região. (GONÇALVES, 2012)

Os interesses coletivos são conceitos no inciso II do artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.

Marcus Vinicius Rios Gonçalves (2012, p.22) quanto aos direitos coletivos, entende que: O que distingue o interesse coletivo do difuso é que este tem como titulares pessoas indetermináveis e aquele, pessoas que são determináveis em função da relação jurídica base. Quanto à decisão jurídica a ser proferida no processo coletivo o citado doutrinador leciona:

Não é possível que a ação correspondente beneficie um dos titulares sem beneficiar os demais. Por isso a lei estabelece a coisa julgada ultra partes. A decisão judicial ou beneficia todos os que se encontram na situação jurídica base, ou não beneficia ninguém (GONÇALVES, 2012, p. 22).

Os interesses individuais homogêneos são conceituados pela lei consumerista como direitos divisíveis e por ser seus titulares determinados ou determináveis ligados por um vínculo de natureza fática.

Marcus Vinicius Rios Gonçalves (2012, p. 23) esclarece que os direitos individuais homogêneos nada mais são que um feixe de interesses individuais, agrupados por uma origem comum, e que, por isso mesmo, podem ser objeto de tutela coletiva.

E ainda quanto a diferença entre os interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos o autor supracitado conclui:

O liame entre os titulares dos interesses coletivos deriva diretamente da relação jurídica, ao passo que entre os titulares de interesses difusos ou individuais homogêneos deriva de uma situação de fato em que eles se encontram. Somente os titulares dos interesses difusos não podem ser identificados como aqueles expostos à propaganda enganosa ou aos efeitos poluentes. Se, nesse grupo, alguns ficarem doentes e sofrerem danos, em virtude do efeito nocivo da poluição, comporão um novo grupo, não mais de titulares de interesses difusos, mas de individuais homogêneos.

Sobre o tema José dos Santos Bedaque (1995, p. 64) expõe:

O que caracteriza o direito difuso e o coletivo é a indivisibilidade do objeto, isto é, a satisfação ou a lesão ao interesse de um dos membros do grupo atinge, necessária e automaticamente, a esfera de todos.

Já os direitos individuais homogêneos são aqueles cuja satisfação ou lesão pode ser concebida individualmente. São verdadeiros direitos individuais, tratados de forma coletiva circunstancialmente.

O princípio da supremacia do interesse público em detrimento do interesse privado é um dos alicerces sob qual repousa toda edificação do Direito Administrativo. Protegendo o interesse da Administração Pública, a esta também confere prerrogativas, contudo não podendo abrir mão de seus direitos (NORONHA, 2012).

Gustavo Binenbojm (2005) posiciona-se ao entendimento de que o princípio da supremacia do interesse público não é absoluto e deve ser passado pelo crivo do princípio da proporcionalidade, onde o interesse prevalente deverá ser ponderado conforme o caso concreto.

Os Direitos Indisponíveis se destacam nesse cenário pois na ocasião da celebração do Termo de Ajustamento de Conduta tais Direitos não poderão ser dispostos, ou seja, o titular não poderá se desfazer desse direito por vontade própria.

Carlos Aberto Carmona (2009, p. 38) no mesmo sentido leciona: Um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido livremente pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o cumprimento do preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua urgência.

O Superior Tribunal de Justiça no REsp 1253986 MG 2011/0094604-1 exortou que a transação poderá ocorrer em matéria de direitos privados, sendo que se tratando de direitos e interesses difusos a transação somente poderá ocorrer quando for a medida mais eficaz para a proteção do bem.

O Egrégio Tribunal de Justiça da Bahia de igual entendimento se posicionou:

Quanto à segunda premissa sobre a qual se funda a sentença ora combatida, qual seja, a impossibilidade de transação acerca de direitos indisponíveis, não se está a olvidar da necessária atenção e proteção que está, permanentemente a merecer, o direito em comento o que enseja inclusive que a regra, de fato, seja a da impossibilidade de se transacionar acerca de tais garantias. Apelação: APL 0307363-79.2015.8.05.0080.

