De proêmio, insta consignar que o aforismo da insignificância, quando cabível, suprime a justa causa que deve supedanear a persecução penal, na medida em que, em casos tais, a conduta hipoteticamente praticada, embora se adeque formalmente à descrição legal da figura típica, será irrelevante do ponto de visto jurídico pois ostenta minguada ofensividade e não afeta, com veemência, o bem tutelado pela tipificação criminal.
Dito de outro modo, o postulado da bagatela é corolário lógico do princípio da intervenção mínima, pois, considerando-se o caráter manifestamente subsidiário do Direito Penal, os comportamentos formalmente típicos que apenas afrontem irrisoriamente a objetividade jurídica calcada na norma penal incriminadora, não ensejam, evidentemente, qualquer censurabilidade fática que exija a intervenção das Ciências Criminais, o que caracteriza a atipicidade dos fatos.
Para corroborar o entendimento ora esposado, e acerca da aplicabilidade do princípio da insignificância, em monografia específica sobre o tema, Carlos Vico Mañas ensina que, de fato, o Direito Penal deve se ocupar exclusivamente de comportamentos incisivamente graves, pois a Lei Penal não dispõe de meios para sanear problemáticas sociais de baixa relevância:
[...] Ao realizar o trabalho de redação do tipo penal, o legislador apenas tem em mente os prejuízos relevantes que o comportamento incriminado possa causar à ordem jurídica e social. Todavia, não dispõe de meios para evitar que também sejam alcançados os casos leves. O princípio da insignificância surge justamente para evitar situações dessa espécie, atuando como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado sistemático e político-criminal de expressão da regra constitucional do nullum crimen sine lege, que nada mais fez do que revelar a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal. No que diz respeito à origem, pode-se afirmar que o princípio já vigorava no direito romano, pois o pretor, em regra geral, não se ocupava de causas ou delitos insignificantes, seguindo a máxima contida no brocardo minimis non curat pretor (MAÑAS, 1994, p. 56).
A propósito do tema, também ensinam os laureados Professores Edilson Mougenot Bonfim e Fernando Capez, que, se a finalidade da norma penal incriminadora é proteger determinado bem jurídico, então, "[...] quando a lesão, de tão insignificante, torna-se imperceptível, não será possível proceder seu enquadramento típico", pois, em casos tais, asseveram inexistir "[...] correspondência entre o fato narrado na lei e o comportamento iníquo realizado". E, de arremate, concluem que "[...] por essa razão, os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos", pois o tipo penal "[...] exige ofensa de alguma magnitude" (BONFIM; CAPEZ, p. 121-122).
Hodiernamente, portanto, a Ciência do Direito Penal não se contenta com a tipicidade puramente formal, isto é, a simples e insuficiente correspondência entre o comportamento do agente e o modelo de conduta descrito na Lei Penal Substantiva.
Deveras, e segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), a aplicação prática do princípio da insignificância demanda o preenchimento cumulativo de alguns requisitos, a saber: (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a ausência de periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento do réu, e, (d) a inexpressividade da lesão ao bem juridicamente tutelado (Habeas Corpus nº 84.412, por exemplo).
Postas tais premissas teóricas, e como é de sabença, as Cortes Superiores consolidaram o entendimento da aplicabilidade do princípio da insignificância em relação à sonegação de tributos federais quando inferiores aos montantes executados pela Fazenda Pública, nos moldes do art. 20, da Lei nº 10.522/02 (BRASIL, 2002) c.c. a Portaria nº 75, do Ministério da Fazenda, de 22 de março de 2012 (BRASIL, 2012), em que o valor estabelecido como parâmetro é de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Como se vê, a lógica por detrás da jurisprudência superior conclui que, se o Estado afasta a cobrança de ordem meramente tributária por motivações de análise econômica, é evidente que o Direito Penal não poderá incidir em razão de sua fragmentariedade. Sobre esse assunto, Cezar Roberto Bitencourt esclarece que, na espécie, "[...] assim, é o próprio Estado que declara que os débitos fiscais naqueles valores não são significativos nem mesmo para efeito de cobrança judicial. Muito menos o serão para efeito de persecução penal e aplicação de pena criminal" (BITENCOURT, 2013, p. 96).
Nesse sentido, e dentre tantos julgados a respeito da temática, exsurge o posicionamento do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmado, por exemplo, nos autos do Recurso Especial nº 1.688.878 - SP (2017/0201621-1):
[...] 1. Considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, deve ser revisto o entendimento firmado, pelo julgamento, sob o rito dos repetitivos, do REsp n. 1.112.748/TO Tema 157, de forma a adequá-lo ao entendimento externado pela Suprema Corte, o qual tem considerado o parâmetro fixado nas Portarias n. 75 e 130/MF R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para aplicação do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho. 2. Assim, a tese fixada passa a ser a seguinte: incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. 3. Recurso especial improvido. Tema 157 modificado nos termos da tese ora fixada.
