Fake news: uma análise dos impactos sociais a luz do Código Civil

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RESUMO

A pesquisa em questão tem como objetivo geral abordar o tema da Fake News dentro do ramo do direito civil, abrangendo os tipos de danos que uma notícia mal formulada ou até mesmo inventada pode ter no cenário social, psicológico e jurídico. Dentro do tema serão elencados os tipos de Fake News, os danos e consequências geradas através de sua propagação, quais as consequências que podem ocorrer com quem cria e com quem as compartilha. Atinente a esfera penal, pode-se compreender um paralelo entre a propagação de uma notícia Fake News e o reconhecimento de uma difamação ou calunia a depender da notícia. O que não é novidade no mundo jurídico é que ainda não existe nenhuma legislação que vigore acerca das penalidades ou consequências civis ou penais de propagadores e criadores de Fake News, e atualmente, este tema vem tomando grandes proporções nas áreas jurídicas e psicológicas, sendo necessária uma abordagem suave e didática com o fim de trazer informações necessárias e ao final uma breve analise hipotética quanto a criação de uma legislação específica que mescle a indenização moral devido aos transtornos psicológicos e sociais do Código Civil, com a penalidade dos crimes de difamação e/ou calúnia do Código Penal.

Palavras-chave: Fake News; Indenização moral; Código Civil; Dano psicológico; legislação.

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Meios de Identificar as notícias fake news: ........................................29

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

  

ART.                        Artigo

CF                          Constituição Federal

DJe                         Diário Judicial Eletrônico

OMS                      Organização Mundial da Saúde

ONU                       Organização das Nações Unidas

PDT - SP                 Partido democrático Trabalhista de São Paulo

PL                           Projeto de Lei

PSB - ES               Partido Socialista Brasileiro do Espirito Santo

STF                       Supremo Tribunal Federal

STJ                       Superior Tribunal de Justiça

TJ - AL                 Tribunal De Justiça de Alagoas

UN                        United Nations

SUMÁRIO

  

 

1.      INTRODUÇÃO.. 13

2.      O CONCEITO DE FAKE NEWS E SUAS ESPECIFICIDADES.. 15

3. OS IMPACTOS DAS FAKE NEWS NO ÂMBITO SOCIAL E PSICOLÓGICO.....20

3.1 OS IMPACTOS DAS FAKE NEWS NO ÂMBITO JURÍDICO ..............................22

4. O CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.....................26

4.1 MEIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DAS FAKE NEWS ...........................................29

4.2 PROJETO DE LEI N. 2.630/2020 E A SUPOSTA CENSURA ...........................30

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................33

6. REFERÊNCIAS ....................................................................................................34

7. ANEXOS ...............................................................................................................37

1.    INTRODUÇÃO

Atualmente, ainda se vive na era da evolução industrial, e a cada dia que se passa, o ser humano tem a certeza de que essa evolução é apenas uma pequena porcentagem do que ainda foi descoberto.

Com o avanço tecnológico, a facilidade de se obter informações e transmiti-las é uma realidade. Em meio a este cenário, falar sobre o tema da Fake News não é algo incomum, isso porque, nos últimos anos este tema tem dificultado a vida de muitas pessoas, inclusive pessoas com imagem pública.

As notícias Fake News serão abordadas de forma juridicamente técnica, no qual a opinião pessoal ou quaisquer tipos de ideologia acerca do tema sejam tratadas de forma explicativa e didaticamente elaboradas, trazendo ao trabalho em questão, uma visão informativa a qual possa acrescentar academicamente e socialmente um conceito diferente dos danos causados pelas Fake News, aos que irão lê-lo.

Ademais, a presente pesquisa acrescentará uma visão socialmente e juridicamente critica quanto o assunto das Fake News, ao passo em que abordará sua altercação com certos princípios constitucionais como por exemplo: o princípio da dignidade da pessoa humana e princípio da liberdade de expressão.

Sendo assim, a divisão dos capítulos e subcapítulos abordam de forma estratégica e cronológica a analogia do tema das notícias Fake News, elencando de maneira subsidiária os princípios constitucionais, ao passo que se tratar dos danos sociais, jurídicos e psicológicos das vítimas de notícias Fake News, seja abordado os ditames do Código Civil.

A metodologia do trabalho se baseará em uma revisão bibliográfica qualitativa, e na revisão da literatura, levando-se em consideração a proposta apresentada pelos autores: Maria Helena Diniz, Cristiano Chaves Faria e Nelson Rosenvald, Maria Berenice Dias e Rolf Madaleno.

As citações e artigos pesquisados serão recentes e apresentarão uma linguagem simples e direta, sendo as citações e menções importantes dos autores acima mencionados. Já os locais de buscas utilizados serão a biblioteca da Faculdade, sites de pesquisas, artigos publicados em sites como: âmbito jurídico, jus Brasil, conteúdo jurídico e acervo digital.

2.    O CONCEITO DE FAKE NEWS E SUAS ESPECIFICIDADES

O ser humano desde sempre se utilizou da mentira para fins diversos, seja para magoar, seja para proteger, ou até mesmo ganhar vantagem sobre alguém ou alguma situação. Com o passar do tempo, o que evoluiu foi tão somente a tecnologia, pois a mentira, atualmente, se tornou uma profissão e uma diversão.

A forma de pensar de cada ser humano diz respeito ao seu caráter e consequentemente as suas crenças e costumes, contudo, nos dias atuais, as divergências de pensamentos levaram o ser humano a começar guerras, massacres e até mesmo desastres químicos e naturais.

Não obstante, mesmo com a evolução humana, o processo constante de globalização, ainda existe o atraso social, quando o assunto se refere às interações sociais:

Processos sociais, econômicos, políticos e culturais que constituem a mundialização, são intensificados pelas forças deflagradas com a globalização do capitalismo, isto é, do capitalismo enquanto modo de produção global e também como processo civilizatório. O globalismo é, portanto, a expressão dos novos desenvolvimentos da realidade social em termos da intensificação e da generalização das forças produtivas e das relações capitalistas de produção, configurando uma nova dinâmica no mercado, nas técnicas produtivas e nas formas de organização do trabalho social. Ora, este cenário é organizado pelas corporações transnacionais e pelas organizações multilaterais, que estruturam os processos de dominação política e apropriação econômica que caracterizam a globalização. (DALEMA, 2003, p.48-53).