O Egrégio Catarinense se manifestou no mesmo sentido exortando:

Os direitos fazendários são indisponíveis: impedem-se transação ou reconhecimento do pedido. Admite-se a composição quando for manifestamente favorável à Administração (STF, RE 253.885-MG) ou houver lei que excepcione o ajuste. TJ-SC AGV: 90439049820058240000.

Fernando Grella (2005, p. 172) pontua: faz a seguinte pontuação:

A mesma pretensão que seria objeto do pedido na ação civil pública deverá estar contemplada no compromisso, não podendo, em nada, ser restringida. Resguarda-se, desse modo, a indisponibilidade do interesse tutelado. A esfera passível de ajuste fica circunscrita à forma de cumprimento da obrigação pelo responsável, isto é, ao modo, tempo, lugar.

Ao seu turno o Egrégio Tribunal de Minas Gerais sobre o tema lecionou: A doutrina, mesmo em se tratando de direitos individuais homogêneos e difusos, admite a conciliação nas causas coletivas, por meio de termo de ajustamento de conduta, que estabelece ações com vistas à reparação das ofensas (Apelação Cível 10024122628829002 MG TJ-MG).

Cumpre trazer o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o qual de igual modo exortou: O objeto da demanda é o ato administrativo que reconheceu a prática de ato de improbidade, ressoando evidente o interesse público. E assim sendo, resta caracterizado o direito indisponível envolvido, razão porque insuscetível de transação (Agravo de Instrumento AI 70056328552 RS (TJ-RS).

Elton Venturi (2016, p. 15) sobre o tema conclui que:

Tanto para os legisladores como para os operadores do sistema de Justiça, não podem mais bastar para justificar a restrição da disposição dos direitos considerados "indisponíveis" abstratas e retóricas presunções a respeito da hipossuficiência e da incapacidade de manifestação volitiva dos seus titulares - que historicamente têm justificado academicamente sua absoluta inegociabilidade.

E ao final Venturi (2016, p. 15) obtempera que a indisponibilidade dos direitos carece da definição de sua natureza jurídica para então determinar o que ele chama fórum resolutivo de conflitos (judicial ou extrajudicial), para então avaliar o limite mais ou menos abrangente de eventuais soluções consensuais que envolvam transação de Direitos Indisponíveis.

Cabe ao Estado enquanto titular do direito transindividual indisponível apresentar uma justificativa sólida e empírica todas as vezes em que pretender intervir a título de proteção do interesse público para então dispor de tal direito.

A questão central se concentra na possibilidade e limite quanto à transação dos direitos de natureza indisponíveis. Geisa de Assis Rodrigues (2002, p.51) que o titular do direito desta natureza não pode dele renunciar, nem submete-lo a uma redução, e ainda observa a nota de indisponibilidade sempre está ligada ao interesse público, aquele reputado como de interesse geral em um momento historio específico de uma dada sociedade, de modo a se evitar o risco de prejuízos a bens relevantes para o sistema jurídico.

Antônio Carlos da Costa Machado (1996, p. 324) expõe que os direitos indisponíveis são enquadrados como leis de ordem pública e possuem as seguintes características: inalienabilidade, instransigibilidade, irrenunciabilidade, impenhorabilidade, não sujeição a reconhecimento jurídico no processo e à confissão e realizabilidade obrigatória em muitos casos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sempre que busque atender o interesse da coletividade, a administração através do regime jurídico administrativo, pode fazer valer seu interesse em detrimento da vontade do particular. Então por meio da supremacia de seu interesse público resta justificado o sacrifício da vontade individual.

A administração pública conduto se sujeita ao princípio da legalidade, onde toda a sua conduta estará regida por uma lei, devendo realizar somente aquilo que a lei deseja. O que não ocorre com o particular, pois lhe é permitido fazer tudo o que não é proibido por lei.

A corrupção desde muito tempo está presente na história do governo brasileiro, onde inúmeros escândalos vêm estampando manchetes de jornais com repercussão até mesmo internacional, causando comoção na população brasileira, a qual indignada acaba por não mais acreditar no governo brasileiro, alegando muitas das vezes que regimes de exceção seria a solução para o problema.

O poder legislativo observando que o grande problema da corrupção assola principalmente as empresas estatais, cria mecanismos legais com escopo de coibir praticas delituosas bem como condená-las e garantir a efetiva indenização ao erário.