Nessa mesma linha, a posição da Corte Suprema tal como se infere do aresto exarado nos autos do Habeas Corpus nº 121659, dentre outros inúmeros julgados:
A aplicação do princípio da insignificância, na linha do que decidido por esta Corte, pressupõe ofensividade mínima da conduta do agente, reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão jurídica causada e ausência de periculosidade social. Na espécie, o valor dos tributos supostamente elididos cerca de R$ 17.000,00 está aquém do limite de R$ 20.000,00 previsto no art. 20 da Lei 10.522/02, alterado pelas Portarias 75/2012 e 130/2002 do Ministério da Fazenda, o que autoriza, em tese, a incidência do princípio da insignificância.
Portanto, há muito a jurisprudência superior reconhece o postulado da bagatela aos crimes fiscais, pois, como é evidente, não se admite que determinada conduta seja irrelevante para a Administração Fazendária e não para o Direito Penal, que é a ultima ratio jurídica.
Nesse quadro, e tecidas tais considerações introdutórias, é interessante pontuar que o mesmo raciocínio vale para tributos estaduais, pois, de acordo com a jurisprudência da Corte Superior da Cidadania, se há Lei Estadual que discipline hipótese de inexigibilidade de execução fiscal para débitos que não ultrapassem dado valor, então haverá como se admitir a utilização de tal referência monetária para fins de insignificância criminal, conforme exemplifica o seguinte aresto:
Ainda que a incidência do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho, quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00, tenha aplicação somente aos tributos de competência da União, à luz das Portarias n. 75/2012 e n. 130/2012 do Ministério da Fazenda, parece-me encontrar amparo legal a tese da defesa quanto à possibilidade de aplicação do mesmo raciocínio ao tributo estadual, especialmente porque no Estado de São Paulo vige a Lei Estadual n. 14.272/2010, que prevê hipótese de inexigibilidade de execução fiscal para débitos que não ultrapassem 600 (seiscentas) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs, podendo-se admitir a utilização de tal parâmetro para fins de insignificância. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância e determinar o trancamento da Ação Penal n. 00010623620178260372 - 2ª Vara Criminal da comarca de Monte Mor/SP (HC 535.063/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 10/06/2020, DJe 25/08/2020).
E, de fato, como referido no julgado, o art. 1º, da Lei Estadual nº 14.272/2010 (SÃO PAULO, 2010), atualizado pela Lei Estadual nº 16.498/2017 (SÃO PAULO, 2017), estabelece que o Poder Executivo, por meio dos órgãos competentes da Procuradoria Geral do Estado, está autorizado a não propor ações, inclusive execuções fiscais, assim como requerer a desistência das ajuizadas, para cobrança de débitos de natureza tributária ou não tributária, cujos valores atualizados não ultrapassem 1.200 (mil e duzentas) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (UFESPs).
Confira a letra da Lei:
Artigo 1º - Fica o Poder Executivo, por meio dos órgãos competentes da Procuradoria Geral do Estado, autorizado a não propor ações, inclusive execuções fiscais, assim como requerer a desistência das ajuizadas, para cobrança de débitos de natureza tributária ou não tributária, cujos valores atualizados não ultrapassem 1.200 (mil e duzentas) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs. (NR).
- Artigo 1º com redação dada pela Lei nº 16.498, de 18/07/2017, produzindo efeitos a partir de sua regulamentação.
Assim, a existência do dispositivo legal em tela atende a condicionante, estipulada pela jurisprudência superior, para incidência analógica da insignificância penal em crimes tributários na esfera estadual:
A aplicação da bagatela aos tributos de competência estadual encontra-se subordinada à existência de norma do ente competente no mesmo sentido da norma federal, porquanto a liberalidade da União para arquivar, sem baixa na distribuição, as execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 não se estende, de maneira automática, aos demais entes federados (HC 480.916/SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 11/6/2019, dje 21/06/2019).