Por outro lado, o processo de socialização do ser humano vem, de maneira relevante se modificando devido ás redes sociais e a facilidade de se obter informações e notícias é algo incrivelmente sagaz, porém, como tudo possui lados positivos e negativos, a socialização tecnológica trouxe consigo o que se chama de fake News.

As fake News, são popularmente tidas como uma rede mentiras e notícias falaciosas, onde a vítima pode ter sua moral e imagem denegridas de maneira rápida e anônima, já que a internet dá o poder às pessoas de não serem elas mesmas, podendo assumir qualquer personalidade, forma ou gênero. 

O conceito de fake news indica histórias falsas com aparência de notícias jornalísticas que são divulgadas pela internet ou outras mídias, o que pode influenciar posicionamentos políticos, bem como decisões administrativas. A fake news corresponde a velhusca imprensa marrom. (TEIXEIRA, 2020).

Além da conceituação do instituto do que é fake News, é importante salientar quais são seus tipos, e o primeiro a ser analisado será as fake News de sátiras ou paródias.

As fakes News sátiras ou parodias, são notícias que distorcem a realidade de maneira descontraída e engraçada, geralmente, assuntos que são sérios e preocupantes são alvos constantes de fake News de parodias e sátiras.

A sátira nem sempre é humorística, já a paródia tende a criar um efeito cômico, ridicularizando o tema escolhido. As três técnicas mais utilizadas na sátira, são a diminuição, inflação e justaposição. A diminuição reduz a grandeza do que está sendo satirizado com o intuito de torná-lo ridículo ou de sobressair os defeitos criticados, a inflação é o oposto, o objeto satirizado tem seus aspectos exagerados ou aumentados, já a justaposição tenta igualar o nível de importância de coisas claramente desiguais. (SERRA, 2018, p.11-12).

No Brasil, dois portais são conhecidos por publicar sátiras e paródias. Apesar dos portais serem bastante explícitos sobre sua natureza de conteúdos fabricados de forma sensacionalista, muitas fake News são replicadas por usuários nas mídias sociais. Como foi o caso da notícia falsa, publicada no site Sensacionalista, que afirmava que havia nascido uma criança com o nome Alquingel devido à grande polemica e atenção que tem tido a pandemia do Corona vírus, conforme se nota na

Outra modalidade de fake News é a falsa conexão, que acontecem quando o leitor clica na notícia, abre outra notícia não relacionada ou de assunto diverso, ou até mesmo quando o criador de fake News modifica parte ou o título da notícia, para torna-la mais sensacionalista.

Pode-se dizer que a fake News por falsa conexão, se iguala a uma propaganda enganosa, pois quando o leitor busca por certa notícia e quando a lê percebe que se trata de outro assunto.

O conteúdo enganoso por sua vez, geralmente é utilizado para denegrir a imagem de outra pessoa, e está bem presente na política. Um caso que ganhou grande repercussão foram as notícias vinculadas a vereadora Marielle Franco após sua morte a tiros no Rio de Janeiro em março de 2018. Entre elas estavam as manchetes de que a vereadora teria engravidado aos 16 anos, teria sido casada com Marcinho VP, um ex-traficante e que teria sido eleita pelo Comando Vermelho.

 A professora Flavia Alcassa, afirma que:

O brasileiro acredita em qualquer informação que é exposta a ele, sem fazer nenhum tipo de verificação do conteúdo recebido. Com isso, o brasileiro é tido como a população que mais acredita em fake news no mundo. Segundo a plataforma, 7 em cada 10 brasileiros se informam pelas redes sociais e 62% já acreditaram em alguma notícia falsa. (ALCASSA, 2020). 

Por este motivo, as fake News com conteúdo enganoso, principalmente na área política, onde têm efeitos desastrosos, e podem de fato modificar o rumo das eleições. Outro ponto importante é sobre a verificação das notícias, que como bem salientado não têm sua autenticidade verificada.

As fake News com conteúdo falso são as mais comuns, e infelizmente mais devastadoras socialmente. O conteúdo falso se refere a conteúdos verdadeiros, porém usados em um contexto errado com o intuito de atrair mais atenção a notícia. (MACGUILL,2017).

Um exemplo de notícias com conteúdo falso surgiu em Londres, quando uma pesquisa preliminar, publicada na conceituada revista Lancet, descrevendo 12 crianças que desenvolveram comportamentos autistas e inflamação intestinal grave. Em comum, dizia o estudo, as crianças tinham vestígios do vírus do sarampo no corpo, e atribuiu o autismo a vacina. Porem hoje, segundo a OMS, as vacinas salvam de 2 a 3 milhões de vidas por ano no mundo. (IDOETA, 2017).

Por obvio esta é uma notícia com conteúdo falso, refutado até mesmo pela OMS, e que ainda continua sendo reportada por sites sensacionalistas.

Também podem ser citadas as fake News com conteúdo de impostor, que basicamente, são notícias replicadas por sites supostamente de jornalismo, no entanto, o site não é legitimo, os repórteres escritores das notícias também não existem, pode-se dizer que são informações postadas por um perfil fake.

Um exemplo disso, é de um site chamado a folha Brasil, que imita o jornal da Folha de São Paulo, o mesmo aconteceu com o site Portal G1, o que chama a atenção é que os sites falsos tinham a mesma programação e aparência dos sites verdadeiros. Ademais, é com muita frequência que grandes sites de notícias sejam plagiados para replicarem informações de fontes duvidosas.

A próxima modalidade de fake News a ser analisada é a manipulação do conteúdo, essa forma de fake News pode ser uma das mais trabalhosas, isso porque, o replicador da notifica fake News tem todo o trabalho de manipular a informação de modo que faça com que os leitores acreditem na história por mais absurda que seja.