A doutrina com uma tendência ainda tímida, tem refletido sobre a aplicação do instituto Compliance às empresas estatais, exortando sobre a importância da criação de normas pragmáticas, visando disciplinar a conduta interna de todos os agentes administrativos atuantes pela administração.

O conjunto das normas de Compliance visão garantir a integridade da empresa, gerenciar riscos que afetam a produtividade e a boa fama da empresa pública. Entretanto sua aplicação carece de uma atuação legislativa, vez que a administração pública está sob o manto do princípio da legalidade.

Entendendo a imperatividade do princípio da legalidade se faz necessária a atuação do legislador em regulamentar distintamente o conjunto de regas e condutas a serem seguidas por todos aqueles que atuam nas empresas estatais, uma vez que a administração pública deve ter toda a sua ação regida por disposição legal.

O Termo de Ajustamento de Conduta inspirado nas Class Actions do Direito Norte-Americano, adentra no ordenamento jurídico brasileiro ainda de forma sutil sendo comumente aplicado nos casos de dano ambiental, onde o causador do dano firma um acordo a fim de regularizar sua conduta afim de evitar novas ocorrências de dano ambiental, bem como também ressarcir os danos já ocorridos.

O Direito Processual Brasileiro primando pela celeridade, economia e efetividade da tutela jurisdicional tem fomentado a solução pacíficas dos conflitos, admitindo meios alternativos de solução da lide.

O Termo de Ajustamento de Conduta se mostra como um instrumento efetivo, pois permite o diálogo entre os pactuantes, sendo observado as particularidades de cada caso; e ainda a tem uma força vinculante normativa que após firmado e homologado se torna um título executivo, dispensando a propositura de manejo de uma ação de conhecimento para apuração da autoria e materialidade do dano.

A administração pública ao celebrar o Termo de Ajustamento de Conduta assume o dever de fiscalizá-lo garantindo assim sua máxima eficácia, buscando evitar novos eventos danosos, ou o agravamento do dano existente.

O Termo de Ajustamento de Conduta é o meio eficaz quando aplicado às empresas estatais afim de garantir sua conformidade jurídica. A empresa em sua gênese celebra o TAC, o qual minunciosamente delimitará sua atividade, buscando a máxima eficiência na prestação de serviço público e atendimento à coletividade.

Tendo o TAC atuando e regendo toda a sua atividade empresarial, o poder público poderá de modo concreto e efetivo fiscalizar a atuação do administrador e agentes públicos, onde caso ocorra algum dano, oriundo de má gestão ficará célere a apuração e posterior ressarcimento frente toda a transparência e legalidade que o TAC trará.

As empresas estatais se submetem ao regime jurídico-administrativo, sendo submetidas aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Devendo ao longo de sua jornada zelar pela sua transparência e prestatividade de um serviço público efetivo, esta é a razão de sua criação e existência.

A grande problemática se infere quanto aos direitos indisponíveis, serem dispostos, em uma transação. A doutrina majoritária exorta pela impossibilidade da transação envolvendo direito indisponíveis, os quais conforme já citado Antônio Carlos da Costa Machado (1996) tais direitos são inalienáveis, intransigíveis, irrenunciáveis, impenhoráveis.

O Termo de Ajustamento de Conduta é um efetivo instrumento quando celebrado sob as características das normas pragmáticas de Compliance, visando entabular regras de conduta que visão gerenciar toda a atividade administrativa, conferindo a máxima legalidade e segurança jurídica, coibindo uma gestão corrupta, e efetiva responsabilização dos agentes, e concreta indenização por danos ulteriores.

Quando a avença objeto de o Termo de Ajustamento de Conduta envolver direitos indisponíveis os quais não são passíveis de transação, merece um olhar atento do poder público quanto ao caso concreto. Sob o crivo do princípio da proporcionalidade quando a disposição de um direito indisponível se justificar para o atendimento de um bem maior, justificado está a permissão em disposição do direito até então indisponível.

Assim conforme o caso concreto resta a avaliação à luz do princípio da proporcionalidade e razoabilidade, onde no conflito entre dispor ou não de tal direito, a administração pública deverá julgar qual o direito em que aplicado em detrimento de outro, será eficaz na busca do interesse público.

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