Portanto, para fins de incidência do princípio da insignificância, é necessária a existência de lei local no mesmo sentido da lei federal, o que ocorre, por exemplo, para o Estado de São Paulo. Nessa alheta inclinou-se a jurisprudência paulista ao analisar caso atrelado à temática sub examine:
Crime contra a ordem tributária valor do imposto estadual (ICMS) sonegado inferior ao definido no art. 1º da Lei Estadual 14.272/2010 incidência do entendimento dos Tribunais Superiores acerca da insignificância penal da conduta no que tange a tributos federais montante para fins de identificação da bagatela restrito ao apurado originalmente no procedimento de lançamento, livre de juros, multas e correção monetária compreensão do STJ ordem concedida para trancamento da ação penal, carente de justa causa (TJ-SP - HC: 21938886520218260000 SP 2193888-65.2021.8.26.0000, Relator: Vico Mañas, Data de Julgamento: 05/10/2021, 12ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 07/10/2021).
Especificamente no que tange aos tributos da seara estadual bandeirante, a consulta ao portal eletrônico da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo é imprescindível para a aferição do valor unitário da UFESP (Disponível em: <https://portal.fazenda.sp.gov.br/Paginas/Indices.aspx>. Acesso em: 23 fev. 2022). Ato contínuo, o cotejo da precificação da UFESP com a data da ocasião da constituição definitiva do crédito tributário, apurada na persecução penal, demonstrará o quantum para a análise da aplicabilidade do princípio da insignificância, que, conforme a literalidade da legislação estadual, não poderá exceder 1.200 (mil e duzentas) UFESPs.
A par dessas considerações, também é preciso lembrar que a Lei Estadual nº 16.498, de 18/07/2017 (SÃO PAULO, 2017), elevou o valor previsto na lei anterior, alterando a previsão de 600 (seiscentas) UFESPs, para fins de ajuizamento de execuções fiscais, para o patamar de 1.200 (mil e duzentas) UFESPs.
No ponto, e como se sabe, a norma posterior mais benéfica deverá retroagir em favor do acusado de eventual caso penal, ainda que o suposto delito tenha sido praticado antes da referida atualização legislativa, daí por que, nessa hipótese, o parâmetro de 1.200 UFESPs, para a caracterização do crime bagatelar de ordem fiscal, retroagirá, conforme entendimento sedimentado pelo Egrégio Tribunal Paulista:
APELAÇÃO CRIMINAL. Crimes Contra a Ordem Tributária. Redução e supressão de ICMS. Artigo 1º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, por 24 (vinte e quarto) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal. Sentença absolutória. Reconhecimento da atipicidade da conduta. Acusação requer a condenação nos termos da denúncia. Impossibilidade. Aplicação do princípio da insignificância. Valor sonegado não atinge o valor mínimo previsto para ajuizamento de execução fiscal. Aplicação da retroatividade da lei mais benéfica. Precedentes. Recurso improvido (TJ-SP - APR: 15000717720198260416 SP 1500071-77.2019.8.26.0416, Relator: Andrade Sampaio, Data de Julgamento: 07/01/2022, 1ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 07/01/2022).
Do corpo do julgado extraem-se os seguintes fundamentos em relação à questão sob estudo:
Primeiramente, cabe ressaltar ser cabível o reconhecimento do princípio da insignificância em crimes contra a ordem tributária, devendo-se, contudo, observar a legislação específica.
No Estado de São Paulo a matéria é regida pela Lei Estadual nº 14.272/2010... [...]
[...] Posteriormente, sobreveio a Lei Estadual nº 16.498 de 18/07/2017, elevando o valor previsto na lei anterior... [...]
A discussão resume-se, portanto, à possiblidade ou não da retroatividade da lei tributária mais benéfica.
Respeitado entendimentos diversos, a norma posterior mais benéfica, mesmo que não seja do âmbito penal, deve retroagir em favor do acusado (TJ-SP - APR: 15000717720198260416 SP 1500071-77.2019.8.26.0416, Relator: Andrade Sampaio, Data de Julgamento: 07/01/2022, 1ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 07/01/2022).
De igual sentir pontificou o Eminente Desembargador Diniz Fernando, com amparo no parecer Ministerial:
[...] No Estado de São Paulo vige a Lei nº 14.272/2010, que prevê hipótese de inexigibilidade de execução fiscal para débitos que não ultrapassem 600 Unidades Fiscais Estaduais.
Este limite, estabelecido no artigo 1º, foi atualizado pela Lei nº 16.498, de 2017, para 1.200 Unidades Fiscais do Estado de São Paulo. Assim, estendeu-se o entendimento para aplacar imposto estadual como o ICMS. Com isso, o poder Executivo ficou autorizado a não propor ações ou até requerer a desistência das ações já ajuizadas, para cobranças com valores que não ultrapassem 1.200 UFESPs.