 Manipular o conteúdo de uma notícia, geralmente é trabalho de especialista, e pode ser feito em áudios, vídeos, imagens, músicas e principalmente em fotos de redes sociais, um conteúdo manipulado pode ofender e inverter o lado da história, na imagem real, a frase escrita na camiseta é rebele-se, de maneira manipulada, foi alterada para jesus é travesti:

Cortes propositais em partes especificas de vídeos também geram muita repercussão na internet. A prática é comum em discursos políticos, onde trechos são selecionados deforma a passar uma informação fora de contexto. Leitores dificilmente notam os cortes e repassam a notícia gerando assim uma maior disseminação das fake news. Existem ainda softwares desenvolvidos para facilitar a manipulação de vídeos que permitem capturar expressões faciais de uma segunda pessoa e sobrepor no rosto de uma pessoa no vídeo original (SOLON, 2017).

É incontestável que as fake News de conteúdos manipulados podem ser as mais perigosas, podendo causar grandes desentendimentos para aquela significativa porcentagem de pessoas que não checam as fontes antes de lerem e replicarem a notícia.

Por fim, serão especificadas as fake News com conteúdo fabricados, diferentemente das fake News com conteúdo falsos ou manipulados, essas são conteúdo inventados em sua integralidade, onde não possuem nenhuma referência prévia, é onde o criador da notícia usa sua imaginação para criar situações sensacionalistas.

Para Paula Salas os criadores das fake News são:

Hábeis em criar e em espalhar informações falsas. Grupos políticos ou de jovens que estão por trás das fake news também utilizam estratégias nas redes para espalhar os conteúdos que produzem. (SALAS, 2019, p.102).

Diante o exposto, pode-se afirmar que as fake News tem o fim especial de enganar e manipular a informação que chega nos leitores, causando uma grande comoção social quanto ao assunto, seja para prejudicar, brincar ou até mesmo chamar a atenção, as notícias falsas têm um impacto social gigantesco, bem como o impacto jurídico, o qual será analisado nos capítulos que se seguirão.

Esgotado todo o conteúdo sobre a conceituação e especificidades das Fake News, é relevante mencionar a motivação por trás deste tipo de mensagem falsa, e para isso, Eliot Higgens apresentou, em Paris, os chamados 4 Ps da motivação. Mais à frente, esse contexto foi ampliado, e hoje, determina-se que  as fake news são motivadas por: Poor Journalism (Jornalismo Pobre); Parody (Paródia), Provoke (Provocação), Passion (Paixão), Partisanship (Aderência de Participação), Profit (Lucro), Political Influence or Power  (Influência ou Poder Político) e Propaganda (Propaganda). (SIQUEIRA, 2019).

Os motivos acima, podem ser definidos como motivação para a criação das Fake News, contudo, há outra espécie motivação quando o assunto são notícias falsas, e essa motivação é pela disseminação das fake News.

Em algumas vezes, as pessoas divulgam as noticias falsas sem ter conhecimento da sua real intenção, ou seja, acreditam fielmente de que a notícia que está divulgando é verdadeira e de fontes seguras, e essa é a primeira razão que as fake News são divulgadas, por serem seus portadores crentes de que a noticia é verdadeira.

 A segunda razão pela qual as pessoas propagam as noticias falsas é que querem mostrar o prestígio da fonte que criou ou que passou para ela a noticia falsa, exemplo: essa noticia é verdadeira, pois meu amigo que trabalha no gabinete deste politico que a enviou. Em síntese, é a propagação de uma noticia passada por uma pessoa de prestigio, o que geralmente deixa a noticia falsa mais famosa.

O terceiro motivo para o repasse de notícias falsas é um verdadeiro desejo de ajudar alguém, quando a pessoa acredita que aquela noticia tem o condão de modificar a vida de alguém em sentido positivo ou não.

De acordo com a jornalista Carolina Giovanelli:

É essencial checar as fontes de uma informação. Isso significa procurar por aquela informação em sites respeitados. Acreditem, mesmo que a notícia tenha sido publicada num grande veículo de jornalismo, não significa que ela seja verdadeira. Claro que quase sempre é nesses casos, mas mesmo grandes jornais e televisões divulgam notícias falsas. (GIOVANELLI, 2018).

Quanto ao meio de disseminação, podem ser utilizados as plataformas de redes sociais como o Facebook possuem uma estrutura radicalmente diferente das tecnologias de mídia anteriores. O conteúdo pode ser transmitido entre usuários sem filtragem significativa de terceiros, verificação de fatos ou julgamento editorial. Um usuário individual sem histórico ou reputação pode, em alguns casos, alcançar tantos leitores quanto a Fox News, a CNN ou o New York Times. (ALLCOLTT, 2016, p.211).

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Pode-se concluir que, as notícias falsas são propagadas na maioria das vezes pela ignorância das pessoas que não checam as fontes de sua criação, tampouco busca em outros locais a mesma informação, para realizar uma checagem da procedência da notícia.

3.    OS IMPACTOS DA FAKE NEWS NO ÂMBITO SOCIAL E PSICOLÓGICO

As fake News possuem um impacto na vida das vítimas devastador, tanto no âmbito social, psicológico e até mesmo econômico. Pode-se imaginar vários cenários em que as noticias falsas podem trazer prejuízo ou danos a alguém, principalmente quando esse alguém está sob os holofotes ou é algum ente politico o famoso.

O ramo da politica é o queridinho dos criadores de fake News, isso porque, o cenário politico do Brasil, desde alguns anos vêm sendo alvo de críticas, investigações e claro, da corrupção, logo se torna um prato cheio para as noticias fake News.

Afastadas tais premissas, neste tópico em questão serão abordados os impactos sociais e psicológicos das noticias fake News, além de estabelecer um paradoxo em que as fake News podem ser penalizadas na esfera cível e até mesmo na esfera criminal.

Conforme antes salientado, podem existir vários tipos de fake News, assim como também existem diversas maneiras de se propagar, e também, vários motivos para que uma pessoa se transforme em uma propagadora das notícias falsas.

No entanto, a motivação pela qual as fake News são criadas possuem uma única essência: transmitir a noticia para o máximo de pessoas possível. E é aí que se encontra a problemática dos impactos negativos das fake News no âmbito social e psicológico da vítima. 

Cite-se como exemplo, o caso da atriz e empresária, Zilu de Camargo (mãe de Wanessa Camargo), que foi vítima de fake News e teve uma forte depressão por conta da proliferação das noticias falsas, em entrevista com a revista Purepeople afirma:

Eu tive depressão. Me sentia triste, sozinha, abandonada, totalmente sem autoestima, desmotivada com a vida. Cheguei a ficar internada algumas semanas por conta disso. Foi um período muito difícil para mim, para os meus filhos e família. Não desejo para ninguém o que senti naquele momento! (...) Os haters são pessoas dignas de pena! Uma pessoa que perde seu tempo dissipando comentários maldosos, críticas ofensivas e atacando outras pessoas, é muito infeliz! Assim como mídias sensacionalistas que se acham no direito de atacar e criar inverdades a respeito de alguém, visando apenas visibilidade e audiência! O meu recado para essas pessoas é 'se curem'. (XAVIER, 2019).                                                                                            

Não há dúvidas do estrago emocional que uma notícia fake News pode fazer, principalmente em uma figura pública, seja ela do mundo da fama, politica ou esportes. Quanto mais famosa a vítima de fake News é, mais rápido a notícia se propaga, e maior é o dano causado em sua vida.

De acordo com estudos, a saúde mental dos propagadores de noticias fake News, é tão afetada quanto à das vítimas. O adoecimento mental ocorre por alterações no funcionamento cerebral associadas a influências do meio ambiente. Aqueles que já têm uma enfermidade claramente estabelecida tendem a piorar dentro de um ambiente de exacerbação de sentimentos e ações descabidas. (MACEDO, p.184, 2018).

Nessa mesma esteira, a autora acima citada demonstra como podem as fake News agir no cérebro das pessoas que as propagam, criam, ou são vítimas:

As chamadas fakes news são fruto da moderna comunicação, surgida por meio das mídias sociais. Na verdade, são mentiras que no passado eram chamadas de fofocas maledicentes, que sempre tiveram como objetivo desestabilizar o poder de uma outra pessoa. Uma adaptação da fofoca unida à má-fé foi usada de maneira sistemática para divulgação de inverdades e destruição de candidatos políticos. Frequentemente, esse tipo de comunicação parte de uma premissa desonesta que instaura a insegurança naqueles que recebem a informação. O resultado deste tipo de prática é que o conteúdo do pensamento humano, que tem se desenvolvido através de milênios para que o homem usufrua melhor da vida, fica contaminado, determinando até mesmo a manifestação de doenças mentais. (MACEDO, p.203, 2018).

Quanto ao dano social que a noticia falsa pode causar, fica claro que, essencialmente no mundo dos holofotes, essa realidade é diferente. Mesmo que seja a notícia declarada fake News em momento posterior, os danos sociais ainda podem persistir. Sabendo disso, pode-se dizer que os efeitos das noticias falsas refletem após sua confirmação de veracidade, já que, a cultura do Brasil, em alguns casos, se baseia na crença ao duvidoso.

 Sob este mesmo aspecto, o advogado e doutrinador, Cristiano Magalhães assegura que a divulgação de notícias falsas pode acarretar sérios prejuízos às pessoas e instituições, tais como, manipulação de comportamentos, prejuízos morais e financeiros para pessoas e empresas, criação ou aumento de sentimento de revolta, estímulo ao preconceito, agravamento de surto de doença. (MAGALHÃES, p.53, 2020). 

3.1 OS IMPACTOS DAS FAKE NEWS NO ÂMBITO JURIDICO

Quando se fala me impactos no mundo jurídico, é o mesmo que falar danos, e a palavra danos é quase que o sinônimo de indenização. Atualmente, com a grande discussão sobre o tema das noticias fake News, muito se discute sobre sua incidência no judiciário e na legislação vigente.

De antemão, é pertinente citar a definição de dano, que nas palavras de CHAMONE (2008) é: toda lesão a um bem juridicamente protegido, causando prejuízo de ordem patrimonial ou extrapatrimonial. Sem que tenha ocorrido dano a alguém, não há que se cogitar em responsabilidade civil. Ao contrário do que ocorre na esfera penal, aqui o dano sempre será elemento essencial na configuração da responsabilidade civil; não há responsabilidade civil por tentativa, ainda que a conduta tenha sido dolosa. (CHAMONE, 2008, p.48).

No entanto, a legislação vigente não trata em nenhum de seus institutos sobre as notícias fake News, assim como não penaliza quem as propaga ou cria. Sendo assim, a solução que se vislumbra e quem vem sendo bastante debatida é aplicação por analogia das leis infraconstitucionais e até mesmo com o respaldo da própria Constituição Federal.

 Como alhures exposto, o dano é algo patente quando se fala em fake News, podendo ser ele, psicológico, material, moral ou até mesmo social, e quando se fala em dano, de automático ligamos ao Código Civil. Antes de tratar sobre a incidência do tema das fake News dentro do código civil e código de processo civil, é primordial conceituar o que é o dano moral.

Para isso, o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves aduz que:

Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1°, III, e 5°, V, e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação. (GONÇALVES, p.359, 2009).

Com o conceito, a compressão se torna mais clara, isso porque, conforme visto no capitulo anterior, as fake News podem causar um dano psicológico tão grave, podendo chegar à depressão, sendo assim, todos os efeitos negativos que ensejam o dano moral, quais sejam: lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome, acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação, é o retrato fiel do que as vítimas das fake News suportam.

Nesse interim, é importante trazer à baila os preceitos do Código Civil quanto à indenização por dano moral, em seu art. 186 que assegura que, aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (BRASIL, 2002).

Ora, a legislação deixa claro que, ainda que o dano seja EXCLUSIVAMENTE moral, é considerado o ato ilícito, e não é para tanto, uma vez que, o dano material pode ser facilmente ressarcido, contudo, o dano moral é algo invalorável.