Como bem salientado pela d. Procuradoria de Justiça: 'Tal norma administrativa, mais benéfica ao acusado em razão da alteração produzida pela Lei nº 16.498/17, deve retroagir para beneficiá-lo, eis que a época dos crimes o valor previsto para a desconsideração do débito era de 600 UFESPs (R$ 12.084,00) e, ainda que assim não se considere, os valores individualizados arrolados na denúncia, já que os crimes foram praticados em continuidade delitiva, são inferiores a tal patamar estabelecido à época pela administração estadual' [...] (TJ-SP - APR: 00018696420188260358 SP 0001869-64.2018.8.26.0358, Relator: Diniz Fernando, Data de Julgamento: 24/08/2021, 1ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 24/08/2021).
Na mesma direção, assim decidiu o E. STF:
PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE DESCAMINHO. VALOR SONEGADO INFERIOR AO FIXADO NO ART. 20 DA LEI 10.522/2002, ATUALIZADO PELAS PORTARIAS 75/2012 E 130/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. I - Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, o princípio da insignificância deve ser aplicado ao delito de descaminho quando o valor sonegado for inferior ao estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, com as atualizações feitas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. Precedentes. II Mesmo que o suposto delito tenha sido praticado antes das referidas Portarias, conforme assenta a doutrina e jurisprudência, norma posterior mais benéfica retroage em favor do acusado. III Ordem concedida para trancar a ação penal (STF, HC 139393, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 18/04/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 28-04-2017 PUBLIC 02-05-2017).
Nesse viés, as lições de Cezar Roberto Bitencourt, a respeito do princípio da retroatividade no âmbito penal, denotam que eventual conflito do direito intertemporal deve ser resolvido com base na seguinte regra: a retroatividade da lei mais benigna.
No conflito de leis penais no tempo, é indispensável investigar qual a que se apresenta mais favorável ao indivíduo tido como infrator. A lei anterior, quando for mais favorável, terá ultratividade e prevalecerá mesmo ao tempo de vigência da lei nova, apesar de já estar revogada. O inverso também é verdadeiro, isto é, quando a lei posterior for mais benéfica, retroagirá para alcançar fatos cometidos antes de sua vigência. O princípio da irretroatividade vige, com efeito, somente em relação à lei mais severa. Admite-se, no Direito transitório, a aplicação retroativa da lei mais benigna, hoje princípio consagrado em nossa Constituição Federal (art. 5º, LX). Assim, pode-se resumir o conflito do direito intertemporal no seguinte princípio: o da retroatividade da lei mais benigna (BITENCOURT, 2011, p. 18).
Em resumo, a norma administrativa em estudo, se acaso for mais benéfica ao acusado em razão da alteração produzida pela Lei Estadual nº 16.498/17 (SÃO PAULO, 2017), deve retroagir para beneficiá-lo, nos termos do art. 2º, parágrafo único, do Código Penal (BRASIL, 1940), c.c. o artigo 5º, inciso XL, da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988).
E, de arremate, é preciso repisar que o valor a ser considerado é somente o montante inicial do débito, isto é, livre de multa, juros e correção, conforme a posição do STJ. Nesse tópico, observe-se o entendimento da Corte Superior, extraído de precedente já citado em linhas pretéritas:
O valor do crédito tributário objeto do crime tributário material é aquele apurado originalmente no procedimento de lançamento, para verificar a insignificância da conduta [...]. Em outras palavras, a fluência de juros moratórios, correção monetária ou eventuais multas, que integram o crédito tributário inserido em dívida ativa, não possui o condão de acrescer valor para a aferição do parâmetro de aplicação do princípio da insignificância. [...]. Na hipótese, o valor principal do tributo, desconsiderados juros, correção e multas, é de R$ 4.687,97, de modo que, tendo em vista o disposto na Lei estadual n. 14.272/2010, incide o princípio da insignificância, nos moldes da jurisprudência desta Corte acerca do tema. Ordem concedida para determinar o trancamento do Inquérito Policial 0004281-95.2018.8.26.0348, ressalvada a possibilidade de reabertura caso existam outros débitos cuja soma dos valores ultrapasse o limite estabelecido no art. 1º da Lei estadual n. 14.272/2010 (HC 480.916/SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 11/06/2019, DJe 21/06/2019).
Em síntese conclusiva, o princípio da insignificância reclama que o comportamento humano, para ser típico, deve não apenas ajustar-se formalmente ao tipo penal, mas, também, ser materialmente lesivo aos bens jurídicos tutelados, o que, a depender do caso concreto, poderá relacionar-se aos contextos fático-probatórios permeados com o Fisco, Estadual ou Federal, como ressalta a jurisprudência pátria, e, assim, imporá o reconhecimento da atipicidade dos fatos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: Saraiva, 2013.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
BONFIM, Edilson Mougenot; CAPEZ, Fernando. Direito Penal Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2004.
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