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça, em entendimento jurisprudencial recente, reconheceu o dano moral em um caso de fake News, e condenou a parte contraria ao pagamento de indenização, senão vejamos:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. MATÉRIA TELEVISIVA. VEICULAÇÃO DE NOTÍCIA FALSA. REPERCUSSÃO GRAVE NA VIDA DO AUTOR. DANO MORAL CONFIGURADO. SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.1. A Corte de origem concluiu, diante das provas produzidas, pela configuração de dano moral à honra do agravado em razão da veiculação de seu nome à prática de crime em matéria jornalística inverídica de cunho sensacionalista. Deste modo, não obstante o caráter informativo inerente à liberdade de imprensa, verifica-se o abuso no exercício desse direito ao imputar, por meio de matéria sensacionalista, prática criminosa à pessoa sem que esta reste comprovada e sem a adoção de cautela necessária a resguardar a imagem da mesma. Alterar esse entendimento é inviável em recurso especial a teor do que dispõe a Súmula n. 7/STJ.2. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1541932/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/06/2020, DJe 04/06/2020). (STJ, 2020).

A analise jurisprudencial acima, têm um fio condutor no qual tenciona a outra discursão quando da leitura da frase: em razão da veiculação de seu nome à prática de crime em matéria jornalística inverídica de cunho sensacionalista.

 De maneira a estimular o raciocínio jurídico, mister se faz trazer outro conceito à tona, nas palavras do ilustríssimo Cezar Roberto Bitencourt, que assevera que, a calunia é crime formal, pois, embora descreva ação e resultado, não exige a sua ocorrência para consumar-se, isto é, consuma-se independentemente de sujeito ativo conseguir obter o resultado pretendido, que é o dano à reputação do ofendido de crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa. (BITENCOURT,2012, p.330).

Paralelo a isso, têm ainda a conceituação descrita no próprio código Penal, em seu art. 138:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa. § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. § 2º - É punível a calúnia contra os mortos. (BRASIL, 1940).

 Cediço é que, o código penal, trata os crimes contra a honra de maneira rigorosa, já que, a danosidade dos crimes contra a honra praticados por meio de fake news está diretamente relacionada com a proporção e o número de pessoas atingidas por suas informações falsas acerca de uma determinada pessoa. Vale lembrar que o art. 141, inciso III, do Código Penal prevê o aumento de pena em um terço caso o crime contra a honra é praticado por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. (EISENBERG, 2013, p.58).

Vejamos que tem um ponto que faz a diferença na compreensão: Para haver o crime de calúnia, o fato tem que ser um crime, e também, falso. Por exemplo: A diz para B que C cometeu um furto em um mercado da cidade.  Importante é que para que o crime de Calúnia se consuma, basta que terceiros fique sabendo.  Claro que, incorre na mesma pena, o terceiro que divulgou ou propalou. (CORRÊA, 2015, p.16).

A dedução é óbvia, à medida em que se confortam a doutrina e a legislação frente ao tema das fake News, e pode-se concluir que, é possível aplicar o código civil e o código penal, cumulativamente ou não.

A exemplo disso, é importante transcrever recente julgado do Trbunal de Justiça de Alagoas:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A HONRA. CALÚNIA. COMPARTILHAMENTO DE NOTÍCIA ALEGADAMENTE FALSA EM REDE SOCIAL. IRRESIGNAÇÃO QUANTO À SENTENÇA QUE DECLAROU EXTINTA A PUNIBILIDADE DO QUERELADO, POR NÃO TER O QUERELANTE DEMANDADO CONTRA TODOS QUE VEICULARAM A NOTÍCIA CALUNIOSA. RENÚNCIA TÁCITA. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PRIVADA. SELETIVIDADE DEMONSTRADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1 Demonstrado nos autos que o querelante optou por demandar apenas contra uma parte das pessoas que "compartilharam" a notícia caluniosa, ao tempo em que colacionou nos autos uma ata notarial relacionando todos que praticaram a conduta, atentou contra o princípio da indivisibilidade da ação privada, incorrendo em renúncia tácita. Precedentes do STF. 2 Constatada a omissão deliberada em relação a alguns autores/partícipes dos supostos crimes apurados, deve ser declarada extinta a punibilidade dos querelados. Sentença que merece ser mantida por seus próprios fundamentos. 3 Recurso conhecido e não provido. (Número do Processo: 0701036-94.2016.8.02.0082; Relator (a): Des. Washington Luiz D. Freitas; Comarca: Foro de Maceió; Órgão julgador: Câmara Criminal; Data do julgamento: 12/08/2020; Data de registro: 13/08/2020). (TJAL, 2016).

O compartilhamento de notícias falsas, não é expressamente tipificado no Código Penal, e as fake News não estão taxadas no código civil. Contudo, conforme amplamente demonstrado, este instituto pode ser facilmente aplicado por analogia à legislação, na medida em que a propagação de notícias falsas, a depender de seu teor, pode ser considerado um crime contra a honra e considerado como calunia, ou,  os danos psicológicos e sociais, podem ser tidos como danos morais, legislados pelos arts. 186 e 927 do Código Civil, gerando uma condenação em indenização por danos morais.    

4.     O CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 

Até aqui, pode-se concluir com certeza de que o tema das fake News foi analisado de forma a impelir o raciocínio e por conseguinte, uma conclusão óbvia: as fake News está se tornando uma doença, que mata o psicológico das vítimas lentamente.

Pode-se concluir também que a sua disseminação e criação, em alguns casos são tidos como ilícito não de maneira direta pela legislação civil e penal, mas sim pelo entendimento jurisprudencial porém, conforme na própria legislação citada acima, infere-se a divergência que se tem com a liberdade de expressão.

 No que concerne à liberdade de expressão:

Em sentido jurídico, a liberdade corresponde à ausência de obrigação de conduta ou, em termos mais rigorosos, à ausência de uma norma jurídica que proíba ou ordene um determinado comportamento. As normas jurídicas proibitivas impõem obrigações de não-fazer ou deveres negativos de conduta, ao passo que as normas jurídicas mandamentais impõem obrigações de fazer ou deveres positivos de conduta. (MOTA, 2006, p.68-69). 

 A proteção que se estende sob a liberdade de expressão é fundamentada na promoção do modelo democrático de governo. A democracia pode ser considerada, conceitualmente, como uma forma de autogoverno ou de soberania popular, pelo qual compete à comunidade, em última instância aos cidadãos, realizar as decisões políticas de seu interesse, seja diretamente ou através de seus representantes. (MARTINS, 2008, p.49).

Tal proteção, se deve aos preceitos constitucionais, ao assegurar que é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato, em se tratando da manifestação do pensamento, não é só a CF quem à coloco sob o manto de proteção, pois, a Declaração Internacional de Direitos Humanos da ONU fez questão de assegurar a liberdade de expressão em seu artigo 19, senão vejamos:

Artigo 19. Todos têm direito à liberdade de opinião e expressão, e este direito inclui a liberdade de ter opiniões sem interferência, e de procurar, receber e transmitir informações e ideias através de quaisquer meios e independentemente de fronteiras. (UN, 2011).

Ainda se tratando da Constituição quanto a proteção ao principio da liberdade de expressão, nota-se um artigo, pouco contemplado pela doutrina, mas que em sua essência trata exatamente sobre a inviolabilidade da liberdade de expressão:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (BRASIL, 1988). 

A liberdade de expressão não é apenas uma partícula relativa à democracia, mas a sua própria essência. Acaso os cidadãos não fluírem livremente de seu direito de falar e ouvir, será impraticável o conceito de autogoverno ou de soberania popular. Se assim for, o governo em questão, no plano formal, será uma oligarquia, ou então uma tirania. O primeiro marcadamente um governo de poucos e o segundo o governo de um só, passando ao largo da democracia. (MARTINS NETO, 2008, p.50-51).

Clarividente a importância e a magnitude protetiva da liberdade de expressão, importância essa, adquirida com vários anos de luta e reivindicações de gerações anteriores, se transformando em um direito adquirido. E por ser um instituto tão relevante no mundo jurídico, o seu enfrentamento com o tema tratado na presente pesquisa se torna fartamente complexo.

Ao pensar no instituto constitucional transformado em principio fundamental que é a liberdade de expressão, não existem argumentos que sustente a tese de que a liberdade de expressão em casos de notícias fake News deve ser vedada. Noutro norte, existe outro principio constitucional que pode bater de frente com o principio da liberdade de expressão, é o principio da dignidade da pessoa humana.

A priori, até mesmo antes de conceituar o principio da dignidade da pessoa humana, importante estabelecer sua relação com as noticias fake News, para que se entenda onde este instituto pode colidir com a liberdade de expressão, sobrepondo a dignidade e integridade da vítima à liberdade de expressão e informação.

Sabe-se que nenhum direito é absoluto, de forma que não estará amparado pela proteção da Lei Maior quando incorrer em abuso de direito ou na ausência dos pressupostos do texto constitucional. Neste ponto a dificuldade se encontra na linha tênue em que, por vezes, se encontra o limite do que é a liberdade de expressão e o que é abuso, restando ao judiciário o papel de solucionar esse conflito. Nem a garantia da privacidade nem a da liberdade de comunicação podem ser tomadas como direitos absolutos; sujeitam-se à ponderação no caso concreto, efetuada pelo juiz, para resolver uma causa submetida ao seu descortino. (MENDES, GONET, 2012, p.317).

De maneira a confrontar e reforçar a tese de que o principio da dignidade da pessoa humana pode se sobressair ao princípio da liberdade de expressão, quando se trata sobre os danos e impactos causados pelas fake news, seja no âmbito jurídico, psicológico, social ou pessoal. Significa dizer que, todo e qualquer danos causados pelas fake News, atingem a honra e dignidade da vítima da notícia.   

O direito à honra, à reputação ou consideração social, abrangendo a honra externa ou objetiva e a interna ou subjetiva perfila como um direito de personalidade, que se reporta ao âmbito do direito civil, mas por ter sido recepcionado pela Constituição Federal (inciso X, do art. 5º, CF), como integrante dos direitos fundamentais, gera a exigência de sua observância, ou seja, um efeito inibitório (chilling effect) não só perante os particulares, mas também sobre a esfera pública. (GONZAGA, 2010, p.17).

O princípio da dignidade da pessoa humana, está intimamente ligado à proteção da honra individual, e é o principio basilar da Constituição Federal, e ensejador de todos os códigos e leis atualmente vigentes.

E sobre esse principio ser a base fundamental de todo o ordenamento jurídico e até mesmo da própria Constituição, assevera Soares (2010):

Uma vez situado como princípio basilar da Constituição Federal de 1988, o legislador constituinte brasileiro conferiu à ideia de dignidade da pessoa humana a qualidade de norma embasadora de todo o sistema constitucional, que orienta a compreensão da totalidade do catálogo de direitos fundamentais, tais como os direitos individuais à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (SOARES, 2010, p.56). 

Conforme já analisado, a jurisprudência também entende que o principio da dignidade da pessoa humana se sobrepõe ao principio da liberdade de expressão, e nas palavras do Ilustríssimo Ministro do STF Gilmar Mendes: a liberdade de expressão, portanto, poderá sofrer recuo quando o seu conteúdo puser em risco uma educação democrática, livre de ódios preconceituosos e fundada no superior valor intrínseco de todo ser humano. A liberdade de expressão, num contexto que estimule a violência e exponha a juventude à exploração de toda sorte, inclusive a comercial, tende a ceder ao valor prima facie prioritário da proteção da infância e da adolescência. (MENDES, 2010, p.308).

A liberdade de expressão quando passa ao largo de suas margens gera consequências. Liberdade não apenas significa que o indivíduo tem a oportunidade e, ao mesmo tempo, a responsabilidade de escolher; também significa que deve arcar com as consequências de suas ações, pelas quais será louvado ou criticado. Liberdade e responsabilidade são inseparáveis. (HAYEK, 1983, p.76).

Sendo assim, não restam dúvidas quanto à prevalência da principiologia constitucional, quando o assunto são os impactos causados pela propagação das noticias fake News, corroborando ainda, o entendimento jurisprudencial segue pelo mesmo caminho, reconhecendo a soberania da honra e da dignidade humana, do que da liberdade de expressão e informação. 

4.1 mEIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DE NOTÍCIAS FAKE NEWS  

As notícias fake News estão por todos os lados, e não somente de assuntos que estão sob os holofotes, como política, religião ou mundo da fama, essas notícias falsas estão por todos os lugares, e sobre todos os assuntos, desde os mais banais, até os mais relevantes.

Diante disso, a identificação de uma notícia fake News é extremamente importante, e para realizar a analise de uma noticia fake News, se faz necessário seguir alguns passos, que serão melhores explicados no quadro sinóptico abaixo:

Quadro 01 Meios de Identificar as notícias fake news:

MEIOS DE IDENTIFICAR AS NOTÍCIAS FAKE NEWS

MEIO

MODO

Critique sempre as manchetes da noticia

Geralmente notícias fake News trazem manchetes chocantes e com letras pequenas, para incentivar o leitor a prosseguir com a leitura da notícia.

Investigue a fonte da noticia

Certifique-se de que a reportagem tenha sido escrita por uma fonte confiável e de boa reputação. Se a história for contada por uma organização não conhecida, verifique a seção "Sobre" do site para saber mais sobre ela.

Analise as imagens da notícia

Geralmente, as fake News trazem imagens adulteradas ou falsificadas, buscar a verdadeira imagem é essencial, em alguns casos a imagem pode até ser verdadeira, porém, retirada do contexto e distorcida para que caiba na noticia

Confira as datas da notícia

Certificar de que as datas coincidem é importante, em algumas vezes é possível encontrar divergências dentro da própria fake News.

Busque por outras reportagens

Essa é a medida mais importante no momento da checagem das fake News, isso porque, quando se busca mais informações sobre a notícia, fica muito fácil comparar a falsa com a verdadeira

Verifique as evidências

Como já dito, as fake News possuem divergências, é necessário antes de checar a fonte, é importante também checar o autor.

FONTE: A autora. 

Mesmo que tenha sido checados todos os pontos acima elucidados, é importante propagar a circulação da notícia somente quando da certeza de sua autenticidade, para evitar a circulação das fake News.

Quanto às ações de combate às fake News no mundo jurídico, o relator da ONU David Kaye (2017, online) afirmou que: as notícias falsas surgiram como um assunto de preocupação global e que os esforços para as combater podem levar à censura. Do mesmo modo afirmou que há o risco também da supressão do pensamento crítico e de outras abordagens contrárias à lei de direitos humanos. (ONU, 2017).

4.2 PROJETO DE LEI N. 2.630/2020 E A SUPOSTA CENSURA 

A censura acima citada, pode ser facilmente um objeto de uma discursão imensa, discursão essa que já teve seu inicio com Projeto de Lei 2.630/2020, que busca combater as fake news nas redes sociais.

O referido projeto de lei foi sugerido pelos deputados federais Felipe Rigoni (PSB-ES) e Tabata Amaral (PDT-SP) em 1º de abril do ano de 2020, e demaneira mais suscinta, tal PL aborda:

Problemas como os fakes (contas inautênticas) e bots/robôs (disseminadores artificiais), restringindo sua atuação nas redes. O artigo 4º do PL define o que é desinformação, conta inautêntica e disseminadores artificiais da seguinte forma:| desinformação: conteúdo, em parte ou no todo, inequivocamente falso ou enganoso, passível de verificação, colocado fora de contexto, manipulado ou forjado, com potencial de causar danos individuais ou coletivos, ressalvado o ânimo humorístico ou de paródia; conta inautêntica: conta criada ou usada com o propósito de disseminar desinformação ou assumir identidade de terceira pessoa para enganar o público; disseminadores artificiais: qualquer programa de computador ou tecnologia empregada para simular, substituir ou facilitar atividades de humanos na disseminação de conteúdo em aplicações de internet. (MENEZES, 2020). 

A PL também, propõe que os usuários deverão ser notificados em caso de denúncia ou de aplicação de medida por conta da lei. Porém, eles não precisarão ser notificados em casos de dano imediato de difícil reparação; para segurança da informação ou do usuário; de violação a direitos de criança e de adolescentes; de crimes previstos na Lei do Racismo; ou de grave comprometimento da usabilidade, integralidade ou estabilidade da aplicação. (HAJE, 2020).

Em entrevista, o diretor do InternetLab, Francisco Brito, fala sobre o lei n. 2.630/2020, e como deveria ser sua aprovação no senado, uma vez que para se tratar de um assunto tão específico demandaria bastante tempo e discussão:

Os bons projetos que tivemos para regulamentar a internet no Brasil foram aqueles que foram gestados com o tempo, amplamente discutidos e com diferentes hipóteses testadas. E isso não está sendo feito agora. Não há sequer uma comissão instalada para o debate. Além disso, há ainda uma questão de diagnóstico que essa lei não toca. Qual é exatamente o problema? Há vários sintomas: há problema dos boatos, um problema de crise de confiança em relação à imprensa e também de polarização política. E as pessoas falam dessa PL como se ela fosse resolver essas duas últimas questões, além das fake news. E não é o caso. Até porque todos estão conectados entre si. (MACIEL, 2020). 

Analisando pormenorizadamente o referido Projeto de Lei, pode-se auferir alguns embates com os princípios constitucionais, como por exemplo: o principio da liberdade de expressão e vedação da censura, e a violação da intimidade dos usuários das redes socias.

O questionamento da liberdade de expressão aqui, é diferente ao feito no capitulo anterior, uma vez que, supostamente, a PL apagaria o conteúdo falso dos provedores. Contudo, tal informação não é verdadeira, pois, a fake News, quando identificada ganhará um rótulo de conteúdo desinformativo e também explicações do porquê a notícia ter sido rotulada dessa forma.

Na opinião de muitos advogados, estudiosos e ativistas da liberdade de expressão, o PL do Senado incentiva as plataformas a adotarem mecanismos automatizados de vigilância massiva.  Para o coletivo Intervozes, "a previsão de concessão de maior poder a corporações privadas quanto ao fluxo de informações contraria recomendação do Relator Especial para Liberdade de Expressão da ONU sobre moderação de conteúdo, que aponta para a necessidade de reduzir o poder de monopólios digitais e não fortalecê-lo. (DE LUCA, 2020).

Ao empurrar para as plataformas a responsabilidade de resolver o problema das fake news, o governo está criando um novo problema, que é o da liberdade de expressão, afirma Francisco Brito da InternetLab. As plataformas não apenas não vão resolver essa questão, como também, ao se sentirem ameaçadas por essa lei, vão simplesmente apagar conteúdos que apresentarem o mínimo de dubiedade. Elas vão resolver o problema delas primeiro e pronto

Por fim, e mais importante, a PL determinará as punições em caso de descumprimento da Lei, que pode ser de advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; Multa; Suspensão temporária das atividades; Proibição de exercício das atividades no país.

Nota-se que em nada se fala sobre a disseminação de noticias falsas imputando crimes às suas vítimas, ou, notícias que degradam a vida psicológica, social ou emocional. Sendo assim, pode-se afirmar que a PL não penaliza de forma proporcional as fake News, sendo essas penalidades acima transcritas, inerentes aos disseminadores da notícia, e não aos criadores desta.

5.    CCONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a presente pesquisa, pode-se concluir que os impactos que as fake News podem ter na vida das vítimas, tanto psicológicos, sociais, emocionais ou jurídicos. Quanto aos impactos jurídicos, a discussão se acirra na medida em que o entendimento jurisprudencial segue a vertente de que os impactos psicológicos das fake News podem gerar a condenação à indenização por dano moral.

Quanto à análise das notícias fake News no âmbito jurídico, restou corroborado de que, ao menos de acordo com o entendimento jurisprudencial, a possível aplicabilidade do código civil, quando da ofensa à honra e dignidade, aplicando os arts. 186 e 927, que atribuem a indenização por dano moral. E a possível aplicação do código Penal no que se refere à condenação por multa do art.138, devido ao crime de calúnia.

Ademais, pudemos analisar a repercussão tida com a promulgação de um Projeto de Lei n°. 2.630/2020, que verse especificamente sobre o complexo tema das notícias fake News, ainda existem discordâncias quanto à eficácia, e a afronta do referido projeto aos preceitos constitucionais da liberdade de expressão e da não censura.

Sendo assim, com o trabalho em questão, depreendeu-se que o tema das fake News, é algo que ainda não pode ser legislado, apesar do esforço da PL nº. 2.630/2020, esta ainda é fragilizada não pela falta de apoio aos seus escritos, mas sim, pela falta de respaldo e cerceamento de argumentos incontestáveis para sua promulgação, mas até lá, as fake News e seus impactos sociais e jurídicos serão palco de muitas lides judiciais a serem respaldadas pelos Códigos Civil e Penal a depender do caso concreto.

 

REFERÊNCIAS

ALCASSA, Alessandra Dos Santos. Como identificar e evitar uma Fake News. Pub: 13 jul 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/330556/como-identificar-e-evitar-uma-fake-news. Acesso em: 26.09.2020.

ALLCOTT, Hunt; GENTZKOW, Matthew. Social Media and Fake News in the 2016 Election. Journal Of Economic Perspectives, [s.l.], v. 31, n. 2, p.211-236, maio 2017. American Economic Association. http://dx.doi.org/10.1257/jep.31.2.211. Acesso em 23 out 2020.

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BRASIL, Decreto Lei n°. 2.848 de 07 de dezembro de 1940, Código Penal Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em: 23 out 2020.

BRASIL, Lei n°. 10.406 de 10 de janeiro de 2002, Código Civil Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm. Acesso em: 23 out 2020.

CHAMONE, Marcelo Azevedo. O dano na responsabilidade civil. Pub: jul 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11365/o-dano-na-responsabilidade-civil. Acesso em: 23 out 2020.

CORRÊA, Ana Paula. Dos crimes contra a honra. Pub:16 ago 2016. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/9255/Dos-crimes-contra-a-honra. Acesso em: 23 out 2020.

DALEMA, Massimo. Entrevista. Carta Capital, 8 de janeiro de 2003.

DE LUCA, Cristina. Uma lei ruim para fake News, votada na hora errada, será um desastre. Pub: 13 mai 2020. Disponível em: https://porta23.blogosfera.uol.com.br/2020/05/24/uma-lei-ruim-para-fake-news-votada-na-hora-errada-sera-um-desastre/. Acesso em: 24 out 2020.

EISENBERG, José. Democracia Digital. In: Giovanni, Geraldo di; Nogueira, Marco Aurélio (Org.). Dicionário de Políticas Públicas. 2v. São Paulo: Fundap/ Imprensa Oficial. 2013.

GIOVANELLI, Carolina. Quatro motivos para a disseminação da fake News. Pub: 13 mai 2018. Disponível em: https://vejasp.abril.com.br/blog/terapia/fake-news-motivos-compartilhar/. Acesso em: 19 out 2020.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, 3ª edição ver. Atual. São Paulo, Saraiva, 2009, V.

GONZAGA, Andrea Neves Marques. Direito à honra. Pub: 18 fev 2010. Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/artigos-discursos-e-entrevistas/artigos/2010/direito-a-honra. Acesso em: 23 out 2020.

HAJE, Lara. Projeto do senado de combate a noticias falsas chega na câmara. Pub: 03 jul 2020. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/673694-projeto-do-senado-de-combate-a-noticias-falsas-chega-a-camara/. Acesso em: 24 out 2020.

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IDOETA, Paula Adamo. A história que deu origem ao mito da ligação entre vacinas e autismo. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-40663622. Acesso em: 27.09.2020.

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MAGALHÃES, Cristiano. O perigo das fake News para a sociedade e o impacto às pessoas e instituições. Pub: 04 ago 2020. Disponível em: https://www.abcdoabc.com.br/abc/noticia/perigo-fake-news-sociedade-impacto-pessoas-instituicoes-105789. Acesso em: 23 out 2020.

Sobre a autora
Ingrid Stefani de Brito Santos

Advogada especializada em Direito de Família e Sucessões, pela PUC-RS Especialização latu sensu em Direito e Processo do Trabalho, pela Universidade Legale Escritora da obra: "Coletânea jurídica: os temas mais relevantes da atualidade" Orientadora e coordenadora monográfica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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